Entrevista com Karl Belin, jovem trabalhador marxista dos EUA

João Diego Leite entrevistou o jovem torneiro mecânico norte-americano que luta pela construção de um partido dos trabalhadores em seu país e pela revolução socialista mundial.

João Diego Leite entrevistou o jovem torneiro mecânico norte-americano que luta pela construção de um partido dos trabalhadores em seu país e pela revolução socialista mundial.

Segundo pesquisas do Election Board (1), a proporção de pessoas entre 18 e 29 anos que votaram em eleições caiu de 51% em 2008, ano que viu a chegada de Obama na Casa Branca, para 23% em 2010.  Essa desilusão parece não ser só com Obama, mas com os governos e com as instituições burguesas, afinal o partido republicano não ganhou maior apoio.

Normalmente as eleições intermediárias tendem a ter uma menor resposta, de modo que essas cifras podem cair. A eleição presidencial de 2008 foi muito maior do que o normal. Mas sim, há uma clara decepção e nós entendemos que é uma decepção geral com as instituições e partidos burgueses. Isto tem sido claramente falado por muitas pessoas. Obama ainda é o alvo dessa insatisfação. No entanto, há uma pesquisa feita pela Rasmussen Poll em torno de 2009 que indicou que pessoas com idade abaixo dos 30 anos estavam divididas em três partes: 1/3 apoiando o capitalismo, 1/3 apoiando o socialismo e 1/3 de indecisos. Esta é outra clara indicação de uma crescente decepção e busca de alternativas.

Essa perda de confiança na política e nas instituições aumentou o número de ativistas?

O número de ativistas certamente cresceu. Mas por outro lado, o número de sindicalizados permaneceu estagnado ou mesmo perdeu números. Isto é porque, por décadas, os sindicatos não organizaram novos locais de trabalho em escala massiva. Além do mais, onde há sindicato, desde o final do boom do pós-guerra, eles continuam tendo as mesmas estratégias da chamada “parceria com os patrões”. É impossível que esta estratégia funcione em um período de declínio econômico geral.  Isso é o que fez com ficassem  desacreditados muitos sindicatos e particularmente os seus dirigentes.

O movimento Occupy foi um caminho que a juventude encontrou para verbalizar seu descontentamento de uma maneira semiorganizada, sem a liderança dos sindicatos, ou porque a liderança sindical não organiza a juventude ou porque os jovens não confiam nos dirigentes para organizá-los.

Podemos supor que o movimento Occupy é fruto da busca por uma alternativa na medida em que os americanos não têm um partido ou organização para se referenciar?

Certamente. A maioria dos jovens nunca esteve em um sindicato, que é a única organização de massas que temos nesse país. O movimento Occupy desenvolveu-se organicamente como um meio para os jovens e trabalhadores manifestarem-se com certo êxito.

Um presidente negro ajudou a mudar a forma como os negros são tratados nos Estados Unidos?

Não. Falou-se muito sobre “América pós-racial”, mas é claro que trabalhadores negros, especialmente as mulheres negras, ainda são a parcela mais explorada da sociedade, ao lado dos imigrantes “ilegais”.

O caso do jovem Trayvon Martin, que morreu no dia 26 de fevereiro, não demonstraria um caso típico de racismo?

Sim, é um típico ataque racista. Mas ainda mais típico foi a maneira como trataram seu assassinato. Levou semanas para que o assassino fosse preso, as penas foram reduzidas e houve um imenso circo feito pela mídia debatendo se ele infringiu ou não a lei. Apenas para ilustrar o quão típico são casos como este: lembramos o caso de Oscar Grant na Califórnia, um rapaz que foi assassinado pela polícia. Outro caso: há apenas alguns dias, houve uma mulher árabe residente na Califórnia que foi brutalmente espancada e morta. Desde a rebelião Bacon durante o século XVII, o racismo tem sido a melhor ferramenta da classe governante para manter os trabalhadores divididos.

Alguns analistas dizem que os negros fazem parte da base leal ao governo, assim como os jovens, isso é verdade?

De certa maneira, sim, isso é verdade. Mas a decepção também tem atingido essa camada.

Que impacto teve a revolução árabe nos Estados Unidos? As manifestações em Madison contra o governador de Wisconsin, Scott Walker, em 2011, que queria acabar com os sindicatos do setor público, seriam uma prova desse impacto?

A revolução no mundo árabe, uma vez que se tornou um ponto de referência, foi uma grande inspiração para os trabalhadores americanos. Uma prova clara disso, por exemplo, é que em Wisconsin vimos slogans como “Fight like an Egyptian” (Lute como um egípcio) e “Down with Hosni Walker” (Abaixo Hosni Walker). Um episódio pitoresco ocorreu quando os trabalhadores estavam ocupando o “Capitólio Estadual”: chegaram centenas de pizzas que tinham sido pedidas por revolucionários diretamente do Egito.

Após um ano, como está o movimento dos trabalhadores nesse estado? Houve avanços?

