10 anos do Movimento das Fábricas Ocupadas

No dia 31 de outubro de 2012 o Movimento das Fábricas Ocupadas (MFO) completa 10 anos. Há dez anos os trabalhadores das fábricas Cipla e Interfibra, em Joinville/SC, tomavam uma decisão histórica – ocupar a empresa, retomar a produção sob controle operário, sem os patrões, lutando pela estatização das fábricas, garantindo os postos de trabalho, a defesa dos direitos sonegados e a defesa da dignidade humana, contra a ameaça concreta do desemprego. Anunciavam, desde então, um caminho coerente, em defesa da expropriação dos meios de produção, fundados nos elementos mais centrais do marxismo e das experiências históricas do movimento operário internacional, buscando a implementação de conquistas sociais da classe trabalhadora, com a denúncia do caráter do Estado, da mesma forma que apontavam os limites da economia solidária e se recusavam o caminho do cooperativismo.

Introdução

No dia 31 de outubro de 2012 o Movimento das Fábricas Ocupadas (MFO) completa 10 anos. Há dez anos os trabalhadores das fábricas Cipla e Interfibra, em Joinville/SC, tomavam uma decisão histórica – ocupar a empresa, retomar a produção sob controle operário, sem os patrões, lutando pela estatização das fábricas, garantindo os postos de trabalho, a defesa dos direitos sonegados e a defesa da dignidade humana, contra a ameaça concreta do desemprego. Anunciavam, desde então, um caminho coerente, em defesa da expropriação dos meios de produção, fundados nos elementos mais centrais do marxismo e das experiências históricas do movimento operário internacional, buscando a implementação de conquistas sociais da classe trabalhadora, com a denúncia do caráter do Estado, da mesma forma que apontavam os limites da economia solidária e se recusavam o caminho do cooperativismo.

Desde então, o MFO se conformou em luta, na porta de cada fábrica em greve ou em situações de fechamento da empresa. Em ao menos 35 fábricas, realizamos o combate com os patrões, com os órgãos do Estado e, muitas vezes, com os próprios dirigentes sindicais. Os caminhos foram bastante diferentes, por conta das realidades concretas de cada um dos casos. Alguns tiveram reintegração de posse, outros decretaram falência. Outros entraram no regime jurídico da lei de recuperação judicial, ou ainda, houve casos que o patrão simplesmente fecha as portas na cara dos trabalhadores. Houve casos de medidas excepcionais, analogias jurídicas que sempre buscaram defender a propriedade privada acima de qualquer luta operária. Vimos caminhos ambíguos e contraditórios desde seu nascimento, como nos casos de co-gestão com os patrões. Aconteceram processos de luta onde a fábrica fechou, houve acampamento por meses nas portas das fábricas, ou ainda, casos em que a fábrica voltou a funcionar, mesmo depois de semanas ou meses sem produção, mas com uma relação de trabalho diferenciada, com o patrão na parede, tendo que cumprir efetivamente o pagamento de todos os direitos dos trabalhadores. Vimos também situações onde se conformou uma cooperativa, com os trabalhadores assumindo a propriedade da fábrica, assim como presenciamos casos onde a direção do sindicato apenas garantiu medidas jurídicas para garantir os direitos trabalhistas, mas nada fez para impedir o ataque ao principal direito trabalhista – o direito ao trabalho.

Justamente por manter extrema coerência entre a referência teórica do socialismo científico (e não o socialismo utópico, como se apresenta o próprio Paul Singer)[1] e a realidade concreta, objetiva e cotidiana da classe trabalhadora, a história do MFO é fantástica, onde se pode verificar de forma cabal o caráter do Estado, que, em última instância, como o “comitê de negócios da burguesia”, ataca uma experiência de luta da classe trabalhadora, de forma direta, como veremos no caso da Intervenção. Porém, devemos salientar que também cumprem sua utilidade em defesa da burguesia com a simples negação do atendimento de suas reivindicações, “lavando as mãos”, promovendo momentos dramáticos de resistência, que apenas reforçaram a força do movimento operário e a solidariedade de classe, para além das perspectivas de luta cooptadas pelo grande capital e pelas direções sindicais coniventes com os patrões.

Assim, temos que o MFO se consolidou com três experiências de luta concreta pela estatização sob controle operário. Cipla e Interfibra, em Joinville/SC, depois a Flaskô, em Sumaré/SP, são as fábricas que permaneceram sob gestão dos trabalhadores por mais tempo, sendo que a Flaskô hoje é a única empresa que ainda permanece sob gestão operária. Todas essas tinham a particularidade de fazerem parte do mesmo grupo econômico (holding HB), que fortaleceu ainda mais a unidade que norteou a luta nesses 10 anos. Nesse sentido, o trabalho de doutoramento de VERAGO (2012) é de grande importância por apresentar todo esse resgate histórico do MFO e sua relação com o Estado.

Portanto, sempre salientamos que independentemente do número de fábricas ocupadas, o MFO pauta-se como perspectiva de luta, como uma pauta sindical e do movimento operário, integrado aos demais movimentos sociais contra o capital e a propriedade privada dos meios de produção, buscando se organizar para além dos limites nacionais. Por isso, em tempos de crise do capital em nível internacional, com grandes embates na dinâmica capital-trabalho, com fábricas sendo fechadas, com medidas de austeridade fiscal e ataques aos trabalhadores pelos mais diferentes governos, temos como resultado o acirramento da luta de classes, que se expressa diferentemente em cada país, mas que encontra sua unidade por escancarar a barbárie instalada pelo capitalismo.

Dessa forma, resgatando esses 10 anos de luta e resistência, os trabalhadores da Flaskô reafirmam a perspectiva de luta da estatização sob controle operário, como um caminho em defesa da transição socialista e a planificação da economia, com a expropriação dos meios de produção e manter o caráter de classe dos trabalhadores, além de ser a única forma de, concretamente e de forma duradoura, garantir os empregos, as conquistas sociais da classe trabalhadora, expressa pelos próprios direitos constantes na CLT e na Constituição Federal. Somente compreendendo essa dialética relação entre teoria e prática é que o MFO analisa sua história objetivando, na verdade, apontar as perspectivas para o futuro, compreendendo o momento decisivo da conjuntura nacional e internacional, cumprindo como um importante ponto de apoio e referência da resistência classista e socialista.

Da greve de ocupação à definição da estatização sob controle operário

Os trabalhadores das fábricas Cipla e Interfibra estavam cansados com o descaso da gestão patronal, que desrespeitava seus direitos diariamente, e que, nos últimos anos, dizia abertamente que encerrariam a atividade industrial e que todos seriam demitidos. Isso estava ocorrendo em todos os grandes centros urbanos brasileiros, como em todo o mundo, particularmente na América Latina, diante da crise do capitalismo que acabou com a burguesia impondo um novo padrão de produção e acumulação, realizando medidas de reestruturação produtiva e de incentivo à mobilidade de capitais, buscando maior exploração da força de trabalho, tudo para recuperar as taxas de lucro. A bibliografia nesse sentido é extensa e de grande qualidade[2].

Ou seja, longe de ser uma particularidade, o que os trabalhadores de Joinville/SC viviam era parte de um processo muito mais amplo de ataque à classe operária em nível internacional. As privatizações e os diferentes aspectos da subordinação ao capital internacional ocorridos ao longo dos anos 80 e 90 foram de tal magnitude que influenciaram decisivamente na dinâmica da luta de classes, colocando os movimentos sociais e sindicais nas ruas, combatendo as medidas do governo FHC que reforçavam o caminho do desemprego e da perda de direitos. É nesse contexto que os trabalhadores se deparam com a situação que enfrentavam com os sócios proprietários. O quadro das empresas do grupo HB era de sucateamento de patrimônio, inadimplemento tributário e sonegação dos direitos trabalhistas (VERAGO; NASCIMENTO).

Interessante ver que no final dos anos de 1980, os Batschauer apostaram no processo de divisão das atividades operacionais da Cipla em unidades de negócios especificas (utilidades domésticas, materiais de construção, tubos e mangueiras flexíveis e produtos especiais), formando empresas juridicamente independentes, responsáveis por seus lucros operacionais, gerenciamento do quadro de pessoal, do parque de máquinas etc. Além disso, apostaram na centralização do capital, aquisições e associações para expansão dos negócios da CHB S.A. (holding corporativa criada em 1988) que, à época, se dividia em seis holdings setoriais, dentre as quais, a HB Consumo S.A. (Cipla: Material de Construção; Produtos do Lar; Tubos, Mangueiras e Flexíveis; Tintas) e a HB Industrial S.A. (Brakofix, Interfibra, Profiplast, Poliex, Glycerin e Flaskô). Tem-se aqui a estruturação de uma gigantesca organização, composta por 39 empresas, que gradualmente ruiria feito um “castelo de cartas” frente ao contexto de crise relativo à fase de reestruturação, crise esta exacerbada a partir do governo de Collor. Nesse período, a CHB sofreu forte queda no faturamento, decidindo instalar um programa emergencial de contenção de despesas, fundamentalmente com demissões em massa (NAPOLEÃO, 2005).

De acordo com o estudo do Dieese (1997, p. 76), referindo-se à crise enfrentada pela CHB,“as respostas quando implementadas foram extremamente duras para os trabalhadores. Configurou-se uma estratégia constituída de: 1) fechamento de 5 fábricas; 2) redução do quadro de pessoal de 5.401 para 1.711 trabalhadores; 3) diminuição de 215 para 51 chefes, além de diretores e gerentes; 4) redução dos níveis hierárquicos de 7 para 3; 5) terceirização da área comercial, com queda de 450 para 180 vendedores; 6) a informatização da área de vendas reduziu de 222 para 33 vendedores; e 7) uma centralização administrativa.”

Assim, como destaca (NAPOLEÃO, 2005):

“Ao final, a CHB não conseguiu superar suas debilidades, restando aos trabalhadores lutar contra tudo e todos em favor da manutenção de seus empregos. Por certo, para a burguesia joinvilense algo inusitado ocorreu, uma das mais tradicionais e reverenciadas empresas do Brasil estava sob o controle dos trabalhadores, e, se não bastasse, estando às paredes das instalações da atual administração abrilhantadas por quadros com figuras de Lênin e Trotsky”.

