Condutores e cobradores do transporte coletivo e trabalhadores da rede pública municipal de Campinas-SP se mobilizam por reajustes salariais e direitos e realizam greves de massa.
Primeiro foram os motoristas e cobradores do transporte coletivo que travaram a cidade, com três dias de greve. Cerca de 600 mil passageiros tiveram que se virar em carros particulares e vans clandestinas, superlotando o trânsito já complicado da cidade. Mesmo assim, não foi tão fácil para a mídia burguesa encontrar pessoas comuns dispostas a falar abertamente contra a greve. Todos reclamavam dos congestionamentos, mas assumiam uma posição de neutralidade simpática ou de apoio ao movimento.
Os trabalhadores conseguiram chamar a atenção do povo para as longas jornadas de trabalho estressante que são obrigados a cumprir e para os baixos salários que recebem e permaneceram unidos. Aliás, a unidade da categoria foi um fator de vitória. Até os dados oficiais diziam que, por dia, apenas de 1% a 10% da frota circulava pelas ruas. Dos quatro mil trabalhadores na base, cerca de 2 mil participavam das assembléias e atos do Sindicato.
A greve arrancou um reajuste de quase 8% para os motoristas e 18% para os cobradores. Esse percentual sobre os baixos salários não deve render por muito tempo, mas foi o suficiente para encher de moral esses homens e mulheres super-explorados pelas empresas parasitárias do transporte público. Além disso, um dia depois da greve, os próprios passageiros se confraternizaram com os motoristas e cobradores, saudando-os e avaliando positivamente o resultado.
No entanto, a resistência dos empresários foi dura: evitaram a negociação, jogando a greve para o Tribunal Regional do Trabalho. A Justiça ameaçou decretar a ilegalidade da greve e, através de escolta policial, obrigou alguns ônibus a rodar!
Já o prefeito, Dr. Hélio (PDT), fingiu que não era com ele e o secretário de transportes, Sr. Gerson Bittencourt, que é do PT, liberou os corredores de ônibus e os terminais rodoviários para qualquer veículo disposto a substituir os grevistas.
Municipais de Campinas
Dias depois, começa a greve dos servidores municipais. A adesão surpreendeu até os mais otimistas. A categoria rejeitou a proposta de 3% de reajuste salarial e 0% no vale-alimentação. Porém, não é de hoje que propostas medíocres como essa são apresentadas aos servidores na data-base.
A categoria sempre reagiu, mas as paralisações e assembléias eram por demais “piqueteiras”, ou seja, de muita combatividade, mas pouca adesão. Tanto o governo anterior como o atual conseguiam vencer esse tipo de resistência – com medidas anti-sindicais e com violência policial – e concediam reajustes abaixo da inflação. Assim, o aumento da arrecadação municipal, fruto do breve período de crescimento econômico pelo qual passou o país, não se reverteu em investimentos nos serviços públicos e para os servidores. E a alegação da Prefeitura para isso era e continua sendo a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
Essa lei criada em 1999 pelo então Presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e que continua em vigor até hoje, com o intuito de garantir o pagamento dos juros da dívida pública, limita os investimentos municipais em folha de pagamento, ou seja, na contratação por concurso público e na valorização salarial dos servidores para privilegiar a terceirização da saúde, da educação, de obras, da coleta de lixo, do transporte, da limpeza etc.
No Hospital Municipal Mário Gatti, por exemplo, de 1600 profissionais, 900 são terceirizados através de convênios e outras PPPs (Parcerias Público-Privado)!
E o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do Governo Lula se baseia nessa mesma lógica. Algumas obras importantes foram feitas na cidade, como o Hospital Ouro Verde, grandes creches (chamadas de Nave-Mãe) e uma nova e moderna Rodoviária: tudo entregue para a iniciativa privada! Da mão-de-obra à administração geral!
E agora com a crise, os primeiros a serem afetados pela queda na arrecadação de impostos são os municípios. A começar pelas cidades mais pobres, como recentemente vimos acontecer em várias prefeituras pelo Norte e Nordeste, dependentes de repasse do governo federal.