Infelizmente ao invés de ter uma greve geral, a qual foi cogitada, os dirigentes sindicais decidiram dividir o movimento com uma reeleição. Eles coletaram milhares de assinaturas para ter essa eleição, no entanto, ao invés de ter um candidato dos trabalhadores, escolheram um político do partido democrata que tinha uma longa carreira antitrabalhista quando foi prefeito de Milwaukee. Seu programa era quase o mesmo de Walker. Uma batalha de classe foi convertida em uma disputa entre republicanos e democratas. A maioria dos apoiadores que o movimento trabalhista tinha, desde pequenos fazendeiros e jovens, foi eliminada como resultado disso. O AFSCME (Federação Americana de Empregados do Estado, Condado e Municipais) é um sindicato que ilustra claramente o resultado dessa estratégia: teve seu número de membros reduzido em dezenas de milhares. 

 

Recentemente vimos o governo Obama entrar em uma batalha para aprovar a lei da saúde. Poderia falar sobre essa lei e de como funciona o sistema público de saúde nos Estados Unidos?

Não existe sistema público de saúde nos EUA. A lei do plano de saúde de Obama, chamada Obamacare, na verdade representa uma maior carga para os trabalhadores. Quando a lei for efetivada aqueles que não podem pagar por plano de saúde, pagarão mais impostos. A luta por saúde universal é uma das mais importantes lutas que os trabalhadores enfrentam. A AFL-CIO passou uma resolução a favor do plano de saúde para todos. Agora é a hora de eles começarem a organizar essa luta.

E sobre a Lei de imigração?

O número de imigrantes, que chega aos EUA vindos do México e de outros países latino-americanos, decresceu e a questão da imigração foi amplamente removida do debate público. No entanto, ainda há mais de 12 milhões dos chamados “imigrantes ilegais” nos EUA. E removendo essa questão do debate público os capitalistas estão agora em uma posição de atacar os imigrantes sem serem expostos à opinião pública.

É verdade que o presidente Obama interrompeu as deportações de jovens imigrantes ilegais, mas isso é apenas uma pequena reforma. Ao final, há apenas uma solução para a questão da imigração, que só pode se dar com a legalização imediata e incondicional para todos. Esta é a posição dos marxistas americanos.

Como o WIL está organizando a juventude na batalha pelo PT?

Em média, os estudantes que se formaram em 2010, tinham uma dívida de aproximadamente US$ 250.000. Claramente esta é uma carga na família trabalhadora. Os estudantes estão começando a perceber isso. Eles estão começando a se organizar sobre essa questão, mas ainda de  uma maneira não uniforme.

O que o WIL tem feito é envolver os estudantes na discussão sobre um LP – Labor Party (Partido do Trabalho), especificamente sobre as condições que eles enfrentam. Por exemplo: dívida estudantil, saúde, empregos para recém-formados, recursos federais para as universidades, etc. Apenas o LP pode lutar pelos estudantes porque os estudantes são trabalhadores em treinamento. E os capitalistas já sabem que seus interesses são opostos aos dos estudantes. O que começamos a fazer é organizar pequenos clubes estudantis com orientação para o movimento trabalhista tendo como principal tarefa a luta por um partido dos trabalhadores de massa.

Nas Universidades a juventude está sendo atingida pela crise? De que forma?

Claramente, a dívida estudantil é o maior problema. Mas também o fato de que, para cada vaga de emprego aberta há em média oito pessoas buscando esta vaga. Isso significa que o desemprego para os jovens, especialmente para os recém-formados, é o principal problema. Outro exemplo, é que anteriormente, após a entrada dos jovens na faculdade, eles deixavam a casa de seus pais definitivamente. Ultimamente, estes jovens, pela falta de oportunidade no mercado de trabalho, não conseguem mais se sustentar após a faculdade e voltam para a casa de seus pais. E muitas vezes, seus pais estão mudando-se para a casa de seus avós. Isso acontece por causa da execução de hipotecas.

Em geral, as universidades têm perdido recursos e cresceu o custo das mensalidades escolares, o preço de livros e materiais escolares também tem subido. Escolas técnicas estão sendo fechadas pela falta de financiamento. Para os estudantes do ensino médio, os programas de artes, músicas e até mesmo ciências estão sendo eliminados. Muitas escolas de ensino médio têm sido privatizadas, o que é um fenômeno sem precedentes.

Tudo isso leva à frustração e raiva entre os jovens.

Como os estudantes enfrentam a crise, quais são as organizações estudantis em nível nacional?

Não há organização dos estudantes em nível nacional. Nem mesmo nas universidades há uma organização ou sindicato estudantil, no entanto tem ocorrido certa quantidade de paralisações nas escolas. A mais notável foi na escola de ensino médio em Madison, no estado de Wisconsin, onde os estudantes saíram às ruas em solidariedade a seus professores e pelo direito de organização.

Outro desenvolvimento encorajador é que em vários campi, os estudantes têm trabalhado para construir pontos de solidariedade com os trabalhadores das escolas e universidades.

A questão mais urgente e provavelmente a tarefa mais importante para os estudantes é a de organizarem-se nacionalmente e combater.