Um interrogatório para criminalizar

A Esquerda Marxista iniciou uma campanha contra a criminalização dos movimentos sociais e decidiu por um editorial do Boletim Foice & Martelo sobre a questão mostrando na prática como esta ofensiva das classes dominantes está se desenvolvendo. Este editorial é especialmente dedicado a todos os que vivem a ilusão de que o Brasil é uma democracia exemplar e de que caminhamos para um capitalismo exuberante onde, pelo menos a grande maioria, será muito feliz.

Origem e atualidade

O tratamento da questão social, neste país atrasado e tão desigual, sempre foi um caso de polícia. Porém, desde os anos 80, a força e a organização do proletariado inverteram o rumo das coisas. Só a chegada de Lula, do PT, ao governo praticando uma política de colaboração de classes, gerenciamento do capital falido, e de submissão pública ao capital e às instituições e aos dirigentes burgueses nacionais e internacionais, seu alinhamento incondicional à defesa das instituições capitalistas, permitiu à burguesia retomar a ofensiva em sua luta de classes contra o proletariado e a juventude. Mas, incapaz de um enfrentamento político aberto, a covarde burguesia utiliza centralmente o seu judiciário de classe para atacar como se os que lutam contra a opressão e a exploração fossem criminosos comuns.

A origem disso é a relação entre a fragilidade do capitalismo brasileiro, dominado e dependente do imperialismo, a força e a juventude do proletariado, a incapacidade das direções das organizações de massa de controlar este proletariado por um longo tempo em uma época de crise como a que vivemos desde 2008. O medo da burguesia frente à resposta da classe trabalhadora com o aprofundamento da crise. A divisão nacional e internacional das classes dominantes entre os que desejam continuar uma colaboração de classes “normal”, como a praticada por Lula e seus amigos, com coalizões governamentais, tripartismo, etc., e aqueles que preferem a via do enfrentamento e destruição, liquidações das organizações de classe mesmo que dirigidas por oportunistas e reformistas irrecuperáveis. Esta é a via do STF, e do judiciário, em geral.
Este é o quadro de fundo da situação internacional em que a resistência das massas e a incapacidade da burguesia de resolver sua crise marcam o ritmo de uma sinfonia que pode se prolongar por décadas. O capital chegou a um pântano conduzido por seus próprios mecanismos internos alimentados e potencializados por décadas de medidas artificiais de sobrevivência de um mercado vivendo uma situação e crise de superprodução.

Lei Antiterrorismo, Lei de Garantia da Ordem (LGO) e Lei de Segurança Nacional (LSN)

Um profundo obscurantismo, o anticomunismo mais tacanho, a sanha e ódio de classe se expressam na perseguição política hoje desenfreada em todo o país. Após as Jornadas de Junho que abalaram o Brasil o ódio aumentou e a perseguição e a criminalização cresceram geometricamente. Sob a batuta do governo Lula/Dilma e tocada pelo aliado Sarney se aprovam pela primeira vez leis antiterrorismo, que permitem prender por 30 anos os dirigentes de uma greve com ocupação ou os dirigentes de uma manifestação de massas que enfrente a polícia alucinada e degenerada chamada PM.

Após Junho até a Lei de Segurança Nacional (LSN) foi invocada e aplicada contra manifestantes ou simples transeuntes próximos das manifestações. A mesma que foi criada e aplicada pela Ditadura Militar em 1979 contra os 7 estudantes presos na Novembrada contra o ditador General João Figueiredo e seu governador Jorge Bornhausen. A mesma Lei usada para prender e julgar Luís Inácio Lula da Silva por dirigir as greves dos metalúrgicos no ABC, em 1979 e 1980. Para coroar, o governo aplica no Leilão do Campo de Libra a Lei da Garantia da Ordem, atribuição exclusiva da presidência para colocar o Exército, a Marinha e Aeronáutica no combate ao “inimigo interno”, ou seja, à população que se manifesta ou protesta. Cada um faz sua parte e a criminalização da questão social se aprofunda. Publicamos a seguir uma parte do interrogatório feito pela Polícia Federal ao companheiro Serge Goulart, dirigente do Conselho de Fábrica da Cipla e Interfibra, fábricas ocupadas pelos trabalhadores em 2002, em Joinville, SC. O objetivo era instruir, em 2010, um processo com acusação de “Formação de Quadrilha” (!) contra os principais dirigentes das ocupações de fábrica naqueles anos de crise da economia brasileira. Este processo foi acolhido por um juiz federal e está em curso. Num próximo editorial publicaremos as perguntas (incríveis!) do Procurador-acusador às testemunhas, na última audiência, em 5/12/2013.

A seguir, para que cada um veja com seus próprios olhos o caráter político, inquisitorial, ditatorial, medieval e antidemocrático do interrogatório estão extratos do mesmo:

“Confirma ter integrado o movimento dos trabalhadores da CIPLA que promoveu a greve de 2002 e que culminou com o afastamento da diretoria? Quem eram os principais líderes do movimento dos trabalhadores? Quem eram os principais líderes do movimento intitulado “Corrente do Trabalho/Esquerda Marxista?”

“Quem eram as pessoas que exerciam cargos de chefia e gestão? Confirma o fato de que pessoalmente liderou um movimento de
resistência contra a ordem de intervenção judicial? O que era a Associação Ferreirinha? Qual seu objetivo? Quem eram seus fundadores? Como era mantida? Confirma que tal associação foi criada pelo depoente e outros comparsas e tinha por objetivo organizar movimentos de tomada de outras fábricas?”

“Enquanto esteve à frente do movimento dos trabalhadores que administrou a CIPLA, manteve algum contato com entidades sindicais ou políticas de outros países, como a Venezuela? Em caso positivo em que consistiram tais contatos quais seus objetivos? É filiado a algum partido político? Qual?”

“A Comissão de trabalhadores que esteve à frente da CIPLA era filiada a algum partido político ou entidade sindical? Qual?”

É preciso unificar as organizações dos trabalhadores para barrar esta escalada repressiva e antidemocrática. Este é o objetivo da campanha que a Esquerda Marxista está a iniciar. Junte-se a nós.