“Ao chegar a uma fase determinada de desenvolvimento, as forças materiais produtivas da sociedade entram em contradição com as relações de produção existentes ou, o que não é mais do que a expressão jurídica disto, com as relações de propriedade dentro das quais se desenvolveram até ali. De formas de desenvolvimento das forças produtivas, estas relações se convertem em suas travas, e se abre assim uma era de revolução social. Ao mudar a base econômica se transforma, mais ou menos rapidamente, toda a imensa superestrutura erigida sobre ela”
Karl Marx, Prólogo à Contribuição à Crítica da Economia Política
“A Crise Histórica da Humanidade se reduz à crise de sua direção revolucionária”
Leon Trotsky, O Programa de Transição
Reconstruindo a Memória Histórica
Faz 30 anos da explosão social de 27 de fevereiro de 1989, conhecida no imaginário coletivo como “El Caracazo”. A juventude e os trabalhadores que não abdicam de suas convicções e lutas por um mundo melhor devem estudar a história como uma fonte infinita de lições, sob pena de repetir os erros das gerações anteriores. A memória coletiva é um patrimônio que se deve tratar com cuidado e persistência em nossas organizações políticas. Essa sempre será uma tarefa militante indispensável no front ideológico. Daí a importância de voltarmos a olhar os acontecimentos de fevereiro e março de 1989. Não só para render tributo a todos os que caíram nas mãos do regime assassino de Carlos Andrés Pérez (CAP), como também para demonstrar que a crise na Venezuela não é nova, que já existia desde os anos 1980 e que as massas venezuelanas tentaram superá-la por meio de sua heroica intervenção apesar de não contar com uma direção política independente e com um programa que guiasse seus passos de forma correta.
Nenhuma formação social é permanente, assim como nada na natureza é eterno. A história da humanidade é impulsionada pelo desenvolvimento das forças produtivas. Quando estas se estancam, desatam-se as contradições, o tipo de sociedade que as albergava terminará desaparecendo mais cedo ou mais tarde. O velho e o novo entrarão em conflito até que um dos dois termine por se impor. Todo o século 20 foi um período de ebulição. As Guerras Mundiais, a Revolução Bolchevique de 1917, a Guerra Civil Espanhola, a Revolução Chinesa, os movimentos de independência do velho mundo colonial, o triunfo da guerrilha em Cuba e a experiência da Unidade Popular chilena são uma demonstração do impasse do capitalismo como sistema econômico. A Venezuela, em sua condição de exportadora de hidrocarboneto, não era alheia às flutuações que o planeta experimentava.
Hoje os meios de comunicação, os partidos mercenários, a academia burguesa, os padres e outras meretrizes a serviço dos opressores buscam apagar a memória dos oprimidos, aliená-los, entretê-los e dominá-los pelos meios mais econômicos possíveis. No entanto, na Venezuela a resistência do povo é à prova de balas. O Caracazo desmistificou toda uma série de crenças sobre os partidos tradicionais e seu controle aparente sobre as massas. Uma vez levantadas as massas, a correlação de forças mudou substancialmente, provocando de forma inexorável a morte do regime Puntofijista. As massas, apesar de não muito esclarecidas sobre o que queriam, sabiam muito bem sobre o que já estavam fartas. Sua consciência, sua capacidade de luta, seu papel imprescindível na transformação radical do país ficaram demonstrados, embora hoje os burocratas furtivos e os políticos demagogos neguem, em benefício próprio, a absoluta possibilidade de que os de baixo, as pessoas comuns, os trabalhadores, tomem as rédeas de seu destino em suas próprias mãos.
Da Venezuela “Saudita” à endividada…
A história pode conhecer todo tipo de transformações. Entre os anos 1970 e 1980 do século 20, a Venezuela passou de um boom petrolífero descomunal ao esgotamento trágico de seu modelo rentista. Logo os efeitos do endividamento gigantesco e da queda da receita petrolífera afetariam significativamente a qualidade de vida da população venezuelana. Na sexta-feira de 14 de fevereiro de 1984, o governo de Luis Herrera Camping (LHC) adotou medidas neoliberais para desacelerar a economia. Iria impor um novo controle cambial e aplicar uma desvalorização monetária de 74%. A época dourada do Puntofijismo, tão desejada pelos Adecos e Copeyanos atuais, chegava ao seu fim. Os venezuelanos sofreriam uma rápida degradação em sua qualidade de vida. A ruína apareceu como um espectro na vida da classe média ou da pequena burguesia venezuelana. Enquanto nos setores populares, os níveis de pobreza cresceram de forma alarmante. Os protestos e suas consequentes repressões se tornaram algo rotineiro na confrontação política do país. Os níveis inflacionários e a fuga de capitais pressionavam a economia venezuelana de forma esmagadora.
