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A morte trans no Brasil: lutar pelo fim da barbárie capitalista!

Este artigo pretende expor e analisar, através de uma perspectiva marxista, a realidade vivida pela população transexual e travesti no Brasil e suas violências cotidianas, sintomas de uma sociedade adoecida. Para esta pesquisa, foi utilizado o atual dossiê intitulado Assassinatos e Violências Contra Travestis e Transexuais Brasileiras em 2024, publicado pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) em janeiro de 2025. Trata-se de um material extenso que se propôs a investigar, sistematizar e catalogar dados sobre violência contra pessoas trans no Brasil. Além disso, foram utilizados textos de apoio da Internacional Comunista Revolucionária (ICR), publicados em marxismo.org.br.

O Brasil segue, pelo 16º ano consecutivo, sendo o país que mais mata pessoas trans no mundo — um dado alarmante e entristecedor, que nos revolta e deve servir de alerta para a necessidade de construir um outro mundo, sem discriminação ou violência.

O fato que não choca ninguém é saber que, sob o governo de união nacional de Lula-Alckmin, não há qualquer mudança substancial nessa situação. O governo Lula segue traindo as massas que o elegeram para barrar Bolsonaro, na esperança de uma melhora nas condições de vida. Seus acenos à população trans não passam de discursos vazios e, na prática, a violência continua a atingir as camadas superexploradas da classe trabalhadora. Não há nada de novo sob o governo Lula.

O que vemos, na verdade, é uma degradação das condições de vida em geral, com impacto ainda maior sobre esses grupos, muitas vezes vistos como um “problema” para a sociedade. Os números glorificados por Lula são enganosos: a suposta redução do desemprego, na realidade, é preenchida por trabalhadores precarizados no setor informal. O cenário é ainda pior para aqueles que são jogados à margem e sistematicamente impedidos de conseguir um emprego, mesmo sob condições horríveis. O que resta para esses grupos são as piores condições de trabalho possíveis, em escalas exaustivas de 6×1, principalmente no ramo de telemarketing, já que a segregação imposta busca “escondê-los” da sociedade. Aqueles que conseguem vagas em shoppings, mercados e no comércio em geral enfrentam constantes perseguições, impedimentos e violências de diversas formas no ambiente de trabalho. Outros, como último recurso, recorrem à prostituição para sobreviver.

Segundo o dossiê, em 2024, foram assassinadas 122 pessoas trans e travestis. Dessas, cinco eram defensoras dos direitos humanos — entre elas, uma suplente de vereadora e outra que já havia se candidatado a um cargo político. Dentre os assassinatos notificados, em 17 casos (15%) não houve informações sobre o meio utilizado para cometer o crime. Dos 104 casos restantes, 40 (38%) foram cometidos com armas de fogo; 30 (29%) com armas brancas; 21 (20%) por espancamento, pauladas, apedrejamento, asfixia e/ou estrangulamento; e 14 (13%) por outros meios, como atropelamentos intencionais, decapitação, desmembramento, carbonização e degolamento. Assim, 89% dos casos apresentam requintes de crueldade.

O perfil das vítimas segue sendo alarmante: “majoritariamente jovens trans negras, empobrecidas, nordestinas e assassinadas em espaços públicos.” Esse perfil nos direciona para uma questão central: o caráter de classe não é apenas um detalhe, mas a questão-chave para compreender a opressão vivida pela classe trabalhadora trans no Brasil e no mundo.

A situação de pobreza em que esses grupos se encontram os condena a uma insegurança constante e a uma violência que vem de todos os lados, principalmente do Estado burguês e seus aparatos de repressão, como a própria Polícia Militar, que age com uma violência normalizada contra pessoas trans e travestis. Relatos de abusos sexuais, ameaças, extorsões e agressões são recorrentes e constantemente noticiados. Além disso, 68% dos casos são registrados em locais públicos, espaços onde, obviamente, a “segurança” do Estado não chega. Diversos corpos foram encontrados em terrenos baldios e obras abandonadas, dentro de rios e lagos, praças e na zona rural de cidades do interior.