Diante disso, os trabalhadores se utilizam de seu mais poderoso instrumento contra o capital – a greve. Cruzam os braços em maio de 2002. Desorganizados e desguarnecidos do apoio do sindicato, sofrem grande repressão, com mais de 120 demissões. Em outubro de 2002, agora sim mais mobilizados e unidos, inclusive com outras forças políticas para além do sindicato, realizam uma nova greve, que dá um salto de qualidade e avança para uma greve de ocupação, isto é, uma greve que ataca a posse empresarial. A ação grevista é fundamental, como destacou Lênin, na clássica passagem:

“As fábricas, as propriedades dos latifundiários, as máquinas, as ferrovias, etc., são, por assim dizer, rodas de uma enorme engrenagem; esta engrenagem fornece diferentes produtos, transforma-os, distribui-os onde necessário. Toda esta engrenagem é movida pelo operário que cultiva a terra, extrai o mineral, elabora as mercadorias nas fábricas, constrói casas, oficinas, ferrovias. Quando os operários se negam a trabalhar, todo esse mecanismo ameaça paralisar-se. Cada greve lembra os capitalistas que os verdadeiros donos não são eles, e sim os operários, que proclamam os seus direitos com força crescente. Cada greve lembra os operários que sua situação não é desesperada e que eles não estão sós”[3] (grifo nosso)

A greve de ocupação possui uma importância ainda maior, pois como salienta (TROTSKY, 1931): “As greves com ocupação de fábricas, escapam aos li­mites do regime capitalista anormal. Independentemente das reivindicações dos grevistas, a ocupação temporária das empresas golpeia no cerne a pro­priedade capitalista. Toda greve com ocupação coloca na prática a questão de saber quem é o dono da fábrica: o capitalista ou os operários” (grifo nosso).

 Dessa forma, os trabalhadores pressionaram os proprietários para não fecharem a fábrica, pois “se a empresa não está dando mais lucro ou não lhe interessavam mais, a atividade industrial poderia permanecer sob controle dos trabalhadores, sem os patrões”. Diante dos três meses de salários em atraso, dos direitos que estão sendo sonegados há anos, não havia a menor credibilidade dos patrões com os trabalhadores.

“Assim, uma greve para receber salários se transformou numa greve para salvar os empregos. Para isso, colocou a questão do controle operário sobre as fábricas. E em seguida colocou a questão da responsabilidade dos governos sobre as crises e sobre a manutenção dos empregos. Os operários decidiram que não aceitavam ser descartados quando os patrões não tinham mais o que sugar, porque os operários não são responsáveis pelo mercado, pelas falcatruas e nem pela política econômica aplicada a serviço do capital financeiro e das multinacionais. Isso colocou a questão da estatização e, na sequencia, a necessidade de uma ação operária para salvar o parque fabril que está sendo liquidado pela política imperialista. Ao encarar desde um ponto de vista da classe a questão, os operários ergueram-se em defesa da nação ameaçada e de todo o povo sofrido do Brasil. Daí surge a orientação de luta sintetizada na palavra de ordem “fábrica quebrada é fábrica ocupada e fábrica ocupada deve ser estatizada””[4].

Portanto, iniciava-se um enfrentamento concreto com os sócios proprietários, assim como se avançava no processo de consciência, discutindo-se o caráter da produção capitalista e os embates em torno da noção da propriedade no capitalismo. Nesse sentido, é certo que os trabalhadores diziam que mais do que ter uma posição definitiva, primeiramente, caberia avaliar quais as reais situações econômicas das empresas. Ou seja, relacionando a base teórica com a situação concreta dos trabalhadores, entendia-se que a abertura dos livros fiscais e o acesso à contabilidade são essenciais para verificar as condições e os desafios que se colocavam para a continuidade da atividade industrial. Como salienta Trotsky, abolição do segredo comercial é uma condição para um verdadeiro controle operário. As primeiras tarefas do controle operário consistem em “(…) esclarecer quais são as rendas e despesas da sociedade, a começar pela empresa isolada” e em “(…) revelar, enfim, diante de toda a sociedade, o assustador desperdício de trabalho humano que resulta da anarquia capitalista e da pura caça ao lucro”[5]. Assim, temos que Trotsky explica que o primeiro passo em direção real ao controle da indústria é a abolição dos “segredos empresariais”. Os segredos empresariais, as contas e os livros são naturalmente usados para justificar todo tipo de ataque contra a classe trabalhadora, como as reduções salariais, demissões e aumentos da jornada de trabalho. Quando os patrões, alegando falência ou redução dos lucros, exigem a adoção daquelas medidas, o controle operário permite a inspeção dos livros e a verificação da situação real. A ideia é a de levantar o véu para mostrar à classe trabalhadora o funcionamento detalhado do sistema capitalista como um passo em direção a sua eliminação.

As tarefas imediatas do controle operário seriam a de explicar os débitos e os créditos, focalizando inicialmente as empresas individuais, para determinar a parte da renda nacional dos capitalistas individuais e, naturalmente, da classe dominante como um todo. Outra tarefa do controle operário seria a de revelar à sociedade a exploração da mão de obra e a descarada caça aos lucros, bem como expor os acordos secretos, fraudes e a corrupção inerente ao sistema. Como ressalta Rob Lyon:

“Trotsky também explicou que o controle operário da indústria é uma “escola de economia planejada”, permitindo aos trabalhadores obter uma compreensão científica do funcionamento da economia e, dessa forma, poder planejar de forma consciente e democrática a produção e o conjunto da economia. Através da experiência do controle operário, a classe trabalhadora prepara-se para a gestão direta das indústrias nacionalizadas. Dessa forma, o controle operário da indústria não é duradouro, nem estável, e de fato implica em dualidade de poder na fábrica ou empresa, e não pode durar indefinidamente enquanto este controle não se transformar em gestão direta”.

Da mesma forma, os trabalhadores foram analisar as experiências históricas do movimento operário internacional, desde a revolução industrial e a luta dos trabalhadores europeus, as diferentes experiências de controle operário na Revolução Russa, ou mesmo no Leste Europeu e na Itália, ou ainda, na Argentina, com uma série de ocupações de fábricas realizadas alguns anos antes no auge da crise em 2000. A opção do MFO pela estatização sob controle operário em detrimento ao cooperativismo pode ser explicado, em apertada síntese, por GOULART (2008):

“Duas das maiores indústrias de Joinville (principal cidade do estado de Santa Catarina, Brasil), a Cipla S/A e a Interfibra S/A, estão hoje sob controle dos trabalhadores, que lutam para salvar os 1.000 postos de trabalho, receber os salários em dia e resgatar as dívidas trabalhistas e previdenciárias. Para isto, em uma Carta à Lula, que já tem mais de 50.000 assinaturas, propõem que o governo assuma as duas empresas. A luta pela estatização já foi reafirmada em várias assembleias dos trabalhadores. Numa época em que todos os governantes e muitos sindicalistas falam em “economia solidária”, a autogestão, ou a cooperativa, é apontada como a solução para salvar os empregos. O problema é que isto não salva emprego e ainda desagrega a luta e a organização dos trabalhadores. Somente a estatização dá uma verdadeira perspectiva para os trabalhadores. Por que não aceitamos a cooperativa? A cooperativa é um acordo entre os trabalhadores, que se apossam dos meios de produção (máquinas, planta da fábrica, ferramentas, etc) frente à ameaça de fechamento de uma empresa e passam a produzir. Assim, estarão regidos pela lei das cooperativas, que não estabelece vínculos trabalhistas, ou seja, não há encargos sociais e nenhum direito previsto. Ao criarem uma cooperativa, os trabalhadores assumem a responsabilidade pelos passivos da empresa, quaisquer que sejam: bancos, fornecedores, acionistas, etc. Ou seja, os trabalhadores passam a ser sócios-proprietários de uma nova empresa onde os explorados são eles próprios. As cooperativas mais organizadas, se conseguem sobreviver, chegam a separar parcela dos lucros para pagar bônus como se fossem 13º salário, férias, etc. Mas a questão central é a mesma que põe as empresas em crise no sistema capitalista. No capitalismo, empresas quebram e desaparecem todos os dias frente à concorrência ou à força dos monopólios das multinacionais. Para evitar a quebradeira, deve-se abaixar o custo da produção ou aumentar a produtividade. Os dois caminhos levam ao famoso “enxugamento”. A economia capitalista obriga as empresas a aumentar sempre o investimento em automação, em novas máquinas e ferramentas, a fazer “reengenharia da produção” buscando maior produtividade, etc. Isso provoca a “sobra” de operários e a necessidade de se “enxugar o quadro”, através de algum tipo de demissão incentivada. O resultado desta lógica infernal é que uma parte dos trabalhadores acaba tendo que escolher qual colega será demitido. Logo, formam-se os grupos, as “panelinhas” que se articulam para demitir os outros. Isto inclui a eleição dos dirigentes da cooperativa para preservar os membros do grupo, etc. (…) A cooperativa é um dos tipos da chamada Autogestão. Existem outros. Os trabalhadores podem assumir as ações da empresa tornando-se acionistas, proprietários. Em geral, carregando junto o ativo e o passivo (dívidas) da empresa. O operário vira patrão. Pelo menos enquanto durar a luta da empresa por se manter no mercado capitalista, sem esquecer de que todo dia se agrava a situação das empresas na disputa por um mercado controlado e pressionado pelo capital financeiro especulativo. Assim, frente à falência das empresas e à ameaça de desaparecimento dos postos de trabalho, a única perspectiva realista que sobra é o controle operário da produção, abertura dos livros (controle administrativo e financeiro) e a luta pela estatização das empresas. É a única alternativa que permite manter em primeiro plano a luta para salvar TODOS os empregos dos trabalhadores da fábrica, responsabilizando em última instância o capitalismo e seu Estado pela crise. Numa economia esmagada pelo capital financeiro especulativo não há saída para as empresas cooperativadas ou autogestionárias. A disputa pelo mercado, a pressão pela produtividade, pelas “vantagens comparativas”, empurram inexoravelmente toda a economia capitalista para o abismo. E a especulação financeira joga aí um papel de acelerador, conduzindo todas as empresas ao ataque maciço para rebaixar o “Custo do Trabalho”. Nenhuma Cooperativa ou Autogestão pode fugir disso. Estas tentativas terminam por transformar os operários em carrascos de si mesmos. E o pior, e mais grave, retiram deles a perspectiva de combate da classe trabalhadora contra a classe capitalista para terminar com toda opressão e exploração sobre a humanidade. As cooperativas ou empresas autogeridas são levadas pela lógica da economia a buscar mercados, a competir, a combater e destruir as outras fábricas concorrentes, ou seja, destruir postos de trabalho de seus próprios irmãos. Afastar-se do eixo da luta pela estatização é inevitavelmente cair na vala reacionária da autogestão ou cooperativa. Acabar na paralisia mais absoluta. Em nenhum destes casos se pode vencer. A luta pela estatização é a única perspectiva, duríssima, difícil, mas que pode salvar os 1.000 postos de trabalho da Cipla e Interfibra”.