Dessa forma surgiu na subjetividade dos setores populares a rejeição às elites políticas e econômicas do Pacto de Puntofijo. A bonança da “Venezuela saudita” criou um crescimento artificial. À margem das grandes obras de infraestrutura construídas nesse período, supostos baluartes modernizadores, cresciam a marginalidade e a pobreza típicas do subdesenvolvimento. As profundas desigualdades se expressariam na acumulação de riquezas em cada vez menos mãos, enquanto a pobreza era socializada em ritmo vertiginoso. A situação imperante no final dos anos 1980 é assinalada por Maza Zavala nos seguintes termos:
“Aumentou o índice da pobreza crítica, que se estima em 35%, e o da pobreza em geral que se estima em 75%. O outro lado da moeda é a maior concentração da riqueza e da renda: o aumento do bem-estar da minoria da população que não passa de 20%; dentro da qual a camada absolutamente privilegiada não chega sequer a 5% da população”.
Dessa forma era inevitável que se incubasse um profundo ódio de classe nos setores mais depauperados da sociedade venezuelana, um ódio acumulado que mais cedo ou mais tarde explodiria. Os moradores dos bairros eram violentados pela polícia metropolitana, submetidos a todo tipo de privações, enganados mais de uma vez pelas promessas desmedidas dos governos em vigor.
No entanto, nos anos anteriores à crise da década de 1980, diversas conjunturas favoráveis no mercado de hidrocarbonetos, entre as quais se destacam as elevadas receitas fiscais do boom petrolífero de 1974, criaram uma melhoria sustentada nas condições de vida do povo trabalhador. Essas concessões, cedidas em tempos de florescimento econômico, permitiriam que Ação Democrática (AD) e COPEI monopolizassem o poder político do país sob uma relativa estabilidade.
Antes de 1974, o Puntofijismo destinou ao Estado o papel de agente distribuidor da renda petrolífera por vias orçamentárias, ademais de lhe reservar o monopólio legal da violência, da coerção e da repressão, como todo tipo de Estado. Seu papel em matéria produtiva era bastante limitado. O gasto público se orientava fundamentalmente às atividades dirigidas à reprodução da força de trabalho, ao fomento do setor privado com proteções, créditos, obras de infraestrutura e o fornecimento de certos insumos abaixo do custo de produção.
Com a primeira chegada de CAP ao poder, seria posto em marcha um gigantesco plano de investimento nas indústrias básicas conhecido como “A Grande Venezuela”. O também chamado “Plano Tinoco” era o projeto “desenvolvimentista” da famosa burguesia emergente, um setor não-tradicional da classe dominante venezuelana. Sua missão, aparentemente, consistia em abandonar a velha distribuição rentista do petróleo para dar um caráter reprodutivo e exportador à economia venezuelana, redimensionando o papel do estado burguês e reinserindo nossa produção nos circuitos do capitalismo mundial. As enormes receitas petrolíferas e a capacidade de endividamento que a Venezuela possuía naquele momento brindaram a este esforço “desenvolvimentista” a base financeira necessária para tentar dirigi-lo a porto seguro.
Para satisfazer o apetite voraz da burguesia emergente, CAP reduziu o gasto público para reorientar as receitas estatais à execução do plano. Em termos trabalhistas foram aplicados decretos e medidas legais para reprimir o movimento dos trabalhadores e as organizações sindicais independentes da CTV Adeca. Já naquele momento amplos setores da população qualificavam as políticas dessa nova administração como “antinacionais” e “antipopulares”, dados os grandes benefícios que as transnacionais acumulavam com as boas indenizações que receberam e com o controle que ainda mantinham da comercialização do petróleo bruto venezuelano. Tudo isso depois da suposta “nacionalização” do petróleo.
Apesar de tudo isso, o projeto da “Grande Venezuela” terminou no fracasso mais rotundo. Não encontraremos sua derrota no campo econômico, pois seus resultados em termos quantitativos foram mais que favoráveis. O revés se originou na luta política suscitada por este projeto no próprio seio da classe dominante. A velha e parasitária burguesia temia perder sua hegemonia histórica diante dos avanços da burguesia emergente, organizada no grupo dos 12 Apóstolos [*]. Inclusive a própria estrutura econômica e política herdada do Pacto de Puntofijo estava em jogo pelas reformas meritocráticas e empresariais colocadas por Tinoco. Por esta razão, o conservadorismo adeco-copeyano, em aliança com a burguesia rentista, defendeu candidatos para as eleições presidenciais de 1978 que prometeram o desmantelamento desse megaprojeto, como efetivamente aconteceu.
