A luta de classes e a emancipação da mulher.
Para os marxistas, a causa original de todas as formas de opressão consiste na divisão da sociedade em classes. Para muitas feministas, por outro lado, a opressão das mulheres está baseada na natureza dos homens. Não é um fenômeno social, mas biológico. Esta é uma concepção inteiramente estática, não-científica e não-dialética da raça humana. É uma visão não-histórica da condição humana, da qual conclusões profundamente pessimistas devem fluir. Pois se aceitarmos que há algo inerente aos homens que os induz a oprimir as mulheres, é difícil ver como a presente situação será remediada. A conclusão deve ser que a opressão das mulheres pelos homens sempre existiu e por isso, presumivelmente, sempre existirá.
O marxismo explica que este não é o caso. Ele mostra que, junto com a sociedade de classes, a propriedade privada e o estado, a família burguesa nem sempre existiu, e que a opressão das mulheres é só tão velha quanto a divisão da sociedade em classes. Logo, sua abolição é dependente da abolição das classes, isto é, da revolução socialista.
Isto não significa que a opressão das mulheres desaparecerá automaticamente quando o proletariado tomar o poder. A herança psicológica do barbarismo de classe será finalmente superada quando forem criadas as condições sociais para o estabelecimento de relações humanas reais entre homens e mulheres. Mas, a menos e até que o proletariado derrube o capitalismo e estabeleça as condições para a realização de uma sociedade sem classes, nenhuma emancipação genuína da mulher é possível.
A fim de produzir a revolução socialista, é necessário unir a classe trabalhadora e suas organizações, cruzando todas as linhas de linguagem, nacionalidade, raça, religião e sexo. Isto implica, por um lado, que a classe trabalhadora deve tomar para si a tarefa de combater todas as formas de opressão e exploração, e colocar-se como a líder de todas as camadas oprimidas da sociedade, e por outro, deve rejeitar decisivamente todas as tentativas de dividi-la – mesmo quando estas tentativas forem feitas por setores dos próprios oprimidos.
Há um paralelo bastante claro entre a posição marxista sobre as mulheres e a posição marxista sobre a questão nacional. Temos a obrigação de lutar contra todas as formas de opressão nacional. Mas isso significa que apoiamos o nacionalismo? A resposta é NÃO.
Marxismo é internacionalismo. Nosso objetivo não é levantar novas fronteiras, mas dissolver todas as fronteiras numa federação socialista mundial.
A burguesia e a pequeno-burguesia nacionalistas representam um papel pernicioso ao dividir a classe trabalhadora em linhas nacionalistas, jogando com os compreensíveis sentimentos de ressentimento causados por longos anos de discriminação e opressão nas mãos da nacionalidade opressora. Por um lado, Lênin e os marxistas russos engajaram-se num esforço implacável contra todas as formas de opressão nacional, mas também por outro lado, contra as tentativas dos nacionalistas burgueses e pequeno-burgueses de fazer uso da questão nacional para fins demagógicos. Eles insistiram na necessidade de unir a classe trabalhadora de todas as nacionalidades no esforço contra a senhoriagem e o capitalismo como a única garantia para uma solução duradoura para a questão nacional numa federação socialista.
Em outras palavras, os marxistas abordam a questão nacional exclusivamente de um ponto de vista de classe.
O mesmo ocorre quanto à atitude dos marxistas em relação à opressão das mulheres. Enquanto combatemos contra todas as formas de discriminação e opressão, devemos decisivamente rejeitar o feminismo burguês e pequeno-burguês, os quais vêem o problema essencial como um conflito entre homens e mulheres, não como uma questão de classe.
Realmente, toda a história do movimento mostra que a questão de classe é fundamental, e que sempre tem havido uma luta amarga entre as mulheres das classes oprimidas, que simbolizam a mudança revolucionária, e as mulheres bem-nascidas “progressistas” que meramente usam a questão da opressão da mulher para seus próprios fins egoístas. Em cada estágio, esta diferença de classe tem se manifestado nas formas mais agudas. Um par de exemplos basta para ilustrar este ponto:
Já no século XVII, as mulheres começaram a avançar as demandas por sua emancipação social e política. A Revolução Inglesa viu uma crescente participação de mulheres na luta contra a monarquia e pela democracia e direitos iguais. Em 1649 tivemos a Petição das Mulheres da cidade de Londres a qual declara que: “dado que estamos seguras de nossa criação à imagem de Deus, e com um interesse em Cristo igual ao dos homens, como também numa partilha proporcional nas liberdades desta Comunidade, só podemos nos espantar e lamentar que pareçamos tão desprezíveis aos seus olhos, como se consideradas indignas de peticionar ou representar nossas penas a esta honorável Casa. Não temos nós um interesse igual ao dos homens desta Nação, nestas liberdades e garantias contidas na Petição de Direitos, e nas outras boas leis da terra?” (Not in Gods Image, de J. O’Faolain e L. Martines, pp. 266-7.)
