Acontecimentos dramáticos se desdobraram na noite passada (17/4/16) enquanto a Câmara dos Deputados votava o impedimento da Presidente Dilma Rousseff. Todo o país esteve acompanhando o processo dividido em dois campos: o reacionário campo a favor do impeachment, burguês e pequeno-burguês; e o campo contra o impeachment dos trabalhadores e da juventude.
Acontecimentos dramáticos se desdobraram na noite passada (17/4/16) enquanto a Câmara dos Deputados votava o impedimento da Presidente Dilma Rousseff. Todo o país esteve acompanhando o processo dividido em dois campos: o reacionário campo a favor do impeachment, burguês e pequeno-burguês; e o campo contra o impeachment dos trabalhadores e da juventude.
Era tal a paixão de ambos os lados que as autoridades tiveram de construir um muro temporário de metal com dois metros de altura e um quilômetro de extensão para separar os milhares de manifestantes a favor e contra o impeachment, que se encontravam do lado de fora do prédio da Câmara em Brasília.
O Congresso votou por grande maioria, 367 a favor do impeachment e 137 contra, mais do que os dois terços requeridos para iniciar os procedimentos contra Dilma. Ela é acusada de manipular as contas do governo. Na verdade, o que ela fez não é criminoso. Ela fez o que todos os presidentes fizeram no passado, isto é, atrasar pagamentos e obter empréstimos bancários para manter as finanças do governo em funcionamento. Em suas ausências durante viagens internacionais seu vice-presidente também assinou estes documentos, mas não está sendo submetido a impeachment. Isto mostra que isto é uma mera desculpa para abrirem procedimentos contra ela, uma vez que os políticos burgueses decidiram que querem seu afastamento. A maioria dos políticos que se posicionam contra ela são eles próprios investigados por corrupção, de modo que a farsa é completa!
O próximo passo é que os 81 membros do Senado devem votar sobre a mesma questão no próximo mês. O Senado tem o poder de deter os procedimentos, mas tudo indica que não fará isto e que confirmará o voto do Congresso. Uma vez que o Senado vote pelo prosseguimento do processo, Dilma será suspensa de funções como Presidente e será iniciado um julgamento no Senado, que pode demorar seis meses. Durante este período transitório, ela seria substituída por Michel Temer, o Vice-Presidente. Depois do período de seis meses, uma decisão deve ser tomada e se uma maioria de dois terços decidir que ela é culpada, ela será removida permanentemente das funções e substituída por Temer até que ocorram novas eleições em 2018. Temer é do PMDB, um dos parceiros burgueses no governo de coalizão.
Os partidos burgueses estão explorando o fato de que Dilma se tornou uma líder impopular em meio a uma severa crise econômica. Ela não é de forma alguma tão popular quanto Lula era quando ele chegou pela primeira vez ao cargo. Então, o Brasil estava crescendo nas costas da expansão chinesa. O capitalismo brasileiro pôde se permitir fazer concessões. Por exemplo, entre 2003 e 2015, 85% dos contratos de trabalho garantiam aumentos de salários acima da taxa de inflação. Havia o que poderíamos chamar de um fator do “sentir-se bem”, em que se basearam os próprios líderes do PT. Mas, agora, há uma crise severa e essas conquistas não são mais possíveis.
Na noite passada, enquanto acompanhava os procedimentos parlamentares transmitidos ao vivo, postei em Facebook meus comentários e os reproduzo aqui para dar o sabor do estado de ânimo no país.
1) Há um clima tenso no Brasil. O Congresso Nacional está reunido para decidir sobre o impeachment de Dilma. Os burgueses estão na ofensiva e não podem tolerar até mesmo este governo moderado de centro-esquerda. Mas, no processo, estão desestabilizando a sociedade brasileira. Revolução e contrarrevolução iniciaram suas marchas. Enquanto todas as principais potências imperialistas são de opinião de que a classe dominante brasileira está cometendo um grande erro ao desatar suas forças, os burgueses aqui estão com pressa para ir à ofensiva, enquanto sentem a pressão da crise do capitalismo mundial. Depois de anos de crescimento e de concessões à classe trabalhadora, agora têm a pior recessão desde a década de 1930. De tudo isto, a classe trabalhadora e a juventude vão emergir como uma força poderosa. Décadas de crescimento econômico criaram uma classe trabalhadora que é muito maior e mais poderosa e agora a burguesia tem um problema enorme: como vai governar contra esta classe? (Nestas condições, os camaradas da CMI no Brasil foram alvo dos reacionários de direita)
2) Estou assistindo à votação do impeachment da Dilma no parlamento brasileiro. Até agora, 186 membros da Câmara dos Deputados votaram pelo impeachment e 50, contra. Vai demorar várias horas porque cada parlamentar faz um discurso explicando seu voto. Estamos vendo os partidos burgueses reacionários do Brasil, incluindo os partidos que estavam no governo com o PT, expressando seu ódio ao movimento dos trabalhadores brasileiros. Estão atacando o PT não por suas recentes políticas de austeridade, mas por suas reformas no passado. Alguns se referiram à CUT (Central Única dos Trabalhadores) como uma força inaceitável. Estão em pé de guerra. É um verdadeiro espetáculo o que está acontecendo no parlamento brasileiro. O presidente do parlamento que preside à votação, Eduardo Cunha, do PMDB, se encontra sob investigação por acusações de corrupção. Adicionalmente, 342 dos 503 deputados são acusados ou se encontram sob investigação por corrupção e, no entanto, estão participando desta farsa. E milhões de pessoas assistem enquanto dezenas de milhares estão nas ruas. Deixam eles remover Dilma e formar seu próprio governo. Será um governo raivoso contra os trabalhadores e provocará uma reação violenta dos trabalhadores, o que evidenciará o real equilíbrio de forças de classe neste país. E qualquer governo formado depois disto será visto como ilegítimo pelos trabalhadores e pela juventude. O Brasil se tornará ingovernável. Somente na região de São Paulo, cinco mil fábricas fecharam, provocando uma elevação significativa do desemprego. A sociedade está sendo polarizada como nunca antes. Um novo período está se abrindo.