Este fato demonstra a natureza reacionária da burguesia venezuelana. Este grupo de empresários e comerciantes são trapaceiros de colarinhos brancos. Sempre sugando a renda para obter o máximo possível de lucros. Sempre temerosos da menor mudança, mesmo que essa se coloque em linhas capitalistas. Como foi o caso da agenda na Venezuela. Desprende-se desse fato a incapacidade absoluta de condução de um processo de diversificação industrial, contando-os como principais “motores” produtivos. Longe disso, o que representam é um freio absoluto ao desenvolvimento nacional. A evolução da burguesia venezuelana refuta mil e uma vezes a tese dos “empresários patriotas”, tão apreciada pelo reformismo de esquerda nos últimos tempos.
No entanto, o mal já estava feito, o caráter superlativo dos investimentos realizados nesse período superou a capacidade de poupança do estado venezuelano. O endividamento seria inevitável e suas consequências futuras determinantes para o futuro do regime Puntofijista. Uma expressão do último seria a frase de LHC em sua posse: “Recebo um país hipotecado”. O princípio do fim estava próximo, como veremos mais adiante, a paciência das massas venezuelanas seria posta à prova.
Como mencionamos antes, a presidência de LHC se dedicou a “esfriar” a economia com políticas recessivas. Este ajuste, longe de resolver o problema subjacente, o piorou, com consequências desastrosas para o desenvolvimento industrial do país e para as exportações não-petrolíferas.
“A partir de uma perspectiva macroeconômica, a estratégia gerou efeitos recessivos, mas não corrigiu a indisciplina fiscal nem restabeleceu uma política monetária saudável, de modo que não deteve a inflação; a partir de um ponto de vista produtivo, ela gerou um ‘esfriamento’ exagerado da economia que deu início a uma desindustrialização prematura da mesma e a um processo de destruição de capacidades que conduziu a uma queda próxima aos 30% da produtividade nas atividades não-petrolíferas” [1]
A dívida pública externa de 1984 superou os 126 bilhões de bolívares. A descapitalização monetária aplicada pelo governo como saída “anti-inflacionária” provocou uma fuga de divisas da ordem de 25 bilhões de dólares, entre 1978 e 1983.
A partir desse momento, a instabilidade social ascenderia. De fato, a aplicação do Ajuste Macroeconômico do governo de LHC não foi uma tarefa fácil, embora contasse com a cumplicidade da CTV e de boa parte da esquerda. No início dos anos 1980, o movimento popular continuou a se mover, ganhando experiência, demonstrando suas forças e limitações.
“O triunfo de Luis Herrera não deteve a ascensão das lutas, sendo seu ponto mais importante outubro de 1979, com uma das maiores mobilizações operárias ocorridas em Caracas, que terminou em um forte confronto com a polícia, e que se repetiu em várias cidades do país, e logo se seguiram greves regionais, que terminaram por impor ao governo recém-empossado uma Lei Geral de Aumento Salarial. Este período de mobilizações, com várias vitórias importantes, se encerrou nos anos 1980-81, quando o governo conseguiu impor sua política econômica, graças à atitude entreguista da esquerda e da burocracia sindical, que fizeram coro ao discurso de ‘crise’ e de ‘sacrifício necessário’ que o governo pronunciava. Por um lado, o governo e a patronal impuseram demissões, a liberação de preços, o congelamento salarial e, por outro, as quadrilhas armadas da burocracia sindical intervieram e desmantelaram as lideranças sindicais não-disciplinadas pela CTV. A derrota da greve geral têxtil em 1980, a imposição do orçamento equilibrado, que quebrou a greve nacional universitária, e a intervenção Adeca (com o apoio de COPEI) à diretiva de SUTISS, em 1981, encerraram o período de lutas iniciado na década dos anos 1970.
A partir daí, os planos econômicos da burguesia venezuelana encontraram muito pouca resistência. O nível de vida do venezuelano foi se reduzindo enquanto desapareciam praticamente as organizações sindicais classistas, a esquerda reformista se acomodou ao jogo parlamentar e o movimento estudantil submergiu no limbo sob a direção do MAS, MIR e PCV, que formava parte orgânica das políticas e dos planos das autoridades universitárias” [2]
Para o Marxismo, uma das principais leis da dialética materialista é que a soma quantitativa de elementos termina por provocar mudanças qualitativas. Com uma dívida externa consideravelmente alta, uma escalada inflacionária incontrolável e um processo de recessão cada vez maior, as relações de produção estabelecidas pelo débil capitalismo venezuelano terminariam rebeladas contra o velho aparato Puntofijista. Sua base rentista-clientelista estava esgotada. As sucessivas manifestações populares dos estudantes universitários, da classe trabalhadora, significavam um reflexo fiel disso. Abria-se um longo período de crise e revolução que até hoje não superamos. Os protestos dos anos 1980, o progressivo desabastecimento de produtos básicos, a repressão dos órgãos de segurança, a corrupção, acumulariam um mal-estar de tal magnitude que despertariam um gigante adormecido sob a superfície da sociedade.
