No dia 12 de fevereiro, os trabalhadores do serviço público municipal de Florianópolis, reunidos em assembleia de seu sindicato, o Sintrasem (CUT), entraram em greve por tempo indeterminado pela retirada dos Projetos de Lei 1.976/2025 e 110/2025, enviados pelo prefeito Topázio Neto (PSD), que atacam as aposentadorias desses trabalhadores, buscando aplicar, em nível local, as medidas contidas na Emenda Constitucional 103/2019.
A previdência social é um direito histórico conquistado por meio de muita luta. Trata-se de um fundo de salários que pretende garantir dignidade ao final da vida laboral e prevê uma conexão fundamental entre diferentes gerações da classe trabalhadora de maneira solidária. A história da previdência dos trabalhadores de Florianópolis é marcada por uma série de ataques e descasos por parte da administração pública, comprometendo a segurança financeira daqueles que dedicaram suas vidas ao serviço público municipal.
Na sua criação, em 1999, pela Lei Complementar 5.494/99, a previdência foi instituída sem qualquer contrapartida da prefeitura, já sinalizando a falta de compromisso do poder público com a sustentabilidade do sistema previdenciário.
O primeiro grande golpe contra os trabalhadores veio em 2004, quando a então prefeita Ângela Amin, a apenas dois meses do fim de seu mandato, retirou 98% dos recursos do fundo previdenciário – um montante de aproximadamente R$ 18,6 milhões – e aplicou no Banco Santos. O banco declarou falência apenas 30 dias depois, levando consigo o dinheiro dos trabalhadores. Até hoje, ninguém foi responsabilizado judicialmente por essa ação criminosa, demonstrando a impunidade que impera quando se trata de prejuízos causados aos trabalhadores na Justiça burguesa.
Em 2006, o prefeito Dário Berger deu continuidade à pilhagem dos recursos previdenciários ao transferir, de forma irregular, R$ 5,4 milhões dos trabalhadores para o caixa da prefeitura. Dois anos depois, em 2008, sua gestão foi ainda mais longe, desviando R$ 30,5 milhões da conta da previdência para o Tesouro Municipal, um dinheiro que nunca mais foi devolvido. No mesmo ano, Berger aprovou o aumento da alíquota de contribuição dos servidores de 8% para 11%, por meio da Lei 349/2009.
Os ataques ao sistema previdenciário permaneceram na administração seguinte. Em 2016, Cesar Souza Junior encerrou seu mandato devendo R$ 50 milhões ao fundo previdenciário dos trabalhadores, pois a contrapartida patronal da prefeitura não estava sendo honrada há muito tempo.
Acompanhando o acirramento da luta de classes, que marca a conjuntura brasileira há pelo menos uma década, a gestão de Gean Loureiro acelerou os ataques aos trabalhadores. Em 2017, em vez de quitar os débitos existentes, previu o parcelamento da dívida de R$ 50 milhões, mas solicitou autorização para não pagar em dia os valores que teria de arcar ao longo de sua própria gestão.
Três anos depois, em 2020, propôs à Câmara Municipal um projeto, em regime de urgência, para elevar de 11% para 14% a alíquota de desconto em folha dos servidores, sob o pretexto de equilibrar as contas do fundo previdenciário. Na prática, tratava-se de uma reprodução fiel da reforma da Previdência de Jair Bolsonaro e Paulo Guedes, aprovada em 2019 (EC 103/2019), transferindo o peso da crise para os trabalhadores.1
A ofensiva contra os direitos previdenciários prosseguiu em 2021, quando Gean enviou à Câmara o Projeto de Lei 1.877/2021, com o objetivo de instituir o Regime de Previdência Complementar. Essa proposta desmontava o princípio da solidariedade geracional, colocando em risco a aposentadoria de milhares de servidores municipais.

Em 2024, a gestão de Topázio Neto iniciou seus ataques ao sistema previdenciário de Florianópolis. Entre as medidas adotadas, reduziu o valor da pensão por morte para apenas 50% do salário de servidores falecidos e diminuiu o valor das aposentadorias dos novos trabalhadores da prefeitura de Florianópolis.
Este ano, os Projetos de Lei 1.976/2025 e 110/2025 representam ofensivas ainda mais duras à previdência do que a reforma de 2019 de Bolsonaro. Vejamos, em detalhes, alguns dos ataques mais duros aos trabalhadores:
- Além de elevar o tempo mínimo de contribuição e a idade mínima para a aposentadoria (para as mulheres, a idade mínima passa para 62 anos; para os homens, são 65 anos. Em ambos os casos, são pelo menos 25 anos de contribuição), a proposta inclui a cobrança de 14% de alíquota para todos os aposentados que ganham mais de dois salários mínimos e ainda prevê gatilhos que aumentam esse confisco ao longo dos anos.
