A reunião do G-20, realizada no início de Abril, em Londres, mostrou mais uma vez o impasse dos governos capitalistas. Para além de discursos otimistas, as medidas efetivas não apontam para o encaminhamento de soluções efetivas para a crise econômica.
Foram anunciados mais US$ 5 trilhões de estímulos à economia por parte dos governos. Esta cifra astronômica se soma aos mais de US$ 12 trilhões que, estima-se, já foram gastos (em recursos destinados tanto às empresas como aos bancos) desde o início da crise. O fato é que se estas medidas podem aliviar um pouco o fardo da recessão econômica, elas não podem jamais atacar o centro do problema: uma crise de superprodução de mercadorias somada a uma monumental circulação de capital fictício (capital que busca se valorizar na especulação, por fora da produção). E mesmo com os enormes recursos já gastos e anunciados, não há qualquer indício de recuperação, muito pelo contrário.
O G-20 acordou também a destinação de mais de US$ 1 trilhão para recuperar o papel de intervenção do FMI. O famigerado Fundo deverá ter o papel imediato de “ajudar” países que tiveram bruscas fugas de capital e perda de reservas (dólares), como o México e parte do Leste Europeu.
Além de tais medidas, a reunião do G-20 aprovou um documento que contém uma série de “boas intenções”: regular o sistema financeiro, combater os paraísos fiscais, evitar o protecionismo entre os países. Nas palavras do presidente francês Sarkozy, deve-se trabalhar para um “novo acordo de Bretton Woods”.
Novo “Bretton Woods”?!
E é justamente nesse ponto que, como já disse Marx, a história se repete: primeiro como tragédia e depois como farsa. Os Acordos de Bretton Woods, após a segunda guerra mundial, marcaram um período onde os governos de fato buscaram regular e controlar o capitalismo de forma a evitar crises como a de 1929. Também foi um período de concessões aos trabalhadores para buscar enterrar a onda revolucionária do pós-guerra. Mas o que esteve por trás de tais acordos foi a liderança absoluta (política, econômica e principalmente militar) dos EUA, que impôs o dólar como moeda-chave do capitalismo internacional.
Mas o capitalismo é o capitalismo, e, como também dizia Marx, “o limite do capital é o próprio capital”. A eterna competição levou a uma queda da rentabilidade entre o final dos anos 60 e início dos 70. Os capitalistas então buscaram se livrar das amarras que foram impostas por eles mesmos. É isso que explica as últimas décadas de “globalização”, marcadas por ataques aos direitos trabalhistas, liberalização comercial, liberalização financeira, novas formas de criação de capital fictício, etc.
A idéia de uma nova regulamentação e controle do capital esbarra hoje em dificuldades enormes. Como controlar, por exemplo, os gigantescos fundos de investimento que atuam com centenas de bilhões de dólares em dezenas de países?
EUA e o “multilateralismo”
Outro fator complicador é a própria relativa perda de liderança dos EUA. Quando caiu a URSS nos anos 90, o imperialismo americano impôs unilateralmente ao resto do mundo o chamado “Consenso de Washington”, que consistiu em um aprofundamento das políticas de liberalização, desregulamentação e privatização.
Agora, o discurso de Obama aponta para a necessidade de “cooperação internacional”, “multilateralismo”, e é justamente por isso que veio à tona a necessidade de se convocar o G-20. Se é certo que os EUA continuam a ser, sem dúvida, a principal potência imperialista, também é fato de que a derrota no Iraque e as complicações da recente crise impedem que o país tenha, mesmo que remotamente, uma liderança semelhante a que teve nos acordos de Bretton Woods. Se no pós-guerra os EUA financiaram sozinhos a reconstrução da Europa e do Japão, agora Obama se vê obrigado a apelar para que estes mesmos países injetem trilhões e também “paguem pela crise”.
Todavia o grau de cooperação entre os países dificilmente deve permitir outras medidas além da injeção de recursos na economia. O protecionismo, apesar de atacado veementemente em discursos, volta à tona como medida de defesa das diferentes burguesias nacionais. E justamente Obama saiu à frente nesta nova cruzada com a cláusula do “Buy American”, que fará com que apenas as empresas que utilizam aço produzido nos EUA tenham subsídios do governo. E mais importante: as eventuais tentativas de regular internacionalmente as finanças certamente vão esbarrar num tema pra lá de espinhoso: o papel do dólar como moeda internacional. As declarações recentes dos governos da Rússia e da China propondo uma “nova moeda internacional” provocaram uma reação imediata dos EUA, que não podem admitir, de forma alguma, perderem o direito de ser o único país no mundo e na história a emitir uma moeda aceita por todos.
Perspectivas para a classe trabalhadora
Portanto, o cenário mais provável para o próximo período não deve ser de “estabilidade” e de “cooperação” entre os países. Diante da crise, as diferentes burguesias e suas frações tendem a entrar num profundo conflito entre si. E certamente as burguesias continuarão buscando jogar sobre as costas dos trabalhadores as conseqüências da crise que elas mesmas criaram.
Mesmo que se consiga estabelecer algum controle sobre o capitalismo, a história já mostrou que a própria lógica do capital tende a transpor os limites impostos. E, sobretudo, nem a regulamentação do capital, nem as políticas keynesianas de gastos públicos, por si mesmas, significam qualquer melhoria efetiva para as massas. No contexto atual trata-se justamente do contrário. Os trilhões que estão sendo gastos para salvar os capitalistas tendem a exercer uma pressão constante sobre os gastos nos serviços públicos, sobre os direitos trabalhistas (no Brasil, por exemplo, o governo pretende desonerar as empresas do FGTS), etc.
A luta contra as demissões e a luta pelos direitos e serviços públicos devem ser a plataforma da classe trabalhadora – plataforma que deve apontar também para a expropriação da burguesia e o socialismo como únicas medidas que podem de fato, não apenas “controlar”, mas sim acabar com o capital.