“O Beijo da Morte do FMI”
Com o governo de Jaime Lusinchi (JL), a crise social continuaria se desenvolvendo. Os hospitais e a educação padeciam com a falta de alocações orçamentárias. Mas a burguesia não tinha problemas, era financiada com créditos e dólares preferenciais. Sob a consigna “A Venezuela pagará tudo o que deve, até o último centavo”, 50% das receitas petrolíferas eram dirigidos ao pagamento da dívida contraída com os organismos multilaterais. Era de tal ordem a instrumentalização do Estado nas mãos das elites, que ele assumiu o financiamento da dívida externa privada. Na prática, a classe trabalhadora era que, em última instância, assumia o pagamento da dívida de um grupo de empresários, comerciantes e banqueiros vinculados ao governo. No entanto, por mais bondosos que resultasse ser o governo de Lusinchi com os empresários, os investimentos privados começam a diminuir nessa administração (1984-1985: 2,19%; 1985-1986: 6,34%).
A censura aos meios de comunicação aumentou e os casos de corrupção chegaram a níveis escandalosos, como, mais tarde, ficaria claro no caso dos “peixes gordos” de RECADI. Paralelamente, as lutas populares se espalhavam, passando dos estudantes e trabalhadores a setores da classe média:
“Mas foi só em fevereiro de 1987 que o triunfo da greve de professores marcou o caminho dos enfrentamentos aos planos econômicos de Lusinchi. Foi a primeira greve nacional desde 1980, quando da greve nacional têxtil, com a incorporação em massa de 230.000 trabalhadores da educação pré-escolar, primária e média. Manteve-se durante 17 dias e arrancou as reivindicações mais importantes levantadas durante a greve.
As primeiras lutas fizeram retroceder parcialmente o governo, que decretou o ‘Bônus Compensatório’ para recuperar, em parte, o poder aquisitivo da população e para conjurar o crescente mal-estar social. Mas os próprios empresários se negaram a cumprir o decreto, o que gerou novos conflitos em inumeráveis fábricas manufatureiras do centro do país e que mobilizou, pela primeira vez em muitos anos, o trabalhador petroleiro. O governo viu-se obrigado a cancelar o pagamento do bônus e, mais tarde, a reconhecê-lo como parte do salário; mesmo assim, muitas empresas pequenas continuaram se negando a cancelá-lo. No entanto, estas lutas episódicas foram isoladas” [3]
De todos estes fatos se destacam: o Março Natalino (1987) e o massacre de Amparo (1988). Estes acontecimentos demonstravam a intensidade da repressão assassina do governo, a corrupção inerente ao regime Puntofijista e o caráter cada vez mais insurrecional que a luta de classes assumia na Venezuela.
No auge de sua popularidade, chega CAP pela segunda vez ao poder com a promessa de corrigir os desequilíbrios macroeconômicos palpáveis no sistema. Tudo isso em meio a uma situação cada vez mais inflamável, de desabastecimento e de preços altos dos produtos básicos. Isso contrastava com as bonanças de seu primeiro governo. As reservas internacionais baixaram a tal ponto que, em 1985, as reservas operativas se encontravam em 300 milhões de dólares.
A realidade social de então se diferenciava ironicamente da faustosa e luxuosa tomada de posse no Teresa Carreño. Toda a mídia internacional e os presidentes que compareceram à cerimônia (entre eles se destacavam Fidel Castro e Daniel Ortega) elogiavam o presidente como o homem que salvaria a Venezuela da catástrofe iminente. Em seu discurso de posse, CAP persistia em se mostrar como um líder do “Terceiro Mundo”, falou demagogicamente sobre a queda salarial, o autoritarismo do FMI e a necessidade de aplicar políticas que fortalecessem a economia.
Não obstante, o que CAP preparava era uma verdadeira bomba contra os interesses da classe trabalhadora e dos Barrios venezuelanos. Usando as mesmas fórmulas aplicadas em vários países da América Latina, foram estabelecidas medidas de ajuste macroeconômicas de procedência do FMI, que perseguiam uma maior intervenção do setor privado na economia, a redução do consumo interno e o aumento das exportações. Tudo isso à custa do sacrifício da cada vez mais arruinada qualidade de vida do povo. Este conjunto de medidas foi conhecido popularmente com o nome de “Paquetazo”. Teriam um caráter de choque agressivo. As medidas teriam aplicação progressiva, mas em períodos de tempo quase imediatos.
As decisões econômicas, anunciadas pelo próprio presidente em 16 de fevereiro, incidiam no âmbito fiscal, na dívida externa, no sistema financeiro, no comércio exterior, na política cambial e no gasto público. A seguir, as mais destacáveis:
Em matéria financeira, foi prevista a assinatura de uma “Carta de Intenções” com os organismos multilaterais, com a finalidade de aumentar a dívida venezuelana. Solicitava-se um montante de 4,5 bilhões de dólares. As empresas não-estratégicas nas mãos do Estado seriam privatizadas. Também seriam liberadas as taxas de juros ativas e passivas de todo o sistema financeiro, até 30%.
