Ilusões verdes na Alemanha

Com a próxima eleição para o Bundestag (Parlamento Federal Alemão), em 26 de setembro de 2021, os Verdes Alemães estão se preparando para um possível retorno ao governo federal e para uma coalizão com a CDU/CSU, aliança partidária da chanceler Angela Merkel. Fundado há 41 anos pelos movimentos ambientalistas, femininos e anti-guerra, o partido há muito se tornou liberal burguês moderno do século 21, eclipsando os liberais burgueses tradicionais do Partido Democrático Liberal.

Os Verdes ganharam uma enorme importância política na Alemanha nos últimos anos. Enquanto outros partidos estão encolhendo ou estagnando, eles têm um fluxo contínuo de membros e, agora, pela primeira vez, contam com mais de 100 mil afiliados. De acordo com as pesquisas eleitorais, é o segundo partido mais forte em nível federal, com o objetivo de entrar no governo depois de quase 16 anos na oposição.  As pesquisas atuais dão aos Verdes entre 17 e 20%, enquanto o Partido Socialdemocrata (SPD) está oscilando entre 15 e 17%. O CDU/CSU (União Democrata-Cristã e União Social-Cristã, respectivamente) de Merkel está atualmente entre 33 e 27%. Assim, com base na representação proporcional alemã, uma coalizão “Preto-Verde” também seria a constelação mais estável aritmeticamente. Claro, todas essas previsões são condicionais.

Não é apenas por essas razões que os marxistas precisam olhar mais de perto para o que os Verdes são. Este partido e sua organização juvenil Green Youth desempenham um papel importante, muitas vezes de liderança em movimentos ambientais como o Fridays for future (movimento também conhecido como Juventude pelo Clima). Precisamos prestar muito mais atenção a esse partido para poder determinar seu futuro na política alemã.

De onde vêm os Verdes?

Os Verdes (Die Grünen) foram fundados em 1980 por elementos ativistas ambientais burgueses e do movimento estudantil, incluindo ex-maoístas, ex-mandelistas e os chamados “Spontis” (ultra esquerdistas que enfatizavam “movimentos espontâneos das massas”). Um ímpeto também veio das políticas da então coalizão do SPD e do Partido Democrático Liberal. O chanceler do SPD, Helmut Schmidt, um socialdemocrata de direita, apoiou enfaticamente as usinas nucleares e os mísseis nucleares de médio alcance nas bases do Exército dos EUA na Alemanha, o que desencadeou um grande movimento de protesto na época.

No período inicial de fundação dos Verdes, houve fortes conflitos entre membros de esquerda e a ala conservadora dos ecologistas burgueses. Na conferência do partido fundador em 1980, os “ecossocialistas” prevaleceram. Isso levou a uma pequena cisão e à fundação do mais conservador ÖDP (Partido Democrático Ecológico), que ainda tem bases municipais aqui e ali na Baviera.

Apesar do domínio inicial de forças que se autodenominam socialistas, os Verdes adotaram um programa básico democrático-radical pequeno-burguês em 1980. A proteção aos pequenos negócios, o movimento pela paz e as questões ambientais foram seus principais pontos de demarcação da socialdemocracia e dos partidos do campo burguês.

Com o tempo, a ala moderada chamada “realo” prevaleceu sobre a ala mais radical chamada “fundamentalista” ou “fundi”. Os Verdes rapidamente se abriram para coalizões em nível municipal, estadual e federal, predominantemente, de modo inicial, com o SPD. A primeira coalizão “Vermelho-Verde” em 1985, em Hesse, tornou-se um marco. A ala esquerda, em torno de pessoas como Jutta Ditfurth, apresentou o início de um ponto de vista de classe em 1987. Quando Ditfurth se candidatou como um dos principais candidatos verdes na eleição federal, ela fez o então líder do SPD, Johannes Rau, parecer insípido. Ela se separou do partido no início dos anos 1990, e os líderes da ala “realo”, em torno de pessoas como Joschka Fischer e Daniel Cohn-Bendit, finalmente, ganharam domínio sobre o partido.