De forma concreta, o que se via no conflito dos trabalhadores e empresários da Cipla e da Interfibra era exatamente a questão da propriedade. Diziam os patrões: “se vocês querem a fábrica, assumirão os “bônus” e os “ônus””. Nas primeiras reuniões do Conselho de Fábrica eleito, como se comprova nas primeiras atas de reuniões intermediadas pelo Poder Judiciário, verificamos esse era o aspecto central do conflito, descrito assim por NASCIMENTO (2004):

“os representantes dos grevistas negociaram por oito dias, reivindicando o imediato pagamento salarial e regularização das dívidas trabalhistas. Nas reuniões, mediadas pelo Ministério Público Federal, Ministério Público Estadual, Delegacia Regional do Trabalho (DRT), além de deputados e vereadores de Joinville, os irmãos Batschauer, que sempre alegavam ilegalidade do movimento, reconheceram que não havia “como pagar as dívidas trabalhistas, previdenciárias e fiscais”. Assim, “foram forçados a firmar um acordo para transferir o controle das duas fábricas a quem os trabalhadores determinassem, além de serem afastados da direção administrativa e operacional”. Para tanto, foi constituída uma Comissão de Transição para avaliar o montante da dívida da Cipla e Interfibra, que foi acompanhada semanalmente pela DRT. Depois de se recusarem a abrir os livros da empresa, apesar do comando estar sob o controle dos trabalhadores, os antigos donos ainda tentavam exercer uma espécie de poder paralelo, mas foram impedidos de entrar na fábrica depois de uma assembleia na Cipla. A Comissão de Transição foi substituída por um Conselho Administrativo Unificado, também reunindo trabalhadores das duas empresas”.

Assim, diante de toda a pressão realizada pelos trabalhadores da Cipla e Interfibra, que haviam mobilizado toda a cidade de Joinville, com apoio de movimentos sociais, entidades estudantis, mandatos de parlamentos, associações de bairro, além de outros sindicatos, o Poder Judiciário outorga poderes de gestão aos trabalhadores das fábricas do grupo econômico HB. Tal procuração foi renovada por duas vezes, ainda por prazo determinado, para depois ser prorrogada por prazo indeterminado. A medida judicial que serviria para garantir o poder de fiscalização da contabilidade aos trabalhadores ultrapassa os objetivos imediatos, e reflete o caminho proposto, agora sim de maneira mais compreensível para o conjunto dos trabalhadores, com a necessidade de continuar a atividade industrial sob a perspectiva da estatização sob controle operário.

A estatização sob controle operário chega à Brasília: O MFO e o governo Lula

Como adiantamos, o contexto político-econômico foi fundamental para consolidar a perspectiva de luta dos trabalhadores na luta pelos postos de trabalho. A crise do capitalismo internacional impôs medidas de reestruturação produtiva e de austeridade fiscal, resultando no aumento do desemprego e de ataques aos direitos trabalhistas. Tais medidas provocaram um desgaste do governo FHC e houve um ascenso das massas, com mobilizações sociais diárias em todo o país, e que resultou na eleição de Lula em 2002. Longe de ter um programa revolucionário, a classe trabalhadora o elegeu para fazer a experiência, depositando nesse processo uma série de esperanças.

O MFO, estando lado a lado com a classe trabalhadora, combatendo no terreno das ilusões, se dirigiu ao governo Lula, apresentando sua pauta de reivindicação, objetivando provocar essas contradições. Ademais, se é verdade que a estatização sob controle operário é uma pauta revolucionária, não entendemos que ela somente possa ser levada adiante em situações revolucionárias ou pré-revolucionárias. Pelo contrário, sabendo da diferença entre governo e Estado, e, por isso, sabendo que estávamos diante de um Estado Burguês, entendemos que essa pauta contribui justamente no movimento dos trabalhadores e na dinâmica da luta de classes, reforçando suas bases marxistas e como instrumento concreto para a denúncia do Estado burguês e da necessidade da revolução.

No dia 11 de junho de 2003, realizou-se a 1ª Caravana do MFO à Brasília, com 10 ônibus saindo de Joinville/SC, onde uma comissão dos trabalhadores foi recebida pelo Presidente Lula. Apesar do clima de festividade, Lula disse que a “estatização sob controle dos trabalhadores não estava no cardápio”, por conta da “coalização e da correlação de forças”, e que provocaria “precedentes preocupantes”. No entanto, afirmou que “faria de tudo para a defesa dos postos de trabalho”, conformando assim, um grupo interministerial para estudar o caso, e apontar soluções.

Como sabemos, a criação de grupo de trabalhos reforça a burocratização do processo de luta, mas foi interessante para provocar as contradições, pois o próprio BNDES, consultado sobre o caso das empresas do MFO como Lula propôs, disse que a melhor solução seria a estatização, realizando-a por meio da compensação tributária:

“Nossa sugestão é de que, por decisão do governo federal e do governo estadual, seus créditos sejam transformados em ações, que seriam postas como capitalização do BNDES. (…) Para encerrar, entendo que é um caminho difícil, mas factível, e entendo também que a única forma de realizar o que parece central neste caso (a manutenção dos empregos) exige que os entes públicos assumam o controle destas empresas através de seus bancos de desenvolvimento social, o BNDES e entes estaduais”.   

Seguimos em negociações com o governo federal até hoje, sem ilusões, mas continuamos provocando as contradições do caráter do Estado Burguês e dos limites de um governo de contenção social, que fez opções políticas, institucionalizando a luta social, cooptando lideranças, filtrando a luta diante de uma fábrica que ameaça fechar as portas somente por meio da perspectiva da economia solidária e do cooperativismo. Isso porque as palavras de Lula foram precisas, pois o “cardápio” é diferente quando se comparam as reivindicações de trabalhadores e empresários. Da mesma forma, os medos de precedentes eram “justos”, pois imaginem se ocorre uma onda de ocupações de fábricas? Isso não fazia parte dos compromissos da “carta aos brasileiros” ou das negociatas da coalizão para sustentar a suposta governabilidade. Lula cumpria seu papel, contendo uma experiência revolucionária, direcionando-a para não ter opção a não ser reproduzir a lógica da economia solidária, que é muito útil ao capital, como bem demonstra Wellen[6].

Entretanto, foi a partir dessa Caravana à Brasília, especialmente com a ocupação e retomada da produção sob controle operário da Flaskô, outra fábrica do grupo econômico HB em Sumaré/SP, no dia seguinte, que se consolidou o MFO com o “slogan” de desemprego zero. Ganhava-se uma perspectiva mais ampla, de aplicar a palavra de ordem que expressava tanto a base teórica que fazia Lula tremer, como o sentimento de cada trabalhador do MFO: “fábrica quebrada é fábrica ocupada; e fábrica ocupada é fábrica que deve ser estatizada e que deve ser colocada sob controle dos trabalhadores”.

As conquistas do MFO

Vale dizer que no momento da ocupação da Cipla e Interfibra, ou depois na Flaskô, os trabalhadores não sabiam quanto tempo a ocupação resistiria, e não se vislumbrava, necessariamente, a continuidade da produção sob controle operário por muito tempo. A unidade dos trabalhadores, e a confiança mútua, olhando nos olhos de cada operário, foi o que garantiu a retomada da produção sem os patrões. A segurança transmitida pelas lideranças que se constituíam a cada assembleia se expressava não com promessas ou garantias de suposto sucesso empreendedor. Pelo contrário, a única garantia que se tinha era de que se levaria a luta pela defesa dos postos de trabalho até o fim, sob uma perspectiva de classe, expondo as contradições do capitalismo. Até hoje é o que cada assembleia da Flaskô ainda se reforça: somente a unidade da classe trabalhadora pode salvar a Flaskô. Os ensinamentos do marxismo são precisos: “A emancipação da classe trabalhadora será obra dos próprios trabalhadores”, “Trabalhadores do mundo, uni-vos”.

Assim, podemos dizer que ao longo desses 10 anos, apesar das diversas dificuldades e erros cometidos, os trabalhadores que compõem a MFO reforçam: valeu a pena! O aprendizado na luta, muitas vezes tendo primeiro um revés, constrói o processo de consciência.  As conquistas sociais são tremendas, mesmo nas derrotas. E são conquistas que vão além das melhorias individuais de cada trabalhador, mas envolve conquistas para a comunidade e para a classe trabalhadora de forma geral.

