O que está por trás do polêmico projeto de lei defendido pelo Deputado Federal Aldo Rebelo no Congresso Nacional?
As mudanças que estão em discussão no Congresso Nacional para o Código Florestal brasileiro têm a clara intenção de flexibilizar as regras existentes para beneficiar o agronegócio e o latifúndio em detrimento da preservação do meio ambiente. Além de não atender nenhum interesse dos oprimidos por esse sistema: os agricultores familiares, os sem-terra, os que são levados pela falta de opção a construir suas casas em áreas de risco como morros e encostas.
Engana-se aquele que acha que o relator do Projeto de Lei que propõe tais mudanças é um membro da bancada ruralista do DEM, do PSDB, ou do PMDB. As propostas partiram do deputado federal Aldo Rebelo, do Partido Comunista do Brasil (PCdoB)!
As mudanças no Código Florestal
Entre as mudanças, está a criação de um novo conceito, o de Área Rural Consolidada, que serve basicamente para dar um nome mais simpático para os terrenos utilizados ilegalmente antes de 22/07/2008. O objetivo é anistiar todos aqueles que cometeram crimes ambientais antes dessa data, independente do tamanho da propriedade. Um verdadeiro presente de Natal fora de época que o Papai-Noel Aldo quer dar aos latifundiários, cujas multas por crimes ambientais somam mais de 8 bilhões de reais!
Uma das polêmicas propostas de mudança no Código está relacionada à largura da faixa a ser preservada nas margens dos rios. A Área de Preservação Permanente (APP) é considerada pela lei como uma área protegida da degradação humana por motivos ambientais ou sociais. No caso dos rios com leito de até 10 metros de largura, atualmente, a faixa de APP é de 30 metros a partir de cada margem. Aldo Rebelo queria diminuir essa largura para 15 metros, mas após embate com governo e ambientalistas, recuou, ou melhor, deu uma impressão de recuo. A APP continua sendo de 30 metros na nova proposta, mas se antes a medição era feita na cheia do rio, pelo projeto do Sr. Aldo passaria a ser feita considerando o leito regular. Se não bastasse essa manobra, ainda existe outra: nos desmatamentos realizados nas tais Áreas Rurais Consolidadas, não seria necessário recompor os 30 metros, mas apenas a distância de 15 metros das margens do rio.
O tipo de vegetação a ser preservada nesses casos, conhecida como mata ciliar, cumpre importantes funções: controlar erosão das margens dos rios, minimizar efeito das enchentes, manter a qualidade da água, filtrar resíduos de agrotóxicos e fertilizantes, auxiliar na proteção da fauna local.
Dados da ONU dizem que em 2050, 45% da população mundial não terá acesso à água potável. Diante desse prognóstico, o que o capitalismo faz é aumentar a destruição de uma vegetação que auxilia na preservação dos reservatórios de água potável – muito sensato.
Também são consideradas Áreas de Preservação Permanente os topos de morros, montes, montanhas e serras a partir de 100m e 25o de inclinação, ou com mais de 1800m com qualquer inclinação e vegetação, além de encostas a partir de 45o de inclinação. A vegetação nessas áreas amortece a chuva, diminui a erosão do solo e evita os deslizamentos de terra nas zonas rurais e urbanas, além de, em cada caso, abrigar uma fauna específica. Com a mudança proposta, independente da importância do local, os desmatamentos realizados até julho de 2008 seriam anistiados no novo código como Área Rural Consolidada, e os proprietários que mantêm alguma atividade produtiva no local ficariam isentos da recomposição da vegetação. O que chama a atenção nesse caso é a falta de critério, liberando a exploração de todas essas áreas desmatadas.
Em artigo de Carlos Alberto Franco da Silva e Flávio Almeida Reis, publicado por nosso site em agosto do ano passado, já alertávamos para as sérias conseqüências trazidas pelas propostas de mudança no Código Florestal. Sobre a Reserva Legal explicamos:
“É o percentual de área que deve ser conservada na propriedade rural com vegetação nativa, localizada numa propriedade ou posse rural, que não seja a de preservação permanente (APP). Seu objetivo é a conservação e reabilitação dos processos ecológicos, proteção do solo, conservação da biodiversidade e proteção da fauna e flora nativas. Ela varia de acordo com o bioma e a dimensão da propriedade. Ela pode ser: Amazônia (80%), Cerrado (35%), demais biomas (20%).
Manter uma área com mata nativa deveria ser interessante até para o proprietário, pois ela diminui a quantidade de pragas na plantação, necessitando assim de menor volume de agrotóxicos, aumenta o número de polinizadores, garante abrigo e alimento para animais que deixam de invadir roças para se alimentar, evita a erosão do solo, além de proteger rios, nascentes e as águas que correm no subsolo.”