Mulheres foram ativas em grupos radicais e seitas religiosas à esquerda do movimento revolucionário, as quais consideravam que elas podiam ser pregadoras e pastoras. Mary Cary, por exemplo, estava associada com o movimento da Quinta Monarquia. Em The New Jerusalem’s Glory, ela escreveu: “E se existem bem poucos homens que são supridos com a dádiva do Espírito; quão poucas são as mulheres! Não apenas existem muitas mulheres reverentes, muitas que de fato receberam o Espírito: mas em quão pequena medida? Quão fracas são? E quão incapazes de profetizar? Pois é disto que eu estou falando, o que este texto diz que farão; o que ainda não vimos cumprido… Mas está chegando o tempo quando esta promessa será cumprida, e os Santos serão abundantemente plenos de espírito; e não somente homens, mas mulheres profetizarão; não somente homens idosos, mas homens jovens; não somente superiores, mas inferiores; não somente aqueles que têm formação universitária, mas aqueles que não a têm; mesmo servos e criadas.”
Feminismo e Revolução Francesa
Na época da Revolução Francesa, a situação havia mudado muito. As relações de classe haviam se tornado mais claras, aguçadas. E assim, tinham consciência. A Revolução não tinha mais qualquer necessidade em vestir-se de roupagens bíblicas. Antes, ela falava na linguagem da Razão e dos Direitos do Homem. Mas e quanto aos direitos da Mulher?
A Revolução Francesa pode somente ser compreendida de um ponto de vista de classe. Os diferentes partidos, clubes, tendências e indivíduos os quais aparecem em desconcertante arranjo, erguendo-se e desabando como ondas num mar turbulento, foram meramente a expressão de diferentes classes lutando pelo domínio da situação, e a lei geral de cada revolução de que os mais radicais sempre tendem a desalojar a tendência mais moderada, até que o impulso revolucionário tenha se exaurido e o filme da revolução comece a se desenrolar às avessas. Este é o destino inevitável de cada revolução burguesa, onde o impulso que vem das massas eventualmente tropeça na contradição entre suas ilusões e o conteúdo de classe real do movimento.
As divisões de classe dentro do movimento revolucionário manifestaram-se desde o princípio. Os assim chamados girondinos representavam a tendência burguesa que queria parar a revolução no meio do caminho e fazer um acordo com o rei para estabelecer uma Monarquia Constitucional. Isto teria sido fatal para a Revolução, a qual somente adquiriu a necessária extensão porque as massas irromperam em cena e começaram a acertar contas com o conservadorismo num estilo revolucionário plebeu. Foi a erupção das massas – tão brilhantemente descrita no livro de Kropotkin – que garantiu a vitória da Revolução Francesa e dissolveu tão completamente a velha ordem.
Não é geralmente reconhecido que as mulheres desempenharam um papel importante tanto na Revolução Francesa quanto na Russa. Mas não estamos nos referindo aqui às feministas educadas de classe média, que emergiram no curso da revolução, mas à classe trabalhadora comum e mulheres plebéias, que ergueram-se em revolta contra a opressão de sua classe. As mulheres plebéias e semi-proletárias de Paris que iniciaram a Revolução Francesa em 1789 levantaram-se na questão do pão, não inicialmente na questão da opressão do gênero feminino, embora naturalmente isto tenha emergido no próprio curso da Revolução.
“Excluídas do voto, e da maioria das sociedades populares, as mulheres podiam, e desempenharam, um papel muito significativo em insurreições, particularmente aquelas de outubro de 1789, 10 de agosto de 1792, e, mais proeminentemente, os levantes da primavera de 1795 (conhecidas como os levantes de Germinal e Pradial do Ano 3, de acordo com os nomes dos meses do Calendário Revolucionário introduzido em 1792). As mulheres, mesmo as mais radicais delas, raramente demandavam o voto, condicionadas como haviam sido pela distinção de gênero do século XVIII, a qual colocava os homens na esfera pública e as mulheres na esfera privada. Elas estabeleceram sociedades femininas populares, a mais famosa das quais foi a Sociedade das Cidadãs Republicano-Revolucionárias; mas este clube durou somente de maio a outubro de 1793. Todavia, como ressaltam historiadores como Dominique Godineau e Darlene Levy, isto não significa que as mulheres não compartilhavam o programa político e econômico dos homens. As mulheres apoiavam, e mesmo encorajavam, os homens à ação. Elas se sentaram nas galerias das sociedades populares; elas criaram seu próprio espaço político do lado de fora das padarias, nos mercados, nas ruas.”(The French Revolution, 1787-1799. The People and the French Revolution, do professor Gwynne Lewis)
Uma revolução agita a sociedade em seu âmago, liberando sentimentos e aspirações há muito reprimidas dentro das massas e de cada camada oprimida. Logo, a demanda pela emancipação da mulher assumiu uma significância candente. Mas esta demanda foi entendida diferentemente por diversas tendências as quais finalmente se apoiavam em diferentes interesses de classe. Não foi por acidente que as mulheres do pobre proletariado e semi-proletariado parisiense abriram o caminho. Elas constituíam a mais oprimida camada da sociedade, aquelas que tinham de suportar o impacto do sofrimento das massas. Também, elas não tinham experiência de luta política e organizações, e entraram em cena desoneradas de preconceitos. Em contraste, os homens eram mais cautelosos, mais hesitantes, mais “legalistas”. Este contraste tem sido visto muitas vezes desde então. Em numerosas greves, onde mulheres têm estado envolvidas, elas têm consistentemente demonstrado maior militância, brio e coragem do que os homens. Significativamente, foi nas questões de classe – a questão do pão – que estas mulheres começaram a se mover. O mesmo foi verdadeiro mais de 100 anos mais tarde em Petrogrado.