Para os trabalhadores das fábricas ocupadas, podemos destacar: a) avanço no processo de consciência de classe, com a realização de greves e, depois, greves de ocupação, e ainda, em seguida, retomar a produção sem um patrão. Essa perspectiva de luta, buscando a emancipação da classe em contraposição ao empreendedorismo individual é de grande importância. Mesmo nos casos de fechamento da fábrica, com reintegração de posse ou volta do patrão, o processo político de unidade da classe trabalhadora foi feito, mostrando o caráter do Estado e a dinâmica do capital ao atacar diretamente a força de trabalho; b) aos trabalhadores que vivenciaram uma situação mais duradoura de controle operário, como na Cipla, Interfibra e até hoje na Flaskô, é certo que aprendemos a adotar uma nova concepção de relações de trabalho, sob a lógica do bem-estar coletivo em detrimento da lógica convencional do capital, de buscar maiores lucros e produtividade explorando cada vez mais a força de trabalho. Nos casos das fábricas do MFO, pelo contrário, realizou-se um novo ritmo diferenciado, sem um chefe com chicote na mão, mas sim com a organização da produção submetida às decisões das assembleias e do Conselho de Fábrica, organizada pelos líderes de turno, que possuem funções organizativas. Tudo isso fez com que houvesse uma brutal redução do número de acidentes de trabalho, um clima de solidariedade e companheirismo entre os trabalhadores, que resultou, inclusive num aumento de produtividade; c) E mais, mesmo quando se adotou a maior das conquistas, que foi a redução da jornada de trabalho sem redução de salários, aumentou-se o faturamento e a produção. Logo na primeira assembleia, a jornada foi reduzida de 44 para 40 horas. Depois, apresentando-se um estudo onde se comprovava o aumento da produtividade, gerando inclusive novos postos de trabalho, conseguimos reduzir a jornada de trabalho para 30 horas semanais, sem redução de salários. Sabemos que somente podemos implementar tais medidas porque não há apropriação privada da riqueza. Mas ressaltamos que se foi possível realizar tal medida em fábricas sucateadas e quebradas, o que dizer da necessária redução da jornada de trabalho, sem redução de salários, nas empresas com alta tecnologia e com altas taxas de produtividade. Isso somente será possível com a generalização de ocupações de fábricas, num processo revolucionário. Assim, a adoção de tal medida, mostra como se dá a exploração da força de trabalho e a extração de mais-valia pelos capitalistas. Trata-se de aplicar uma bandeira histórica da classe trabalhadora, garantindo mais tempo para educação, cultura, lazer, família, militância, etc.; d) O aprendizado coletivo sobre a produção, diminuindo a alienação do trabalho, diminuindo a subsunção real, conhecendo o conjunto da produção da empresa, sentindo-se parte do processo produtivo, deliberando sobre os rumos da gestão, discutindo sobre temas centrais de uma empresa, prática que seria impossível num empresa capitalista. Aprofunda-se as discussões conjuntura política e econômica, sobre direitos (sobre hora extra, adicional noturno, dissídios coletivos, piso da categoria, salários, PLR, etc.), ou seja, temáticas centrais para a classe trabalhadora, para além da realidade de cada fábrica.

Para a comunidade, podemos salientar que onde o MFO esteve, realizando o embate contra o fechamento das fábricas, conseguimos estimular a aliança dos trabalhadores com a comunidade, expressa em associações de bairro, o dono da lanchonete em frente à empresa, outros movimentos sociais e setores da região, que, de uma forma ou de outra, reafirmavam a “sacanagem dos patrões em querer fechar a fábrica e demitir os trabalhadores”. A luta pela ocupação das fábricas, retomando a produção sob controle operário sempre teve o apoio da comunidade, que se identificava com a luta, compreendendo as mazelas sociais do eventual fechamento das fábricas. Assim, a luta pelos postos de trabalho se fortalecia e germinavam posições de denúncia do caráter do Estado e da necessidade de “vivermos sem patrões”.

Na Cipla e Interfibra, em Joinville/SC, tal relação com a comunidade foi essencial para sustentar politicamente a produção sob controle operário. O apoio das associações de bairro, de lideranças populares, de parlamentares, de setores das pastorais operárias, do movimento estudantil, muitos vizinhos ou amigos de algum trabalhador da fábrica, era muito importante, criando laços de identidade e solidariedade.

Particularmente, na Flaskô, duas situações avançaram no que se refere à relação com a comunidade. O terreno onde está sediada a Flaskô é uma propriedade de 140 mil metros quadrados, sendo que a fábrica ocupada ¼ desse todo. O que fazer com os ¾ abandonados, que estavam servindo como especulação imobiliária para os patrões, e que somente servia como depósito de cadáver e para o tráfico de drogas? O MFO se articula com associações de bairros da periferia de Sumaré, e organiza uma ocupação por moradia nessa área. Em 12 de fevereiro de 2005, realiza-se a ocupação pelo direito à moradia. Conforma-se, assim, a Vila Operária e Popular, contando, atualmente, com 564 famílias.

Desde então, a relação entre os moradores da Vila Operária e Popular e os trabalhadores da Flaskô é muito forte, uma vez que a luta se fortaleceu, seja na defesa da gestão operária da Flaskô, seja contra qualquer ameaça de despejo das famílias e pela regularização da área, e ainda na defesa de avanços estruturais necessários para uma vida digna, como acesso à água, luz, saneamento básico, etc. Foram dezenas de atos públicos em conjunto, fazendo com que as conquistas sociais extrapolassem às relações de trabalho, fazendo com que, de forma coerente, a área fosse ocupada para cumprir o direito à moradia.

Essa relação com a comunidade, por meio da Vila Operária, foi o primeiro passo para a interface dos movimentos de fábricas ocupadas e dos movimento de moradia, que realizam ocupações urbanas. Logo depois, ocorreram outras 4 ocupações por moradia, em Sumaré, Hortolândia e Campinas, do MTST e do MTD, e sempre estivemos juntos à cada ação dos movimentos. O mesmo podemos dizer com os movimentos que lutam por reforma agrária. Nas cidades de Limeira e Americana, próximas à Sumaré, o vínculo de pertencimento entre os trabalhadores da Flaskô e os militantes do MST é tremendo, justamente porque sempre ressaltamos: “Quando o campo e a cidade se unir, a burguesia não vai resistir!”.

Não obstante essa relação, é certo que a partir do Projeto da Fábrica de Cultura e Esportes o vínculo com a comunidade aumentou. Mais de 400 atividades culturais e sociais, além de dezenas de atividades esportivas, foram realizadas nos galpões abandonados da Flaskô. Tudo isso somente reforça as conquistas sociais realizadas pelo MFO, particularmente na Flaskô, tendo como base a necessária ocupação dos espaços da fábrica pela comunidade. Garantimos, assim, o acesso às atividades culturais que jamais tinham tido oportunidade de olhar, discutir, debater, proporcionando à toda comunidade atividades de lazer e educação.

Por fim, porém não menos importante, é certo que as conquistas sociais do MFO são uma experiência de luta para toda a classe operária internacional. É um exemplo de organização produtiva, que prioriza o social em detrimento do capital, e que longe de se idealizar, aponta os limites e contradições, mas que aplica (e explica como consegue) conquistas sociais históricas da classe trabalhadora. Mostra que uma gestão operária consegue aplicar um novo conceito de produção social, e ainda aumentar seu faturamento e a produção, sem aumentar a exploração da força de trabalho. Apresenta, humildemente e cientes de seus limites, uma contraposição prática entre a lógica capitalista e a lógica socialista, e, tendo uma perspectiva de classe, combate o empreendedorismo individual, e reforça a necessidade de pensar o trabalho sob o olhar do conjunto do movimento operário. Esfrega na cara do Estado burguês sua conivência com a sonegação tributária e as fraudes dos empresários, e enfrenta os caminhos ilusórios dos setores cooptados pela economia solidária. Assim, pauta-se pelo legado que a classe trabalhadora, historicamente e internacionalmente, nos apresenta, mantendo viva a luta pela estatização sob controle operário e a luta pela revolução comunista.

MFO diante do Estado Burguês

O MFO sempre defendeu: a) os postos de trabalho e os direitos trabalhistas (especialmente seu principal direito – o direito ao trabalho); b) a necessidade de manter os trabalhadores organizados enquanto parcela da classe operária na necessária luta pela sua emancipação e pelo socialismo, direcionando-se aos sindicatos para que impulsionassem esse debate; c) a estatização sob controle dos trabalhadores, mostrando, na prática, o significado do combate contra a propriedade privada dos meios de produção.

Com isso, o MFO enfrentou: a) a burguesia, como inimiga de classe de forma objetiva e visível, personificada no empresário em cada greve ou ameaça de fechamento de fábrica; b) a burguesia enquanto Estado, expressa nos aparatos de repressão, ou mesmo, o governo da burguesia, considerando o governo de conciliação de classe de Lula/Dilma, que se exemplifica com a institucionalização da economia solidária e do cooperativismo; c) setores do movimento sindical baseados em práticas conciliatórias e que reproduziam os discursos da burguesia.

Assim, diante da coerência com que levou o combate pelas suas posições, e sabendo que estava enfrentando inimigos poderosos, o MFO passa a sofrer as retaliações políticas por tamanha “ousadia”. Vários ataques políticos são realizados contra o MFO, utilizando o poder judiciário ou os grandes meios de comunicação, ou mesmo a pelegada sindical, para conter a força política que o MFO se conformava. Ficou evidente a contradição com que as Procuradorias e os Juízes tratavam o MFO, com medidas favoráveis ao reprimir, mas negativas quando para favorecer o MFO. Denunciamos a prática de “dois pesos e duas medidas”, provocando as contradições da suposta legalidade e neutralidade do poder judiciário. Os grandes meios de comunicação cumprem o papel de intimidação e deslegitimação das lideranças combativas, e os pelegos usam do aparato sindical para defender uma política de conciliação com os empresários, rebaixando o nível do debate necessário para enfrentar o capital. Isso não é novidade, e, como marxistas e coerentes com as bandeiras históricas do controle operário, sabíamos que esses enfrentamentos ocorreriam, e que o desafio do MFO se mantém em apontar as contradições do Estado e do capitalismo, mantendo os trabalhadores organizados enquanto classe.

Dessa forma, como não foi suficiente ataques pontuais, com leilões de máquinas, penhoras de faturamento, omissões quanto aos pleitos apresentados, a burguesia se organizou fortemente e deu um duro golpe contra o MFO. Lula havia dito que tinha medo de precedentes e que a estatização não estava no cardápio. Os Juízes já estavam responsabilizando a gestão dos trabalhadores pelas dívidas deixadas pelos patrões. Mas, o MFO continuou realizando as conquistas sociais que apontamos, e mais, continuava a ir a cada porta de fábrica, a cada greve, a cada anúncio de demissões, apresentando a pauta da estatização sob controle operário. A burguesia não poderia tolerar tamanho enfrentamento, e prepara muito bem uma tentativa de por fim ao MFO.

No dia 31 de maio de 2007, às 05h00, a fábrica Cipla (a maior do MFO, com 1.000 trabalhadores) amanhece invadida com 150 policiais federais para garantir cumprimento de uma ordem judicial da Justiça Federal[7], em que foi nomeado um interventor judicial para as fábricas, afastando-se o controle operário. Os trabalhadores membros do Conselho de Fábrica foram proibidos de entrar, e o tal interventor, Sr. Rainoldo Uessler, já estava dentro da fábrica, apresentando aos trabalhadores as novidades, como: lista prévia de 44 demissões (todos líderes de turno e membros do Conselho de Fábrica, além dos trabalhadores do setor de mobilização), volta da jornada de trabalho para 44 horas semanais, plano de viabilidade econômica em 6 meses, com prováveis cortes de linhas de produção, segurança privada dentro da fábrica, para evitar qualquer agitação e mobilização dos trabalhadores.  

