O Partido Comunista Chinês (PCC) 1927-1937 – O desenvolvimento do Maoismo – Parte 8

O tortuoso caminho da revolução Chinesa seria um enigma insolúvel se abstraído da revolução mundial e do imperialismo. Levantou inicialmente sua cabeça durante a Rebelião Taiping em meados do século XIX, na forma de um levantamento tradicional dos camponeses, mas cujas causas e resultados foram modelados na repentina integração da China no mercado mundial. A fase proletária da revolução, a partir de 1919, foi desde o início determinada pela gravitação da classe trabalhadora chinesa em direção às ideias e métodos do Bolchevismo.

O PCC e o Imperialismo Japonês

A última fase da revolução, que conduz à vitória do PCC em 1949, é inseparável da invasão japonesa da China, que, em vez de unir toda a China contra o Japão, na verdade serviu para pôr em relevo todos os antagonismos de classe da sociedade chinesa. Na primeira metade do século XX, o imperialismo não enfrentou a China como uma força totalmente alheia, e sim como parte integrante da sociedade chinesa. Era impossível de se saber onde terminava a classe dominante chinesa e começavam os imperialistas. Este não era mais o caso quando se tratava de sua atitude para com as massas chinesas e o movimento comunista, aos quais ambos se opunham igualmente. Portanto, a atitude do PCC em relação à invasão japonesa da China é fundamental para se compreender tanto o curso da revolução e do papel do PCC nela, assim como as formas alternativas que a revolução poderia ter desenvolvido.

A emergência do Japão como uma força no mercado mundial foi anunciada com a Primeira Guerra Sino-Japonesa de 1894-5, pelo controle da Coreia. A China tinha dominado a Coreia (bem como toda a Ásia Oriental, em geral) durante séculos, razão porque a vitória japonesa nesta guerra marcou uma mudança qualitativa na política da Ásia Oriental, provocada pela introdução com mais êxito do capitalismo no Japão. Dez anos mais tarde, seguiu-se a guerra russo-japonesa, uma guerra abertamente imperialista pelo controle da Estrada de Ferro Oriental da China. Esta ferrovia era essencial às rotas de comércio em toda a região e, como tal, também foi palco da principal guerra sino-japonesa nos anos 1930 e 1940. A vitória do Japão sobre a Rússia representou a primeira vitória da Ásia sobre uma potência europeia na era moderna, e seria vista como o início da longa marcha da Ásia à preeminência capitalista global.

O Incidente de Mukden

O Incidente de Mukden marca o início da segunda guerra sino-japonesa e representou a condenação do Kuomintang na China Continental. Em 18 de setembro de 1931, o Japão realizou uma clássica manobra diplomática do imperialismo encenando um “ataque” à Estrada de Ferro Oriental da China (que ela possuía, como potência imperialista), em Shenyang, Província de Liaoning, no Nordeste da China (então conhecida como Mukden, no interior da Manchúria). Alguns oficiais militares japoneses plantaram explosivos na linha férrea (de forma pateticamente fraca, para não provocar danos a sua ferrovia), declararam que era um ataque dos nacionalistas chineses e, em seguida, invadiram a cidade, e posteriormente toda a província, cujo controle asseguraram em cinco meses.

Do ponto de vista do PCC, a agressão japonesa era uma grande oportunidade e uma tábua de salvação para o partido. Até certo ponto, a agressão japonesa desviou recursos militares destinados a atacar as bases soviéticas; no entanto, como veremos, Chiang Kai-shek minimizou este resultado de sua política de não-resistência ao Japão. Mas esta política estava em flagrante contradição com as necessidades objetivas da sociedade chinesa, que era brutalmente oprimida e cujo desenvolvimento foi violentamente detido pelo fascismo japonês. Portanto, quanto mais Chiang se recusava a resistir ao Japão para centrar-se em atacar ao PCC, mais suscitava oposição de massa na China e simpatias para com o PCC. Esta era, portanto, uma situação de “vencer ou vencer” para o PCC – se Chiang atacasse o Japão, receberia toda a pressão sobre seus ombros. Se atacasse o PCC, minaria seu poder.

