Bolsonaro, o negacionismo e a vacina

Em dezembro de 2020, diversos países iniciaram o processo de vacinação de suas populações contra a Covid-19, concentrado principalmente nos mais ricos, cujos governos compraram a maior parte das primeiras doses das vacinas aprovadas. Apesar dessa concentração no centro do capitalismo, na América Latina países como Argentina, Chile e México iniciaram a vacinação de suas populações. No Brasil não há certeza sobre quando vai ser iniciada a vacinação ou mesmo se haverá estrutura para imunizar imediatamente a população.

Bolsonaro tem feito abertamente uma campanha contra a vacinação. No dia 17 de dezembro, questionando os efeitos colaterais das vacinas, ele afirmou: “Se você virar um jacaré, é problema seu“. Pouco antes, Bolsonaro havia sugerido que as pessoas que se vacinassem deveriam assinar um termo de responsabilidade. Nas palavras do presidente: 

“Tem gente que quer tomar, então tome. A responsabilidade é sua. Quer tomar, toma. Se der algum problema por aí… Espero que não dê.”

No dia 28 de dezembro, Bolsonaro declarou que os laboratórios deveriam procurar o governo, e não o contrário, dizendo: “Pessoal diz que eu tenho que ir atrás da vacina. Quem quer vender é que tem”. Nesta declaração, Bolsonaro deixou explícito que a vida dos trabalhadores deve estar nas mãos do livre mercado, e continuou:

“O Brasil tem 210 milhões de habitantes, um mercado consumidor de qualquer coisa enorme. Os laboratórios não tinham que estar interessados em vender para a gente? Por que eles não apresentam documentação na Anvisa?”

Além da difusão de mentiras e da tentativa de colocar a responsabilidade nas pessoas, procurando isentar o governo de quaisquer responsabilidades, Bolsonaro trata o debate sobre a vacina como uma mera questão comercial. Não se preocupa sequer em apresentar um efetivo plano de vacinação e oferece os trabalhadores brasileiros aos laboratórios como um grande “mercado consumidor”.

Essas falas de Bolsonaro ocorreram pouco antes de o registro de mortes diárias ter voltado a superar mil pessoas e diante da iminência de colapso do sistema de saúde pública de várias cidades. A burguesia vem considerando a vacina como um item essencial, não por preocupação com a saúde dos trabalhadores, mas pela necessidade de que a economia retome a dinâmica que os capitalistas consideram normal. Essa é a motivação de Paulo Guedes, ministro da Economia, quando afirmou, em 18 de dezembro: “O capítulo mais importante vem agora, que é a vacinação em massa“. Guedes, que no governo é o porta-voz dos banqueiros, explicou os interesses da burguesia:

“O retorno seguro ao trabalho exige a vacinação em massa da população brasileira. É uma vacinação voluntária e o que o governo tem que fazer é disponibilizar todas as vacinas para a população de forma voluntária e gratuita. Qualquer brasileiro pode escolher a vacina que quer tomar, não paga pela vacina e escolhe a vacina se quiser tomar. Essa vacinação gratuita de forma voluntária para os brasileiros é o que nós precisamos para que a asa da saúde bata ao mesmo tempo da asa da recuperação econômica.”

Para a burguesia, o negacionismo de Bolsonaro soa no mínimo incômoda, na medida em que faz com que o Estado cumpra muito lentamente seu papel de sustentáculo dos interesses econômicos capitalistas. Essa postura do presidente e de parte do governo começa a mostrar seus resultados concretos para dificultar o início da vacinação. No começo de dezembro o governo anunciou que teria iniciado uma licitação para a compra de agulhas e seringas. Esse tardio processo de compra, que, caso ocorresse sem problemas, demoraria entre 60 e 90 dias para ser concluído, conseguiu garantir apenas 2,4% dos itens previstos. O governo terá de iniciar um novo processo licitatório, que vai atrasar ainda mais a imunização da população mesmo que em janeiro haja uma vacina aprovada pela Anvisa.

Bolsonaro mostrou ao longo da pandemia que não tem qualquer interesse na vida dos trabalhadores. Dificultou o quanto foi possível o pagamento do insuficiente auxílio emergencial; propôs medidas que flexibilizam os deveres dos patrões e precarizam os direitos dos trabalhadores; deixou de disponibilizar testes da Covid-19, agora com risco de perderem a validade; Bolsonaro sequer se dispôs a gastar integralmente o limitado orçamento previsto para o combate à pandemia. Agora, se nega a dar efetivos encaminhamentos que garantiriam a vacinação de toda a população ainda nos primeiros meses de 2021.

Os trabalhadores devem lutar por uma campanha de vacinação massiva e imediata, garantida pelo Estado, bem como outras medidas de saúde e segurança que se façam necessárias (testes gratuitos para todos, equipamentos de proteção, álcool gel, direito ao isolamento para os doentes, direito ao distanciamento para quem pertence a grupos de risco, interrupção de atividades não essenciais etc.). Essa luta deve estar ligada diretamente à necessidade de derrubada de Bolsonaro e à construção de um governo dos trabalhadores, sem patrões nem generais.