Pela violência com que se realizou o golpe, não houve qualquer possibilidade de reação dos trabalhadores. O processo estava em segredo de justiça[8], havia dezenas de policiais federais, fortemente armados[9], e, claro, conseguiram cumprir com o objetivo intimidatório, além do que, nos dias posteriores havia a presença cotidiana de segurança privada nas fábricas. Os trabalhadores demitidos não foram reintegrados, apesar da sentença brilhante que afastou a justa causa e caracterizou a demissão discriminatória, abusiva e ilegal, como clara perseguição política,[10]. Houve grande mobilização em defesa do MFO[11], combatendo a intervenção judicial, seja por seu aspecto jurídico, seja pelo caráter eminentemente político, haja vista ter sido requerida pelo INSS, um órgão do governo federal[12]

O processo que originou a intervenção tratava justamente de uma execução fiscal do INSS, realizada pela Procuradoria da Fazenda Nacional, pela cobrança do passivo de INSS da Cipla e demais empresas do grupo HB. A decisão negou o pedido de unificação das execuções e redução da penhora de faturamento, e nomeou um interventor judicial para que fosse paga a dívida previdenciária da empresa. A sentença pode ser vista nos autos nº 98.01.06050-6/SC – 1ª Vara Fazenda Pública de Joinville/SC, mas ressaltamos alguns pontos, que, a nosso ver, explica o real motivo desta medida extrema:

 “Quinto, e talvez o mais importante reflexo negativo do custo social da atitude da executada: a acolher-se o argumento de que tudo pode ser feito para a manutenção de mil postos de trabalho, estar-se-á legitimando o desrespeito odioso das leis e jogando por terra o Estado Democrático de Direito. Imagine se a moda pega?”

Portanto, o pressuposto do Juiz é claro e mostra como a decisão expressa o sentido de classe, enquanto burguesia: não é possível admitir que trabalhadores transcendam seu processo de consciência e passem a entender que não precisam de patrões para gerir uma fábrica. Impossível aceitar que empregados se insurjam contra os patrões lutando por um novo modo de relação de trabalho, e por fim, como consequência, é inaceitável que a classe trabalhadora passe a pensar em um novo tipo de gestão da sociedade – sem patrões, sem excluídos, sem desigualdade. Ou seja, a centralidade da medida é evitar que “a moda pegue”, reafirmando que experiências como a do MFO ofenderiam o Estado Democrático de Direito.

A preocupação com os precedentes que viriam a partir da luta do MFO fica clara ao observarmos que meses antes a burguesia, por suas associações empresariais, já tinha manifestado publicamente a necessidade de combater a perspectiva do controle operário. A Fiesp[13] e a Abiplast[14] se manifestaram exigindo providências contra o MFO. Os jornais catarinenses, assim como a revista Veja[15], estampavam a “ótima” solução adotada para resolver a “desordem na Cipla”, apontando as lideranças do MFO como criminosos.

Assim, o MFO sofria o seu mais duro golpe. Na Flaskô conseguiu-se resistir, primeiramente, com a pressão dos trabalhadores e a solidariedade de diversos movimentos sociais, entidades sindicais e organizações políticas. Com isso, barrou-se o interventor. Depois, comprovou-se que a decisão judicial não poderia afetar a Flaskô, No entanto, o interventor enganou ou “convenceu” a CPFL[16], que efetuou corte de energia. O MFO, por meio do conselho de fábrica da Flaskô, conseguiu religar a luz 45 dias depois, após muita pressão. A Flaskô, que estava em seu auge de produção e com 118 trabalhadores, retomava a produção com salários em atraso, maquinário quebrado e com 52 trabalhadores. Ela permanece até hoje sob controle operário, resistindo em nome do MFO, como exemplo vivo do significado da luta organizada dos trabalhadores.

Em Joinville/SC, a situação foi absurda. O interventor realizou mais de 600 demissões na Cipla em 5 anos e diz que a fábrica deve fechar, pois não é viável financeiramente. A Interfibra, que possuía 300 trabalhadores sob a gestão operária, está com 40, em processo de transformação para ser uma cooperativa com 30 trabalhadores. Mas a contradição fica ainda mais patente. O processo da intervenção tinha como objetivo fazer com que fossem pagos os impostos devidos que supostamente os trabalhadores estavam se recusando a pagar. Ocorre que 4 anos depois, o interventor não pagou um real de imposto! Assim, escancaram-se os reais motivos desta elucubração jurídica: afastar o controle operário e evitar que a “moda pegue”. É o que conclui a própria Justiça Federal, em decisão de dezembro de 2010, quando diz que:

“Em maio de 2007, a exeqüente teve seu pedido deferido e, excepcionalmente, foi decretada a intervenção judicial das empresas do Grupo Cipla, nomeando-se o senhor Rainoldo Uessler interventor/administrador judicial. (…) passados mais de três anos desde o início da intervenção judicial, nem sequer há previsão de quando se iniciará o cumprimento da penhora sobre o faturamento, que era a finalidade da intervenção. Não há outra alternativa senão reconhecer que, infelizmente, a medida excepcional adotada não atingiu seus objetivos. Feitas essas breves considerações (…), declaro encerrada a intervenção judicial das empresas Cipla (…), pois a medida excepcional não se mostrou capaz de garantir a penhora sobre o faturamento e, por conseguinte, a finalidade almejada quando de sua decretação. Encerrada a intervenção, consequentemente, encerra-se a necessidade de manter um interventor/administrador judicial no Grupo Cipla. A ser assim, determino a interrupção imediata dos trabalhos desempenhados pelo senhor Rainoldo Uessler, na condição de interventor/administrador judicial das empresas sob intervenção, e o destituo do encargo de interventor/administrador judicial. Encerra-se, também, a remuneração do interventor/administrador judicial. O controle e administração das empresas do Grupo Cipla deve retornar, de imediato, aos trabalhadores, pois eram esses os administradores do grupo econômico quando decretada a intervenção (…)” (grifo nosso).

 

Ou seja, a própria Justiça Federal, pressionada pelas evidências apontadas pelo MFO, admite que adotou uma medida excepcional[17], e que a mesma “não cumpriu com seu objetivo”, determinando, assim, que a fábrica voltasse ao controle operário. No entanto, dias seguintes, o interventor consegue uma liminar da Justiça Estadual não somente cassando a decisão da Justiça Federal, como o nomeando definitivamente como administrador das empresas, por prazo indefinido.

Assim, constatou-se não somente como a intervenção foi uma decisão política, e nesse sentido, “cumpriu seu objetivo” real, que era enfraquecer o MFO. Mas conseguimos resistir e o MFO segue como expressão da luta da Flaskô. Portanto, a sentença que determinou a intervenção judicial é um belíssimo documento político, sob a forma jurídica, de como a luta de classes se expressa. A síntese do ódio da burguesia está dito tanto pelo Lula ao afirmar que acatar as reivindicações do MFO traria “perigosos precedentes” quanto pelo Juiz, qual afirma, categoricamente, “imagina se a moda pega?”.

Por tudo isso, o MFO mostra a sua importância, organizando a classe trabalhadora e denunciando o caráter do Estado e do capital. Após a intervenção, o MFO seguiu resistindo com a continuidade do controle operário na Flaskô. Com muitas dificuldades, obviamente, mas firmes com as bandeiras históricas que tanto incomodam a burguesia. Não é à toa que os ataques continuam. Passamos por pedido de falência, por ataques do governo, por decisões judiciais que ameaçam, concretamente, a continuidade da atividade industrial, mas, até hoje, conseguimos seguir adiante. Não é à toa que a burguesia continua não atendendo nossas reivindicações, e, ao contrário, busca reprimir cada vez mais, seja com penhoras de conta de trabalhadores, responsabilização por todas as dívidas patronais, processos criminais, utilizando os meios de comunicação, fazendo reportagens combatendo a resistência da Flaskô, condenando as principais lideranças do MFO. Sabemos que tais medidas fazem parte de um conjunto de ataques da burguesia que se expressam como a criminalização das lutas sociais. É a criminalização dos movimentos de moradia, dos lutadores no campo, da juventude, e do próprio movimento sindical, com judicialização das greves e interditos proibitórios que rasgam anos de luta da classe trabalhadora pelo direito de greve e pelo direito de lutar.

Dessa forma, não temos dúvida: o ataque da intervenção foi um golpe de classe contra o MFO, pela sua coerência de luta. Mas, como resistimos, e seguimos na fábrica ocupada Flaskô, com uma série de avanços nos últimos anos, não temos dúvida de que a burguesia não aceitará a continuidade do controle operário na Flaskô. Aprofundando-se a crise do capitalismo no Brasil, a burguesia não permitirá que o “mal exemplo esteja de pé”. Ela pode fazer isso com um só golpe forte, como foi em Joinville, em 2007, como pode fazer (como parece ter feito com a Flaskô até hoje) “com um gole fatiado”, pressionando diariamente aparentemente de forma sutil. No entanto, alertamos a burguesia, incluindo os setores do governo, que continuam a recusar nossas reivindicações, que não sucumbiremos. Sabemos que não há socialismo num só país, muito menos haverá uma única fábrica ocupada, sob a perspectiva socialista. Por isso, resistiremos com nossas bandeiras históricas que a burguesia tanto teme. Continuaremos batalhando para que a moda pegue!

MFO e a perspectiva internacionalista

Como dissemos, o MFO defende a expropriação dos meios de produção, com a reivindicação da estatização sob controle dos trabalhadores, como legado histórico do marxismo e das experiências mais avançadas de luta do movimento operário. Temos como referência a perspectiva teórica e prática que vai passar pela Comuna de Paris, pela Revolução Russa e por diferentes caminhos de controle operário no leste europeu. Da mesma forma, possuímos referências na própria América Latina e em períodos recentes, onde podemos destacar a luta pelo controle operário na Bolívia, no Uruguai, no Paraguai, na Venezuela, na Argentina, que lutam até hoje pelo controle operário.