A corrupção do regime de Chiang Kai-shek o empurrava na direção de um acordo com o Japão para esmagar o PCC. Esta era, certamente, a perspectiva de Chiang. Mas o extremo caráter reacionário do regime e do imperialismo japonês aumentava constantemente o apoio potencial ao PCC (visto como a única força de oposição ao Japão) e, portanto, empurrou setores da classe dominante à oposição a Chiang Kai-shek, enfraquecendo enormemente a liderança do capitalismo chinês. O fascismo é uma expressão da aguda crise e do impasse do capitalismo, daí o seu vicioso caráter reacionário. A combinação do semi-fascismo de Chiang Kai-shek com a imposição do fascismo japonês na China não significou o fortalecimento da classe dominante na China e no Japão, mas, mais exatamente, o seu impasse.

Não há dúvida que a crise provocada pelo Japão foi o fator que contribuiu mais diretamente para a vitória do PCC. A questão é: em que medida o PCC aproveitou isto, e como? Pode-se arrombar uma porta frágil com um bom chute de forma rápida e efetiva, ou se pode gastar dias desmontando-a de seus caixilhos, de forma que, quando se abre a passagem, a porta permaneça intacta. Isto não é uma questão pedante. A forma de oposição do PCC à agressão japonesa e à capitulação do Kuomintang a ele foi às vezes concebida para levar o PCC ao poder sem esmagar ao Kuomintang e seu aparato corrompido. Moscou não queria uma grande revolução conduzida pelas massas chinesas a suas portas; queria, sim, organizar burocraticamente um estado chinês amistoso.

Contudo, a resposta inicial do PCC à agressão japonesa estava na direção correta. Se eles tivessem seguido esta política correta, o PCC poderia ter sido levado ao poder muito mais cedo e na base não de vitórias militares, mas de um levantamento de massas.

O PCC respondeu imediatamente ao incidente de Mukden com uma resolução declarando que “o Partido Comunista Chinês considera o ataque japonês na Manchúria como um ataque imperialista”. Desse momento em diante o Partido nunca hesitou em condenar o odiado imperialismo japonês, e ganhou um grande apoio ao fazer isto. A tarefa era reconstruir o partido nas cidades na base de uma oposição militar ao imperialismo japonês e da liquidação do Kuomintang, e da procura de pontos de apoio no exército.

Graças à repulsa popular que a posição de Chiang atraiu, e à qual o PCC corretamente se posicionou contra, este obteve um imediato e muito significativo ganho quando 20 mil soldados do Kuomintang desertaram para o Exército Vermelho no levantamento de Ningdu de dezembro de 1931.

Nesse momento, a Comintern estava perseguindo a ultra-esquerdista política do “Terceiro Período”, que foi uma forte reação burocrática destinada a encobrir seus pecados oportunistas anteriores, como disse Trotsky. No entanto, um subproduto positivo desta política foi que ela realmente encorajou o PCC a adotar uma linha revolucionária em relação à invasão japonesa. Em setembro de 1932, a liderança da Comintern aprovou uma resolução insistindo em que o PCC prosseguisse nesta política.

“A tática da frente única por baixo na luta anti-imperialista… organizar as massas sob a palavra de ordem de uma guerra revolucionária de libertação nacional pela independência, unidade e integridade territorial da China contra todos os imperialistas, pela derrubada do agente do imperialismo – o Kuomintang” (citado em Pinckney Harrison, op. cit.).

Isto foi acompanhado em janeiro de 1933 com o correto apelo a que grupos militares se juntassem ao PCC em uma aliança de luta sob a condição de que eles “detenham qualquer participação na Quarta Ofensiva Nacionalista então em andamento contra as áreas Soviéticas; que haja uma garantia imediata de direitos democráticos e liberdades; e o imediato armamento das massas para a guerra contra o Japão” (Pinckney Harrison, op. cit.).

Embora muitos desses grupos militares que se afastaram do Kuomintang sobre a questão da resistência ao Japão tivessem origem e liderança burguesa/feudal, esta política do PCC corretamente antecipa o fato de que tais movimentos devem ter representado um afastamento de Chiang Kai-shek em linhas de classe. A demanda de armar o povo contra o Japão neste apelo por uma aliança traz este caráter de classe ao primeiro plano e colocaria a liderança burguesa desses grupos sob pressão. Se combinada com táticas hábeis por parte do PCC, poderia ter provocado o rompimento desses grupos com Chiang e também com seus próprios líderes burgueses, ou convertido esses líderes à causa comunista, como aconteceu com o Levantamento de Ningdu.

