O sofrimento do povo do Paquistão é largamente desconhecido no Ocidente. Uma cortina de silêncio foi cuidadosamente montada em relação ao número de pessoas mortas a cada dia por drones [aviões não tripulados] americanos e assassinos talibãs.
O sofrimento do povo do Paquistão é largamente desconhecido no Ocidente. Uma cortina de silêncio foi cuidadosamente montada em relação ao número de pessoas mortas a cada dia por drones [aviões não tripulados] americanos e assassinos talibãs. Mas, recentemente, um pequeno canto da cortina foi levantado em consequência de um acontecimento particularmente assustador. Ontem, Malala Yousafzai foi brutalmente baleada por bandidos quando voltava da escola e ia para sua casa. Assassinos mascarados detiveram um ônibus cheio de crianças aterrorizadas, identificaram-na e a balearam a curta distância na cabeça e no pescoço.
Quem são estes homens que fazem guerra a crianças indefesas? Sabemos quem são porque já admitiram a culpa. Os covardes assassinos que perpetraram este ato vil não sentem nenhuma necessidade de se esconderem da opinião pública. Não se sentem envergonhados, porque são absolutamente sem-vergonhas. O Talibã do Paquistão assumiu a responsabilidade por este ato de sanguinária selvageria.
Que crime cometeu esta jovem garota de 14 anos de idade que justificasse tirar a sua vida? Seria ela uma amiga do imperialismo americano? Teria ela apoiado a ocupação do Afeganistão? Estaria ela do lado do governo paquistanês e de seu exército?
Não, ela não tinha nada a ver com isto. Pelo contrário, Malala estava do lado do povo oprimido do Paquistão e do Afeganistão e de todos os países. Ela era inimiga do imperialismo, do latifúndio e do capitalismo. Ela apoiava a causa da liberdade, do progresso e do socialismo. E, por esta razão, eles tentaram tirar sua jovem e inocente vida.
Swat devastada
Talvez em nenhum outro lugar sejam maiores os sofrimentos do povo do Paquistão do que na área montanhosa conhecida como Swat. O vale do Swat é um lugar pitoresco que se tornou conhecido por sua música e sua tolerância. É o destino favorito para se curtir um feriado ou uma lua de mel. Agora, vive assolada por uma guerra caracterizada pela mais extrema selvageria de ambos os lados.
Devido a sua proximidade com o Afeganistão, esta bela região mergulhou em uma guerra sangrenta, em que o exército paquistanês, os talibãs e o imperialismo EUA lutam entre si para ganhar o domínio.
Primeiro o Talibã ganhou o controle. Eles tornaram a vida do povo de Swat um inferno, forçando homens a fazer crescer as barbas, decapitando seus opositores, impondo a lei da sharia e outras medidas reacionárias para manter as massas no estado da ignorância e do analfabetismo o que facilitaria dominá-las através de mulás e fanáticos religiosos. (Lei de Sharia: sistema jurídico derivado do corão, o livro sagrado dos muçulmanos, e da sunna (também conhecido como hadith), uma coleção sobre os feitos e passagens da vida do profeta Maomé (570-632). A Sharia prevê quatro graus de penas para quem infringe as leis corânicas. Para os crimes mais graves, como homicídio, adultério e blasfêmia, está prevista a pena de morte. O alcoolismo é punido com chibatadas e, em casos de roubo, o ladrão tem a mão cortada. Outras penas consistem na reparação financeira, castigos físicos e na retaliação, quando o criminoso recebe o mesmo tratamento que deu à vítima. Nota do editor).
Em um incidente o Talibã matou 14 pessoas em uma aldeia e pendurou seus corpos em árvores como advertência. Somente duas pessoas se atreveram a enterrar os corpos. Mais tarde, elas começaram a organizar resistência aos terroristas e agora são militantes da CMI. Apesar de todas as dificuldades e perigos, os camaradas da Corrente Marxista Internacional em Swat organizaram com muito êxito sua Escola Marxista neste verão, que ocorreu de 13 a 15 de julho.