Vale também ressaltar que diante das situações de crise do capitalismo, nos últimos anos, nos EUA, nos países árabes e na Europa, houve casos de fábricas ocupadas e a pauta do controle operário se fortaleceu no último período. Casos de ocupações de fábricas na Inglaterra, Espanha e França foram capas de jornais da própria burguesia, enquanto nos EUA a ocupação de uma fábrica de vidros teve espaço inclusive no filme do Michael Moore, “Capitalismo, uma história de amor”. No Egito, foi fundamental para o desenvolvimento da “primavera árabe”, as ocupações de fábricas e o controle operário momentâneo do porto do Canal de Suez. Ou seja, estamos discutindo algo que está ocorrendo, desafios que estão postos diante do conflito entre capital e trabalho, e que a perspectiva da expropriação dos meios de produção provoca na organização da classe trabalhadora para a construção do socialismo. Nesse sentido, o acúmulo de conhecimento e experiências dos trabalhadores de fábricas ocupadas é necessário para fortalecer a luta em cada fábrica, em cada país, mas, fundamentalmente, para construir a solidariedade e unidade internacional, enfrentando o capital.

Na Bolívia, temos uma situação emblemática, e dramática, inclusive nesse presente momento, com uma intensa disputa de rumos. O caso dos mineiros da Bolívia, que possuem um legado histórico revolucionário, principalmente por sua força junto com a COB (Central Obrera da Bolívia), é bastante conhecida. Há um forte embate entre os cooperativistas e os camaradas da Frente Sindical dos Trabalhadores Mineiros da Bolívia (FSTMB) para definir o futuro das minas – se a propriedade será privada, na forma da cooperativa, ou se será estatizada/nacionalizada, mantendo-se o controle operário.

No Uruguai a PIT-CNT, central sindical de grande importância para todo movimento sindical latino-americano, sempre pautou a perspectiva da gestão dos trabalhadores, impulsionando resistências contra empresas transnacionais e contra as ameaças de demissões. Grandes conquistas foram garantidas nesses embates, como, por exemplo, constar na lei de greve, a possibilidade taxativa de greve de ocupação, atacando a posse empresarial. No Paraguai, um país basicamente agrário, há importantes resistências pela gestão de trabalhadores, como nos casos das Cooperativas Itauguá e Cerro Guy, ou a metalúrgica Acepar, situações onde as fábricas foram ocupadas e cumprem o papel de manter os operários unidos sob uma perspectiva classista.

Na Venezuela, diante do processo revolucionário impulsionado pelas massas, a perspectiva de controle operário teve enorme força nos últimos anos. Constitui-se a FRETECO (Frente de Trabalhadores de Empresas Ocupadas e em Co-gestão), e depois a luta pela nacionalização sob controle operário segue com a Frente Bicentenária de Fábricas Ocupadas. Chávez estatizou mais de mil fábricas nos últimos cinco anos, e o movimento sindical mais combativo pressiona os setores burocráticos do governo, dizendo que não basta nacionalizar, mas tem que colocar as fábricas sob controle operário. Essa luta teve grandes repercussões com a Inveval, Vivex, Gotcha, Sanitários Maracay entre outras, e segue como forma de organizar os trabalhadores, intervindo no PSUV (Partido Socialista Unificada da Venezuela), mostrando como a pauta da expropriação dos meios de produção, com a estatização sob controle operário, é o caminho para construção do socialismo. A importância estratégica do processo venezuelano para toda a América Latina somente reforça a necessidade de acompanharmos, e sempre nos solidarizarmos, com a luta dos companheiros que lá impulsionam essa perspectiva de luta.

Por fim, quando falamos de fábricas ocupadas, não podemos deixar de mencionar a Argentina, que, diante da crise vivida nos anos 2000, terá uma explosão de fábricas e outros locais de trabalho ocupados por trabalhadores, retomando-se a produção sem os patrões. É de conhecimento público as experiências da Brukman, da Zanon, da IMPA, da UST, do hotel Bauen, entre tantos outros casos, onde a luta pela estatização sob controle operário se colocou nas ruas, sendo importantes pontos de apoio do conjunto da classe trabalhadora argentina. O caso argentino é um referencial quando tratamos de fábricas ocupadas justamente pelo seu protagonismo, sua força popular, sua capilaridade junto à população, com as fábricas abertas à comunidade, articulando atividades culturais, educacionais e esportivas, que mostram o significado de uma fábrica sem patrão.

Acompanhando a realidade de cada país, o que o MFO conseguiu foi impulsionar a unidade entre essas diferentes experiências. A solidariedade de classe continua presente em cada campanha, com envio de moções e saudações de apoio, com atividades construídas em conjunto, atuando internacionalmente, fortalecendo a perspectiva de luta da estatização sob controle dos trabalhadores. Concretamente, o MFO impulsionou a realização de quatro encontros internacionais, que estiveram sempre delegações representativas dos movimentos de fábricas ocupadas diferentes países mencionados acima.

O primeiro foi na Venezuela, em 2005, e contou com mais de 50 fábricas ocupadas de diferentes países. Nesse “I Encontro de Fábricas Recuperadas” o Presidente Chávez esteve presente, reforçando a tendência de expropriação das empresas, conhecendo a perspectiva do controle operário. Depois, em dezembro de 2006, houve o Encontro Pan-Americano, na Cipla, em Joinville/SC, que contou com a presença de mais de 600 delegados, de 16 países, reunindo novamente as diferentes experiências de controle operário na América Latina. Reforçou-se a unidade de classe entre os trabalhadores, consolidando um movimento internacional de fábricas ocupadas.

O terceiro encontro ocorreu na Assembleia Legislativa de São Paulo, no dia 31 de maio de 2008, quando completava um ano da criminosa intervenção federal no MFO e havia grande pressão da burguesia contra o processo revolucionário da Venezuela. Realizamos, assim, um ato em defesa da Revolução Venezuelana, impulsionado pela campanha “Tirem as Mãos da Venezuela”, que aglutinou o conjunto de movimentos de fábricas ocupadas da América Latina. O quarto encontro ocorreu novamente na Venezuela, em 2009, contando com a presença do Ministro da Indústria da Venezuela, Eduardo Samán, que na abertura do encontro anunciava mais 30 expropriações que se realizam naquele momento. É importante ressaltar que nesse “II Encontro de Fábricas Recuperadas” contando com a presença de delegações internacionais, para além da própria América Latina, que, trocando experiências com os casos concretos de fábricas ocupadas, ao voltarem aos seus países, impulsionaram o combate pelo controle operário, nos EUA, na Europa, no Iraque, no Irã, no Paquistão, enfim, apontando uma pauta de fortalecimento do movimento sindical, e que direciona, de forma concreta, para construção do socialismo.

Isso é fruto da clara concepção do MFO quanto à necessidade de solidariedade de classe internacional, seja porque o capital (e a burguesia) atua, necessariamente, em nível internacional, seja, por isso, a luta pelo socialismo também é, eminentemente, internacional. A cada passo dado numa fábrica ocupada, ou a cada ataque sofrido, sempre soubemos que podíamos contar com os camaradas de cada um das fábricas ocupadas em todo o mundo. Revertemos decisões de fechamento de fábricas, enfrentamos e resistimos contra os ataques da burguesia fundamentalmente porque sempre tivemos a solidariedade da classe trabalhadora, que ultrapassa as fronteiras dos Estados nacionais.

MFO como frente única, através da resistência da Flaskô: aliança com movimentos de moradia e pela reforma agrária

O MFO sofreu com o golpe da intervenção. Durante um ano conseguimos nos manter organizados denunciando a intervenção, buscando a retomada do controle operário, todavia, a decisão do MFO foi de fortalecer a resistência na Flaskô, entendendo que sua defesa permanece até hoje com a trincheira de luta pela estatização sob controle operário. Com isso, num primeiro momento, tivemos dificuldades de avançar para novas ocupações de fábricas, seja pelas nossas forças, seja pelas questões conjunturais, onde a questão de ocupar fábricas diminui diante das condições objetivas da economia brasileira, que se aproveitou da situação internacional para manter um cenário mais estável. No entanto, durante o segundo semestre de 2008 e ao longo do ano de 2009, diante da crise mundial do capitalismo, diferente do que Lula dizia sobre a “marolinha”, houve uma série de demissões e fechamento de fábricas. Nesse processo, intervimos em vários casos, apresentando a perspectiva do controle operário.

Entretanto, o que queremos ressaltar nesse momento é que o MFO, com a Flaskô, por algumas questões particulares, acabou consolidando a referência de luta para além das relações de trabalho e do movimento sindical em si, sendo um ponto de apoio da esquerda de forma geral, realizando ações de “frente única” com movimentos urbanos de luta pela moradia e do movimento dos trabalhadores rurais sem-terra. Primeiramente pela particularidade da Vila Operária Popular. Em segundo lugar, pelo projeto Fábrica de Cultura e Esporte e sua relação com a comunidade. Isso deu novo ritmo às ações políticas do MFO, mantendo a perspectiva da estatização sob controle operário, buscando diferentes formas para fortalecer a resistência e denunciar as contradições do Estado Capitalista.

Em relação à Vila Operária e Popular, cabe lembrar que, após a ocupação da fábrica pelos trabalhadores, o MFO se articular com lideranças populares dos bairros da região, e organiza, com 200 famílias, uma ocupação do terreno da própria propriedade onde está a Flaskô, que se encontrava abandonado há mais de dez anos, servindo, dentre outras coisas, como “depósito de cadáveres” e estando a mercê do crime organizado. Assim, diante do déficit habitacional, as famílias não tiveram alternativa a não ser ocupar o terreno com o fim de garantir seu direito à moradia, direito esse fundamental na ordem constitucional brasileiraojeHoj. . Hoje se constituiu um bairro onde vivem 564 famílias, e que, junto com a Flaskô, lutam pela regularização da área e por todas as questões estruturais, como água, esgoto, iluminação pública, etc. Com a unidade da luta, realizando dezenas de atos públicos, conquistamos a aprovação da lei 5023/2010, que garantiu água para qualquer ocupação irregular na cidade. Nos últimos anos, essa unidade de luta se fortaleceu com a campanha de declaração de interesse social de toda a área, para fins de desapropriação.

