Comemorando os 95 anos da Revolução Russa publicaremos, de 25 de outubro a 7 de novembro (data equivalente ao 25 de outubro no calendário russo), uma série de textos sobre essa revolução que mudou o mundo e abriu o caminho do futuro para todos os oprimidos e explorados. Iniciamos com um texto sobre a chegada de Lênin e as Teses de Abril que, adotadas pelo partido bolchevique, levaram à vitória da revolução proletária em 25 de outubro de 1917. Lênin foi decisivo para reorientar o partido e o artífice prático da insurreição foi León Trotsky.
Lênin chegou a Petrogrado em 3 de abril de 1917. Retornou logo após a revolução de fevereiro, que depôs o czar Nicolau II e entregou o poder à burguesia. Com a volta de Lênin, a revolução tomaria um rumo diverso, à esquerda do pretendido pelos membros do Governo Provisório e seus apoiadores, incluindo aqui a maioria da direção bolchevique.
Em março, até alguns dos dirigentes bolcheviques aceitavam o poder nas mãos da burguesia, para que esta instaurasse uma república parlamentar nos moldes ocidentais apenas sepultando o feudalismo reinante; mas o pensamento não era o mesmo na base operária do partido, que tivera um papel decisivo na insurreição de fevereiro e já havia entrado em choque com o novo governo em algumas ocasiões, percebendo a dualidade de poderes com a restauração dos Soviets e exigindo conquistas e avanços. Para eles era natural que a classe vitoriosa tomasse o poder. Como exemplo o comitê de Vyborg adotou uma resolução da necessidade de tomada de poder pelos Soviets, que dava indícios da disposição das camadas mais avançadas das massas operárias disciplinadas. Apenas careciam dos recursos teóricos para defender suas posições, mas estavam prontos a responder a um chamado.
Os bolcheviques achavam que era cedo para tomar o poder, uma vez que ainda não estavam realizadas todas as experiências da democracia burguesa. Temiam se isolarem com uma atitude vanguardista precipitada. O retorno de Kamenev e Stalin do exílio em março não ajudou. Eles afastaram a redação do Pravda, para eles ela estava muito à esquerda, orientaram o partido ainda mais à direita, declarando no Pravda seu apoio ao Governo provisório em 15 de março. Isso causou intensos protestos entre os militantes operários do bairro de Vyborg.
Pouco antes, em 6 de março, Lênin havia telegrafado de Estocolmo a Petrogrado, orientando: “Nossa táctica: desafio completo, nenhum apoio ao novo governo: desconfiemos de Kerensky armamento do proletariado – única garantia: eleições imediatas à Duma de Petrogrado; nenhuma aproximação com outros partidos”
Lênin havia percebido a urgência de agir já que havia se passado mais de um mês da revolução (em se tratando de revoluções é muito tempo) e apresentou no dia seguinte de sua chegada um programa breve e claro, que ficaria famoso como as “Teses de Abril”.
Naquele momento o governo mantinha a guerra imperialista com a desculpa da “defesa da revolução”, tese que mesmo os dirigentes bolcheviques não confrontaram. Lênin demonstrou que a tarefa dos bolcheviques era derrubar esse novo governo imperialista. Consciente de que não tinham ainda a maioria, evocou a necessidade de um trabalho de propaganda, onde explicassem pacientemente o caráter do novo governo e seus os interesses na manutenção da guerra: “Nós não queremos que as massas nos acreditem cegamente. (…) queremos que as massas se libertem pela experiência dos seus erros.” Lênin confiava nas massas e na possibilidade de que a tomada do poder na Rússia ergueria o proletariado europeu contra o imperialismo.
As teses causaram espanto nos outros partidos e colocou os demais bolcheviques contra Lênin. Em 08 de abril o Pravda declarava as teses inaceitáveis. Stalin e Kamenev não compreenderam que a aliança dos operários e camponeses conduziu a insurreição à vitória, já limitando o poder da burguesia com a recriação dos Soviets ainda em fevereiro.
A experiência precisava ser levada até o fim, estabelecendo a ditadura do proletariado, apoiada na aliança dos operários e camponeses. O que a revolução necessitava era um elo que ligasse uma análise marxista dos fatos aos ânimos e anseios das massas, e não aqueles que ajustavam os eventos à camisa de força dos dogmas.
A história encontrou esse elo em Lênin, que não criou o processo revolucionário (nascido das forças históricas objetivas), mas ao interpretá-lo corretamente, desafiou até os dirigentes do partido, numa batalha decisiva para a vitória. A ditadura do proletariado decorria da situação, uma vez que a revolução mal iniciara e já recuava, com a burguesia degenerando antes da vitória do seu regime, abrindo um vácuo, que em política é sempre ocupado, quer pelas forças da reação, quer pela vanguarda dos trabalhadores. Vencer abriria o caminho da revolução no ocidente e esta a impulsionaria na Rússia.
Mas era necessário romper definitivamente com a II Internacional e com a burguesia. Lênin soube com sabedoria elevar o ânimo das massas à insurreição e à tomada do poder. Muitas vezes ficou em minoria e disse que se necessário fosse romperia com a maioria para edificar o novo partido, o comunista.
Hoje, neste momento histórico convulsivo de crise internacional do capital e da direção do proletariado, a lição que devemos tirar da crise de abril é como a individualidade pode contribuir para acelerar os eventos do processo revolucionário, através do domínio do método dialético de análise e de sua conexão com as massas pela compreensão de seu movimento para apontar a política necessária. São essas as condições para responder à altura das tarefas históricas que se colocarão diante dos marxistas, cedo ou tarde.
Construir os quadros necessários e educados sob o marxismo, essa é a tarefa central dos militantes da Esquerda Marxista.