Governo Federal 1998-2005

De 1998 a 2005, os Verdes foram parte integrante do governo de coalizão com o SPD sob o chanceler Gerhard Schröder e o vice-chanceler Joschka Fischer em nível federal por dois períodos eleitorais. Desse modo, também compartilham a culpa pelos ataques à previdência do Estado (Riester), pela Agenda 2010 com a notória legislação Hartz IV, pela pressão para cortar e privatizar o sistema de saúde e por uma política externa alemã mais agressiva com a participação ativa da Bundeswehr (Forças Armadas da Alemanha) em guerras internacionais.

Depois do 11 de setembro, o governo Schröder-Fischer participou das operações militares no Afeganistão e no Chifre da África. Além disso, a Alemanha participou do bombardeio da Iugoslávia pela OTAN em 1999, com danos massivos à população civil.

Os Verdes projetam uma imagem ecológica, pró-imigração e cosmopolita, mas qual é sua história real e seu papel na política alemã? / Foto: Tillwe

Por razões táticas, Schröder e Fischer no ano eleitoral de 2002 invocaram o “caminho alemão” como alternativa ao “belicismo americano” no Iraque e descreveram a Alemanha como uma “potência de paz”. Isso não mudou o fato de que a Alemanha indiretamente apoiou a guerra contra o Iraque em 2003 com direitos de sobrevoo e ajuda logística. Após esses anos no governo, qualquer oposição residual importante e relevante aos cortes sociais e militarismo dentro dos Verdes foi rompida.

O manifesto de 1980 excluiu qualquer intervenção militar e apelou à dissolução da OTAN. Ainda assim, em 2020, os Verdes adotaram um novo manifesto pela terceira vez. Nele, as operações militares são descritas como um “meio extremo” que pode ser necessário, o Bundeswehr também é visto como um “meio necessário de política de segurança internacional e estatal” e é dito que a Alemanha deve ser “confiável” como um agente internacional parceiro de aliança. Apesar das críticas, a OTAN é agora vista pelos Verdes como um “ator indispensável para garantir a segurança da Europa”.

Até hoje, os Verdes se alimentam de sua reputação de “partido progressista dos direitos civis” porque já haviam se pronunciado a favor dos direitos civis e de voto para os imigrantes e da naturalização mais fácil para os migrantes na década de 1980, muito antes do SPD. Os Verdes conseguiram se distinguir como “anti-AfD” (AfD – partido político alemão populista de extrema-direita) e construíram uma reputação de “consistente partido pró-refugiados”. Isso, combinado com sua forte adesão à política de identidade, significa que são vistos como um grande inimigo político pelas forças de extrema direita. Isso ajuda a dar a eles uma imagem “progressista” e “cosmopolita”.

Da mesma forma, os Verdes se beneficiam enormemente com a questão ambiental cada vez mais importante. Por exemplo, o desastre nuclear em Fukushima, Japão, no início de março de 2011, repentinamente, deu um forte vento a favor para os Verdes nas eleições em Baden-Württemberg, Renânia-Palatinado e Hesse naquela época. Em Baden-Württemberg, o louco projeto imobiliário, estação ferroviária e construção “Stuttgart 21” deu-lhes um impulso adicional. E, por meio de sua forte intervenção na FFF (Fridays For Future), eles foram capazes de aumentar muito sua popularidade entre os jovens.

Aumento de sócios e fluxo de carreiristas

Todos estes são fatores que levaram a um aumento acentuado no número de membros a partir de 2017, tornando os Verdes agora o segundo partido mais forte no plano eleitoral. Os Verdes quase dobraram sua base de associados desde 2015. Qualquer partido em ascensão torna-se um alvo desejável para os carreiristas, pois é possível obter mandatos e cargos bem remunerados no aparelho de Estado em um período bastante curto de tempo. Embora de forma alguma todos os novos membros verdes possam ser rotulados de carreiristas, a história tem mostrado repetidas vezes que mesmo as convicções mais fortes não são imunes a ambições profissionais e oportunismo posteriores.