A cada ponto-chave de inflexão da Revolução Francesa – ao menos em seus primeiros estágios – as mulheres das classes baixas deram o exemplo. Em outubro de 1789, enquanto os cavalheiros da Assembléia Constituinte falavam interminavelmente sobre reforma e constituições, as mulheres pobres de Paris – as peixeiras, lavadeiras, costureiras, vendedoras, criadas e mulheres de trabalhadores, levantaram-se espontaneamente. Estas sans culottes femininas organizaram uma demonstração e marcharam para a prefeitura de Paris exigindo pão barato. Elas envergonharam os homens marchando sobre Versalhes e trazendo de volta o rei e a rainha (elas não faziam distinção entre os dois – se havia alguma, a “mulher austríaca” era mais odiada que seu marido) sob uma virtual prisão domiciliar. A cena é bem descrita por George Rudé:
“Foi então que as mulheres começaram a intervir. A crise do pão havia sido peculiarmente delas, e doravante foram elas, mais do que os homens, que interpretaram o papel principal no movimento. Em 16 de setembro, Hardy lembra que as mulheres pararam cinco carroças carregadas de grãos em Chaillot e as trouxeram para o Hotel de Ville em Paris. No dia 17, ao meio-dia, o Hotel de Ville estava sitiado por mulheres enfurecidas queixando-se da conduta dos padeiros; elas foram recebidas por Bailly e o Conselho Municipal. ‘Ces femmes [escreveu Hardy] disaient hautement que les hommes n’y entendaient rien et qu’elles voulaient se mêler des affaires’ [‘Estas mulheres diziam em voz alta que os homens não sabiam de nada e que elas mesmas iriam resolver as coisas. ‘] No dia seguinte, o Hotel de Ville estava novamente sitiado e promessas foram feitas. No anoitecer deste dia, Hardy viu mulheres tomarem uma carreta de grãos na Place des Trois Maries e escoltá-la até a sede do distrito local. Este movimento continuou para além da manifestação política de 5 de outubro.”(George Rudé, The Crowd in the French Revolution, p. 69.)
E novamente: “Daí em diante as mulheres passaram a convergir para o Hotel de Ville. Seu primeiro objetivo era pão, o segundo provavelmente armas e munições para os seus homens. Um negociante de tapetes, passando pela entrada do mercado velho às oito e meia, viu grupos de mulheres parando estrangeiros nas ruas e obrigando-os a acompanharem-nas até a prefeitura, ‘où l’on devait aller pour se faire donner du pain’. Os guardas foram desarmados e suas armas entregues aos homens que aguardavam por trás das mulheres, exortando-as. Outra testemunha, um caixeiro do Hotel de Ville, descreveu como, cerca das nove e meia, grandes quantidades de mulheres com homens entre elas, precipitaram-se pelas escadas e irromperam por todas os escritórios do edifício. Uma testemunha disse que eles portavam bastões e piques, enquanto outra insistiu que eles estavam armados com machados, alavancas, porretes e mosquetes. A um caixeiro, que teve a temeridade de admoestar os invasores, foi dito ‘qu’ils étaient les maîtres at maîtresses dud Hôtel de Ville’. Em sua busca por armas e pólvora, os manifestantes rasgaram documentos e livros contábeis e um maço de 1000 livres [notas da Caisse des Comptes] desapareceu de um armário. Mas seu objetivo não era dinheiro nem saque: mais tarde, o Tesoureiro Municipal contou à polícia que algo em torno de 3,5 milhões de livres em dinheiro e notas foram deixados intocados; e as notas bancárias desaparecidas foram devolvidas intactas poucas semanas depois. Tendo soado o sinal de alerta do campanário, os manifestantes retiraram-se para a vizinha Place de Grève por volta das 11 horas. Foi nesse ponto que Maillard e seus volontaires entraram em cena. De acordo com o seu relato, as mulheres estavam ameaçando Bailly e Lafayette. Fosse para impedir tal desastre ou meramente para promover os objetivos políticos dos ‘patriotas’, Maillard deixou-se persuadir a liderá-las na marcha de doze milhas até Versalhes para peticionar o rei e a Assembléia para providenciar pão para Paris. Ao partir, no início da tarde, removeram o canhão do Châtelet e [escreveu Hardy] forçaram todo tipo e condição de mulher que encontraram – ‘même des femmes à chapeau’ – a juntarem-se à elas.” (George Rudé, The Crowd in the French Revolution, pp. 74-5)
Aqui vemos perfeitamente o modo pelo qual as mulheres da classe trabalhadora de Paris entenderam a luta. Frustradas e impacientes com a inação de seus homens, elas se lançaram na luta com tremendo élan que arrastou tudo à sua frente. Mas em nenhum momento elas encararam a luta como de “mulheres contra homens”, mas uma luta de toda a classe de pessoas pobres e exploradas contra os opressores ricos. Começando com demandas econômicas (“pão”), elas marcharam para a prefeitura, e no processo outra demanda emergiu quase que por sua própria conformidade: a demanda de armas. “Seu primeiro objetivo era pão, o segundo provavelmente armas e munições para os seus homens”. O objetivo era envergonhar os homens na ação – e nisso as mulheres de Paris foram brilhantemente bem sucedidas e salvaram a Revolução.
