A tortura é uma política oficial do Estado

Apesar de ser considerada crime pela Lei 9455/97, a tortura é uma prática comum no Brasil, e as principais vítimas são pessoas privadas de liberdade, sob custódia do Estado. Os principais torturadores são agentes públicos de segurança e a utilizam em investigação de crimes patrimoniais, principalmente.

Dentre outras ações constitui crime de tortura constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental com o objetivo de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa; para provocar ação ou omissão de natureza criminosa; em razão de discriminação racial ou religiosa; submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo.

Porque a tortura é tolerada no Brasil?

Porque ela atinge setores vulneráveis e mais pobres da sociedade. Essa parcela da população majoritariamente composta por negros é sistematicamente violentada pelos órgãos de repressão do Estado.

Vemos isso de forma cotidiana. Alguns casos ganham repercussão como a morte de Amarildo, mas são tratados de forma isolada, desconectado da cultura da opressão que historicamente se abate sobre a população pobre, e é tolerada por uma série de instituições da “dita sociedade civil”, composta em sua maioria por pessoas oriundas da classe média.

Em Bauru a tortura atinge população vulnerável, pobre e negra

Em Bauru existem vários acampamentos de pessoas que estão lutando por moradia. Elas estão sendo alvo de toda sorte de ataques muito bem organizados por vários setores da cidade, públicos e privados. São difamações em órgãos de imprensa, em pronunciamentos de vereadores e vereadoras, e em ações dos aparatos policias da cidade.

Essas ações orquestradas se agravaram após o prefeito Clodoaldo Gazzetta (PSD) anunciar seu plano municipal de habitação, que terá como público alvo a população de baixa renda.

Em 1º de setembro, no acampamento Canaã essa prática que fere a legislação se repetiu mais uma vez. Sistematicamente unidades da Polícia Militar se postaram nas entradas dos acampamentos, e a pretexto de realizarem batistas policiais param veículos, constrangeram os moradores com perguntas capciosas, ameaças veladas por estarem acampadas, como se os locais em que habitam não fossem moradias protegidas pela inviolabilidade. O que mais causa terror em idosos e crianças são as manobras do helicóptero Águia, que voa muito baixo o que provoca o desmonte de várias casas construídas com matérias frágeis.

Essa violência é sistemática contra os “de baixo”, e é uma política oficial do Estado, o que ficou claro nos depoimentos do novo comandante da ROTA de São Paulo, aonde em entrevista exclusiva concedida ao UOL disse: “Se eu coloco um policial da periferia para lidar, falar com a mesma forma, com a mesma linguagem que uma pessoa da periferia fala aqui nos Jardins, ele pode estar sendo grosseiro com uma pessoa do Jardins que está ali, andando. É uma outra realidade. São pessoas diferentes que transitam por lá. A forma dele abordar tem que ser diferente. Se ele [policial] for abordar uma pessoa [na periferia], da mesma forma que ele for abordar uma pessoa aqui nos Jardins [região nobre de São Paulo], ele vai ter dificuldade. Ele não vai ser respeitado”, ou seja, assume o comandante da ROTA Ricardo Augusto Nascimento de Mello Araújo, que a polícia dá tratamento diferenciado de acordo com a classe social das pessoas. Teve a coragem de dizer publicamente o que toda a população sabe, principalmente a população pobre e negra.

Isso se repete em todas as cidades do Estado. Quantas vezes a polícia entra nos condomínios de alto luxo chutando portas das mansões e sem mandato? Quantas vezes realiza blitz sistemáticas nas entradas destes loteamentos? Essas práticas são comuns nos bairros onde mora a população pobre e negra.

Este silêncio todo me atordoa

As instituições e organizações de Bauru que se situam no campo democrático como a OAB, universidades, conselhos, entidades religiosas, associações, movimentos sociais, sindicatos, associações de bairro, partidos e organizações políticas do campo popular devem assumir e adotar posição contra essas posturas discriminatórias e violentas de integrantes de uma instituição do Estado.

Manter o silêncio nesta hora tão grave é se tornar cúmplice de uma violência brutal e sistemática contra pessoas em alto grau de vulnerabilidade, violência motivada por preconceito de classe e por racismo institucional.