Nesta nota política a Comissão Executiva da Esquerda Marxista analisa os ultimos acontecimentos na Venezuela e extrai importantes conclusões e orientações aos marxistas e lutadores comprometidos com a revolução naquele país e em todo mundo.
Uma apertada vitória eleitoral de Maduro, o candidato do PSUV a presidente na Venezuela, foi seguida por uma série de atos de violência perpetrados por bandos fascistas seguidores do candidato derrotado da oposição, Capriles, que se recusa a reconhecer e aceitar o resultado das urnas. Tais atos de violência por todo o país levaram à morte de 8 militantes revolucionários, dezenas de feridos e um incontável número de estabelecimentos públicos depredados (centros médicos, escolas infantis, emissoras de TV, etc.) bem como sedes do PSUV. Com apoio dos EUA, Espanha e do presidente da OEA (Organização dos Estados Americanos), a burguesia venezuelana preparava um golpe de Estado. Enquanto Capriles, pelas redes de TV privadas, incitava seus seguidores a expressar sua indignação nas ruas, criando um clima de instabilidade e buscando provocar a repressão do Estado para em seguida denunciá-lo, o próprio governo venezuelano descobria e denunciava movimentações militares dos EUA no oceano em direção à Venezuela.
Uma breve análise do que disseram as urnas
No domingo, 14 de abril, houve 79,78% de comparecimento às urnas (num país onde o voto não é obrigatório), com Maduro recebendo 7.575.506 votos (50,78%) e Capriles 7.302.641 votos (48,95%). Outras 4 pequenas candidaturas somaram juntas apenas 38.910 votos (0,24%). Com apenas 66.691 votos nulos. O PSUV (Partido Socialista Unido de Venezuela) venceu em 16 estados e a oposição do MUD (Mesa da Unidade Democrática – frente que reúne cerca de 20 partidos de oposição) venceu em apenas 8.
Importante ressaltar que o candidato do PSUV, Maduro, obteve 500 mil votos a menos que Chávez em outubro do ano passado, quando este foi reeleito para o seu 3º mandato presidencial. E Capriles, mesmo agora sem o apoio formal do COPEI (partido de direita que rompeu com o MUD e declarou apoio à Maduro na véspera da eleição), obteve pouco mais de 800 mil votos a mais em comparação à sua própria votação em outubro, quando enfrentava Chávez. Além disso, na eleição passada Chávez havia vencido em 22 estados e Capriles em apenas 2. Agora, embora a diferença continue grande, a oposição ganhou terreno.
Esse crescimento da oposição e um pequeno encolhimento eleitoral do PSUV deve ser analisado com atenção pelos revolucionários na Venezuela. Sabemos que as eleições burguesas expressam apenas de maneira distorcida as reais forças da luta de classes, mas aí há um recado. Pode ser que setores mais atrasados das classes exploradas venezuelanas, afetados pela alta inflação e atingidos concretamente pelos planos de desabastecimento e sabotagem econômica da burguesia (principalmente no que diz respeito à distribuição de alimentos e energia elétrica), que não tinham desenvolvido ainda consciência de classe, mas votavam no Chávez, agora sem Chávez, votam no que lhes parece como aquele que trará mudanças, pois o que sabem é que precisam de mudanças. Ou seja: o canto da sereia de Capriles teria conseguido migrar votos chavistas, dos setores mais atrasados dos explorados, para a direita.
Por outro lado, amplos setores das massas venezuelanas já se encontravam no terreno eleitoral da oposição (milhões de votos não representam apenas a classe média-alta do país) e agora isso pode estar aumentando.
Mas com a onda de violência após as eleições (que tinham um claro corte de classe – eram elementos de classe média e alta que participavam dos ataques) e a direita não aceitando a derrota, pudemos ver várias manifestações individuais nos bairros mais pobres de trabalhadores com cartazes dizendo “Votei errado! Capriles, devolva meu voto!”. E até gente de classe média que tinha votado em Capriles por seu discurso de “conciliação” agora dizendo na internet que se sente traído com tanta violência. O que mostra que o chicote da contrarrevolução pode fazer avançar a consciência de classe.
Por outro lado o que se discute nas ruas hoje na Venezuela entre os militantes psuvistas é que a via eleitoral burguesa está se esgotando e que para avançar será preciso construir outras formas de democracia. Todos falam de socialismo, mas o que falta é a direção do movimento apontar o caminho e como fazer.