Na nova proposta, os proprietários de terrenos com até 4 módulos fiscais (400 hectares) que derrubaram a vegetação nativa da Reserva Legal antes de 22/07/2008 não precisarão realizar o reflorestamento, o que abre brecha para os latifundiários burlarem fiscalizações fracionando a propriedade. Além disso, como pudemos ver no trecho citado acima, na atual legislação a Área de Preservação Permanente presente em uma propriedade não conta na soma da área que deve ser destinada à Reserva Legal. Já com a mudança proposta, a APP passaria a fazer parte dessa soma, o que na prática significaria uma diminuição da Reserva Legal.
Aliança com quem e para quê?
Em toda essa novela das mudanças no Código Florestal existe uma questão importante a ser analisada. O governo no ano passado posicionou-se contra o primeiro relatório de Aldo Rebelo. Foram feitas então negociações, idas e vindas, mudanças que mudam pouco e se chegou a um acordo. Só que quando o relatório final foi apresentado aos deputados federais para ser votado na quarta-feira da semana passada (11/05/2011), a coisa esquentou com bate-boca e acusações. Apesar do acordo fechado antes com o governo, o deputado Paulo Teixeira (líder do PT na Câmara) protestou e posicionou-se pelo adiamento da votação. Enquanto isso, o também petista Cândido Vaccarezza, líder do governo na Câmara, vendo a possibilidade do DEM apresentar emendas ao projeto que retomavam pontos da primeira versão e avaliando que o governo poderia perder a votação, pediu a contagem do quórum e na insuficiência do número regimental para prosseguir a discussão, ela foi adiada.
A maioria dos dirigentes petistas diz que a coalizão do governo com partidos da burguesia é necessária para se ter governabilidade, para que se aprovem os projetos do governo. Esse é um caso exemplar do quanto isso é falso. O governo conseguiu aliados no parlamento para aprovar um reajuste do salário mínimo rebaixado e para realizar cortes no orçamento, mas quando o caso contraria os interesses da classe dominante não se tem maioria. Óbvio, pois os partidos burgueses aliados, como o PMDB, estão infestados de ruralistas que querem lucrar agora, não querem pagar multas pelo desmatamento realizado, enfim, defendem seus interesses de classe, da classe que é inimiga da classe trabalhadora.
Por isso, é necessário romper essa coalizão com os partidos burgueses para que se faça um governo verdadeiramente voltado para os interesses da classe trabalhadora, aliando-se à base do PT, à CUT, ao MST e demais movimentos sociais. Por isso Dilma deveria seguir o conselho do Manifesto contra as mudanças em discussão no Código Florestal, assinado por várias organizações, entre elas CUT, MST e UNE, que diz:
“Esperamos que a presidenta Dilma mantenha seus compromissos de campanha no que toca à não flexibilização da legislação ambiental e nos comprometemos a apoiar e dar sustentação política na sociedade para enfrentar os interesses do agronegócio que vem buscando o desmonte da legislação ambiental. Conclamamos ao povo brasileiro a se somar nessa luta contra as mudanças no Código!”
O projeto deve ir à votação na câmara nas próximas semanas, a pressa em aprovar sem aprofundar a discussão dos reais impactos que essas mudanças podem causar se deve ao fato de que em 11 de junho acaba a suspensão da punição para aqueles que cometeram crimes ambientais antes de julho de 2008, sendo um dos pontos a ser aprovado justamente a anistia a esses crimes. Depois o projeto segue para o Senado e para a sanção da presidente. Devemos acompanhar atentamente o comportamento dos parlamentares petistas e dos ditos aliados nessa questão, além disso, Dilma deve vetar os pontos que forem aprovados que vão contra os interesses do povo.
A hipocrisia capitalista
A destruição do meio-ambiente de uma forma predatória, que não leva em conta a conservação das riquezas naturais, é consequência direta da “anarquia” capitalista. O uso racional das riquezas naturais, utilizando os avanços tecnológicos na agricultura e pecuária, propiciaria alimentos a todos, condições dignas de vida a todos, preservando a natureza e o futuro da vida no planeta.
A conservação do meio-ambiente é mais uma das tarefas impossíveis de serem cumpridas pela burguesia e pelo capitalismo. Eles fazem seus discursos demagógicos de sustentabilidade, de economia de água e papel, enquanto do outro lado estão destruindo a natureza em larga escala e sem dó. O fim dessa hipocrisia, a verdadeira utilização sustentável da natureza, para usar a palavra da moda, um futuro pleno de vida, só poderá ser conquistado com um mundo socialista, onde a produção global será utilizada para satisfazer as necessidades de todos e não o lucro de alguns.