Relato do 7º dia (17/04/2013) do camarada Alexandre Mandl, enviado da Campanha “Tirem as Mãos da Venezuela” a Caracas:
A situação está mais calma, e a tentativa de golpe e violência somente reforçou a necessidade de defender o processo revolucionário, e avançar rumo ao socialismo sem qualquer negociação ou concessão com a burguesia, os reformistas e a burocracia. Viu-se que, indo às ruas, os “chavistas” sinalizaram à Maduro de que pode contar com a classe trabalhadora e a juventude para ir à esquerda!
Compas,
Hoje fiquei praticamente todo o dia por conta da importantíssima visita à Fábrica Inveval, ocupada em 2002, e nacionalizada por Chávez em 2005. Mas, tanto lá, como nas conversas pelas ruas, pelos jornais e pelas notícias na TV, faço alguns comentários sobre essa quarta-feira.
Sobre a Inveval:
A fábrica Inveval, fica em Los Teques, na grande Caracas. São grandes lutadores, que sempre, historicamente, estivemos juntos, aprendendo e mostrando a unidade da classe trabalhadora internacional.
A situação da Inveval parece muito com a da Fábrica Ocupada Flaskô?. A história é sempre a mesma – patrão não paga salários, direitos, começa a tirar máquinas, não paga impostos, cortam a luz, etc. A Inveval produz e faz manutenção das válvulas utilizadas pela PDVSA.
A Inveval foi ocupada em 2002, e é uma das primeiras a puxar o movimento das fábricas ocupadas na Venezuela, colocando a pauta da nacionalização sob controle dos trabalhadores.
Junto com a Inveval realizamos o “I Encuentro de Fabricas Recuperadas de América Latina”, em Caracas, em 2005, e que contou com a presença de Chávez, e que, vestindo um boné do Movimento das Fábricas Ocupadas do Brasil disse que “fábrica quebrada é fábrica ocupada, e fábrica ocupada deve ser estatizada e colocada sob o controle dos trabalhadores”.
Depois, realizamos o II Encuentro de Fabricas Recuperadas em 2009, também em Caracas. Entre os dois, em dezembro de 2006, os camaradas da Inveval estiveram presentes no Encontro Pan-Americano em defesa dos direitos dos trabalhadores e da reforma agrária”, na Fábrica Ocupada Cipla, em Joinville/SC.
Depois, no aniversário de 8 anos da Fábrica Ocupada Flaskô, além de contar com a presença de Esteban Volkov, neto do Trotsky, contamos com a presença e a solidariedade dos trabalhadores da Inveval, representados por Ramon Mocetillo.
Hoje, cheguei na fábrica e participei da assembleia geral. Uma discussão de altíssimo nível, debatendo as perspectivas políticas da Venezuela, como pressionar o governo, diante do contexto pós eleição de Maduro.
A burocracia e os reformistas da PDVSA têm travado a compra de sua produção, fazendo com que as dificuldades sejam enormes. Jorge Paredes, coordenador-geral do Conselho de Fábrica da Inveval explicou que eles estão em um momento chave, pois se não conseguirem vender para a PDVSA, poderão fechar as portas, e que eles estão dispostos a tomar todas as decisões, frisou, todas, para garantir o funcionamento da fábrica. E isso eles cobrarão nas ruas.
No Facebook, divulguei vídeo que fizeram, contando rapidamente como estão vendo o processo venezuelano e prestando solidariedade à luta da Fábrica Ocupada Flaskô.