A escola teve o comparecimento de mais de 225 camaradas de todos os lados do país. Mesmo alguns soldados estiveram presentes. Também estava presente a camarada Malala Yousafzai, que participou dos debates. Ela estava cheia de confiança e entusiasmo na justa causa pela qual estava lutando.
Agora, menos de três meses depois, ela luta por sua vida em centro de terapia intensiva de um hospital em Peshawar, com uma bala alojada perto do cérebro.
A natureza reacionária do Talibã
Existem no Ocidente os que se consideram a si próprios de “esquerda” e que pensam que é correto apoiar o Talibã, alegando que eles estão “combatendo o imperialismo”. Aqui, temos ignorância e cinismo combinados em iguais proporções.
O Talibã e outros grupos reacionários nunca foram anti-imperialistas. No passado, eles foram apadrinhados, armados e financiados pelo imperialismo, que os utilizaram como fantoches contra o exército soviético no Afeganistão. Naquele momento, a mídia ocidental os descrevia como “combatentes da liberdade”. Agora, ela os descreve como terroristas. Na verdade, eles eram naquela época terroristas contrarrevolucionários e agora são terroristas contrarrevolucionários.
Movimentos reacionários como o Talibã estão intimamente ligados aos latifundiários e aos capitalistas. Defendem os interesses, não dos pobres, mas dos comerciantes ricos, usurários, latifundiários e traficantes de drogas. Não é segredo de ninguém que eles são financiados, armados e, em grande extensão, controlados por elementos do Estado do Paquistão e do notório serviço de inteligência, o ISI.
Eles são contra a presença dos americanos no Afeganistão na medida em que seus padrinhos, no ISI, estão buscando transformar o Afeganistão em uma colônia do Paquistão. Não representam um avanço para o sofrido povo do Afeganistão, representam somente a troca de um opressor estrangeiro brutal por outro.
A luta contra o imperialismo somente pode ter êxito se for conduzida pelo povo trabalhador sob a direção de um partido marxista revolucionário. O verdadeiro caminho para se derrotar os imperialistas é arrancando pela raiz seus pontos de apoio – os latifundiários e capitalistas corruptos. A luta contra os opressores estrangeiros somente pode ter êxito se estiver ligada à derrubada do latifúndio e do capitalismo.
Os marxistas paquistaneses têm desvelado consistentemente as íntimas conexões entre os fundamentalistas islâmicos e o Estado paquistanês. Isto lhes rendeu o ódio eterno dos talibãs, que temem, com razão, que a influência em expansão do marxismo revolucionário os enfraqueça.
Em Swat nossos camaradas organizaram as massas locais contra estes reacionários. Em consequência, muitos camaradas têm sido vítimas do terrorismo fundamentalista. Um camarada teve oito balas de rifle G-3 alojadas nele. Os camaradas informaram que “somente a sua força de vontade e o ódio que sentia pelo estado repressivo e pelos talibãs contrarrevolucionários o mantivera vivo”.
O heroísmo de Malala
Depois dos horrores da ocupação Talibã, o exército paquistanês varreu o vale e causando o caos. Esta ofensiva desalojou em torno de 1,2 milhões de residentes. O exército também é acusado de abusos aos direitos humanos, inclusive assassinatos, torturas e o massacre de prisioneiros. Como sempre ocorre, em meio a tudo isso as pessoas simples são colhidas de surpresa.
Os contrarrevolucionários talibãs fazem particular oposição a que as mulheres desempenhem algum papel na sociedade além de serem escravas domésticas. Querem impedir as garotas de irem à escola. Tal é o seu ódio fanático à educação que destruíram escolas e mataram professores. O pai de Malala era o diretor da última escola feminina a ser fechada.