A emergência das massas na cena política é o primeiro e mais fundamental elemento em toda revolução. Isto é particularmente verdadeiro em relação às mulheres. Na Revolução Francesa, as mulheres não estavam de forma alguma satisfeitas em deixar a política para os homens. Em Paris nós vimos a instituição pró-jacobina das Citoyennes Républicaines Révolutionaires (Cidadãs Republicanas Revolucionárias) que usavam um uniforme vermelho e branco com pantalonas listradas, barrete da liberdade vermelho, e carregavam armas em suas passeatas. Elas demandavam o voto para as mulheres e o direito das mulheres em ocupar os mais altos postos civis e militares na República – isto é, o direito das mulheres à plena igualdade política com os homens, e o direito de lutar e morrer pela causa da Revolução.
Contudo, a própria Revolução foi caracterizada por uma luta constante de partidos e tendências na qual a tendência mais radical constantemente sobrepujava e substituía as tendências mais moderadas, até que a Revolução finalmente exauriu seu potencial e começou a afrouxar numa espiral descendente que levou ao bonapartismo e a Waterloo. Essa briga partidária no fundo refletia a luta entre classes diferentes. A facção girondina representava aquela parte da burguesia que temia as massas e estava batalhando por um acordo com o rei. Estes antagonismos de classe – os quais assumiram uma forma particularmente amarga na Revolução Francesa – também afetaram a questão da mulher de um modo fundamental.
As ativistas girondinas – algumas das quais tinham posições realmente avançadas sobre a questão formal dos direitos da mulher – colocaram a questão de forma diferente das mulheres sans culotte – sarcasticamente batizadas de tricoteuses por historiadores hostis por causa do seu hábito de tricotar enquanto cabeças aristocráticas caíam no cesto. As mulheres das classes pobres de Paris estavam indubitavelmente motivadas por um forte espírito revolucionário, consciência de classe e um ódio eterno pelos ricos. As mulheres girondinas, oriundas da classe média privilegiada e famílias burguesas, não tinham os mesmos interesses imediatos das mulheres dos distritos pobres de Paris.
Os girondinos aprovaram uma lei de divórcio a qual foi indubitavelmente um avanço para as mulheres. Mas as girondinas colocaram forte ênfase nos direitos de propriedade das mulheres. Na época da Revolução Francesa, tal demanda não era de forma alguma uma questão candente para a maioria das mulheres, pela simples razão de quem nem elas nem seus maridos possuíam qualquer propriedade. As mulheres sans culotte que tinham interpretado um papel espetacular na Revolução opuseram-se ao “direito sagrado à propriedade” porque entendiam a revolução do seu próprio ponto de vista de classe. Hostis aos burgueses bem-nascidos, mesmo quando usavam o barrete vermelho da revolução, elas instintivamente batalharam por uma República na qual todos, homens e mulheres seriam verdadeiramente iguais – não apenas iguais perante a Lei – isto é, elas lutaram por uma sociedade sem classes, um mundo sem ricos e pobres. As forças produtivas que são as bases materiais para o socialismo não tinham ainda alcançado um nível de desenvolvimento suficiente para permitir isso. A natureza de classe da Revolução Francesa era burguesa por necessidade. Mas isto não estava claro de forma alguma para as massas que tão entusiasticamente se mobilizaram na Revolução, e que selaram sua vitória com o próprio sangue. Eles não estavam combatendo para entregar o poder aos burgueses – fossem homens ou mulheres, mas para assegurar a justiça para sua classe.
A luta entre as tendências revolucionárias e moderadas foi expressa de forma muito aguda nas fileiras das mulheres. Olympe de Gouges (1748-93) foi uma típica feminista girondina. Nascida Marie Gouges, filha ilegítima de um nobre e da mulher de um açougueiro em Montauban, no sul da França, ela rebelou-se contra a estreiteza da vida provinciana e o modo como o pai havia tratado a mãe dela. Após um casamento infeliz, ela fugiu para Paris, mudou de nome e começou a apresentar-se no palco. Típica do tipo de mulher de classe média que foi inspirada pela Revolução sem haver apreendido sua essência, ela habituou-se a escrever peças e panfletos, conclamando pela abolição do tráfico de escravos, oficinas públicas para os desempregados (uma idéia mais tarde adotada pelo reformista socialista Louis Blanc) e um teatro nacional para mulheres. Em 1791 ela publicou a Declaração dos Direitos da Mulher, uma resposta à Declaração dos Direitos do Homem, da Assembléia.