3) O problema é que os deputados do PT estão se opondo ao impeachment na base de apelos à defesa da Constituição e da democracia. Eles deviam usar esta oportunidade para falar aos milhões de trabalhadores brasileiros e de pobres para levantar as questões de classe, isto é, o que a direita está preparando e mobilizar as massas. Mas são incapazes de fazer isto porque são responsáveis pela austeridade do período recente. (Até agora, são 224 pelo impeachment e 77, contra. Está parecendo muito que o impeachment vai ser aprovado)
4) Os ricos são uma raça particularmente repugnante. Diante dos problemas de bilhões de pessoas, observar os ricos com seu estilo de vida luxuoso é nauseante, mas os ricos de países como o Brasil e seus representantes políticos, carreiristas e alpinistas sociais, são ainda mais nauseantes.
5) O nível destes parlamentares burgueses brasileiros é inacreditável. Perdi a conta do número de deputados que abriam seus discursos com as palavras “Por minha família, por meus filhos, por meus amigos e por minha querida pátria…” e, em seguida, votavam pelo impeachment de Dilma. Alguns adicionavam “Pelos evangelistas e por todos os cristãos…”. Um deles colocou um ponto interessante, “Tomaremos de volta nossa economia…”, o que significa: tomaremos o controle direto das coisas e não teremos mais de governar através dessa gente do PT. Cada vez que um deputado se declara a favor do impeachment, a massa de deputados reacionários fica de pé ao seu redor e começa a aplaudir como o público de uma luta de boxe. São como porcos que já podem sentir que estão a ponto de enfiar seus focinhos de volta no coxo. Estão famintos e não podem esperar. (Os votos pelo impeachment são agora 334. Necessitam de mais oito e estão frenéticos)
6) Temos impeachment! E os outros estão comemorando como os hooligans do futebol. Os trabalhadores e particularmente a juventude da classe trabalhadora ficarão desgostosos deste espetáculo.
7) Os manifestantes reacionários de direita estão comemorando nas ruas. A esquerda está decepcionada, mas também está com raiva. Temos dois campos nas ruas das cidades brasileiras hoje: os que pertencem ao mesmo campo dos esquálidos e da oligarquia de direita na Venezuela, os que acreditam em seu direito divino de viver às custas dos trabalhadores, dos camponeses e dos pobres; e os que representam estes mesmos trabalhadores. Como escrevi mais cedo, revolução e contrarrevolução estão nas ruas do Brasil hoje. O parlamento não representa o povo. Um período de intensa luta de classes está sendo preparado. O marxismo encontrará terreno fértil nesta situação.
8) Poucos parlamentares se destacaram com uma crítica mais clara à esquerda. Entre estes estavam os deputados do PSOL, e alguns deputados do PT e do PCdoB. Denunciaram isto como o início de um ataque aos direitos dos trabalhadores. O PCdoB explicou que este é apenas o início da luta. Estes são os poucos deputados que refletiam o ânimo das forças vivas reais dos trabalhadores e dos jovens do Brasil.
9) A Esquerda Marxista, a CMI no Brasil, se pronunciou consistentemente contra o impeachment, mas sem apoiar o governo e participou do movimento contra o impeachment. Eles responsabilizaram os líderes do PT por estar no governo com os partidos burgueses, que agora votaram a favor do julgamento político, e pela realização da austeridade no período recente.
Últimas (18 de abril de 2016)
As últimas notícias de hoje é que a CUT, outros sindicatos, o MST e outras organizações dos trabalhadores, reunidos no movimento “Frente Brasil Popular” e no movimento “Frente Povo sem Medo” – essa uma frente da qual a Esquerda Marxista é membro -, lançaram uma declaração dizendo que “não reconheceremos a legitimidade de qualquer governo comandado por Temer, produto de um golpe institucional”, e que “iremos lutar contra este governo ilegítimo, e lutaremos contra cada medida que seja adotada contra nós, contra os níveis salariais e empregos, as reformas sociais e os direitos dos trabalhadores conquistados através de lutas amargas e defenderemos a democracia e a soberania nacional”.
Isto confirma o que escrevi na noite passada. Dois campos mutuamente hostis estão alinhados para a batalha, os trabalhadores, os desempregados, os camponeses sem terra, a juventude, de um lado, e a burguesia e tudo o que é reacionário, do outro lado. A classe dominante brasileira viverá para lamentar este desencadeamento das forças de classe a partir de baixo.
Alguns veem isto como manobras de uma classe dominante que enlouqueceu. Mas há uma lógica nesta loucura. A crise do capitalismo mundial está intensificando a luta global por mercados. A burguesia brasileira quer tomar de volta tudo o que foi forçada a conceder no passado. Mas, ao fazer isto, estão desatando forças revolucionárias vinda de baixo.
Artigo publicado originalmente em 18 de abril de 2016, no site da Corrente Marxista Internacional, sob o título “Brazil: Impeachment of Dilma opens up new period of class struggle“.
Tradução de Fabiano Leite.