Segundo os sociólogos, os Verdes são considerados o partido dos acadêmicos de esquerda. Eles são, de longe, o partido com a maior proporção de graduados universitários em seu quadro de associados e base de apoio. Ao todo, 72% dos membros possuem um diploma universitário (técnico).

Luisa Neubauer, membro do Partido Verde e da Juventude Verde, surgiu na mídia como o rosto atual da FFF na Alemanha. Isso não é uma coincidência ou um caso isolado, porque os Verdes estão tentando com todas as suas forças se apropriar do movimento principalmente como um movimento eleitoral e campo de recrutamento. A liderança verde está tentando com todas as suas forças reprimir as forças anticapitalistas sistematicamente. Camaradas do IMT na Alta Baviera experimentaram que os Verdes regionais preferem dividir os demos do FFF a permitir que slogans anticapitalistas sejam apresentados.

Em 2011, o ex-maoísta Winfried Kretschmann se tornou o primeiro presidente verde em um dos 16 estados federais. Ele está no cargo no estado de Baden-Württemberg desde então. De lá para cá, Kretschmann se entendeu muito bem com a grande burguesia de Baden-Württemberg, que é dominada por corporações como Daimler, Porsche, Audi e Bosch. A associação regional de empregadores Südwestmetall foi um dos primeiros grupos de grandes empresas a transferir regularmente grandes doações para os Verdes.

No entanto, o lobby de negócios e grupo de pressão mais importante dentro dos Verdes é a “Bundesverband Erneuerbare Energie” (Federação Industrial para Energia Renovável). Esta organização lobista guarda-chuva demonstra enorme compromisso financeiro com os eles. Alguns ex-políticos do partido já trabalham para esta associação como consultores e empregados.

A nova posição dos Verdes no estado de Baden-Württemberg, com sua forte indústria automotiva, tornou o partido cada vez mais atraente para os grandes negócios. Isso pode ser visto em somas cada vez maiores em patrocínios em convenções partidárias e em grandes doações.

Patrocínio de eventos:

Conferência Federal Verde 2013 – 82.800 euros

Conferência Federal Verde 2018 – 173.513,85 euros

Conferência Federal Verde 2019 – 277.482,97 euros

Grandes doações para os verdes:

2013 – 60.000 euros, apenas Südwestmetall

2018 – 258.501 euros

2019 – 335.001 euros

Muito claramente, de 2018 a 2019, um grande salto no financiamento de grandes empresas pôde ser visto para os Verdes.

Segundo pilar da classe dominante

Os Verdes estão agora claramente sendo construídos pela burguesia como um segundo pilar indispensável dos partidos burgueses. Os sinais estão apontando claramente para uma aliança “Preto-Verde” dos Verdes com a CDU/CSU pós-Merkel. Os supostos “partidos populares” e pilares da “grande” coalizão, CDU/CSU e SPD, não têm mais uma maioria estável conjunta, segundo as pesquisas. Da mesma forma, o SPD é anêmico e dificilmente consegue mobilizar as pessoas. Mesmo a clássica constelação governamental de classe média de CDU/CSU e Partido Democrático Liberal, que esteve no cargo por 33 dos 72 anos da República Federal da Alemanha, provavelmente não terá votos suficientes nas próximas eleições. Por outro lado, os Verdes, como força ascendente, são exatamente o que a CDU/CSU precisa.