Há muita coisa interessante neste documento, com seu apelo comovido às mulheres: “Mulheres, acordem; o sinal de alerta da razão está sendo ouvido através do universo inteiro; descubram seus direitos. O poderoso império da natureza não está mais cercado por preconceito, fanatismo, superstição e mentiras. A chama da verdade dispersou todas as nuvens da tolice e usurpação. O homem escravizado multiplicou sua força e precisa de sua ajuda para quebrar suas cadeias. Tendo se tornado livre, ele se tornou injusto para com sua companheira. Oh, mulheres, mulheres! Quando vocês deixarão de ser cegas?”
Ela também escreveu uma nova forma de Contrato Social Entre Homem e Mulher – para substituir os votos matrimoniais existentes – começando com as palavras: “Nós, ________ e ________, movidos por nossa própria vontade, nos unimos pela duração de nossas vidas, e pela duração de nossas inclinações mútuas, sob as seguintes condições: Nós pretendemos e desejamos tornar nossos bens comuns, reservando entretanto para nós mesmos o direito de dividi-los em favor de nossas crianças e daqueles para os quais possamos ter uma inclinação particular, reconhecendo mutuamente que nossa propriedade pertence diretamente às nossas crianças, qualquer que seja a cama da qual tenham provindo, e que todas elas, sem distinção, têm o direito de usar o nome de seus pais e mães que os tenham reconhecido, e nos responsabilizamos em subscrever a lei que pune a renúncia ao próprio sangue. Da mesma forma, nós nos obrigamos, em caso de separação, a dividir nossos bens e a reservar antecipadamente a parcela que a lei indicar para nossas crianças, e na ocorrência de uma união perfeita, aquele que morrer será despojado de metade de suas posses em favor de suas crianças, e se alguém morrer sem descendência, o sobrevivente herdará por direito, a menos que a pessoa moribunda tenha disposto metade dos bens comuns em favor de quem ele julgou merecedor.”
“Eu ofereço um método infalível para elevar a alma das mulheres; é uni-las a todas as atividades do homem; se o homem persistir em achar este método visionário, que ele compartilhe sua fortuna com a mulher, não ao seu capricho, mas pela sabedoria das leis. Preconceitos caem, a moral é purificada e a natureza recupera todos os seus direitos. Acrescente a isto o casamento dos padres e o fortalecimento do rei no seu trono e o governo da França não pode falhar.” (Olympe de Gouges, Declaration of the Rights of Woman and Female Citizen, em Darline Gav Levy, H. Applewhite e M. Johnson, eds., Women in Revolutionary Paris, 1785-1795, pp. 92-96.)
Contudo, a totalidade da perspectiva de Gouges era o de uma girondina – isto é, uma burguesa liberal. Deverá ser notado que no novo contrato de casamento, a ênfase principal jaz sobre a questão da propriedade. E que ao fim, ela argumenta em favor do “fortalecimento do rei no seu trono”. Isto está inteiramente no espírito girondino, dado que a ala moderada da Convenção estava batalhando por um acordo com o rei e o estabelecimento de uma monarquia constitucional. Posteriormente, ela publicou um apelo contra a execução do rei, o que selou seu destino. Ela foi executada pelos jacobinos. No caminho para a guilhotina, fez um discurso que incluía as palavras: “Cadafalsos e carrascos – são então estes os resultados da Revolução que deveria ter sido a glória da França, difundindo-se sem distinção sobre ambos os sexos e servindo como um modelo para o universo?”
Estas palavras, ditas por Olympe de Gouges enquanto era levada para a guilhotina, mostram o quão pouco ela entendeu da realidade da Revolução. A execução do rei foi uma linha divisória precisa que separou as duas fases da Revolução no período de sua ascensão. Ela desfechou um golpe decisivo contra o centro nervoso da contra-revolução na qual conspirações estavam constantemente sendo incubadas; ela intimidou a aristocracia; ela enviou uma mensagem desafiante para todas as cabeças coroadas da Europa; acima de tudo, traçou uma linha na areia, separando todos os elementos indiferentes e vacilantes daqueles que fervorosamente desejavam levar a Revolução adiante.
Filisteus condenaram a Revolução Francesa pelo uso da violência. O Terror tem sido universalmente condenado com palavras que lembram as palavras de Gouges. Mas sem o Terror revolucionário dos jacobinos, a Revolução não teria sobrevivido. As massas precisaram empregar meios extremos para defender-se contra a ameaça da contra-revolução realista a qual teria, se bem sucedida, afogado-a em sangue. Toda a história, começando com a revolta de escravos de Spartacus, mostra que a crueldade sangrenta da classe dominante quando ela se vinga das massas, não tem limites. O Terror usado contra os aristocratas, padres e contra-revolucionários no primeiro período teve um caráter progressivo. O Terror usado mais tarde contra os revolucionários a fim de consolidar a reação Termidoriana era contra-revolucionário. Aqueles que não conseguem ver a diferença merecem as nossas condolências, mas não podem nunca ser levados a sério.
