Com esse artigo de Luiz Bicalho, iniciamos uma série, onde iremos polemizar com os textos de Zé Dirceu publicados em seu blog, os quais em geral defendem permanentemente a política de colaboração de classes, que é possível desenvolver o capitalismo de uma maneira menos agressiva, que para chegar ao poder o PT deve se unir aos capitalistas mais sensíveis, mais humanos, que a privatização feita por Dilma é diferente das feitas pelo PSDB e que isso vai beneficiar o povo.
Luiz Bicalho contesta o Zé
Com a nefasta privatização dos aeroportos: o Blog do Zé Dirceu, preparando o terreno e depois se justificando, trouxe várias matérias defendendo a privataria com argumentos completamente descabidos, vejamos:
– que concessão é diferente de privatização
– que as privatizações (“concessões”) dos aeroportos vão melhorar a vida dos passageiros
– que isso é bom para o governo, porque os cofres públicos lucrarão com a transação
– que isto tudo é muito diferente daquilo que os tucanos fizeram nas privatizações
Muito bem. Juridicamente falando, concessão é diferente de privatização. Na primeira, você privatiza a gestão, na segunda privatiza a propriedade. Mas, nos dois casos ocorre a privatização. Ou seja, o governo assume que o Estado é ineficiente para tocar determinada atividade econômica e, portanto, o que temos que fazer é transferir a gestão desta atividade econômica para o setor privado. Essa é essência e a lógica de todas as privatizações tucanas.
Aliás, os dois argumentos seguintes do Zé Dirceu são exatamente os mesmos que os tucanos usavam na privatização: que a vida dos usuários (no caso, usuários de telefonia e energia elétrica) iria melhorar, que os serviços iriam melhorar e que o governo ganharia muito dinheiro com a transação. Os jornais da época comemoravam o sucesso dos leilões, exatamente como comemoraram agora, ressaltando que o ágio pago nunca tinha sido tão alto. E que o dinheiro da privatização iria ser investido no interior.
Coitado do pessoal do interior que até hoje espera a internet prometida. E coitados serão os usurários dos aeroportos pequenos, que sofrerão o fato de não terem dinheiro, porque o dinheiro das concessões servirá para…pagar a dívida interna, para fazer o famoso superávit primário. Alias, diga-se de passagem, um dos motivos do aumento da dívida do ano passado foi o repasse de dinheiro do tesouro para o BNDES investir. E, surpresa, o que faz o BNDES com este dinheiro? Financia 80% das privatizações com juros subsidiados.
Moral da história: o dinheiro que volta para os cofres do governo (o “ágio”) saiu, em sua maior parte, dos cofres do governo (do BNDES). Só que para o governo pagar a si mesmo, tendo como intermediário uma empresa privada que ficou com a “gestão” do negócio e vai lucrar com ela, o governo pega dinheiro emprestado (dívida pública) e paga juros de mercado. Entenderam? Para privatizar, o governo aumenta a dívida e usa o lucro da privatização para…pagar a dívida. Espera aí, então tudo ficou como antes, não mudou nada? Nada disso.
Depois da negociata a coisa ficou assim:
– aumentou a dívida pública e aumentaram os pagamentos de juros para os banqueiros (ano passado o pagamento de juros foi de 230 bilhões de reais, 50 bilhões a mais que a média histórica dos últimos 10 anos.
– o BNDES empresta a um investidor privado com juros subsidiados que vai ter lucros imensos com a diferença de juros entre o que o mercado exige e o que o BNDES fornece.
– o governo usa o “lucro” que ele próprio criou para pagar juros maiores. Em outras palavras, o governo perde a diferença entre os juros do mercado que ele paga e os juros do BNDES pelo qual ele financia a privatização.
– e uma empresa privada passa a deter a concessão por 20 ou 30 anos, lucrando durante todo o período.
Grande negócio, no qual ganha o concessionário e ganham os bancos e, claro, alguém perde, o governo. Tudo igualzinho a privatização tucana.
Agora, além do prejuízo financeiro existe um prejuízo muito maior. O PT nasceu como o partido que lutava pelo socialismo, por uma sociedade sem explorados nem exploradores. A privatização (ou a “concessão”, nos termos do Zé Dirceu) questiona a fundo exatamente isso: para funcionar alguma coisa, precisa de um patrão, precisa de um dono, precisa de alguém que mande, o coletivo dos trabalhadores não pode aspirar dirigir a sociedade.
Em última análise, a privatização faz com que os militantes petistas se perguntem mais e mais se este é realmente o seu governo! Afinal, no grito da CUT, estão duas coisas: de um lado a exigência de que Dilma mude o rumo do governo. De outro, a constatação de que este governo não é o governo do PT, é um governo onde quem manda é a coalizão (PMDB, PP, etc) e onde o peão não tem vez.
Está certa a CUT quando na manifestação contra a privatização dos aeroportos gritou: “Dilma, eu não me engano, privatizar é coisa de tucano”. Sim. E, infelizmente, estão certos os tucanos que dizem que Dilma os copiou.
Nós, que há muito combatemos estas coalizões, continuamos no mesmo lugar: ao lado dos trabalhadores, contra as privatizações, contra as coligações que desnaturam o PT. Lamentamos ver Zé Dirceu do outro lado da cerca.