Alguns comentários sobre o que aconteceu hoje:
Primeiro, na verdade, ainda ontem, apesar de ter escrito, quero ressaltar uma questão. O recuo dos golpistas possui vários aspectos – divisão da oposição (tendo setores empresariais que não queriam uma instabilidade econômica derivada de um eventual golpe), fragilidade internacional diante de uma série de apoios vindos ontem para respaldar de que não aceitariam ter um golpe (e alguns intelectuais, de que não aceitariam o desrespeito à democracia e ao Estado Venezuelano), a descoberta do plano pelo setor de inteligência do governo e do exército, mas, principalmente, porque a classe trabalhadora e a juventude, os moradores dos bairros, os “motorizados”, os “chavistas” saíram às ruas para impedir novamente um golpe, como sucedeu em 2002. Em todas as capitais e em muitas cidades, os golpistas tentariam fazer atos em frente das sedes regionais do Conselho Nacional Eleitoral. Os chavistas foram às ruas para impedir isso, e enfrentar os “esquálidos”, dizendo que se eles optarem por esse caminho, de golpe e violência, eles não permitiriam e defenderiam a revolução.
Um aspecto que não tinha dado tanta importância, mas hoje vi muita gente falando é o embate que houve na Assembleia Nacional ontem. Primeiro, só para esclarecer, aqui o poder legislativo é unicameral, ou seja, não há senadores, são todos deputados. O presidente é Diosdado Cabello, que muitos dizem que é o cara com mais poder no chavismo, sendo corrupto e aliado da burguesia. Mas, por outro lado, dizem que é um cara extremamente leal à Chávez, e que sempre enfrentou a direita, pelo menos na oratória, seu maior ofício.
Ontem ele, como presidente da Assembleia Nacional, para cada deputado que pedia para fazer uso da palavra, ele perguntava antes: “Reconhece o Estado Democrático de Direito da Venezuela, e o resultado apresentado pelo Conselho Nacional Eleitoral?”. Se não, ele não autorizava a falar e cortava o microfone. Foram assim como todos da oposição. Se sim, todos os chavistas, ele deixava falar.
Isso foi feito num contexto de ontem, com todos os aspectos que mencionei. O mais interessante é o que ele disse depois que questionado pelo deputado opositor que está nervoso e agressivo, ameaçando, etc., Diosdado respondeu com uma bela síntese: “Olhem, deputados, lembrem que Chávez não está mais aqui entre nós. Chávez era quem podia controlar o povo. Ele era o único que poderia conter qualquer insanidade e loucura. Prestem atenção ao que estou dizendo. Ele não está aqui. Por isso, recomendo à vocês que entendam o que estão provocando. Não temos Chávez. Se vocês fizerem loucuras, terão a resposta na mesma altura, mas sem o Chávez para coordenar isso. Nós não teremos o controle e não podemos nos responsabilizar. É o povo na rua que vai derrubar vocês contra qualquer tentativa de golpe”.
Ou seja, o recado foi dado, e foi dado pelo representante do chavismo mais próximo da burguesia. Ele deixou claro o que estamos salientando, de que ao não ter o Chávez que, justamente por causa de sua autoridade política diante da classe trabalhadora e da juventude, e que, muitas vezes, puxou responsabilidade para a via institucional, individualizou e centralizou os conflitos, agora, sem o Chávez, o governo não teria quem freasse os chavistas nas ruas.
Depois desse claríssimo recado, os deputados opositores se calaram, colocando um rabinho entre as pernas e foram se reunir para avaliar suas atitudes. Em menos de 2 horas, estava Capriles na TV cancelando o ato público que teria hoje.
Esse caso é emblemático para demonstrar muitos aspectos da conjuntura venezuelana.
A preparação é para sexta-feira, onde haverá grande manifestação para acompanhar a posse de Maduro na Assembleia Nacional. Vamos ver…
Amanhã visitarei uma fábrica que acaba de ser ocupada – Azertia, na região leste de Caracas, que é extremamente estratégica, pois é uma gráfica que imprime papel moeda, cheques, cartões de alimentação para todo o governo. Antes, porém, farei duas apresentações sobre a história do Movimento das Fábricas Ocupadas e a luta pela nacionalização sob controle operário para dois grupos de trabalhadores do Ministério de Ciência e Tecnologia.