Outro exemplo de uma feminista girondina foi Théroigne de Méricourt (1766-1817). Tendo vivido como cortesã antes da Revolução, ela adotou a questão dos direitos da mulher, mas novamente, de um ponto de vista puramente girondino. Esta infeliz feminista foi atacada por mulheres jacobinas enquanto caminhava nos jardins das Tulherias em junho de 1793, despida e apedrejada. Terminou sua vida num asilo de lunáticos.
De um ponto de vista humano, podemos simpatizar com estas infelizes mulheres que, até certo ponto, almejaram melhorar o destino das mulheres – embora das mulheres burguesas. Mas o que isso mostra além de qualquer dúvida é que um abismo de classe separava as feministas burguesas das mulheres revolucionárias das classes oprimidas, e que a linha que separava ricos de pobres, girondinos de jacobinos, fora traçada com sangue. Apelos para unir todas as mulheres, independente de classe social, não tiveram eco afinal entre a massa de mulheres da classe trabalhadora que lutaram ao lado de seus homens para ganhar uma sociedade mais justa.
Divisões de Classe entre as Sufragetes
Os anos iniciais da ascensão do Movimento Trabalhista na Grã-Bretanha foram também um período de intensa agitação entre a classe trabalhadora e também entre as mulheres. O Novo Sindicalismo nasceu no fim do século XIX numa série de greves militantes, as quais estimularam os trabalhadores desorganizados, segmentos nunca envolvidos antes. Algumas delas envolveram mulheres das classes trabalhadoras, tais como a famosa greve das garotas da fábrica de fósforos. Entre as mulheres de classe média, havia uma crescente agitação pelo direito ao voto. Todavia, as sufragetes de classe média estavam interessadas somente na obtenção de igualdade formal – e teriam ficado realmente satisfeitas em conseguir o voto para mulheres donas de imóveis – isto é, para mulheres de sua própria classe. Deixe-nos lembrar que naquela época, muitos homens não tinham direito ao voto. Contudo, os eventos logo demonstraram a natureza reacionária da burguesia feminina, a qual demonstrou sua hostilidade para a causa da classe trabalhadora – fossem homens ou mulheres.
Como Jen Pickard assinalou corretamente em seu artigo sobre Sylvia Pankhurst: “Os nomes da família Pankhurst são sinônimos da luta pela conquista do voto para as mulheres, mas o que distinguiu a abordagem de Sylvia Pankhurst daquela da de sua mãe Emmeline e de sua irmã Christabel, foram questões de classe. Isso terminou nos anos 1920, após quase 20 anos de luta, com Emmeline concorrendo como candidata parlamentar dos conservadores e Sylvia tornando-se membro fundadora do Partido Comunista Britânico.”
A Women’s’ Social and Political Union (WSPU) [União Política e Social das Mulheres] foi fundada em 1903 como conseqüência da indecisão do Independent Labour Party (Partido Trabalhista Independente) na questão do voto feminino. A WSPU cresceu rapidamente e por volta de 1907 tinha 3000 seções, atraindo professoras, balconistas, escreventes, costureiras e tecelãs. O seu jornal Votes for Women (Votos para Mulheres) vendeu 40 mil cópias numa semana. Elas foram capazes de encher o Albert Hall e organizar uma manifestação de 250 mil no Hyde Park.
Em 1911, ao mesmo tempo em que o governo liberal de Asquith prometia autonomia para a Irlanda, também acenava com a perspectiva do voto para mulheres (proprietárias). Mas os liberais traíram ambas as promessas. Quando as sufragetes recorreram à ação direta para a sua causa, confrontaram-se com a repressão mais brutal: surras, prisão e a tortura da alimentação forçada. Esta campanha foi organizada principalmente pelas mulheres de classe média. Mas a tática de quebrar janelas, defendida pela ala burguesa das sufragetes, não levou a parte alguma. A classe dominante continuou opondo-se implacavelmente ao voto feminino.
O verdadeiro caminho progressista para o movimento dos direitos das mulheres deveria ter sido o de forjar elos com o movimento operário, o qual nesta época estava envolvido numa luta amarga com a classe patronal. Este foi um tempo de crescente luta de classes na Grã-Bretanha, com greves em massa de estivadores e trabalhadores em transportes. O “liberal” Asquith mandou tropas para interromper uma greve de mineiros em Gales do Sul. Uma seção do movimento feminino tentou fazer isso com algum sucesso. Sylvia Pankhurst preferiu adotar os métodos de agitação e propaganda entre as mulheres da classe trabalhadora no East End de Londres. Em Bermondsey, no sul de Londres, mulheres em greve numa fábrica de alimentos receberam a adesão de 15 mil outras de fábricas e oficinas locais num comício monstro em Southwark Park. Elas exigiam aumento de salário – e voto. Esta era a via progressista: usar a arma da luta de classes para unir a luta por demandas econômicas às demandas políticas, especialmente a demanda do voto feminino.
