A tempestade de 2 horas que atingiu a cidade de São Paulo no último dia 24, foi a mais intensa, desde 1988. Passageiros se equilibraram em bancos e corrimões do metrô para se protegerem de enxurradas dentro das estações. Cenas de alagamentos de ruas, rajadas de vento e granizo deixaram estragos com desabamentos, correntezas que arrastaram automóveis, principalmente nas regiões norte e oeste. O acumulado de chuva somou 124 milímetros, com transtornos em diversos pontos da cidade, segundo a Climatempo.
Algumas regiões tiveram acúmulos históricos. A Estação Meteorológica do Mirante de Santana, zona Norte, registrou 121,8 milímetros em apenas 2 horas de chuva, sendo 82 mm somente na primeira hora. Esse foi o maior volume já registrado desde o início das medições, em 2006. Um volume pluviométrico que se posiciona como a 3ª maior chuva da história de São Paulo.
Meteorologistas explicam que a chuva foi uma combinação entre o excesso de calor e umidade, unidos à passagem de uma frente fria em alto mar, além de uma circulação de ventos com tendência ciclônica no estado. Mas esse volume de água é incomum? Vamos debater os registros.
Na tabela abaixo, vemos que chuvas extremas com mais de 100 mm está ficando mais comum em São Paulo. Entre as dez maiores chuvas da história, sete ocorreram nos últimos 20 anos.
Dez maiores chuvas da história da cidade de São Paulo | ||
RANKING | DATA | VOLUME PLUVIOMÉTRICO |
1 | 21 de dezembro de 1988 | 151.8mm |
2 | 25 de maio de 2005 | 140.4mm |
3 | 24 de janeiro de 2025 | 125.4mm |
4 | 05 de julho 2019 | 123.6mm |
5 | 10 de fevereiro 2020 | 123.0mm |
6 | 02 de fevereiro de 1983 | 121.8mm |
7 | 16 de janeiro de 2017 | 115.0mm |
8 | 15 de dezembro de 2012 | 114.3mm |
9 | 28 de fevereiro de 2011 | 109.5mm |
10 | 16 de janeiro de 1991 | 106.4mm |
Centro de Gerenciamento de Emergências da Defesa Civil do Estado de SP, dados do INMET
O que os negacionistas climáticos vão dizer? Está provado o aumento da frequência de fortes temporais na cidade. Nessa chuva vimos precipitação recorde para uma hora, e a crise climática torna esse problema cada vez mais comum. Os dados dos registros já confirmam uma mudança no padrão meteorológico da cidade. A frequência de chuvas extremas na grande São Paulo triplicou em uma década (INMET). Entre a primeira e a segunda décadas deste século (2001/2010 e 2011/2020), os temporais acima de 100 milímetros passaram de dois para sete a cada dez anos. Já as chuvas fortes, acima de 80 mm, aumentaram de 9 para 16. Lembrando que 1 mm de chuva equivale a 1 l/m² de água.
A mudança no padrão de precipitação da região metropolitana fica ainda mais evidente quando se compara a última década com o período inicial da análise do INMET (1961-1970). O número de dias com chuva acima de 50 mm passou de 37 para 47, enquanto as precipitações acima de 80 mm foram de 3 para 16 (13 a mais!). As tempestades acima dos 100 mm se repetiram 7 vezes no período mais recente. Já nos anos 1960, o cenário era outro: nenhuma ocorrência.
A resposta do Estado
Pela primeira vez, o alerta de risco severo de chuva e ventania foi disparado pela Defesa Civil para os celulares. A mensagem recomendava procurar abrigo e se manter em local seguro. A cada grande tempestade, a resposta está sempre na ponta da língua dos governantes: “não esperávamos por uma chuva como essa”, ou “choveu num dia a metade do que se esperava chover em janeiro todo”. Mas estamos agora diante da era dos desastres ambientais, os registros apontam que daqui pra frente os eventos extremos serão mais frequentes e mais intensos. Ora tempestades mais fortes, ora secas mais fortes.
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O governador Tarcísio anunciou a criação de um novo centro de gestão de risco de desastres, o Centro Paulista de Radares e Alertas Meteorológicos (CePRAM), e do Conselho Estadual de Mudanças Climáticas. Com radares, integração de equipamentos e nova equipe técnica para responder ao “novo clima”, isto é, ondas de calor que se combinam a chuvas muito intensas, produzindo extremos climáticos cada vez mais frequentes. Uma resposta suficiente ou eleitoreira visando 2026?
Existem promessas de adaptação da infraestrutura urbana. Como ampliação da cobertura verde e áreas de drenagem, formas a evitar alagamentos e deslizamentos de encostas. E transferir os moradores de áreas de risco da cidade — hoje são cerca de 490, segundo a Prefeitura de São Paulo. Há inclusive propostas mais avançadas como eletrificação da frota de ônibus e ampliação da rede de transporte sobre trilhos. Ou até mesmo propostas transitórias como a estatização de serviços de eletricidade. Mas quanto isso vai custar? E como é possível implementar essas medidas pagando fortunas para a dívida pública e impondo teto de gastos?
