Todos ao combate pela revogação do Novo Ensino Médio

Editorial da 26ª Edição do jornal Tempo de RevoluçãoFaça sua assinatura agora! Apoie a imprensa operária e independente.

Decretado via Medida Provisória por Temer em 2016, aprovado pelo Congresso Nacional em 2017, e com implementação iniciada por Bolsonaro em 2022, o Novo Ensino Médio é um ataque brutal à educação pública, que tem gerado revolta entre estudantes e professores pelo país.

A Esquerda Marxista, que desde o início se colocou contra esta reforma, está em combate para pô-la abaixo, coletando adesões ao abaixo-assinado lançado pelo mandato do deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ), que já conta com mais de 100 mil assinaturas pela revogação do Novo Ensino Médio. É preciso avançar na organização de comitês de luta e em mobilizações unificadas para conquistar a revogação total e imediata deste ataque.

O que está por trás do Novo Ensino Médio

As mudanças no Ensino Médio foram propagandeadas pelos governos Temer e Bolsonaro como inovadoras, um salto na qualidade da educação, que dariam ao aluno a liberdade para escolher a área que tem mais interesse de estudar, além de possibilitar uma formação profissional e tecnológica. A escola, assim, se tornaria mais atrativa para os jovens. Um sonho.

No entanto, a realidade é que as mudanças resultam em maior restrição do acesso da juventude ao conhecimento geral, ampliação das desigualdades entre escolas públicas e privadas, avanço da iniciativa privada na educação pública, uma formação profissional precária nas escolas para trabalhos precarizados, disseminação do Ensino a Distância (EaD), piores condições de trabalho e perda de postos de trabalho para os professores.

Estiveram diretamente envolvidos na formulação da proposta do Novo Ensino Médio e da Base Nacional Comum Curricular aprovada em 2018, a Fundação Lemann (de Jorge Lemann, o homem mais rico do Brasil), o Instituto Unibanco, a Fundação Itaú, o Instituto Natura, entre outros. Sua implementação tem sido financiada pelo Banco Mundial. Isso tudo só evidencia que esta reforma está a serviço do capital e é parte de uma ofensiva internacional do imperialismo sobre a educação.

As armadilhas dos “itinerários formativos”

Uma das “inovações” da reforma é a introdução dos chamados itinerários formativos. Essa é a parte da carga horária que o estudante escolheria para se aprofundar. Seriam cinco itinerários segundo a Lei aprovada: I – linguagens e suas tecnologias; II – matemática e suas tecnologias; III – ciências da natureza e suas tecnologias; IV – ciências humanas e sociais aplicadas; V – formação técnica e profissional.

Estes itinerários são um “vale tudo”, sem disciplinas ou conteúdos definidos. Daí surgiram relatos de disciplinas exóticas em escolas, tais como: “O que rola por aí”, “RPG”, “Mudo Pets SA”, “Brigadeiro caseiro” etc.

Apesar de serem cinco itinerários disponíveis, uma escola é obrigada a fornecer apenas um itinerário. Ou seja, um estudante pode ter interesse no itinerário “ciências humanas e sociais aplicadas”, mas sua escola pode oferecer apenas o itinerário “formação técnica e profissional”. Então, ou ele se enquadra no que tem, ou terá que buscar vaga em uma outra escola que ofereça o itinerário que deseja.

Estes itinerários são a precarização total da educação. Apesar de incluir o itinerário “formação técnica e profissional”, isso nada tem a ver com as escolas técnicas tradicionais que incluíam 2,4 mil horas de conteúdo geral, para além do ensino técnico profissional, que também, em geral, é bem mais sério do que tem surgido nesses itinerários. A formação profissional do Novo Ensino Médio, na maioria das escolas públicas do país, no máximo será formação de uma mão de obra precária para um mercado de trabalho precarizado e desregulamentado. Por isso, surgem as matérias que incentivam o empreendedorismo individual como “Brigadeiro caseiro”.

Cerceando o acesso ao conhecimento

Um ataque central da reforma é a transformação das disciplinas tradicionais (Português, Matemática, História, Geografia, Física, Biologia, Química, Filosofia, Sociologia, Artes, Língua Estrangeira – inglês ou espanhol – e Educação Física) em “áreas do conhecimento”, divididas em 4: I – linguagens e suas tecnologias; II – matemática e suas tecnologias; III – ciências da natureza e suas tecnologias; IV – ciências humanas e sociais aplicadas. Com essa mudança, apenas Português, Matemática e Inglês seriam disciplinas obrigatórias nos três anos do Ensino Médio. E as demais disciplinas? Em tese estariam englobadas nas tais “áreas do conhecimento”, podendo ou não se manter como disciplinas com seus nomes tradicionais, o que interessa para a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) aprovada em 2018 – após a reforma – é o aluno atingir determinadas metas de habilidades e competências em cada área, secundarizando o conteúdo a ser abordado em cada disciplina e em cada etapa.

De qualquer forma, o Novo Ensino Médio significará uma redução da carga horária do conteúdo comum obrigatório. Se antes da reforma a carga horária mínima nos três anos de Ensino Médio deveria somar 2,4 mil horas com as disciplinas tradicionais, com a mudança, a carga horária máxima total do conteúdo comum obrigatório é de 1,8 mil horas. E, atenção, a lei estabelece uma carga horária máxima, mas não uma carga horária mínima para as áreas englobadas pela BNCC. Ao mesmo tempo, ela estabelece um aumento da carga horária mínima geral para o Ensino Médio, passando de 2,4 mil horas para 3 mil horas, isso significa que, no mínimo, 1,2 mil horas seriam destinadas aos famigerados itinerários formativos e 1,8 mil horas no máximo para o conteúdo comum obrigatório.