Foi decidida uma unificação cambial com a eliminação da taxa de câmbio preferencial. A taxa de câmbio passaria a ser determinada no mercado livre de divisas e a realização de todas as transações com o exterior seria na nova taxa flutuante.
Os comerciantes tampouco sairiam prejudicados. Quanto ao mercado interno, decidiu-se pela liberação de todos os produtos com exceção de 18 itens da cesta básica. Os serviços públicos, como telefonia, água, eletricidade, transporte público e gás doméstico, sofreriam um aumento gradual em suas tarifas. Isto também seria obrigatório para os produtos derivados do petróleo, com um aumento inicial da gasolina de 100%.
A burguesia parasitária ganharia concessões em todos os terrenos. No comércio exterior, por exemplo, as tarifas de importação seriam progressivamente eliminadas, deixando-se a indústria interna em total desamparo.
A natureza autoritária e excessiva destas medidas gerou mal-estar em diferentes tendências políticas naquele momento. Alguns partidários de COPEI mostraram seu desacordo com o ajuste de CAP, alegando os impactos que poderia ocasionar sobre a população. O CEN de AD, mais alarmados pelas próximas eleições regionais, também expressaria sua preocupação com o capital político em risco. A esquerda reformista, representada no MAS, pensava que as medidas excessivas eram um disparate; no entanto, também pensava que eram necessárias.
CAP e seus epígonos falavam repetidamente da necessidade de se fazer sacrifícios, que era o momento de ajustar os cinturões por um amanhã melhor. Pediam compreensão e serenidade. Mas esses sacrifícios tinham que ser realizados pelos setores populares, eram eles que teriam que passar fome, privações, violência, necessidade, enquanto que os setores acomodados continuariam mais ricos a cada dia. Do CAP retórico e crítico da campanha eleitoral não restava mais nada.
As medidas começariam a ser aplicadas de forma imediata. A partir de 26 de fevereiro se tornaria efetivo o aumento da gasolina com uma subida generalizada nas tarifas do transporte público. No terminal em ruínas de Guarenas irromperia o relâmpago que incendiaria todo o bosque.
El Caracazo ou Tomando “Caracas” por assalto
Os eventos de 27 e 28 de outubro são conhecidos como El Caracazo, devido a sua magnitude arrasadora na cidade de Caracas, mas seu foco inicial foi na cidade-dormitório de Guarenas. Tudo começou com o grêmio das empresas transportadoras. Estas não ficaram satisfeitas com o aumento de 30% das passagens decretado pelo governo. Alegavam que era insuficiente para cobrir os aumentos dos custos da elevação dos preços da gasolina, do aumento dos preços das peças de reposição e serviços automotrizes. De forma que as transportadoras procederam a um aumento arbitrário de 100% das tarifas, desconsiderando, além disso, o benefício da passagem estudantil.
Este movimento seria a faísca do detonador. Os usuários, zangados, negavam-se a pagar mais do que o governo havia aprovado, considerando que esse montante já era demasiado elevado. As transportadoras ameaçavam as pessoas com a expulsão das unidades ou a não lhes prestar o serviço se não pagassem o montante aprovado pelo grêmio que, segundo eles, contava com o respaldo do ministério dos transportes. As tensões foram se acumulando e derivando em protestos violentos. Os usuários responderiam com incêndios de unidades de transporte público e bloqueios de rua. A situação desbordou ante os olhos impotentes dos efetivos de segurança. 20 ônibus seriam queimados somente nos distúrbios de Guarenas.
Logo o movimento se espalharia às cidades mais importantes do país, principalmente nos setores populares da cidade de Caracas, Caricuao, Nuevo Circo, La Hoyada, Catia, 23 de Enero e El Valle. No interior do país, a fagulha também se espalhava: Maracay, Valencia, Barquisimeto, Mérida, Barcelona e cidade Guayana. As bases do regime Puntofijista começariam a tremer. Muito em breve as ruas de Caracas seriam ganhas pelo povo.
As situações revolucionárias não são o fruto maduro da consciência do povo. Tal coisa não pode existir, salvo na cabeça dos reformistas e nos preconceitos da pequena burguesia. O pensamento humano é muito conservador e, em seu íntimo, tende a uma forte rejeição ao que é novo, o medo às mudanças o mantém preso apenas naquilo que conhece. Mesmo quando a cultura, as ciências, as artes, a produção e a técnica estão muito avançadas, os seres humanos tendem a estar muito na zaga desses desenvolvimentos. Somente em momentos de profunda crise, instabilidade, perda material, incerteza, conflitos de alta intensidade, somos capazes de cancelar a letargia e de questionar tudo aquilo que até ontem considerávamos como algo natural, rígido e imutável.