A liderança verde também está pronta para isso. Enquanto a ala direita do Partido de Esquerda (DIE LINKE) sonha com uma coalizão com o SPD e os Verdes, o líder do Partido Verde, Robert Habeck, claramente derrubou as esperanças de um acordo Verde-Vermelho-Vermelho. Em seu livro Von hier an anders (daqui em diante de forma diferente), ele justifica o fato com o “afastamento dos ambientes”, argumentando que uma coalizão Verde-Vermelho-Vermelho perturbaria ainda mais a coesão da sociedade. Em vez de uma “revolução”, é necessária uma “nova base de confiança”, diz Habeck.

Os Verdes estão agora claramente sendo construídos pela burguesia como um segundo pilar indispensável dos partidos burgueses / Foto: Kaihsu

Por todas essas razões, um governo federal Preto-Verde é muito possível como resultado das eleições para o Bundestag em setembro. Os Verdes não estão no governo federal há quase 16 anos e se apresentam em seu PR como uma força “nova”, “progressista”, “ecológica” e “antirracista”. Os jovens com menos de 30 anos geralmente não conseguem se lembrar do papel dos Verdes no governo Schröder-Fischer e muitas vezes nutrem ilusões em relação a eles.

O modelo para uma aliança Preto-Verde em nível federal é o estado de Hesse, onde uma CDU nacionalista tradicionalmente de direita governou pacífica e silenciosamente com os Verdes por sete anos. O vice primeiro-ministro e ministro dos transportes de Hesse, Tarek Al-Wazir (Verde), está atualmente mostrando à classe dominante que é um representante confiável dos interesses do capital como responsável pelo desmatamento da Floresta Dannenröder (Danni), que foi pressionada através da violência policial brutal. Ele certamente seria o mesmo em um gabinete federal. Desde o outono passado, a exploração madeireira está em andamento no valioso Danni, que também serve como reservatório de água potável para uma vasta área, para a construção de um projeto de rodovia com financiamento privado. Isso desencadeou um forte movimento de protesto.

Como partido do governo, os Verdes certamente tentarão se diferenciar com gestos simbólicos e projetos emblemáticos que impressionem uma parte de sua base e promovam capitalistas verdes, ecofazendeiros, “ciclos regionais”, lobbies de bicicletas e políticas de identidade. Mas o antigo partido ecológico mais uma vez se revelará um grande traidor de seus próprios ideais ecológicos no governo. A proteção efetiva do clima e os interesses capitalistas são diametralmente opostos e incompatíveis.

Quando os líderes verdes alcançam posições lucrativas no governo, eles conhecem apenas uma moral: preservar seus cargos e privilégios. Se eles defenderem implacavelmente os interesses capitalistas em disputas como a dos “Danni”, e se mostrarem duros e imunes à pressão de baixo, então um lucrativo posto em grandes negócios e associações de lobby os espera, mesmo depois de deixarem cargos políticos. Isso é demonstrado pelas carreiras de ex-ministros do governo verde e secretários de Estado, como Joschka Fischer, Rezzo Schlauch, Margareta Wolf, Matthias Berninger. Todos eles, subsequentemente, se tornaram lobistas altamente remunerados para grupos de capitais conhecidos e corporações internacionais.

Annalena Baerbock, a atual copresidente do Partido Verde, já recebeu mais aplausos do que palestrantes de outros partidos parlamentares no congresso da Federação das Indústrias Alemãs (BDI), em junho de 2019. No entanto, como nenhuma eleição pode ser ganha com o aplauso dos capitalistas apenas, os estrategistas de campanha do ex-partido ecológico estão ocupados em consertar uma imagem “socialdemocrata” na campanha eleitoral em expansão.

A demanda pela abolição das sanções “Hartz IV” (benefício semelhante ao seguro-desemprego), por exemplo, visa atrair as pessoas que, como resultado do bloqueio, são repentina e inesperadamente ameaçadas de serem jogadas no pesadelo burocrático dos escritórios de assistência social e centros de emprego. Do ponto de vista da burocracia Verde, isso inclui os autônomos e os comerciantes, que serão duramente atingidos pelo bloqueio, que não poderão reivindicar o abono de trabalho por não se qualificarem como empregados, e quem poderiam, portanto, encontrar-se financeiramente no limite. Hartz IV foi uma peça central das contrarreformas do governo Schröder-Fischer e levou ao empobrecimento maciço dos desempregados e à expansão do trabalho temporário.