A Flaskô também organizou o Projeto da Fábrica de Cultura e Esporte, com dezenas de atividades esportivas (como futebol, vôlei, xadrez, ballet, tênis de mesa, etc) e culturais (apresentações de teatro, de músicas, oficinas, cinema, etc.), que envolvem, regularmente, cerca de 400 pessoas, dentre elas muitas crianças. Além disso, temos o Festival Cultural, que em agosto de 2012 realizou seu terceiro encontro, com dezenas de atividades culturais. Junto com o projeto cultural, desenvolvemos um jornal junto com a comunidade e os movimentos sociais – Jornal Atenção, assim como impulsionamos um Centro de Memórias (CEMOP), que realiza seminários, exposições, parcerias com centro de estudos e universidades, organiza biblioteca, videoteca, além de uma série de publicações, buscando a formação da militância e dos trabalhadores.

Ou seja, após a intervenção nas fábricas ocupadas de Joinville, a Flaskô aprofundou sua relação com a comunidade, e com os movimentos sociais da região, que apresentavam suas demandas. A Flaskô as absorveu sob um corte classista e fundado no marxismo, consolidando-se como um espaço para o fortalecimento dessas lutas sociais, seja os movimentos culturais, os movimentos pela democratização dos meios de comunicação, com as rádios comunitárias, seja com os movimentos de moradia e da luta dos sem-terra. Na região de Sumaré, onde fica a Flaskô, houve processo de ocupações de terra em Limeira e Americana, assim como ocupações de moradia, em Sumaré, Campinas e Hortolândia, organizadas pelo MTST e MTD, sendo que a Flaskô cumpriu um importante papel na organização ou no apoio dessas ações políticas. Uma série de seminários e debates, encontros e confraternizações se conformaram na Flaskô, virando uma referência de luta ainda mais ampla. Em dezembro de 2012, Flaskô, MTST, Sem-terras da região de Campinas, e a Ocupação do Pinheirinho, sem São José dos Campos (antes da criminosa reintegração de posse), realizam um ato na Avenida Paulista, na sede do escritório da Presidência da República, reivindicando desapropriações por terra, trabalho e moradia.

Tal perspectiva de luta se consolidou com a campanha pela declaração de interesse social da Fábrica Ocupada Flaskô, para fins de desapropriação. Trata-se de uma forma de combater pela estatização sob controle operário, aglutinando essas novas formas de luta, diante da particularidade da Flaskô, que comprova a função social da área, seja pelas relações de trabalho, seja pelo direito à moradia (com a Vila Operária), seja pelo acesso á cultura, lazer e educação. Essa campanha se deu em diferentes caminhos táticos, articulando nível municipal e nacional, e poder executivo e poder legislativo.

A pressão com a Prefeitura resultou até agora, somente a transformação da área em Zona Especial de Interesse Social (ZEIS) – lei nº 01/2012. É um avanço, mas ainda insuficiente para garantir a regularização da área, como debatemos e explicamos, seja no dia 10 de fevereiro de 2010, quando entregamos esse projeto de lei à Prefeitura, seja na Audiência Pública realizada na Câmara de Vereadores de Sumaré.

Em Brasília, apresentamos o projeto diretamente à Presidenta Dilma, representada pela Secretaria da Presidência, assim como realizamos uma Audiência Pública na Comissão de Direitos Humanos no Senado, presidida pelo Senador Paulo Paim, no dia 05 de julho de 2011. Nessa audiência apresentamos dois projetos de lei. O primeiro é para que a área da Flaskô seja declarada de interesse social, para fins de desapropriação. Tal projeto foi aprovado por unanimidade na referida comissão, e tornou-se oficialmente um projeto de lei (PLS nº 257/2012)[18], após parecer do Senado Eduardo Suplicy, e está, atualmente, na Comissão de Constituição e Justiça. O segundo projeto é para que qualquer fábrica que for ocupada por trabalhadores possa ser desapropriada. Esse projeto ainda está na Comissão de Direitos Humanos, mas já consta com parecer favorável.

Entendemos que tais caminhos são importantes instrumentos de frente única, que aglutinam setores esparsos da classe trabalhadora. O primeiro projeto serviu de apoio para os próprios moradores da ocupação do Pinheirinho, assim como hoje é a forma como se expressa a resistência do assentamento Milton Santos, em Americana. O objetivo segue fortalecer a organização da classe trabalhadora, denunciando o caráter do Estado Capitalista. Por isso, esses projetos de lei são um marco para que a Flaskô, que a burguesia tanto teme, possa servir de exemplo para que outras fábricas possam ser ocupadas, retomem a produção sob controle operário, mantenham a perspectiva de classe, não caindo na ideologia do empreendedorismo cooperativista, e façam da fábrica e seu espaço, um efetivo espaço coletivo. Os referidos projetos de lei reforçam a perspectiva da construção do socialismo, e, por isso, combateremos para sua aprovação, realizando debates e expondo as contradições do Estado. No entanto, sabemos que, sem um ascenso das massas, eles dificilmente serão aprovados. Não temos ilusões no parlamento burguês. O que desejamos com essa campanha, mais do que tudo, é usar esses instrumentos como forma de luta, aglutinando apoios para a compreensão da necessidade da luta pela expropriação dos meios de produção e o controle operário.

Conclusão

Diante de tudo que buscamos apresentar, entendemos que nesses 10 anos do MFO, reafirmamos os postulados históricos da classe trabalhadora, que foram os alicerces da ocupação da Cipla e Interfibra, em outubro de 2002, e permanecem vigentes até hoje, por meio da resistência da Flaskô. A base teórica do combate à propriedade privada dos meios de produção, pela defesa intransigente dos postos de trabalho e dos direitos trabalhistas historicamente conquistas nas ruas e nas lutas pelo movimento operário, o controle operário e a construção do socialismo, se expressam em ações básicas: o que fazer diante de uma ameaça de fechamento de fábrica? O que fazer diante de ataques dos empresários aos direitos trabalhistas? Respondemos: “ocupar, produzir, resistir”. Ou seja, ocupar a fábrica, retomar a produção sob controle operário, e resistir, contando com a solidariedade da classe. Respondemos: “Fábrica Quebrada é Fábrica Ocupada; e Fábrica Ocupada é Fábrica que deve ser Estatizada e colocada sob controle dos trabalhadores”.

O MFO conseguiu, com muitas dificuldades e sem idealizar, implementar conquistas sociais historicamente reivindicadas pelo movimento operário. Redução da jornada para 30 horas semanais, sem redução de salários. Efetivar um verdadeiro controle democrático dos trabalhadores, determinando o caráter social da produção. Garantir que a propriedade seja um espaço da classe trabalhadora e da comunidade, dando o fim social para todos os galpões e áreas que os patrões usam para especulação imobiliária e fins privados. Articulamos a solidariedade internacional das fábricas ocupadas, cumprindo o papel de identificação para além das esferas nacionais. Combatemos as práticas conciliatórias dos governos burgueses, mesmo os de base operária, como foi o governo Lula em Brasília, explicando que ele havia sido eleito para atender os trabalhadores e que deveria estatizar as fábricas ocupadas, colocando-as sob gestão operária. Denunciamos que, ao contrário, Lula não somente não acatou nossas reivindicações, como “sujou de sangue seu governo” com a intervenção federal na Cipla e Interfibra. Aprofundamos a identidade entre os movimentos sociais, contribuindo para a construção de ações de frente única contra a burguesia. Denunciamos a criminalização dos movimentos sociais e o papel do poder judiciário da dinâmica da luta de classes. Apresentamos dois projetos de lei que podem cumprir o papel de serem importantes referências para a luta pela expropriação dos meios de produção, articulando o movimento sindical com o movimento social, discutindo, inclusive, com os setores do cooperativismo, mostrando que há outros caminhos e possibilidades de fábricas geridas por trabalhadores.

Por tudo isso, a burguesia tem medo do MFO. O golpe ao MFO foi muito duro e sofrido. Os trabalhadores sofreram com demissões e perseguições. O terrorismo foi implementado pelo interventor, esmagando possibilidades de resistência nas fábricas de Joinville. As lideranças estão sendo criminalizadas, condenadas por lutarem em defesa da classe trabalhadora. Os capitalistas não permitirão “que a moda pegue” e que “esses perigosos precedentes” avancem.

No entanto, seguiremos lutando, com a coerência que sempre nos guiou, atuando no movimento da classe, entendendo que a luta de classes é o motor da história. O MFO tem cumprido seu papel, e sabe que não há socialismo num só país, muito menos haverá somente uma fábrica ocupada. Por isso, estaremos sempre batalhando para que a moda pegue, impulsionando a organização dos trabalhadores, buscando fortalecer o movimento sindical e as ações dos demais movimentos urbanos e rurais, atuando junto com a juventude, denunciando esse modo de produção centrado na exploração da força de trabalho e na propriedade privada dos meios de produção.

Se não for assim, sabemos que são grandes as pressões do reformismo, da cooptação e da degeneração, e podemos, sim, ser derrotados na Flaskô. Não conseguimos e nem queremos reproduzir a lógica da concorrência capitalista, e sabemos que somos o elo mais frágil da cadeia produtiva. Sabemos que somos uma fábrica “quebrada”, em última instância, com maquinário sucateado e dificuldades cotidianas. Não podemos idealizar ao ponto de reproduzir ilusões. Somente sobreviveremos enquanto força política da classe trabalhadora, sendo fiéis aos princípios que norteiam até hoje o MFO e a resistência da Flaskô. Mas, a luta é de classes, e nossos inimigos são fortes. Como dissemos, os ataques podem vir fortes e concentrados, mas a tática de “fazer sangrar” também tem sido muito bem utilizada pela burguesia contra nós, particularmente pelo governo federal, que segue recusando atender nossas reivindicações.

Portanto, do mesmo jeito que em 2002, com o ascenso das massas populares e das classes trabalhadores, entendemos que a crise do capitalismo provocará ataques da burguesia contra os operários e a população mais pobre. Já estamos vendo isso com as medidas de austeridade fiscal, desoneração de folha de pagamento, criminalização das lutas sociais, precarização de direitos trabalhistas, ataques à aposentadoria, etc. Essa tensão deverá se agudizar no próximo período e a Flaskô, com o legado do MFO, atuará nessa dinâmica explorando as contradições do capitalismo para ser um ponto de apoio na construção do socialismo.   