Os planos da burguesia
A burguesia venezuelana, embora tenha se unificado no projeto da candidatura de Capriles desde 2011, continua dividida sobre como enfrentar a revolução e isso fica mais evidente agora após as duas derrotas eleitorais de Capriles (outubro/2012 contra Chávez e abril/2013 contra Maduro). Essa divisão na burguesia venezuelana certamente reflete uma divisão no imperialismo americano sobre o que fazer.
Um setor importante imaginava que a ausência de Chávez abriria uma brecha para que atacassem a revolução frontalmente. Este setor apostava na desestabilização através dos planos de sabotagem e desabastecimento como preparação para um golpe e era o que buscavam fazer agora a partir do resultado eleitoral apertado. Antes mesmo de ser declarado o resultado das eleições, Capriles telefona a Maduro lhe dizendo que o país está dividido no meio e lhe propõe que anunciem juntos um “empate técnico” e um governo de unidade. Capriles já esperava que Maduro rechaçasse tamanho absurdo e chama uma coletiva de imprensa dizendo não reconhecer o resultado, exigindo a recontagem de 100% dos votos. A oposição manipula imagens alegando que o CNE (Conselho Nacional Eleitoral) estaria queimando material eleitoral e chama seus apoiadores a expressar sua indignação nas ruas. Maduro orienta a todos para que mantenham a calma e pede paz. Os bandos incitados por Capriles, além de toda a violência já relatada, buscam tomar escritórios regionais do CNE e Capriles chama uma marcha nacional em direção ao escritório central do CNE em Caracas para a quarta-feira, 17/04. Diante das mortes e ataques aos projetos sociais do governo, Maduro muda o tom e chama o povo às ruas para defender a revolução. Em muito maior número, os chavistas rapidamente impedem que os bandos opositores continuem seus ataques. As milícias populares motorizadas rompem barricadas com pneus queimados e retomam o controle das ruas. Maduro anuncia que o governo descobriu os planos de golpe da oposição, prendeu grupos de paramilitares colombianos e que não permitirá uma marcha da oposição em Caracas. Que se a oposição quisesse poderia questionar o resultado através dos meios legais. Maduro responsabiliza Capriles pelas mortes.
A Espanha que apoiava o pedido de recontagem dos votos volta atrás e reconhece o resultado das urnas. O mesmo faz a OEA. A União Europeia continua declarando que a recontagem é o melhor a se fazer, mas reconhece o resultado. Capriles vai à TV e embora siga exigindo a recontagem dos votos, diz que todos os protestos da oposição são pacíficos.
O presidente da Assembleia Nacional (parlamento unicameral nacional) Diosdado Cabello, forte representante da burocracia do PSUV, protagonizou um episódio esclarecedor na terça-feira, dia 16. Presidindo a seção do parlamento, para cada deputado que pedia para fazer uso da palavra, ele perguntava antes: “Reconhece o Estado Democrático de Direito da Venezuela, e o resultado apresentado pelo Conselho Nacional Eleitoral?”. Se não, ele não autorizava a falar e cortava o microfone. Assim foi como todos os deputados da oposição. Quando questionado por um deputado opositor que estava nervoso e agressivo, ameaçando, etc., Diosdado respondeu: “Olhem, deputados, lembrem que Chávez não está mais aqui entre nós. Chávez era quem podia controlar o povo. Ele era o único que poderia conter qualquer insanidade e loucura. Prestem atenção ao que estou dizendo. Ele não está aqui. Por isso, recomendo a vocês que entendam o que estão provocando. Não temos Chávez. Se vocês fizerem loucuras, terão a resposta na mesma altura, mas sem o Chávez para coordenar isso. Nós não teremos o controle e não podemos nos responsabilizar. É o povo na rua que vai derrubar vocês contra qualquer tentativa de golpe”.
Então os deputados da oposição se calaram e foram se reunir. Menos de duas horas depois, Capriles vai à TV e cancela a marcha a Caracas.
O que Diosdado Cabello falou procede e é o principal medo da burocracia do PSUV, que não quer a revolução, mas sim conciliar com a burguesia. O povo organizado nas ruas obriga o imperialismo e a burguesia a recuar e, por ora, suspender o golpe. Novamente o povo trabalhador venezuelano mostrou sua força e salvou a revolução. Entretanto, a pequena margem eleitoral faz com que a burguesia se sinta fortalecida e isso impõe uma necessidade maior de defesa da revolução.
