Aprovada em assembleia online na semana anterior, a greve iniciada na segunda-feira (03/06) pelos trabalhadores em Educação do Paraná mostrou a incrível capacidade e disposição de luta da categoria, que foi capaz de reunir mais de 20 mil educadores em Curitiba, em resposta rápida às ações do governo. O objetivo imediato era barrar a aprovação do cruel projeto de lei encaminhado por Ratinho Júnior à Assembleia Legislativa do Estado do Paraná (Alep), que permite a privatização de todas as escolas da rede estadual, salvo pouquíssimas exceções. Antes de prosseguir com este balanço, é preciso fazer uma observação básica: o mote utilizado pela direção da APP-Sindicato – “Não venda a minha escola” – é equivocado. O que ocorre no Paraná é a simples tentativa de entrega das escolas públicas para a iniciativa privada, afinal vender algo pressupõe que o comprador pague alguma coisa, o que obviamente não é o caso. O setor privado pretende receber de graça as escolas públicas.
O Governo do Estado, na tentativa de evitar o início da greve, acionou rapidamente a “Justiça do Paraná” para declarar a greve ilegal e rotulou as críticas realizadas pelos educadores ao projeto como “fake news”. A Justiça deu causa parcial ao governo, exigindo a suspensão da greve dos educadores por 15 dias, devido à “falta de mesa de negociação e plano de reposição”, algo que o sindicato nunca se recusou a fazer. Na verdade, quem se recusa, de maneira intransigente, a tal ação é exatamente o governo Ratinho Júnior, que adota uma política truculenta contra os educadores, o funcionalismo público e a classe trabalhadora paranaense, em grau muito maior que seu antecessor. Contudo, a APP-Sindicato apresentou recurso à liminar, judicializando-a, e corretamente manteve a deflagração da greve como planejado e decidido em assembleia da categoria.
Paralelamente à entrada com ação na Justiça pela ilegalidade da greve, o governo Ratinho Júnior apelou para ações ainda mais radicais e ilegais, como elaborar um vídeo apócrifo contra a greve, procurando amedrontar pais quanto ao “perigo de seus filhos participarem de movimentos grevistas, partidários e violentos”. Para isto, o governo do Estado, por meio da Secretaria Estadual de Educação (SEED), utilizou-se de dados pessoais e sigilosos para disparar o referido vídeo no WhatsApp de todos os pais da rede estadual de ensino do Paraná, o que viola a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Apesar de todas estas ações por parte de Ratinho Júnior e seus assessores e secretários de Estado, os educadores obtiveram sucesso na mobilização para a deflagração da greve.
Além do grande ato na capital, ocorreram atos em outras cidades do Estado, bem como plenárias lotadas nas diversas sedes regionais da APP-Sindicato. Nos balanços feitos, a adesão não era de 100%, mas contou, inequivocamente, com a maioria dos educadores. Durante a votação do projeto, feita em regime de urgência, os trabalhadores em Educação e estudantes presentes no ato em Curitiba ocuparam a Assembleia Legislativa com o intuito de impedir a votação do mais escandaloso e absurdo ataque contra a Educação pública e a classe trabalhadora paranaense, sobretudo aos filhos desta classe. No processo de ocupação, dois trabalhadores foram detidos – Ronaine Hegele, professora do Núcleo Sindical de Cascavel e Pedro Lanna, técnico administrativo em Educação – e indiciados por crime ao patrimônio, desacato e impedir o direito ao trabalho, além de só serem soltos no dia seguinte. Manifestamos nossa solidariedade aos dois trabalhadores e afirmamos que é preciso lançar uma campanha em prol destes companheiros e de outros que podem ser criminalizados por esta luta em defesa da educação pública.
No entanto, prevendo a ocupação da Assembleia Legislativa pelos educadores, que já é de costume para aqueles que conhecem a história de luta da Educação paranaense, os deputados ligados ao governo do Estado e que compõem a maioria absoluta do Legislativo, fugiram do plenário da Alep, dirigindo-se até seus gabinetes e suas casas, para votarem de modo online pela aprovação do projeto de privatização das escolas públicas, recusando os direitos de fala para defesa do mesmo, exigindo-se apenas o encaminhamento da votação. A sessão virtual, gravada e disponível no YouTube, deixa registrado para a história política do Paraná e do Brasil o grau de frieza, cinismo e hipocrisia da burguesia paranaense e seus lacaios contra a classe trabalhadora e os educadores. Os deputados de oposição deveriam ter saído e não participado dessa sessão de aprovação atropelada de um projeto ilegítimo.