“À vista de acontecimentos desta natureza contemplamos verdadeiramente com nossos olhos como a insurreição de todo um povo (…) vai amadurecendo não só como ideia nas mentes (…) mas também como o passo seguinte, inevitável e praticamente inevitável do próprio movimento, resultado da crescente indignação” (Lenin)
Em Caracas, os acontecimentos explodiriam em torno do terminal de Nuevo Circo, neste caso com protestos estudantis em defesa da passagem estudantil. As pessoas, pouco a pouco, foram se unindo. Logo as avenidas Lecuna, Bolívar e Parque Central seriam tomadas por jovens, estudantes, trabalhadores e moradores dos bairros adjacentes. Gritavam consignas contra “El Paquetazo Hambreador” e se pedia aos agentes de segurança para não atacar aos seus irmãos de classe.
“Às 4:30 p.m. começaram os incêndios de pneus e ônibus que serviam de barricadas nas avenidas Bolívar, Fuerzas Armadas, Lecuna, Sucre, Praça O’Leary, La Hoyada, Catia, 23 de Enero, em todo o casco central, Chacaíto e Petare (…) Logo começaram os disparos (…) falou-se de vários mortos. Mas a polícia, que evidentemente não controlava a situação também ficou incapacitada para informar com detalhes; a única coisa que respondia quando era consultada era que a situação estava crítica em toda a cidade”.
(El Nacional, 29/02/89)
“Depois da primeira surpresa, o pânico e a incompreensão do que se havia desatado foi criando uma paralisia progressiva em todas as instituições do regime. Nem os sindicatos Adecos, a CTV, a Igreja, o Congresso, nem nenhum dos partidos do Parlamento, de direita ou de esquerda, estavam conectados à rua, nem eram capazes de liderar o processo. E menos ainda de controlá-lo. As milhares de chamadas que solicitavam informação terminaram saturando as linhas telefônicas, criando um caos semelhante ao que, no tráfego de Caracas, os protestos estavam criando” [4]
As manifestações pacíficas deram lugar a saques em massa e à destruição de locais de abastecimento, desde pequenas lojas até supermercados. Na grande maioria desses locais se encontravam açambarcados os produtos da dieta do venezuelano, que não podiam obter nas prateleiras: leite, açúcar, café, farinha, macarrão, entre outros. Os Barrios começaram a descer de forma incontrolável. Não assaltavam joalharias, bancos ou casas de câmbio, sua atenção estava dirigida para as lojas de alimentos, roupa, calçados, eletrodomésticos, linha branca, móveis, entre outros. Buscavam satisfazer, dessa forma, o seu direito à qualidade de vida, que por tanto tempo lhe foi negado. O povo saiu para recuperar o que os expropriadores de sua força de trabalho lhe haviam tomado. Agora, o povo, esse populacho desalmado que não deixava pedra sobre pedra, era o expropriador de seus açambarcadores. Só o moralismo pequeno-burguês pode se indignar com esses fatos.
“Aos conservadores a revolução parece um estado de demência coletiva, apenas porque exalta até o máximo a ‘loucura normal’ das contradições sociais. Há muitos que se negam a reconhecer o seu retrato se lhes for apresentada uma caricatura atrevida. Todo o processo social moderno nutre, intensifica, agudiza até o intolerável as contradições e assim se vai gestando, pouco a pouco uma situação em que a maioria ‘se torna louca’. Em tais transes, costuma ser a maioria insana quem coloca a camisa de força na minoria que não perdeu sua sanidade. É assim como avança a história” [5]
Muito cedo a polícia foi superada pela força deste movimento espontâneo. Todo o lixo ideológico introduzido pela classe dominante: subordinação, disciplina, manutenção da ordem, começou a rachar ante a empatia sentida por muitos funcionários com os manifestantes, visto que conheciam na própria carne a situação venezuelana – afinal, tratava-se de gente do povo “em uniforme”. É importante ressaltar que os policiais, em sua dupla situação de garantidores da ordem e de assalariados, sofriam atrasos em seus pagamentos. Evidentemente, a escalada inflacionária também impactava negativamente em suas condições de vida.
Inclusive existiram casos de policiais que ajudavam estabelecendo algum tipo de ordem nos saques. Permitiam que crianças, mulheres e homens entrassem nos locais para tomar as mercadorias que necessitassem, mas com ordem e calma.
“A vacilação das tropas, que, na realidade, é um fato inevitável na presença de todo movimento verdadeiramente popular, conduz ao aguçamento da luta revolucionária, a uma verdadeira luta para se ganhar o exército” V.I. Lenin
Não obstante, salvo algumas demonstrações iniciais de afinidade de alguns efetivos, o grosso dos policiais e militares responderam com fogo aos manifestantes. Não basta ter uma origem de classe para que a polícia e os militares deponham as armas ou que apontem os fuzis contra os opressores, também é necessário que a classe trabalhadora demonstre sua capacidade orgânica para conduzir a luta e vencer.