Imagem “socialdemocrata”

Certamente, os Verdes não representam outra coisa senão um partido burguês liberal moderno do século 21. Mas para esconder sua cumplicidade nos cortes sociais durante os sete anos de governo federal “Vermelho-Verde” de 1998 a 2005, o que vincula em certa medida a percepção pública, o PR e os estrategistas eleitorais agora apontam para uma suposta “proximidade com os sindicatos” e o movimento operário. Dessa forma, eles querem “dar uma mordida” no enfraquecimento do SPD em seu próprio campo, pois a direção do SPD sempre se orgulhou de ser moderadora e mediadora do aparato sindical.

Apesar das ilusões de que desfrutam, os Verdes não representam outra coisa senão um partido burguês liberal moderno do século 21 / Foto: Paula Schramm

No início de 2021, o líder do Partido Verde, Robert Habeck, e Rainer Hoffmann, presidente da confederação sindical DGB, publicou um artigo conjunto na FAZ intitulado “Die Linke droht sich im Widerspruch zuverhedrdern” (A esquerda ameaça se enredar nas contradições). Nele, eles rejeitaram um imposto sobre a riqueza e defenderam mais dívida pública em tempos de crise.

Outra questão poderia servir de farol para os Verdes na campanha eleitoral para reivindicar uma suposta “proximidade com os sindicatos”. Frank Bsirske (68), que havia sido o líder do segundo maior sindicato da Alemanha, ver.di, e que é membro do partido desde os anos 1980, está se candidatando aos Verdes pelo Bundestag no distrito eleitoral nº 51 (Wolfsburg-Helmstedt), que é dominado pela grande fábrica da Volkswagen em Wolfsburg. Ele almeja ganhar a cadeira diretamente e quer obter uma posição segura e de topo na chapa do partido para o estado da Baixa Saxônia.

Alguns rumores dizem que Bsirske deseja uma segunda carreira na velhice – não como backbencher, mas como ministro do Trabalho federal. Em quase duas décadas como líder ver.di, o eloquente Bsirske soube se apresentar como um “camarada” comprometido. Seu papel no aparato sindical, nas rodadas de negociação coletiva e em muitos conselhos de supervisão de empresas conhecidas era o de defender o status quo, exatamente na mesma medida que outros líderes da aristocracia trabalhista.

Mas Bsirske também tem talento para estados de espírito. Em setembro de 2019, por exemplo, ele convocou os membros de seu sindicato a participarem das greves climáticas do movimento FFF, mas “somente fora do horário de trabalho”, como destacou. As discussões sobre formas criativas de contribuir para a greve climática “de forma bastante legal” nas fábricas, por exemplo, por meio de reuniões de trabalho, estavam longe de sua mente.

Verdes favorecem a privatização da ferrovia britânica

Os Verdes ainda vivem de sua reputação como defensores supostamente consistentes de uma mudança fundamental nas políticas de transporte e como defensores das ciclovias e do transporte público. No entanto, suas políticas concretas em Hesse e Baden-Württemberg e outros estados da federação onde estão envolvidos em governos parecem bem diferentes.

O fato de os Verdes não cumprirem seus slogans é exemplificado por uma olhada em um novo documento do grupo parlamentar Verde no Bundestag sobre o futuro das ferrovias alemãs. Verbalmente, o jornal rejeita a privatização da Deutsche Bahn (DB – empresa de transporte alemã), que ainda é 100% propriedade do governo federal. A tentativa de venda das ações da DB por meio de um IPO fracassou em outubro de 2008 devido à crise do capitalismo mundial. Desde então, nenhum ator político sério quer se queimar com este assunto irritante. Além disso, os investidores privados não estão interessados em pacotes de ações, mas em lucros e na escolha seletiva. Corporações como a Siemens, Knorr-Bremse, Stadler e ferrovias privadas que operam internacionalmente, como National Express, GoAhead e outras, estão de olho em trabalhos de reparo, outras suboperações e licitações para transporte público.