Durante a greve, funcionários dos Núcleos Regionais de Educação (NRE) realizaram – uns com prazer, outros nem tanto – uma operação nas escolas para assediar diretores e equipes pedagógicas pelo lançamento das aulas, conteúdos e faltas nos livros online dos professores, visando com isto considerar os dias de greve como “dias normais” com “todas as aulas dadas”. Os funcionários dos NREs, enviados a mando da SEED para a força-tarefa de assédio e prática antissindical, foram orientados a visitar as turmas dos professores em greve, entrar nas salas de aula, ligar as ditas TVs Educatron e fazer a chamada. Em alguns casos, com a presença da direção da escola.
Ao mesmo tempo em que era possível observar uma disposição extraordinária da categoria, também era notável, entretanto, um sentimento de indisposição e desconforto por parte da direção do sindicato, que demonstrava certa apreensão, não apenas com as medidas judiciais empreendidas pelo governo do Estado contra o sindicato, mas com o próprio e possível crescimento da mobilização, pensando na hipótese de ter que encerrar uma greve grande e forte, no calor do momento, sem sequer arrancar uma mesa de negociação. Para agravar a situação, o governo Ratinho Júnior, furioso com o impacto da greve em sua imagem política nacional e internacional, exige da Justiça a prisão da presidente da APP-Sindicato, Walkiria Olegário Mazeto, além de destituições das direções de escola que se posicionaram a favor da greve contra a privatização, na qual nos posicionamos em absoluto apoio e solidariedade.
A derrota na Assembleia Legislativa não foi uma surpresa. Mas o que seria “surpresa” para muitos – não para aqueles que já estão acostumados às manobras da burocracia sindical – foi o ocorrido na Assembleia Geral dos Educadores, convocada pelo “comando de greve” (direção da APP) em regime extraordinário, na quarta-feira, dia 05/06, ou seja, no terceiro dia de greve e com menos de 24 horas para sua realização, em formato online. Aqui registramos nossa frontal discordância com este método. As assembleias virtuais, especialmente para debater os rumos de uma greve, servem como um instrumento de manobra para impedir a livre participação dos trabalhadores em Educação, bloquear inscrições e deixar nebulosa a conferência dos votos. Outro ponto a ser destacado é o suposto comando de greve, cujo real significado é distorcido pela direção sindical. Um comando de greve pressupõe que um conjunto de trabalhadores da base seja eleito para impulsionar a greve e dirigir os seus rumos. O que faz a direção da APP-Sindicato é simplesmente formar um consórcio com dirigentes estaduais, regionais e uma representação da oposição “reconhecida” para dar um ar de democracia ao suposto comando de greve.
Na Assembleia Geral dos Educadores, houve longa fala introdutória e de balanço da greve por parte da presidente do sindicato, que confirmou e reforçou ao longo de seu discurso a força da greve e o poder de mobilização dos educadores, algo que também era possível perceber nas inúmeras plenárias regionais de balanço da greve. Porém, na sequência, a direção da APP-Sindicato praticamente orientou à base que “era necessário o encerramento da greve”. O que deve ter causado estranhamento para muitos – não para quem já conhece a burocracia sindical da APP e seus métodos – é o conflito entre as premissas da fala da presidente e a sua conclusão. Os discursos das lideranças sindicais regionais da APP seguiram a mesma linha.