Os salários dos professores e profissionais da saúde atrasam, mas o dinheiro para as empresas parasitárias do serviço público continua sendo pago, pois caso não seja, os capitalistas ameaçam abandonar os projetos…
Mas, voltando à greve dos municipais de Campinas, desta vez, algo diferente está ocorrendo. Desde 2003 que os servidores não se mobilizavam em massa e com tanta energia, recuperando suas tradicionais formas de luta, como agora. É o fruto de tantos anos de tensão acumulada, de políticas de terceirização dos serviços públicos e desvalorização dos trabalhadores. De insatisfação pela falta de médicos, remédios e equipamentos de saúde. De insatisfação pela falta de vagas nas creches, pelas salas superlotadas e nenhum apoio aos profissionais da educação, que são os responsáveis pelas crianças de 0 a 12 anos na maior parte do dia.
Calcula-se que a adesão do setor de saúde seja de 70%, ou seja, total, levando-se em conta a norma de manutenção de 30% dos serviços considerados essenciais (urgência e emergência). Um exemplo disso é a participação na greve dos trabalhadores do SAMU (ambulâncias), que se revezam entre o pronto-socorro e as atividades do movimento grevista. Em toda passeata, reunião e assembléia, lá estão eles, uniformizados, na linha de frente, mostrando à população que, por mais que se esforcem, não dá para salvar vidas com apenas 15 ambulâncias para 1 milhão de habitantes!
Mas, não são só eles que demonstram garra e organização. São cerca de 5 mil trabalhadores por dia que tomam as escadarias do Paço Municipal e se manifestam em passeata pelas principais ruas e avenidas de Campinas.
Os rumos do movimento
Nesse ambiente, há um caldo de cultura propício para que as idéias marxistas e revolucionárias germinem. Apesar de numericamente inferior a outros grupos políticos, a categoria, na sua própria experiência, acaba por identificar as melhores lideranças e, dialeticamente, os marxistas acabam por identificar os melhores combatentes para convidá-los a se integrarem em nossa organização revolucionária.
Há dois perigos para o movimento grevista hoje: o espontaneísmo e o esquerdismo. O primeiro implica em rebaixar as tarefas políticas do movimento ao âmbito meramente econômico-sindical e em acreditar que não é necessário piquetes e nem comando para manter o movimento fortalecido. O segundo implica em querer resolver todos os problemas numa única ação bem radical e de impacto midiático. Ambas as posições acabam sendo irresponsáveis com os trabalhadores em greve.
É preciso trabalhar para que a adesão quase espontânea dos trabalhadores não acabe na semana seguinte por falta de uma direção clara sobre o que fazer e como fazer, pensando inclusive em estender a greve por mais tempo, se a Prefeitura não ceder (que é o que tudo indica).
Nesse sentido, criar um fundo de luta e um calendário de atividades, além de espalhar comandos de mobilização por setores e regiões (centralizados pelo comando geral da greve) ajudaria e muito a colocar todos os trabalhadores em ação, compartilhando tarefas e fazendo com que cada um se sinta útil para o movimento. É hora também de batalhar para que a Guarda Municipal entre na greve, como fez em 2003, quebrando o primeiro aparato repressivo que a Prefeitura se utiliza para conter os trabalhadores.
Além disso, é preciso avançar e aprofundar a discussão política. Elevar a batalha pelas reivindicações para o terreno político significa explicar pacientemente à população trabalhadora que a greve não é a responsável pela péssima qualidade da saúde e da educação e sim o governo – para desgastá-lo e isolá-lo, forçando o PT e o PCdoB a romperem a aliança que mantêm na cidade com PDT, PMDB e DEM!
Significa também explicar que as condições de vida dos trabalhadores só melhoram com greve, com luta, porque senão o capitalismo e sua crise mundial vão arrastar a humanidade para a barbárie. E enfim, significa explicar que o movimento grevista é pela unidade dos trabalhadores e por uma greve geral no país contra a crise e pelo socialismo!
No caso da “greve dos ônibus”, toda essa discussão sobre o governo e sua relação com as empresas que exploram o transporte coletivo passou pela tangente, portanto, a greve não avançou para o terreno político, o que poderia colocar na ordem do dia a luta pela municipalização do transporte urbano. Mesmo assim, os trabalhadores puderam perceber que juntos e mobilizados têm a força! Parafraseando o camarada Allan Woods, dirigente da Corrente Marxista Internacional: sem a permissão dos motoristas e cobradores dos ônibus, nenhum pneu gira, nenhum sistema de transporte funciona.
Já na greve dos servidores, os marxistas estão lá e vão batalhar para levantar essas questões cruciais para a luta dos trabalhadores!