Para se ter uma ideia do caráter dessa violência, basta observar os dados revelados no “Mapa da Desigualdade de São Paulo 2024“, publicado pela Rede Nossa São Paulo: “A expectativa de vida na capital paulista depende do endereço residencial. No distrito de Anhanguera, por exemplo, a idade média de morte é 58 anos, ou seja, 24 anos a menos do que no Alto de Pinheiros, que apresenta a média de 82 anos.” Há uma disparidade enorme nas condições de saúde, habitação, trabalho e renda, mobilidade, direitos humanos, cultura, esportes, infraestrutura, segurança pública e meio ambiente entre essas localidades da cidade. Esse cenário não se restringe apenas a São Paulo, já que o Brasil é um dos países mais desiguais do mundo.

A idade também se torna um fator de maior risco, já que o perfil das vítimas inclui, em sua maioria, jovens trans entre 15 e 29 anos, os alvos mais recorrentes das dinâmicas de violência. Os dados de 2024, nos casos em que foi possível identificar a idade, mostram que: duas vítimas (3%) eram menores de 18 anos, com 15 e 17 anos; 38 vítimas (49%) tinham entre 18 e 29 anos; 16 vítimas (21%) tinham entre 30 e 39 anos; 15 vítimas (19,5%) tinham entre 40 e 49 anos; 5 vítimas (6,5%) tinham entre 50 e 59 anos; e uma vítima (1%) tinha mais de 60 anos. Segundo a Antra, “As chances de uma pessoa trans jovem de até 29 anos ser assassinada, em média, chegam a ser cinco vezes maiores do que em outras faixas etárias.”

Esses dados alimentam um medo e uma sensação de ameaça constante para esses grupos, tornando perigoso até mesmo sair de casa para acessar serviços públicos, espaços de lazer e mercados. Além disso, são frequentemente expulsos de banheiros públicos.

Historicamente, esses grupos são condenados pela Igreja, criminalizados pelo Estado e sofrem com a patologização de suas vidas ao serem considerados “doentes”. Ainda hoje, vemos a retrógrada burguesia moribunda dar passos para trás nessa questão, como ocorreu recentemente com as modificações das diretrizes da Meta, empresa do bilionário Mark Zuckerberg. A nova Diretriz da Comunidade da Meta afirma:

“Nós permitimos alegações de doença mental ou anormalidade quando baseadas em gênero ou orientação sexual, dado o discurso político e religioso sobre transgenerismo e homossexualidade e o uso comum não sério de palavras como ‘estranho’.”

O professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e escritor brasileiro Renan Quinalha comenta:

“Fomos internados compulsoriamente em hospitais psiquiátricos e manicômios judiciários, locais em que fomos submetidos a violências como choques elétricos, lobotomia, insulinoterapia e convulsoterapia […]. Fizeram laudos e prescreveram diferentes tratamentos. Graças a um abaixo-assinado iniciado em 1981 no Brasil, nosso país despatologizou a homossexualidade em 1985. […] Mas vejam como é recente essa conquista. […] Agora, as redes sociais vão deixar circular discursos de patologização novamente. Não vai ter moderação das plataformas, teremos de acionar o Judiciário para remoção. É muito grave. Porque o tempo da justiça é lento. Porque nos onera mais uma vez a nos defender sozinhos e por nossa conta dos ataques. […] Vão viralizar memes e falsas pesquisas que nos classificam como doentes. E muita gente vai acreditar. É assim que se constroem preconceito e discriminação.”

O fato é que uma ação como essa não impressiona ninguém, vinda de um parasita bilionário alinhado com o capital e suas ideologias reacionárias de divisão da classe. A nova diretriz da Meta é mais uma expressão da influência reacionária de Trump, que não tem interesse algum na “regulamentação das redes sociais”, muito menos em garantir as liberdades individuais em suas plataformas. Os grupos de extrema direita certamente ficaram felizes com a medida, que lhes concede mais abertura para expor seus comentários preconceituosos na internet.