Os fenômenos atmosféricos possuem escalas local, nacional e global. São Paulo não é um caso isolado. Estamos verificando que os padrões estão mudando em Porto Alegre e Belém, por exemplo. No Rio Grande do Sul, devastado pelas tempestades recordes em 2024, o padrão pluviométrico mudou em relação aos anos 1990. Comparando dados do INMET da última década (2011/2020) com o período de 1991/2000, nota-se aumento de ocorrências de chuva acima de 50 mm (21 dias a mais), 80 mm (6 dias a mais) e 100 mm (2 dias mais). Ou seja, há mais dias com chuvas mais fortes na capital gaúcha. A série histórica do INMET também mostra a alteração dos padrões em Belém. Na comparação entre as décadas de 1991-2000 e a de 2011-2020, os dias com chuva acima de 50 mm passou de 75 para 110. As chuvas acima de 80 mm também se tornaram mais frequentes, passando de 15 para 26 dias. Já as que excedem os 100 mm se mantiveram estáveis (de 8 para 7 dias). Lembrando que o Pará é o estado que registrou o maior índice de degradação da Floresta Amazônica (ONG Imazon). Esse desgaste da cobertura vegetal é causado, sobretudo, pelas queimadas, que tiveram recorde em 2024.
As lutas que estão por vir
A urbanização no Brasil é resultado de uma industrialização tardia, acelerada, desordenada e dominada pelo capital financeiro internacional, típica de países atrasados. A crise ambiental que atravessamos é resultado de décadas em que o Estado atuou para que as corporações multinacionais acumulassem capital explorando nosso povo e nossos recursos naturais de modo predatório.
As cidades de um país dominado pelo imperialismo são cidades sem o urbano, inacabadas, que nunca se completam. A cidade nasce, cresce, ganha maturidade, mas sem conhecer as acessibilidades urbanas. Cidades construídas e reconstruídas de costas para a ciência, sem correspondência com seu relevo e seus rios. Vemos como as desigualdades sociais segregam a cidade e a concentração de oportunidades de trabalho localiza-se distantes das moradias populares. Uma das consequências é um deslocamento diário amplificado. Ou seja, mais tempo e energia gastos com transporte, isso significa mais emissões de gases do efeito estufa e a consequente intensificação de ilhas de calor que aumentam as tempestades. Tudo isso devido a ausência de planejamento urbano, especialmente São Paulo, uma cidade desenhada para o automóvel.
Em 2025 vemos um recuo dos EUA quanto ao estímulo de políticas ambientais com Donald Trump rompendo com o Acordo de Paris e pondo fim aos incentivos para o carro elétrico. Isso está sendo lido pelo mercado como perda de confiança nos EUA e aumento de oportunidades em países como o Brasil quanto a investimentos em economia verde. É o tipo de conjuntura que Lula gosta de lidar para se encontrar com empresários e autoridades internacionais e vender o Brasil como País do Futuro, ou liderança ambiental global, enquanto o agronegócio rouba do Cerrado e da Amazônia os recursos para sua produção. E com ajuda do PSOL, de Guilherme Boulos e Sônia Guajajara, canalizam as insatisfações das massas de trabalhadores com o capitalismo para a disputa eleitoral, restringindo e rebaixando o programa aos limites das alianças com os políticos da ordem. Ou vendem ilusões de que instituições farsescas como a COP30-ONU podem estabelecer um contraponto aos interesses do mercado e do imperialismo.
Por outro lado, cresce a quantidade de pessoas que se organizam por uma cidade mais democrática, mais inclusiva e sustentável. Nesse sentido, a inspiração num programa mais radical é fundamental. As lutas dos trabalhadores do transporte, estudantes, professores, operários, camponeses, lutas que se erguem contra as opressões, luta da juventude trabalhadora dos serviços de aplicativo e contra a escala 6×1… Nossas lutas precisam deixar de ser fragmentadas e se unificar para incorporar a dimensão em comum a todas elas, um programa anticapitalista.
A solução duradoura para esses problemas passa pela planificação socialista com um sistema econômico envolvendo a produção, distribuição e consumo de bens e serviços organizados de forma centralizada, com base em decisões coletivas e planejadas nacionalmente. Essa política é capaz de construir um mundo diferente, um mundo de reconciliação entre o homem e a natureza. Pois inverte a lógica atual em que tudo é determinado pelo mercado. O objetivo deve ser atender às necessidades sociais e reduzir desigualdades no lugar de buscar maximizar o lucro de um punhado de burgueses. A planificação é a saída para encerrar a privatização do espaço público, a segregação entre as classes sociais e a mercantilização da habitação, transporte e serviços públicos.
As lutas que estão por vir precisam ter ideias claras para resistir às pressões da burguesia no interior das nossas organizações, forçando a dissolução do nosso programa. As lutas que estão por vir devem construir um enfrentamento da crise ambiental superando a acumulação de capital e as demandas do mercado, com confiança nas forças da própria classe trabalhadora, sem ilusões no parlamento ou instituições do Estado.
Os cientistas mais otimistas preveem que os desastres ambientais serão cada vez mais frequentes. Convidamos você a juntar-se aos comunistas pela reconstrução de um partido de classe e revolucionário no Brasil para colocar em prática este programa.