Nesse sentido, para concluir, entendo que a carta final do II Encontro de Fábricas Recuperadas, realizado em julho de 2009, sintetiza os desafios que nos está colocado na atualidade:

“Este II Encontro Latino-Americano de Fábricas Recuperadas também reforça que as fábricas recuperadas não podem existir isoladas em meio a uma economia capitalista. Ou a luta pela tomada e ocupação de fábricas se estende para todo o país e para o continente e ao restante da classe trabalhadora, ou estará condenada a sucumbir fruto da pressão da concorrência ou da sabotagem estatal e capitalista.

Por isso a palavra de ordem “fábrica fechada, fábrica ocupada” deve disseminar-se e ser levada à prática para que possamos sobreviver com o propósito final de que todo o aparato produtivo esteja sob controle da classe trabalhadora aliada com os pobres do país.

Este II Encontro Latino-Americano de Fábricas Recuperadas por Trabalhadores faz um apelo a todos os movimentos progressistas do mundo a apoiar nossa luta por um futuro decente para as famílias trabalhadoras e para a juventude de nosso continente. Somente os trabalhadores estão interessados em desenvolver a indústria nacional frente ao parasitismo dos empresários e à política das multinacionais.

Este II Encontro Latino Americano de Fábricas Recuperadas faz um chamado a todos os trabalhadores do continente e do mundo a seguir nosso caminho e unir-se a esta luta. A crise capitalista em um contexto de desemprego e falta de trabalho colocará às claras os limites da greve como método de luta. A própria experiência dos trabalhadores lhes fará ver que devem pressionar ainda mais os patrões. A situação que eles criam nos obriga a ir à greve, mas estas lutas só podem ser vitoriosas se lhes arrebatamos o controle da empresa. Esta crise conduzirá a esta conclusão primeiro milhares e logo depois milhões.
 

Companheiros, o futuro pertence à classe trabalhadora. Estamos no início de nosso movimento, agora somos milhares, amanhã seremos milhões. Adiante na luta, viva os trabalhadores das fábricas recuperadas!”

Referências bibliográficas

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BUZZI, D. Relatório do BNDES, BRDE e BADESC sobre a recuperação da Cipla/Interfibra. Florianópolis, 2005

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NAVES, Márcio Bilharinho. Democracia e dominação de classe burguesa. Artigo retirado da internet em 23 de junho de 2012, in: www.unicamp.br/cemarx/criticamarxista/4_Naves.pdf

RASLAN, Filipe Oliveira. Resistindo com classe: o caso da ocupação da Flaskô. Dissertação de Mestrado em Sociologia, apresentada ao Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas, 2007.

SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. Yes, Nós Temos Sociedade e Direito. Texto divulgado pela internet, em 24 de março de 2009

TROTSKT, Leon. El control obrero. Retirado em 12 de setembro de 2008, do link: www.marxist.org

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VERAGO, Josiane Lombardi. Fábricas Ocupadas e o Controle Operário: Brasil e Argentina (2002-2010). Os casos da Cipla, Interfibra e Flaskô e Zanon/Fasinpat. Sumaré: Edições, CEMOP, 2011.

Sites consultados:

www.estatizaraflasko.org.br

www.fabricasocupadas.org.br

www.tiremasmaosdacipla.blogspot.com

www.marxismo.org.br/fabricas

www.memoriaoperaria.org.br

 

 


[1] Se não bastassem as referências bibliográficas que afirmam isso, em Audiência Pública realizada em 05 de julho de 2011, na Comissão de Direitos Humanos do Senado, Paul Singer, principal referência do cooperativismo no Brasil, presidente da Secretaria Nacional de Economia Solidária dos governos Lula e Dilma, ao encerrar sua intervenção, diz que a “nossa (dos defensores da economia solidária) referência teórica é Saint Simon e Fourier, que foram os primeiros socialistas da História”. Em seguida, nós reafirmamos que nossa base teoria era do socialismo científico, com os ensinamentos de Marx, Engels, Trotsky, Lênin, Rosa Luxemburgo, diferente, portanto, do socialismo utópico, superado historicamente. 

[2]ALVES, Giovanni. O novo (e precário) mundo do trabalho. Reestruturação produtiva e crise do sindicalismo. São Paulo: Boitempo, 2000; POCHMANN, Márcio. O emprego na globalização: a nova divisão internacional do trabalho e os caminhos que o Brasil escolheu. São Paulo: Boitempo, 2001; TUMOLO, Paulo Sergio. Da contestação à conformação. A formação sindical da CUT e a reestruturação capitalista. Campinas: Editora da Unicamp, 2002; ANTUNES, Ricardo – Os Sentidos do Trabalho: Ensaios sobre a afirmação e a negação do trabalho. São Paulo: Boitempo, 2007; CARDOSO, Adalberto Moreira. A Década Neoliberal e a Crise dos Sindicatos no Brasil, Boitempo, 2003.

[3] LÊNIN. Sobre os sindicatos, São Paulo, Ciências Humanas, 1979, p. 273.

[4] GOULART, Serge. Apresentação de NASCIMENTO, Janaína Quitério do. Fábrica quebrada é fábrica ocupada, fábrica ocupada é fábrica estatizada: a luta dos trabalhadores da Cipla e Interfibra para salvar 1000 empregos. (Livro-reportagem) 2004.

[5] Trotsky, Léon. Programa de transição. São Paulo: Sundermann, 2005

[6] WELLEN, H. A. R. Para a crítica da “economia solidária”. Expressão Popular: São Paulo, 2012

[7] A sentença pode ser vista nos autos nº 98.01.06050-6/SC – 1ª Vara Fazenda Pública de Joinville/SC

[8] A alegação para tanto é que se assim não fosse, não seria possível cumprir a ordem judicial, haja vista existir um “histórico de resistência dos trabalhadores contra leilões e penhoras de máquinas”.

[9] Nos autos do processo pode-se verificar o pedido do Juiz quanto à necessidade de “operação de guerra” para o cumprimento da decisão judicial.

[11] Pode ser visto pelo site criado especificamente para tanto, pelas moções e um próprio documentário, chamado “Intervenção” e Tribunal Popular para Julgar a Intervenção, realizado em julho de 2008.

[12] O caráter político da decisão ficou explícito, quando meses depois o MFO descobriu que antes da Intervenção, o Sr. Rainoldo tinha tido uma reunião com o Ministro da Previdência Social à época, o Sr. Luiz Marinho e com a presidência do INSS. Infelizmente, ao invés do governo Lula atender os trabalhadores como prometido, o resultado foi este duro golpe.

[13] Paulo Skaf, presidente da FIESP, disse em entrevista em ao Estado de São Paulo, em abril de 2007: “A ajuda de Chávez, que apóia esse tipo de ocupação na Venezuela e em outros países da América Latina, desagrada a setores tradicionais da indústria. Para a FIESP, esse tipo de cooperação caracteriza ingerência em assuntos internos brasileiros. A Fiesp respeita a soberania nacional e não reconhece nenhum tipo de ingerência política de outro país nas questões internas brasileiras”. O MFO possui relações de solidariedade com as ocupações de fábricas em toda América Latina. Na Venezuela, além da relação com as fábricas sob controle operário, o MFO tinha um acordo comercial e solidário com a empresa estatal Pequiven. Mas, para os empresários, que realizam cotidianamente acordos comerciais, inclusive na Venezuela, fábricas sob controle operário não podem fazer isso.

[14] Em boletim público da Associação das Indústrias do Ramo Plástico, em abril de 2007, temos: “No Brasil, segundo noticiaram recentemente os jornais, o governo venezuelano apóia ocupações de indústrias de plásticos que foram assumidas por operários. Já são três (Cipla, Interfibra e Flaskô) as empresas que recebem apoio na forma de compra subsidiada de matéria-prima vinda da Venezuela. É absolutamente inaceitável esse tipo de intromissão de um governo estrangeiro em qualquer empresa brasileira. Cabe aos empresários e também ao governo brasileiro denunciarem, com todas as forças e em todas as instâncias, o quanto absurda e descabida é a interferência de um governo estrangeiro em negócios de empresários brasileiros. Em razão dessas atitudes, é imprescindível que os empresários e a sociedade civil de forma geral, organizem um manifesto de repúdio contundente a esse tipo de prática antes que isso se torne cotidiano e prejudique a democracia. Precisamos resgatar a indignação diante da interferência em nossos interesses, com o risco de sermos coniventes e passivos em demasia com esse nível de intromissão“.

[15] Reportagem Revista Veja: http://www.vejanasaladeaula.com.br/290807/p_086.shtml (29 de agosto de 2007 – ed. 2023). “O MST das Fábricas. Radicais do PT criam o MST das fábricas e usam o dinheiro das empresas ocupadas em proveito próprio. Invasões de terras, de repartições públicas, de universidades – num país que garante impunidade à violência política, é natural o surgimento de um grupo de lunáticos ansiosos por pavimentar o caminho da revolução com a tomada de fábricas. Desde 2002, militantes da Esquerda Marxista, facção radical do PT, tomaram posse de cinco indústrias em São Paulo e Santa Catarina e formaram o Movimento das Fábricas Ocupadas. Na empresa em que a ocupação foi mais prolongada, a Cipla, tradicional fabricante de produtos plásticos em Joinville, isso significou quatro anos e sete meses de irregularidades administrativas, desvio de fundos e violência política.(…)”. Tal reportagem foi feita como forma de respaldar a nomeação do interventor judicial. Em seguida, o MFO respondeu à agressão sofrida diante de tantas mentiras: http://tiremasmaosdacipla.blogspot.com/search?updated-min=2007-01-01T00%3A00%3A00-03%3A00&updated-max=2008-01-01T00%3A00%3A00-03%3A00&max-results=50

[16] Rainoldo enviou a decisão judicial que determinava a intervenção nas fábricas de SC juntamente com uma carta dizendo que suspenderia a produção, e, por isso, poderiam efetuar o corte de energia. Assim foi feito. As máquinas estavam funcionando, e por pouco não houve acidentes com os trabalhadores.

[17] Nós sempre questionamos que tal medida não tem previsão legal, é inconstitucional. As medidas judiciais foram feitas, mas sempre negadas. Denunciamos à agressão à luta social e às organizações políticas dos trabalhadores em https://www.marxismo.org.br/index.php?pg=artigos_detalhar&artigo=652

[18] O CEMOP publicará uma cartilha específica sobre a campanha. Veja também todos os documentos e pareceres no site www.estatizaraflasko.org.br .