- O governo Topázio quer criar um fundo de capitalização, com aplicações do fundo de salários dos trabalhadores no mercado financeiro, colocando em risco a aposentadoria de milhares de servidores submetidos ao cassino das finanças. Já vimos esse filme na crise de 2008, quando milhões de pessoas no mundo inteiro perderam a poupança de suas vidas, pois estavam aplicadas nos títulos podres do manipulado mercado imobiliário dos Estados Unidos.
- O modelo clássico, de solidariedade geracional, só vai perdurar entre os trabalhadores da ativa que têm mais de 40 anos e os aposentados com mais de 78 anos, o que significa submeter a maioria da categoria a um risco previdenciário e à insegurança permanente. Trata-se de uma reedição ainda mais perversa dos assaltos realizados à previdência dos servidores municipais nos últimos 30 anos.
- A proposta de reforma em Florianópolis é, acima de tudo, vergonhosa e desumana, pois exclui o direito à aposentadoria de servidores que tenham padecido de alguma incapacidade permanente. Por exemplo, os servidores não poderão mais se aposentar mesmo que sejam diagnosticados com doença de Parkinson e de Alzheimer, doenças graves no coração e no fígado, paralisias irreversíveis e incapacitantes, além de esclerose múltipla, entre outras.
- Muda também o valor pago ao aposentado: em vez de descartar 20% das contribuições de menor valor, agora será paga a média aritmética de todas as contribuições. Trata-se de uma redução drástica no valor recebido pelos aposentados do município. Para receber 100% do valor, será preciso trabalhar até cinco anos além da idade mínima para a aposentadoria.
- Há retrocessos também no regime de aposentadoria especial, pois professores e trabalhadores que recebem adicional de insalubridade precisarão trabalhar no mínimo cinco anos a mais para poderem se aposentar.
- Cria-se também um regime de transição que obriga os trabalhadores a contribuir por mais tempo até que estejam elegíveis para a aposentadoria. O projeto amplia o tempo de trabalho para quem está na faixa dos 50 anos entre dois e cinco anos.2
Como se pode observar, o que o governo Topázio propõe é uma aplicação requentada, mas ainda mais dura, da reforma da Previdência realizada em 2019 pelo governo Bolsonaro, cuja implementação já foi tentada por Gean Loureiro e derrotada parcialmente pelos trabalhadores recentemente.
Diante da forte greve, pautada pela retirada dos projetos de lei e pelo atendimento de outras demandas referentes ao descumprimento do acordo coletivo, os vereadores do PSOL, Afrânio Boppré, Leonel Camasão e Ingrid Sateré Mawé, e a vereadora do PT, Carla Ayres, chegaram a defender emendas ao projeto para “torná-lo menos pior”, mas foram rechaçados pela categoria. Publicamente, eles estão defendendo a posição aprovada em assembleia. Por sua vez, o vereador Bruno Ziliotto, do PT, tem se mostrado o único parlamentar irredutível em sua posição pelo arquivamento integral do projeto.
O grande ponto ao qual devemos nos atentar é que ataques como esses não são exclusividade de Florianópolis. A reforma de 2019 abriu as portas do inferno para que servidores públicos de todo o país sofressem uma onda de ofensivas em diversos estados e municípios, sob o pretexto de arrastá-los às condições já deterioradas dos trabalhadores celetistas. Por isso, a luta contra a reforma da Previdência em Florianópolis deve ser considerada dentro de um espectro mais amplo: o espectro de ataques aos trabalhadores brasileiros como um todo.
Diante disso, é fundamental que a luta contra a reforma da Previdência de Topázio seja parte de uma mobilização nacional mais intensa dos trabalhadores por todo o Brasil, cobrando do governo Lula a revogação da EC 103/2019, pois isso fortalecerá a luta dos trabalhadores dos setores público e privado, tanto regional quanto nacionalmente.
Por uma mudança real na política econômica de ajuste fiscal contra o povo de Lula e Haddad. Pela derrubada da reforma da Previdência de Bolsonaro e contra a reforma da Previdência de Topázio. É nessa luta, compreendida de forma unificada, que mora o caminho da vitória dos nossos servidores municipais! A defesa da Previdência em Florianópolis é a luta pela Previdência nacional!
Comitê Regional de Florianópolis da OCI
Notas
- Informações baseadas na publicação “O que aconteceu com nossa previdência?”, do Sindicato dos Trabalhadores do Serviço Público Municipal de Florianópolis (Sintrasem-CUT).
- Informações baseadas na publicação “Entenda os principais pontos de ataque à nossa aposentadoria”, do Sindicato dos Trabalhadores no Serviço Público Municipal de Florianópolis (Sintrasem-CUT).