Portanto, a juventude que sente e se revolta com o mundo como ele está já expôs sua insatisfação com a nova diretriz em suas redes, formando um movimento contrário à medida. Por outro lado, é importante compreendermos que, na prática, a regulamentação das redes sociais não é suficiente para resolver nossos problemas, pois pequenas medidas de controle nessas plataformas não podem romper com a ideologia dominante, que promove a divisão dos trabalhadores a partir de preconceitos disseminados nos meios de comunicação das camadas mais atrasadas da burguesia. No fim das contas, o capitalismo e seus representantes não estão preocupados com a segurança, dignidade e vida dos grupos marginalizados das camadas mais pauperizadas da classe trabalhadora. O que importa para eles é manter os lucros nos bolsos dos bilionários.

Ao analisar a realidade imposta e as condições de vida desses grupos da classe trabalhadora, não podemos nos enganar com a ideia de um capitalismo melhorado ou inclusivo. As empresas “inclusivas” que oferecem cotas ou que direcionam contratações para pessoas transexuais, travestis ou pretas, apesar de seus slogans bonitos, estão longe de ser espaços seguros, livres de preconceito, exploração e violações, ou que garantam condições dignas de trabalho. Na verdade, isso não pode ser oferecido à classe trabalhadora dentro do sistema capitalista. Nenhum representante, mesmo que tenha boas intenções, pode resolver essa questão de forma individualizada, pois a ideologia que domina é a ideologia da classe dominante. Portanto, apenas com a superação da sociedade de classes poderemos garantir os direitos e as liberdades de todos.

O capitalismo precisa dividir os oprimidos e, para isso, objetifica corpos e prolifera o ódio e o preconceito por meio de seus discursos, negligenciando, perseguindo e assassinando determinados grupos na sociedade de classes. Obviamente, essa lógica brutal não se sustenta apenas com seus aparatos de violência, mas também com a orquestração da própria divisão da classe trabalhadora, promovendo opressões de classe contra classe por meio de ideologias reacionárias. Seguindo essa lógica, a camada mais atrasada e reacionária da extrema direita se esforça, inclusive por meio de suas campanhas eleitorais, para disseminar pesquisas negacionistas ou falsas contra a existência de pessoas trans. Foi o que vimos Bolsonaro fazer em seu mandato: disseminar o ódio contra grupos LGBT e, por consequência, provocar um aumento considerável da violência contra essas pessoas. O prejuízo é devastador para sua autoestima e saúde mental como um todo, pois suas vidas estão em constante ameaça.

Diante desse cenário, é papel de todo comunista defender políticas públicas que melhorem e garantam a vida e o acesso dessas pessoas a todos os seus direitos. No entanto, também é papel de todo comunista ir muito além disso. Não basta defender as reivindicações históricas da população LGBT, pois nenhum direito está garantido no capitalismo, especialmente em tempos de crise. Sabemos que a burguesia dá com uma mão e tira com a outra. Devemos unificar a luta de toda a classe trabalhadora, organizando-nos para derrubar esse regime de violência.

Na sociedade capitalista, não há um futuro digno para nenhum dos grupos oprimidos, marginalizados e superexplorados pelo Estado burguês. Um futuro digno para se viver depende de um presente de luta organizada pela construção de uma internacional de massas, capaz de guiar a revolução comunista em todo o mundo e abrir o caminho para que todos os seres humanos sejam realmente livres, pois, como disse Maya Angelou: “Ninguém é livre até que todos sejam livres!”.

Se você está revoltado com a barbárie capitalista, organize-se com a Juventude Comunista Internacionalista (JCI), fração jovem da Organização Comunista Internacionalista (OCI), e venha construir as forças do comunismo!