Esta abordagem diferente de classe levou a uma cisão do movimento sufragete em linhas de classe – e a uma cisão na família Pankhurst. Em janeiro de 1914, poucos meses antes da Guerra, Sylvia foi convocada à Paris para uma reunião com a mãe, Emmeline e a irmã, Christabel. Instalada num confortável exílio em Paris, Christabel era a própria imagem da saúde, enquanto Sylvia estava desgastada pela prisão e greves de fome. Num contraste flagrante à posição de classe advogada por Sylvia Pankhurst, sua irmã Christabel insistiu na independência da WSPU de todos os partidos masculinos. Christabel exigiu a exclusão da Federação de East London da WSPU. Isto é, ela exigiu a expulsão das mulheres da classe trabalhadora do movimento sufragete.
Esta esnobe de classe média argumentou que a Federação de East London tinha uma constituição democrática e apoiava-se maciçamente nas mulheres da classe trabalhadora. Parece que a mãe tentou chegar a um consenso, mas Christabel estava determinada, exigindo um “corte claro”. Então, em janeiro de 1914, East London foi forçada a romper com a WSPU e formar uma organização em separado – a East London Federation of Suffragettes (ELFS). Isto ilustra perfeitamente a atitude do feminismo de classe média para com a classe trabalhadora. Jen Pickard comenta: “Esta cisão na WSPU refletia uma polarização geral ocorrendo na sociedade britânica. Entre 1911 e 1914, cada grupo chave de trabalhadores (estivadores, trabalhadores em transportes, ferroviários, engenheiros) estava envolvido em greves. Mesmo entre os membros da WSPU, aprisionadas e alimentadas à força, eram as mulheres da classe trabalhadora quem sofriam as piores condições e tratamento.”
Aqui novamente, a questão de classe era fundamental. A cisão no movimento sufragete mostrou a verdadeira atitude das feministas burguesas quanto às mulheres da classe trabalhadora, socialismo e movimento trabalhista. Apresentando a questão como uma luta de “homens contra mulheres”, elas interpretaram um papel negativo e inevitavelmente terminaram numa posição reacionária, como foi demonstrado uns poucos meses depois da cisão. Em 1914, a Primeira Guerra Mundial interrompeu o desenvolvimento da luta de classes na Grã-Bretanha. Da noite para o dia, as “rebeldes” feministas Emmeline e Christabel transformaram-se imediatamente nas chauvinistas mais fanáticas. O nome do jornal da WSPU foi mudado para Votes to Women to Britannia (Voto Feminino para Inglaterra). Seu mote era “King, Country, Freedom” (Rei, Pátria, Liberdade).
Esta foi uma traição abjeta e descarada da causa das mulheres. Ela expôs a verdadeira natureza de classe do feminismo burguês, e o abismo que o separava da classe trabalhadora e do socialismo. Com todo seu radicalismo verbal e demagogia, em última análise, elas estavam preparadas para juntarem-se aos homens de sua classe – a classe dominante – contra os homens e mulheres do proletariado: aqueles que tinham de realizar toda a luta, morrendo e sofrendo enquanto eles acenavam a bandeira de uma posição de conforto e segurança. É sempre a mesma história.
Sylvia Pankhurst, em seu crédito, opôs-se à Guerra – embora de um confuso ponto de vista pacifista – e engajou-se numa campanha nas fábricas para obter pagamento igual para as mulheres que tinham sido recrutadas para a indústria de armas e engenharia em substituição aos homens na frente de batalha. Ela publicou um jornal chamado The Workers’ Dreadnaught (O Encouraçado dos Trabalhadores) e posteriormente juntou-se ao Partido Comunista, onde manteve uma posição ultra-esquerdista. Sua compreensão do marxismo era muito limitada, mas ao menos ela tentou adotar uma posição de classe. Em 1918, as mulheres britânicas acima dos 30 anos obtiveram o direito ao voto. Isto não foi o resultado da tática das sufragetes, mas um subproduto da Revolução Russa e do fermento revolucionário que se seguiu à Primeira Guerra Mundial, a qual chocou a classe dominante britânica e obrigou-a fazer concessões. Aqui, novamente, a reforma mostrou-se ser tão somente um subproduto da revolução.
A Emancipação das Mulheres e o Socialismo
As revoluções burguesas do passado proclamaram os “direitos do homem” ainda que na prática nunca tenham obtido a igualdade da mulher. Na verdade, o avanço das mulheres sob o capitalismo tem sido parcialmente um subproduto da luta de classes e em parte um resultado do papel alterado das mulheres na produção. Certos direitos políticos têm sido conquistados nos países capitalistas avançados (a minoria do mundo), mas emancipação genuína não tem sido obtida e nunca poderá ser obtida com base no capitalismo.