Nós defendemos que os jovens tenham o mais amplo acesso ao conjunto do conhecimento conquistado pela humanidade. O Novo Ensino Médio faz com que o estudante tenha que optar por um itinerário ou se contentar com o que tem na sua escola, em detrimento do acesso ao conjunto das áreas do conhecimento humano. Se a escola pública tinha problemas antes, a reforma não melhora nada, ao contrário, só piora.

Avanço da privatização na educação pública

Uma parcela do Ensino Fundamental e Médio ofertado no país já está nas mãos das empresas privadas de educação. Mas aí ainda está um amplo mercado a ser explorado. O Novo Ensino Médio irá sucatear ainda mais a educação pública, ampliando a pressão para que os pais que têm alguma condição financeira, enviem os filhos para uma escola privada, que tem melhores condições de se adequar às mudanças no ensino médio.

Além disso, a implementação na rede pública do Novo Ensino Médio tem significado o avanço da entrada das empresas privadas de educação, através de convênios e parcerias público-privadas com os governos.

No Paraná, por exemplo, o governo de Ratinho Jr. começou em 2022 a terceirizar aulas a distância para a Unicesumar, uma empresa privada de educação que embolsou R$ 38,4 milhões pela parceria. As aulas gravadas provocaram uma revolta generalizada entre os estudantes no ano passado, em várias escolas houve protestos em que os jovens se recusaram a assistir as aulas. Alguns cartazes diziam: “Televisão eu assisto em casa” e “Queremos professor em sala de aula”.

O Ensino a Distância é uma ferramenta para reduzir os custos tanto no ensino público quanto no privado. Ele substitui vários professores que ministrariam a aula presencialmente com acompanhamento de cada aluno, por um único professor que grava uma aula e ela é transmitida para vários estudantes. Não somos contra o uso de novas tecnologias para o ensino, mas a EaD tem o objetivo fundamental de baixar custos com rebaixamento da qualidade do ensino.

Escola de Tempo Integral, para quem?

Um dos pontos do Novo Ensino Médio é o avanço em direção ao Projeto de Ensino Integral (PEI). Em tese, seria um sonho ter uma escola integral, que possibilitasse o múltiplo desenvolvimento da juventude, nas artes, nas línguas, na ciência e no desenvolvimento físico, sem precisar de vestibulares para entrar e sem ter que se preocupar em trabalhar para ajudar em casa ou para se bancar estudando. Com material, uniforme e alimentação gratuita e para todos. Com laboratórios interativos, incentivo à pesquisa, bibliotecas robustas, visitas e viagens técnicas, salas confortáveis, inclusivas e salubres. Com profissionais bem qualificados, bem remunerados e em abundância para atender a 15 estudantes por sala. Mas isso não tem nada a ver com a escola integral da realidade.

Na prática, o PEI mantém a escola sucateada e os estudantes enfurnados na escola o dia inteiro com toda a falta de conteúdo que já explicamos. Além disso, na realidade concreta, sem bolsas de estudo, o ensino integral obrigatório fará com que muitos estudantes tenham que escolher entre ir para a escola ou ir trabalhar. A necessidade de sobrevivência falará mais alto, e isso só poderá provocar o aumento da evasão escolar.

O impacto da reforma para os professores

Os professores são diretamente atingidos pela reforma, tendo que cortar conteúdo pela redução da carga horária de suas disciplinas ou tendo que dar aulas sobre temas que não têm capacitação.

A reforma é um ataque geral à carreira de professor. Introduz-se a possibilidade de contratação de profissionais com “notório saber” para dar aulas nos tais itinerários. Ou seja, profissionais sem formação como professor e com subjetivos critérios para caracterizar o “notório saber”.

A ampliação do Ensino a Distância, além da redução de carga horária das disciplinas comuns obrigatórias, só pode provocar a redução dos postos de trabalho e elevar o desemprego na categoria.

Organizar o combate pela revogação

Por todo o exposto, resta claro que essa reforma precisa ser inteiramente e imediatamente revogada. Não tem como ser aperfeiçoada ou revisada.

Notícias recentes de jornais afirmam que o “Governo Lula descarta revogar reforma do ensino médio, mas quer rever falhas” (Folha de S. Paulo, 28/02/2023). Camilo Santanta, ministro da Educação, declarou: “Falar em revogação sem aprofundar o debate sobre quais elementos problemáticos e as promessas não cumpridas não seria justo com nossos jovens e não nos ajuda a avançar. Defendemos a retomada do diálogo democrático sobre o sentido do Ensino Médio e sobre como podemos, juntos e com a prudência necessária, entregar a melhor escola”. Enquanto isso, a CNTE e a UBES não mobilizam professores e estudantes pela revogação da reforma, restringem-se a posicionamentos formais e negociações com o governo.

Este é um combate central, há uma ampla indignação e disposição de luta na base. É preciso organizar e mobilizar, ampliar as adesões ao abaixo-assinado pela revogação, constituir comitês de luta que organizem os próximos passos. É possível vencer! Ao combate!