Durante a ocupação de Swat pelo Talibã em 2009, Malala, já com 11 anos de idade, pronunciou-se contra o fechamento da escola feminina. Numa época em que os políticos covardes em Islamabad estavam ocupados em apaziguar o Talibã, ela se pronunciou contra eles. Ela escreveu um blog para a BBC sob um pseudônimo Urdu. Subsequentemente, ela continuou a levantar a voz contra o Talibã, uma ação que significava uma coragem tremenda de sua parte. Eles começaram por ameaçá-la, mas ela continuou sua obstinada luta que adquiriu um caráter cada vez mais consciente e político.
Os líderes talibãs espalharam uma falsa informação, acusando-a de ser pró-Obama e pró-Ocidente. Mentira. Embora ela fosse visceralmente oposta ao Talibã contrarrevolucionário, a camarada Malala também se opunha ao imperialismo dos EUA e ao corrupto regime burguês do Paquistão. Suas simpatias dirigiam-se em direção totalmente diferente: para o socialismo revolucionário e ao internacionalismo.
Naturalmente, neste ponto, era mais conveniente para o regime burguês que alguém como ela revelasse os crimes do Talibã. Ela foi indicada ao prêmio nacional da paz em 2011. Mas, logo, os princípios burgueses voltaram a agir naturalmente. Os novos informes sobre a tentativa de seu assassinato fazem referências oblíquas ao seu crescente interesse na política, mas não dizem de que política consiste. Na verdade, ela era simpatizante da CMI.
Isto não é difícil de entender. No momento, a seção paquistanesa da CMI é a única força organizada de esquerda que existe em Swat. Há poucos anos nossas fileiras foram fortalecidas com o fluxo de antigos militantes do Partido Comunista que permaneceram leais às ideias de Marx e Lênin e que estão continuando a lutar pelo socialismo apesar de todos os riscos.
O informe final da escola marxista em Swat, que publicamos em marxist.com, conclui assim: “Esta escola deu grande energia e força à luta pelas ideias do socialismo científico proporcionando uma alternativa ao fundamentalismo religioso e ao liberalismo burguês”.
Um porta-voz do Talibã, Ehsanullah Ehsan, confirmou por telefone que Malala se tornara um alvo, chamando sua cruzada pelo direito à educação de “obscenidade”. A verdadeira obscenidade é uma sociedade que se baseia na escravidão de milhões de trabalhadores e camponeses e trata as mulheres como escravas de escravos. A verdadeira obscenidade é o trabalho infantil e o analfabetismo, a pobreza, as enfermidades e a ignorância. E são estas, precisamente, as coisas que o Talibã pretende perpetuar.
Malala é uma dos muitos excelentes jovens camaradas que estão buscando uma saída do presente e infernal impasse, tomando o caminho da revolução. Ao fazê-lo, ela estava muito bem ciente dos riscos. Ela estava preparada para arriscar sua vida pelos direitos humanos básicos, como a educação. E, por esta razão, pagou um alto preço.
Cada trabalhador com consciência de classe do mundo sentirá profundamente o drama de uma jovem abatida a sangue frio por um assassino covarde pelo crime de exigir os direitos das mulheres. Nossos corações sangram pelo sofrimento de sua família, amigos e camaradas. Fervorosamente desejamos sua total recuperação.
O perverso ataque não nos desviará de nossa tarefa. Expondo a baixeza e a crueldade de nossos inimigos, que são apenas a essência destilada da abjeta e cruel sociedade que produziu esses monstros, isto tornará de aço nossa determinação de continuar a luta pela qual a camarada Malala fez tão grande sacrifício.
Mais do que nunca, a única opção para a humanidade é: socialismo ou barbárie. Uma escolha entre as forças das trevas e da luz, entre a ignorância e o conhecimento, entre a selvageria e a civilização. É uma opção fácil de fazer, e Malala a fez. Permitamos que sua vida e coragem sejam um exemplo para todos nós.
Abaixo os assassinos contrarrevolucionários! Abaixo o imperialismo!
Vamos lutar por justiça para todos, por uma vida livre da ignorância, da violência e da opressão!
Levantemo-nos para lutar por um futuro melhor em um mundo socialista!
Londres, 10 de outubro de 2012.