Um outro setor da burguesia e do imperialismo não precisou do aviso do deputado e bom conselheiro Diosdado Cabello para entender isso tudo. Faz parte deste setor o COPEI que já havia declarado apoio a Maduro antes das eleições e todos aqueles que nos bastidores se esforçam para levar o governo do PSUV à conciliação com a burguesia. O resultado desse esforço podemos ver quando o The New York Times publica que Maduro “quer melhorar a relação com os EUA, regularizar a relação” e que “a Venezuela estaria disposta a reatar as conversações que tinham sido interrompidas”. No mesmo sentido Lula recomenda a Maduro que amplie o leque de alianças.
Claro está que ao fim e ao cabo o imperialismo busca combinar todo tipo de tática. Se conseguirem centralizar e unificar a burguesia venezuelana em torno da tática mais inteligente, que é a da conciliação de classes, a revolução estará correndo sério risco e será necessário aumentar a pressão da base para que Maduro não ceda.
Já o CNE acaba de ceder e decidiu fazer a recontagem de 100% dos votos. Este foi um grave erro político. Ceder à pressão da burguesia só irá fazê-la sentir-se mais forte para pressionar mais e mais. Eles matam 8 pessoas e queimam tudo o que vêem pela frente e o CNE atende ao pedido deles?
As tarefas na ordem do dia
A declaração de Lula à imprensa no dia 15 criticando a ingerência dos EUA nos assuntos internos da Venezuela foi um passo importante. Mas para ser coerente, Lula não deveria ter enviado tropas brasileiras ao Haiti, ou pelo menos deveria discutir com Dilma para que ela retirasse as tropas de lá. Lula também não deveria aconselhar Maduro a ampliar o leque de alianças. Ou ainda não deveria ter permitido o capital financeiro internacional ter mandado e desmandado no Brasil durante o seu governo – o que segue ocorrendo no governo Dilma. Mas, incoerências à parte, é importante que Lula faça essa crítica e defenda a soberania da Venezuela. Mas isso mesmo ainda não é suficiente. As direções do PT e da CUT deveriam convocar o movimento operário brasileiro a se levantar contra a ameaça de golpe na Venezuela, ameaçando parar fábricas no Brasil caso a vontade legítima do povo venezuelano fosse desrespeitada.
Diante dos ataques logo após as eleições e da descoberta dos planos do imperialismo de levar a cabo um golpe de Estado, Maduro respondeu dizendo que nacionalizaria e assumiria o controle dos setores energéticos e alimentícios, que vinham sendo alvo de sabotagem por parte da burguesia. Este é um passo muito importante, mas ainda não é suficiente. Enquanto os capitalistas detiverem o poder econômico na Venezuela, os ataques não cessarão. É preciso estatizar o setor financeiro, os bancos, toda a grande indústria, decretar o monopólio estatal do comércio exterior e planificar a economia sob controle dos trabalhadores. Só isso poderá resolver os problemas da economia que têm afligido os mais pobres e ao mesmo tempo tirar da burguesia o poder de continuar qualquer sabotagem.
O povo trabalhador revolucionário é a única força capaz de completar a revolução. A vanguarda revolucionária que está presente em cada bairro operário, em cada comunidade camponesa, fábrica e quartel militar necessita se organizar para defender as conquistas da revolução, para impedir o avanço da direita e discutir medidas de controle da economia e da produção contra a sabotagem feita pela burguesia. Ajudar neste processo é o objetivo dos marxistas do PSUV. E a melhor ajuda que podemos dar aqui do Brasil é construir as forças do marxismo aqui também. E isso só é possível com uma perspectiva internacionalista. Por isso ganha maior importância hoje a campanha internacional em solidariedade à revolução venezuelana “Tirem as Mãos da Venezuela”.
· Não ao golpe! Solidariedade internacional à revolução venezuelana!
· Na Venezuela, defender e eleição de Maduro nas ruas, fábricas, comunidades e quartéis!
· Nenhuma conciliação de classe ou aliança com a burguesia!
· Controle operário contra a sabotagem!
· Expropriação dos grandes meios de produção, dos bancos e das grandes propriedades de terra!
· Construir uma forte corrente marxista no interior do PSUV!
· A luta segue pelo Socialismo!
Comissão Executiva da Esquerda Marxista
19 de abril de 2013