A repressão começa na tarde de 27 de fevereiro. Cai a primeira vítima no Parque Central. Trata-se de Yulimar Reyes, uma estudante de letras da universidade central da Venezuela. Estas ações não intimidaram o movimento, espalhou-o como a gasolina espalha o fogo. De todos os lados voavam garrafas e pedras, que eram lançadas contra a polícia. Logo esta se encontrava isolada e abandonada por seus comandantes, o recuo era iminente.
As massas, eufóricas por este triunfo momentâneo, arrasariam com os saques. Todos os órgãos de segurança do Estado estavam sob o mais absoluto desconcerto. DISIP, PTJ, Guarda Nacional, PM, paralisados, desapareciam de cena momentaneamente, alguns poucos se mantinham nela ao lado da insurreição.
Uma insurreição sem direção política
Superados os limites da institucionalidade Puntofijista, as massas tinham até certo ponto o controle sobre o terreno. Em 28 de fevereiro, nem as instituições políticas nem os órgãos de repressão foram capazes de estabelecer a ordem, encontravam-se paralisados. Era tal a divisão e a perplexidade da classe dominante que CAP diria uma vez passada a tormenta: “Foi uma ação dos pobres contra os ricos e não contra o governo”. Não obstante, nem os patrões, representados por FEDECAMARAS, nem o governo se responsabilizavam pelo sucedido.
“Parece-nos que o que realmente desorganiza o governo são aqueles e somente aqueles casos em que as amplas massas verdadeiramente organizadas pela própria luta fazem com que o governo se desconcerte, em que as pessoas da rua compreendem a legitimidade das reivindicações apresentadas (…) em que começam a compreendê-la inclusive uma parte das tropas chamadas para ‘pacificar’ (…) em que as ações de guerra contra dezenas de milhares de pessoas do povo vão precedidas de vacilações das autoridades, que não dispõem de qualquer possibilidade real para saber aonde conduzirão aquelas ações militares, em que a massa vê e sente, nos que caem no campo de batalha, a seus irmãos e camaradas e acumulam novas reservas de ódio e anseia por novos e decisivos encontros com o inimigo. Aqui já não é um rufião determinado, mas todo o regime vigente que aparece como inimigo do povo, contra o qual se levantam armados com todas as suas armas, autoridades locais, policiais, as tropas, para não se falar da gendarmaria e dos tribunais, que, como sempre, complementam e coroam toda insurreição popular” V.I. Lenin
As ruas pertenciam a Los Barrios. O questionamento do poder estava na mesa. Lamentavelmente não estavam conscientes disso. A espontaneidade dessa insurreição também era uma de suas grandes debilidades. Nenhum dos centros do poder foi tomado pelo povo, nem existiam as estruturas de governo autônomo ao estilo dos sovietes. Os órgãos de comando com os quais se poderia substituir a velha estrutura Puntofijista não existiam. Os insurretos não contavam com um programa nem com a vontade de poder necessários para converter a insurreição em uma revolução.
Por seu lado, os partidos de esquerda tradicionais, em vez de aproveitar a situação objetiva para conduzir as massas à tomada do poder, estavam completamente desligados delas. Acomodados à luta parlamentar pediam ordem, calma, sossego e a volta aos princípios da democracia, mas da democracia burguesa, claro está. O MAS solicitava um pacote de medidas gradualistas, que fosse em consenso e com o menor impacto possível sobre a população. Para eles, não se tratava de cancelar o pagamento da dívida, mas de reestruturá-la. Tampouco Causa R se opôs consequentemente às medidas de CAP e quase chegaram a repudiar as ações violentas da população contra os comerciantes e proprietários.
A natureza abomina o vazio. Na ausência de uma direção clara e consequente com os interesses da classe trabalhadora, que aproveitasse a vitória momentânea para passar à tomada do poder, a direção da insurreição foi assumida espontaneamente pelos bairros de Caracas, que desdobraram toda a sua força em saques e distúrbios.
Em meio à paralisia das instituições do regime democrático-burguês, a insurreição não mostrou determinação suficiente para demolir a maquinaria governamental do estado. Se tivesse procedido dessa forma, teríamos assistido a uma revolução. Para isso, teria sido necessário que o vazio de poder existente fosse ocupado por instituições revolucionárias submetidas à democracia operária, com absoluta legitimidade entre as massas. Mas tais organizações não existiam nem, tampouco, havia uma direção que, de forma consciente, oferecesse uma orientação às massas nesse sentido. A insurreição conseguiu paralisar o regime e deixá-lo ferido de morte – um de seus maiores méritos – mas não concluiu sua liquidação. Assim foram as coisas e era uma questão de tempo para que o inimigo de classe se recuperasse, curasse suas feridas e levantasse a cabeça.