Seja como for, a oposição defendeu a continuidade da greve até abertura de mesa de negociação, pois além da luta para se barrar o projeto de privatização das escolas públicas do Paraná, havia na pauta outro ponto fundamental a ser debatido e cuja luta precisava ser levada adiante: o da reposição salarial, a data-base da categoria e dos servidores públicos. Contudo, a posição da direção sindical teve, como sempre tem, um peso enorme nas decisões da assembleia. Na Assembleia Geral de 25 de maio, quando a direção orientou voto favorável à deflagração de greve, obteve-se 89% de aprovação. Na ocasião, a própria direção insistiu na defesa de que a greve não poderia ter uma “pauta única”, enfatizando a necessidade de incorporação da luta pela data-base na pauta, inclusive para garantir a própria legalidade da greve. Já no dia 5 de junho, a direção ignorou este ponto, defendendo então uma “pauta única” e orientando o voto pela suspensão do movimento grevista, alegando que “para continuar a greve era preciso ter pauta”. A proposta obteve 63% de votos favoráveis e 35% contrários, o que demonstra o poder e a importância que o posicionamento de uma direção sindical possui perante os trabalhadores, tanto para colocá-los em luta, como também para bloqueá-los.
Com a greve encerrada, sem sequer a abertura de uma mesa de negociação, um clima de perseguição e insegurança se abate sobre os educadores. Diretores de escola que se posicionaram favoráveis ao movimento começaram a ser afastados de seus cargos. O pedido de prisão feito pelo governo contra a presidente da APP-Sindicato permanece, assim como o processo contra os dois trabalhadores que participaram da ocupação da ALEP. Ameaças de lançamento de faltas, com descontos em salário, além de outros tipos de práticas antissindicais, estão ocorrendo e devem continuar ocorrendo no próximo período. Para termos uma ideia do grau de vigilância e autoritarismo exercido por Ratinho Júnior e subordinados no Paraná, em 4 de junho, o governo impôs sigilo de 5 anos a documentos da SEED. Tais medidas, segundo especialistas, representam algo extremamente atípico, uma vez que imposições de sigilo a informações são geralmente usadas por órgãos como a Polícia Federal e a ABIN (Agência Brasileira de Inteligência), mas não em instituições como uma secretaria estadual de educação. Confira a matéria do Jornal Boa Noite Pelo Paraná clicando aqui.
Portanto, no fritar dos ovos, a direção da APP procurou, no fundo, desaguar o excesso de revolta acumulada no último período de permanentes ataques do governo Ratinho contra os educadores e funcionários públicos, buscando ainda aproveitar a proximidade do período eleitoral para divulgar candidaturas municipais, com atividades em câmaras de vereadores e prefeituras, evitando ao máximo a organização de piquetes e panfletagens em frente às escolas, uma vez que a greve – como confessou sem nenhum constrangimento um dos dirigentes do sindicato em sua declaração de voto favorável ao encerramento – “tinha prazo e data marcada para terminar”.
Com o fim da greve, a direção da APP-Sindicato convoca os trabalhadores em Educação, estudantes e a comunidade escolar para barrar a privatização por meio da mobilização para as consultas públicas, o que é uma conduta precipitada. O que a APP e as entidades estudantis, especialmente a UPES (União Paranaense dos Estudantes Secundaristas), devem fazer é uma campanha pela revogação da lei aprovada, especialmente no momento em que há pedidos de reconhecimento da sua ilegalidade, para o que não faltam fundamentos. O empenho durante as consultas públicas deve ser um desdobramento da luta pela revogação desta lei. Aceitar que a lei da privatização das escolas públicas é algo dado e o que nos resta é combater em cada local de trabalho é atomizar o movimento. Além disso, é preciso que esta luta não fique restrita ao Estado do Paraná. Trata-se de um combate que deve ser travado em âmbito nacional, pois é uma tendência que deve emergir, em pouco tempo, em outros Estados, e também dirigido Governo Federal que recentemente, através do BNDES, assinou recentemente um contrato com o governo de Minas Gerais para implementação de Parcerias Público-Privadas (PPP).
Frente a este cenário, é preciso buscar converter em organização toda a revolta da categoria contra o governo, bem como contra as manobras e traições da burocracia sindical. Por isso, convidamos a todos a conhecerem e se juntarem à OCI, para nos organizarmos contra os ataques da burguesia e os bloqueios da burocracia.
- Não à privatização das escolas públicas!
- Fora Ratinho Jr!
- Abaixo as perseguições e criminalização promovidas pelo governor, SEED e NREs!
- Em defesa do reajuste do funcionalismo público e do pagamento das perdas salariais! Data-base já!
- Junte-se à OCI e venha lutar conosco!