No dia 2 de outubro, centenas de manifestações ocorreram pelo país com o lema “Fora Bolsonaro”. Houve protestos em todas as capitais e principais cidades do país e os organizadores estavam animados com a adesão de vários partidos na convocação das atividades e prometeram realizar o maior ato da campanha nacional em São Paulo: “Dez carros de som vão tomar a avenida Paulista a partir das 13h; diversas lideranças de movimentos sociais e indígenas, entidades sindicais, artistas e esportistas, além de políticos de 21 partidos estarão presentes” – anunciava o comunicado oficial.
De fato, estabeleceu-se uma frente ampla na convocação que ia dos partidos de esquerda até PDT, PSB, PV, Rede, Cidadania e Solidariedade. No ato de São Paulo participaram (com vídeo ou presencialmente) lideranças do PSL, DEM, MDB e PSD. Porém, a junção de tantas legendas não significou um aumento no número de manifestantes nas ruas e, apesar de reunir milhares de pessoas, acabou sendo menor do que os protestos realizados, por exemplo, em junho e julho e que não contavam com a adesão de todas essas agremiações.
E por que as manifestações foram menores, sendo que as pesquisas de opinião indicam um aprofundamento da rejeição do povo ao governo Bolsonaro?
Impeachment e eleições 2022
A resposta a essa pergunta pode ser encontrada na política defendida pelas organizações tradicionais da classe trabalhadora e por boa parte da chamada oposição ao governo Bolsonaro. O PT, o PCdoB e a direção do PSOL, após serem contra o “Fora Bolsonaro”, estão há meses atuando para descaracterizar o sentido original desta palavra de ordem.
O “Fora Bolsonaro” lançado pela Esquerda Marxista e entoado em manifestações e panelaços expressava a vontade das massas trabalhadoras de lutar para derrubar o governo já e, portanto, através de sua mobilização independente, abrir o caminho para revolucionar toda a sociedade. No entanto, a ação das direções dos aparatos foi para desvirtuar este sentido.
Quando viram que estavam prestes a perder o controle do movimento, manobraram para assumir a dianteira das mobilizações contra o governo, adotaram para si a palavra de ordem “Fora Bolsonaro”, mas buscaram traduzi-la como sinônimo de pressão sobre os deputados para abertura de um processo de impeachment num primeiro momento e agora nem escondem mais que o importante mesmo para eles é a candidatura de Lula à presidência da República nas próximas eleições. Portanto, o “Fora Bolsonaro” se transformou em “Fica Bolsonaro até 2022”! Assim, ao invés de acelerar o movimento na via original da palavra de ordem, atuaram para freá-lo e desviá-lo segundo seus próprios interesses burocráticos e eleitorais.
Já a chamada oposição burguesa a Bolsonaro, que reúne a grande imprensa e vários partidos burgueses e pequeno-burgueses, ao ver que o movimento estava perdendo seu conteúdo explosivo, sentiu-se segura a aderir a esse chamado de 2 de outubro. Na verdade, se sentiu segura em usar o palanque porque não mobilizaram ninguém, até porque sabemos que a maioria desses partidos não possui militância, possui recursos financeiros com os quais pagam suas campanhas.
O movimento de jovens e trabalhadores contra o governo Bolsonaro não deve confiar na burguesia ou se colocar a reboque dela. Setores da classe dominante podem ter abandonado o barco de Bolsonaro, mas estão unidos na política econômica de privatizações e ataques a direitos de nossa classe. A solução real dos problemas que afligem a maioria do povo só pode se dar com independência de classe.
Paciência revolucionária
Apesar da fome, do desemprego e da inflação fazerem cair por terra o discurso demagógico antissistema de Bolsonaro e apesar dos escândalos de corrupção na família do presidente e na cúpula governamental virem à tona, dia após dia, e minarem sua base social cada vez mais restrita, todo esse acúmulo de insatisfação tende a ser desviado pelas direções de esquerda –
em conjunto com desacreditados partidos de direita – para o terreno das instituições da democracia burguesa, em particular para as eleições de 2022.
Já o impeachment aparece como algo cada vez mais remoto. O acordo entre Bolsonaro e boa parte do chamado “Centrão”, incluindo aí o presidente da Câmara, Arthur Lira (que precisa aceitar o processo), são bloqueios concretos para esta via. Os partidos burgueses que se opõem ao governo também não desejam de verdade o impeachment diante dos perigos de ampliação da instabilidade social. As direções majoritárias dos partidos de esquerda, como já dissemos, miram na eleição de Lula em 2022.
Diante do bloqueio das direções, as massas passam a perceber como um tanto quanto infrutífero o esforço para derrubar Bolsonaro agora. Não que não possa haver uma revolta social ou uma explosão de lutas no próximo período, mas as massas buscam, via de regra, o caminho mais econômico para satisfazer seus anseios e, como sua mobilização independente está travada pelas direções de esquerda, a alternativa eleitoral passa a ser vista como a alternativa possível, como quer Lula, o PT, PCdoB, PSOL, etc.
Esse cenário, no entanto, não deve abater os revolucionários. A raiva e a vontade de mudar o sistema não sumiram da equação, continuam se acumulando na base da sociedade. A crise do sistema se aprofunda em todo o mundo. Existe uma vanguarda da classe trabalhadora e da juventude ávida por ideias que possam, de fato, representar um caminho para a transformação radical da sociedade. E essas ideias são as ideias do marxismo revolucionário.
Portanto, se por um lado haverá uma pressão, cada vez maior, para a dispersão e o desânimo, por outro lado, se os revolucionários se mantiverem firmes, mesmo nadando contra a corrente do oportunismo e do pragmatismo eleitoral, e continuarem erguendo suas bandeiras, difundindo o marxismo e lutando por um programa de transição ao socialismo, será possível continuar se conectando a essa vanguarda consciente da classe trabalhadora e da juventude, avançando na construção da organização revolucionária e, dessa forma, nos prepararmos para as próximas mobilizações de massa que, cedo ou tarde, ressurgirão, assim como uma onda sempre se levanta contra a maré.