No editorial do jornal Tempo de Revolução 13, intitulado “Vale tudo contra Bolsonaro?”, explicamos a posição da Esquerda Marxista diante da “possibilidade de Geraldo Alckmin sair do PSDB e compor a chapa de Lula como seu vice”. Na última quarta (15), o agora ex-tucano se desfiliou do PSDB, sinalizando um passo nessa direção.
Porém, antes da desfiliação de Alckmin, Lula fez uma declaração sobre a possibilidade de tê-lo como seu vice, durante sua viagem a Bruxelas, na Bélgica:
“Eu tenho uma extraordinária relação de respeito com Alckmin, eu fui presidente quando ele foi governador, nós conversamos muito. Não há nada que aconteceu entre eu e Alckmin que não possa ser reconciliado”
Isso levantou um importante debate que devemos fazer sobre independência de classe e sobre o que podemos esperar tanto das próximas eleições, quanto de um eventual governo Lula a partir de 2023. Porém, nos focaremos aqui em um ponto: não haveria mesmo nada de irreconciliável entre Alckmin e um partido que diz defender os interesses da classe trabalhadora?
Principais marcas do governo Alckmin
Alckmin governou o estado de São Paulo de 2001 a 2006 (assumindo como Governador após a morte de Mário Covas) e de 2011 a 2018. A marca de seu governo foi a mais dura repressão contra os movimentos populares, sindicais e contra a juventude. Abaixo listamos os principais ataques e denúncias relacionadas ao governo tucano:
- Fechamentos de 700 escolas em 2015;
- Greve de 92 dias dos professores, sem negociar e cortando salários;
- Privatização das escolas estaduais de SP via PEIs e PPP;
- Parte do governo Covas que instituiu o corte de ponto dos servidores em greve;
- Chacina de Osasco e em 2018 número de mortos por policiais no governo Alckmin dobrou e foi o maior em 22 anos! De 2011 a 2017 a letalidade policial aumentou em 96%;
- Máfia da merenda;
- “Monopólio” de OSs em que 5 faturavam todas as licitações da saúde. Há inclusive evidências para afirmar a quarteirização das empresas;
- Denúncia por fraude em licitação do metrô;
- Escândalo do Rodoanel e desvio de verbas;
- Crise hídrica de 2014 e favorecimento de 13 empresas;
- Gastos milionários com a imprensa burguesa: Estadão, Folha e Veja, que em 2015, durante a greve dos professores, foram inimigos declarados dos trabalhadores. Isso sem citar sua campanha pela condenação sem provas de Lula praticamente desde o início de seu mandato.
Vamos a alguns exemplos.
Em 2012 Alckmin ordenou o que ficou conhecido como o “Massacre de Pinheirinho” em São José dos Campos. Como forma de garantir o latifúndio do então especulador condenado Naji Nahas, a PM de Alckmin desalojou milhares de famílias que ocupavam o terreno, destruindo suas casas. Alckmin, enquanto tradicional representante da burguesia, cumpriu suas ordens de modo exemplar. Milhares de famílias desalojadas, pelo menos 3 pessoas mortas, incluindo uma criança de 4 anos. Tudo para garantir a propriedade privada da classe dos impunes corruptos, que representam o retrocesso humano2.
A política reacionária de Alckmin atuou em todas as esferas do funcionalismo público. Na educação, também em 2012 Alckmin iniciava o programa das Novas Escolas de Tempo Integral. Agora, voltada ao Ensino Médio, embora não exclusivamente. Isso antecipou a política do Novo Ensino Médio, hoje aplicada pelo Dória, que desenvolve e aprofunda os ataques que Alckmin iniciou. Nesse projeto estava contido o cerne de sua política: privatização da escola pública. Desde o início a ideia era que empresas adotassem escolas, desonerando o estado de sua função e as empresas do pagamento de impostos, sendo esse o objetivo central da proposta. Contudo, os ataques de Alckmin não param por aí.
Em um país onde as escolas seguem lotadas, onde professores são mal pagos e as condições de trabalho são precárias, o estado mais rico do país não fugiu à regra. E mais do que isso, tentou piorar a situação.
Em setembro de 2015, o Secretário da Educação do governo Alckmin anunciou o fechamento de 700 escolas do estado de SP! Com muita luta e uma heroica resistência, naquele ano os estudantes, apoiados pelos professores e pelo conjunto da classe trabalhadora conseguiram impor uma senhora derrota ao governo tucano, com um inspirador movimento de ocupação de escolas.
Alguns meses antes o governo Alckmin já havia demonstrado sua truculência se recusando a negociar com os professores em greve. Mais do que isso, junto a Mário Covas, os dois instituíram o corte de ponto a grevistas em 2000. Prática essa levada adiante por ele e José Serra (PSDB) rigorosamente. Deixaram professores endividados, passando fome e esmagaram greves por melhorias salariais e de infraestrutura. Em 2015, os professores chegaram a ficar 3 meses sem salário. E em todos esses anos o sindicato principal da categoria, a Apeoesp, foi dirigido pelo PT. Ou seja, Alckmin foi quem reprimiu e deixou passar fome professores grevistas dirigidos pelo PT. E é com esse representante da classe dominante que Lula diz não ter diferenças irreconciliáveis.
Ainda na Educação, foi no governo Alckmin que se descobriu a Máfia da Merenda, um dos muitos escândalos fruto das políticas de favorecimento do governo tucano a determinadas empresas terceirizadas. Isso ocorreu na saúde, no metrô, no Rodoanel e apareceu mesmo na crise hídrica de 2014, em que se constatou favorecimento de 13 empresas contratadas pelo governo.
Também em seu governo foram expostos os contratos milionários com a Folha, Estadão e Veja, setores da imprensa burguesa que são armas da classe dominante. Embora mais visível em tempos de luta, era comum chegarmos à escola e vermos tais jornais e revistas com suas notícias falsas, distorcidas e profundamente reacionárias todos os dias nas 5 mil escolas estaduais de SP. Tudo isso financiado com dinheiro público! E mesmo o fim disso foi conquistado somente em processos de luta.
Não bastasse tudo isso, também é preciso salientar o teor da política do governo Alckmin quanto à segurança pública: ele duplicou o número de mortes pela PM em seu governo. De 2011 a 2017 o índice de mortes por policiais aumentou em 96%! E sabemos quem são os mortos: jovens proletários e, em sua maioria, negros.
Qual a nossa posição?
Qualquer governo que se proponha a defender os interesses da classe trabalhadora jamais poderia sequer pensar em qualquer tipo de conciliação com representante direto da burguesia como Alckmin, com nossos inimigos de classe. Para defender o programa necessário à classe trabalhadora é preciso total independência de classe. E se Lula avançar nessa discussão com Alckmin ou qualquer candidato burguês estará aprofundando ainda mais sua lista de traições à classe trabalhadora.
Não temos nenhuma ilusão em Lula ou no PT. Seu programa é de conciliação de classe e há muito abandonou a política de independência de classe. Isso o impediu e o impedirá de garantir qualquer demanda essencial ao conjunto da classe trabalhadora. Nossa saída segue sendo a luta pela construção de um partido proletário e independente, como forma de organizar a classe trabalhadora em função de nossa única saída frente a barbárie capitalista: a revolução proletária e socialista. Entretanto, se chegarmos diante das eleições de 2022 em um cenário sem candidatura do PSOL e com Lula enfrentando Bolsonaro, nos restará chamar o voto crítico em Lula, cobrando dele a responsabilidade de governar de acordo com os interesses da classe trabalhadora – o que implicará um ferrenho combate nas ruas e nos locais de trabalho depois de Lula eleito.