Qualquer um que se aprofunde no assunto e examine o documento dos Verdes rapidamente descobre a estratégia de arrastar a privatização pela porta dos fundos, como o BDI, o CDU/CSU e o Partido Democrático Liberal vêm exigindo há décadas. O DB de propriedade federal deve ser completamente desmembrado e dividido. A rede ferroviária e a infraestrutura serão separadas e transferidas para uma instituição de direito público (AöR), que será maciçamente financiada por fundos públicos. Por outro lado, as filiais da DB Transport responsáveis pelo transporte de passageiros e mercadorias devem ser organizadas em uma GmbH (sociedade por quotas). Isso facilita uma privatização material. Apoiados por frotas de veículos públicos, os grupos de capitais privados estão cada vez mais envolvidos no transporte de passageiros de longa distância por meio de concursos.

Este já é o caso do transporte regional, onde a participação de mercado da DB caiu quase pela metade em duas décadas a favor dos grupos privados. No caso do S-Bahn de Berlim (ferrovias suburbanas) e nos estados federais, os políticos verdes são os pioneiros em licitações e, portanto, em privatizações gradativas. As muitas experiências negativas não são questionadas em nenhum lugar no jornal dos Verdes.

Seu modelo está em vigor com base na situação atual na Grã-Bretanha, a pioneira europeia da privatização ferroviária, onde a rede deficitária é efetivamente pública, enquanto os principais ativos no setor de transporte e serviços são controlados por empresas privadas. Isso coloca os Verdes em sintonia com as associações empresariais e outros partidos burgueses. Com um possível governo federal Preto-Verde, um impulso tão sério para filetagem, desmontagem e privatização das ferrovias no modelo britânico está se aproximando.

Desta forma, os Verdes estão traindo seus próprios (antigos) objetivos ecológicos. Um sistema ferroviário baseado no lucro privado e empresas de operação ferroviária desmanteladas e fragmentadas nunca explorará as vantagens do transporte ferroviário. O setor ferroviário está fadado a perder a concorrência com outros modos de transporte.

Este exemplo também mina a esperança reformista de que o coronavírus e a crise econômica possam levar a uma mudança de curso na política econômica, longe do “neoliberalismo” e das orgias de privatização. É verdade que há tendências claras para o intervencionismo do Estado na crise. Mas a privatização crescente em muitos setores continua. Não há como fugir da política de privatizações à vista.

Tudo isso também oferece novas oportunidades para a radicalização da juventude em torno da FFF. A reivindicação dos Verdes à liderança já foi fortemente criticada em muitos lugares. Existem boas oportunidades para os marxistas em um futuro próximo intervirem com ideias socialistas radicais.

Aqui e ali, mais ativistas ambientais radicais tentarão explorar o potencial do eleitor verde nas eleições regionais e locais. Mas não se espera um grande avanço.

Muitos jovens que se radicalizam com a questão ambiental irão muito rapidamente tirar conclusões socialistas com base em suas experiências e perceber que se trata de uma questão de classe. Para enfrentá-lo, não precisamos levar os desvios por meio de um suposto “ecossocialismo”. Marx, Engels, Bebel e outros pioneiros explicaram a estreita ligação entre a destruição ambiental e o modo de produção capitalista já no século 19. Somente uma economia planejada democrática e socialista mundial liderada pela classe trabalhadora pode parar a catástrofe climática global e interromper e reverter gradualmente seus efeitos.

Este texto foi publicado originalmente em 24 de fevereiro.

TRADUÇÃO DE LUCIANA LEAL.
PUBLICADO EM MARXIST.COM