Para atacar o trotskismo, reformistas e stalinistas (ou ex-stalinistas) frequentemente recorrem ao seguinte argumento: “uma revolução mundial é uma perspectiva utópica pouco realista, porque uma revolução não pode eclodir em todos os países ao mesmo tempo!”.
É fácil responder a esta objeção, porque, na realidade, nenhum teórico marxista – nem mesmo Marx, Engels, Lênin ou Trotsky – afirmou que a revolução deve, ou mesmo poderia, eclodir simultaneamente em todos os países. Contudo, apontaram que o sucesso definitivo de uma revolução socialista é impossível dentro dos limites das fronteiras nacionais de um único país. De fato, o socialismo só pode vencer definitivamente em escala internacional. Explicaremos em termos concretos o porquê da “revolução mundial” e o que ela significa.
Capitalismo e socialismo
Hoje, o desenvolvimento das forças produtivas e, desse modo, o progresso em geral, esbarra em dois obstáculos fundamentais: 1) a propriedade privada dos grandes meios de produção; 2) a divisão do planeta em Estados-nação. O desenvolvimento do mercado internacional, após a Segunda Guerra Mundial, removeu apenas parcialmente o segundo obstáculo. Além disso, desde a crise de 2008-2009, houve um ressurgimento de tendências protecionistas, que só tendem a agravar a recessão econômica.
O socialismo significa a remoção dos dois obstáculos: a expropriação dos grandes capitalistas e a planificação democrática da produção em escala internacional. Isso implica, então, a longo prazo, o desaparecimento dos Estados-nação e das fronteiras nacionais em favor de uma planificação global dos recursos produtivos. Aliás, a resolução da crise ambiental só será possível nesta escala, porque as diversas formas de poluição – incluindo as emissões de gases do efeito de estufa – não respeitam fronteiras.
A burocracia stalinista se opôs a essa perspectiva internacionalista desde meados da década de 1920 com a sua teoria nacionalista de “socialismo em um só país”. Leon Trotsky, que liderou a oposição de esquerda ao stalinismo, apontou que essa suposta “teoria” refletia, acima de tudo, o conservadorismo de uma burocracia que ansiava por desfrutar pacificamente de seus crescentes privilégios e, assim, normalizar suas relações com os governos capitalistas. De resto, Trotsky demonstrou que é impossível desenvolver, harmoniosamente, uma economia nacionalizada e planificada dentro dos limites de um único Estado-nação, por mais gigantesco que seja. É impossível construir o socialismo em um entorno capitalista, ou seja, em um entorno econômico, político e militarmente hostil. O posterior destino da União Soviética confirmou essas análises.
Internacionalismo
Portanto, o socialismo deve prevalecer em nível mundial, ou, eventualmente, nunca se concretizará. Mas, é possível? Como?
Marx enfatizou que os trabalhadores formam uma mesma classe internacional. Um trabalhador francês tem muito mais em comum com um trabalhador alemão, russo ou indonésio, do que com os grandes capitalistas franceses Bernard Arnault1 ou Martin Bouygues2. Por isso que uma revolução em um país sempre serve de exemplo e inspiração para os trabalhadores de outros países. A história está repleta de exemplos desse fato. Em 1848, como em 1917 e 1968, as mobilizações revolucionárias cruzaram fronteiras e puseram em movimento enormes massas de trabalhadores e camponeses pobres, apesar de suas diferenças de idioma, costumes ou religião. Novamente este foi o caso, mais recentemente, da Primavera Árabe: em 2011, a revolução tunisiana se espalhou rapidamente por todo o mundo árabe. Também afetou Israel, onde dezenas de milhares de pessoas se manifestaram contra a austeridade. Na Espanha, o movimento dos Indignados foi inspirado por ela, assim como o movimento Occupy nos Estados Unidos e as grandes greves em Wisconsin.
A derrubada do capitalismo em um país – qualquer que seja – será uma grande inspiração para os trabalhadores em todo o mundo. No movimento operário internacional, se levantará a seguinte questão: “ser contra ou a favor da revolução socialista”? A radicalização e a atividade revolucionária das massas serão fortemente estimuladas. Porém, para que isso leve à derrubada do capitalismo em outros países, será necessário ter construído, previamente, “o partido mundial da revolução socialista”, segundo a fórmula de Lênin, quer dizer, uma Internacional revolucionária suficientemente enraizada na juventude e na classe trabalhadora. É precisamente isso que a Corrente Marxista Internacional se esforça a construir.
TRADUÇÃO DE NATHAN BELCAVELLO DE OLIVEIRA.
Artigo publicado na página do Révolution, seção francesa da Corrente Marxista Internacional, sob o título “La ‘révolution mondiale’: une utopie?”, publicado em 31 de março de 2023.
Notas:
1 Empresário francês, atual presidente e diretor-executivo da LVMH, a maior empresa de artigos de luxo do mundo, sendo, atualmente, a pessoa mais rica do mundo, ultrapassando Elon Musk em dezembro de 2022 (WIKIPEDIA, 2023 – Nota do Tradutor).
2 Outro bilionário francês, presidente de um grupo industrial multinacional que leva o nome da família, menos rico que Bernard Arnault (N.T).