O Genocídio
Quando os protestos nas cidades do interior do país foram sufocados, o governo concentrou todo o seu esforço em dobrar a insurreição na capital. Quando as condições o permitiram, mandaram reforços para Caracas. 4.000 soldados de infantaria foram enviados para apoiar a polícia metropolitana.
Em 28 de fevereiro, o governo de CAP passa à ofensiva anunciando a suspensão das garantias e um toque de recolher. O regime colocaria em marcha o plano Ávila, declarando uma guerra de morte contra o povo revolto. Os organismos envolvidos na repressão: GN, PM, PTJ, DISIP e o Exército, iriam exercer uma violência desmedida. As cifras oficiais de mortos especificavam 300 pessoas. No entanto, as estimativas não-oficiais falam de cifras muito mais elevadas: afirmam que 2.000 pessoas foram abatidas pelos corpos de segurança do Estado ou em incidentes relacionados à repressão.
A partir de agora, o ânimo “democrático” do Puntofijismo ficaria evidenciado. Os bairros foram submetidos brutalmente com rifles e armas automáticas. As bordas das colinas foram tomados pelas unidades militares para abrir fogo indiscriminado contra tudo o que se movesse. Dezenas de vítimas morreram, muitas delas por não poderem chegar aos centros de atenção médica face ao bloqueio das forças de segurança.
Os blocos do bairro 23 de Enero foram varridos por rajadas de fogo de metralhadoras calibre ponto 50. Mães e crianças morriam dentro de suas casas por balas perdidas. A magnitude da repressão foi verdadeiramente sádica. Gente que se entregava era executada no local. Feridos eram pegos para em seguida fazê-los correr e serem atingidos pelas costas. Ocorreram detenções arbitrárias e invasões forçadas. Os bairros estavam pagando com sangue a ousadia de olhar adiante e buscar uma vida significativa, digna e com razões suficientes para valorizar.
As aulas foram suspensas pelo ministério da educação, o absenteísmo trabalhista chegou a 80% e o sistema de transporte público só funcionava pela metade. Caracas estava estremecida de cima abaixo.
Em 1 de março, CAP anuncia a aplicação do pacote e no dia 7 do mesmo mês decide ordenar ao ministro da Defesa, Ítalo del Valle Alliegro, o fim do toque de recolher. A reação terminaria se impondo sobre a insurreição. No entanto, tudo havia mudado a partir de agora. Melhor preparado militarmente, com recursos econômicos e meios de comunicação a sua disposição, o governo de CAP superaria este acontecimento inesperado. Mas saber encaixar as derrotas também é vencer. Os bairros derrubaram mitos. Os pobres se deram conta de tudo o que podiam fazer quando os de baixo se põem em movimento. O sacrifício de centenas de caídos não seria em vão; toda a sociedade venezuelana, incluindo os quartéis, foram abalados por estes acontecimentos. A correlação de forças mudou e a partir de então acompanharia as massas venezuelanas em seu anseio de transformação social. Dez anos depois desses acontecimentos, a revolução bolivariana despojou do poder político os velhos representantes do Puntofijismo e abriria a possibilidade de uma superação radical do atrasado capitalismo venezuelano.
Hoje, esta história não terminou. A revolução bolivariana ficou pela metade e com isso desatou suas contradições. Se desejarmos salvá-la, estamos proibidos de esquecer. O debate sobre o sucedido em 27 de fevereiro de 1989 continua vigente, porque os velhos problemas continuam sem solução.
Honra e glória aos Caídos!
Nem um minuto de silêncio. Toda uma vida de combate!
Une-te à Corrente Lucha de Clases** e reconstruamos a memória histórica!
Notas:
* A burguesia emergente ou o Grupo dos 12 Apóstolos estava formada por: Pedro Tinoco, Arturo Briceño, Siro Febres Cordero, Edgar Espejo, Enrique Delfino, Gustavo Cisneros, Julio Pocattera, Jesús Muchacho Bertoni, Concepción Quijada, Anibal Santeliz, Ignacio Moreno, Gumersindo Rodrígues, Armando Tamayo Suarez, Carmelo Lauria, Diego Arria Salicetti e Luís Jigo Amador.
** A Corrente Lucha de Clases é a seção venezuelana da Corrente Marxista Internacional (CMI), da qual a Esquerda Marxista é a seção brasileira.
- Corrales Werner, “Venezuela, Vértigo y futuro”. Año 2018
- Colmenarez Elio, “La Insurrección de Febrero, un análisis para la lucha revolucionaria” Ediciones la Chispa. Caracas , 1989.
- Ibidem
- Ibidem
- Trotsky Leon, “Mi vida”. Fundación Federico Engels. 2010
Tradução de Fabiano Leite.