Já em 1848, Marx e Engels levantaram a demanda pela abolição da família burguesa. Contudo, a família não pode ser abolida de um golpe só. Esta demanda não pode ser alcançada a menos que haja uma base material para ela. Isto só pode ser atingido pela derrubada do capitalismo e o estabelecimento de uma nova sociedade baseada em um plano de produção harmonioso e democrático, com o envolvimento de toda a sociedade nas tarefas comuns da administração. Uma vez que as forças produtivas estejam livres da camisa-de-força da propriedade privada e do estado-nação, será possível atingir rapidamente um nível inimaginável de bem-estar econômico. A velha mentalidade de medo, ganância, inveja e avareza desaparecerá quando as condições materiais que lhe deram origem forem removidas.
A estrada estará aberta para uma transformação radical das condições de vida e por conseguinte, uma transformação das relações entre homens e mulheres e de todo o seu modo de pensar e agir. Sem tal pulo de gigante, toda a conversa sobre mudar o caráter e a psicologia das pessoas será apenas conversa fiada e decepção. O ser social determina a consciência.
O papel das mulheres da classe trabalhadora foi visto na Rússia em fevereiro de 1917. O czar foi derrubado por uma revolução que começou no Dia Internacional da Mulher, quando as trabalhadoras de Petrogrado decidiram entrar em greve e protestar a despeito da recomendação dos bolcheviques locais que temiam a ocorrência de um massacre. Guiadas por seus instintos proletários de classe, elas puseram de lado todas as objeções e começaram a revolução. Veríamos muitos outros exemplos como esse no futuro. Na Rússia, em outubro de 1917, tal base não existia dado o atraso predominante. Em conseqüência, a despeito dos enormes avanços tornados possíveis pela Revolução, a posição das mulheres na Rússia foi jogada para trás, primeiro pelo stalinismo e agora ainda mais pela tentativa de reimposição do capitalismo. A posição das mulheres na Rússia e na Europa Oriental está agora pior do que antes. Isto não deveria surpreender ninguém. Com base no capitalismo, nenhum caminho progressista é possível em parte alguma, muito menos na Rússia.
As mulheres desempenharão um papel essencial na derrubada do capitalismo e na construção do socialismo. Mas aqui novamente trata-se de uma questão de mulheres da classe trabalhadora, lutando por sua própria emancipação – e de toda sua classe. Logo, não se trata da questão de homens ou feministas universitárias de classe média “ensinarem” mulheres a lutar por “causas femininas”, mas das mulheres das classes trabalhadoras adquirirem consciência de classe e confiança em si mesmas através da participação na luta de classes. No processo de luta para transformar a sociedade, homens e mulheres também transformarão a si mesmos. Podemos ver como, em cada greve, os trabalhadores erguem-se às alturas de seres humanos reais e põe de lado a mentalidade de escravo. Quão mais verdadeiro isto seria no caso de uma revolução!
Este é o único modo de obter liberação genuína – não para mulheres, mas para mulheres e homens. De fato, uma coisa não é possível sem a outra. Lutamos não pela liberação deste ou daquele grupo, mas da própria humanidade. Isto não significa de modo algum que as mulheres devam suspender a luta por melhorias imediatas. Pelo contrário. Sem a luta diária por avanços sob o capitalismo, a revolução socialista seria impossível. Mas por outro lado, é necessário entender que sob o capitalismo, quaisquer melhorias possuirão um caráter parcial, distorcido e instável, e serão constantemente ameaçadas pela crise do sistema e a deterioração geral da situação, e a decadência social, moral e cultural. Por outro lado, é necessário unir com firmeza a luta contra a opressão da mulher com a luta da classe trabalhadora contra o capitalismo. Esta é a única estrada possível para a vitória.
Certamente, as cicatrizes psicológicas do barbarismo de classe com seu cálculo personalista, ganância e egoísmo não desaparecerão da noite para o dia, mesmo após a derrubada do capitalismo. Um período de tempo deve transcorrer antes que todo o lodo finalmente desapareça. Mas desde o começo, as relações entre homens e mulheres começarão a melhorar. As terríveis pressões econômicas que obscurecem vidas e distorcem todas as relações humanas serão imediatamente abolidas com a introdução de empregos decentes, moradia e educação para todos. Um plano socialista democrático de produção criará as condições para que todos participem do funcionamento da sociedade. Isto abolirá, entre outras coisas, a velha família introvertida e o indivíduo atomizado, e viabilizará as condições para a criação de uma psicologia inteiramente diferente, enraizada em relações humanas novas e livres.
A eliminação da sociedade de classes – e eventualmente da mentalidade de escravo que flui da imundície da sociedade de classes – levará a criação de um novo homem e de uma nova mulher: seres humanos livres, capazes de viver juntos em harmonia como pessoas liberadas, inteiramente livres da velha psicologia possessiva de escravo. Tendo libertado homens e mulheres da perseguição humilhante de coisas materiais, a qual distorce e degrada a vida humana, será possível pela primeira vez que as pessoas se relacionem umas com as outras como seres humanos. O relacionamento entre homens e mulheres – o relacionamento mais belo e natural – estará livre para desenvolver-se sem qualquer coerção externa, cálculo egoísta ou dependência humilhante.
19 de Julho de 2001