O fardo rural

Como poderia o PCC utilizar a guerra com o Japão para construir uma efetiva oposição ao Kuomintang, bem como ao Japão? Como poderia reforçar e desenvolver sua base de apoio nesta nova e perigosa situação?

Estas questões somente podem ser respondidas com uma análise sóbria e materialista da situação da guerra e de seus efeitos sobre a luta de classes na China. Todas as questões se resumem em uma só – poderia a invasão empurrar o proletariado nos braços da classe dominante em um paroxismo de patriotismo antijaponês ou exacerbaria as divisões de classe? No último caso, seria vital para o PCC restabelecer uma forte base urbana tão cedo quanto possível.

Trotsky considerava (corretamente) que “há motivos para considerar que a guerra vai causar uma febril revitalização da indústria… particularmente se a guerra vai ser financiada pela Grã-Bretanha, os EUA ou União Soviética”. Um marxista mais ‘mecânico’ pode concluir que isto reduziria os antagonismos de classe; no entanto, Trotsky mais uma vez chegou corretamente à conclusão oposta:

“A dependência do exército e do governo com relação à produção interna elevará incomensuravelmente o papel e a importância dos trabalhadores industriais chineses… esta circunstância abre amplas possibilidades para a luta econômica dos trabalhadores. O governo vai ter que ser mais cuidadoso em sua repressão para não perturbar o ritmo da indústria de guerra. Naturalmente, os canalhas do Kuomintang e os não menos canalhas do partido estalinista vão gritar que uma luta econômica em tempo de guerra é “impatriótico”. No entanto, as massas laboriosas dificilmente simpatizarão com este conselho, especialmente se os verdadeiros revolucionários puderem expor os tremendos lucros dos capitalistas e a rapacidade dos burocratas” (Trotsky, A Discussion on China).

É, portanto, a partir desta compreensão de que os comunistas chineses (ele estava escrevendo para seus seguidores na China, mas todas as suas recomendações poderiam ser aplicadas ao próprio PCC) devem começar com a obra clássica de uma organização Marxista – a construção nas fábricas e nos sindicatos,

“Parece-me que seria muito mais correto tentar criar organizações ‘de guerra’ numa base de classe, para a realização do trabalho que, em situação correspondente, os sindicatos realizariam. Por exemplo, se em alguma fábrica vários trabalhadores forem à guerra, então seria necessário organizar um grupo para manter ligações com eles e para prestar-lhes e às suas famílias ajuda material e moral… as demandas pelo controle dos trabalhadores sobre a indústria, particularmente sobre a indústria de guerra, têm enorme significado – não apenas para ‘controlar’ os lucros, mas para tornar mais difícil aos capitalistas fornecer ao exército maus produtos de baixa qualidade… É necessário que as organizações [dos trabalhadores] tenham a sua disposição, no entanto, um programa mínimo mas plenamente concreto, ligado aos interesses do exército e dos trabalhadores.

            (…)

“A preparação mais importante para a Guerra é criar comitês sindicais e uma organização partidária: uma sistemática propaganda para a libertação de todos os imperialismos, em primeiro lugar o imperialismo japonês, não por manobras diplomáticas, capitulações, mas através da luta militar revolucionária, através de uma guerra do povo chinês contra os imperialistas. O que é importante é criar um ponto de apoio que, no transcorrer do tempo, possa se tornar a base para a mobilização do povo.

            (…)

“A tarefa da vanguarda consiste nisto: baseando-se na experiência da guerra, soldar os trabalhadores em torno da vanguarda revolucionária, para reunir os camponeses em torno dos trabalhadores” (Ibid.).

Mas permaneceria impossível para o PCC realizar isto na base do isolamento rural e do enfrentamento de batalhas diárias pela mera sobrevivência. Não se pôde estabelecer contato efetivo com o movimento urbano, que podia explodir sob várias formas durante os anos 1930. O PCC estava muito distante de participar nestes movimentos, muito distanciado politicamente para entender o acúmulo de frustrações e para levantar demandas concretas para se conectar com eles.

O primeiro exemplo deste fenômeno é o movimento estudantil contra o Japão começando em 1931 em resposta ao incidente de Mukden. Apesar da ousada postura anti-imperialista do PCC sobre este assunto, não puderam se conectar com este movimento de dezenas de milhares devido ao seu isolamento físico e político, e, dessa forma, o movimento se esfumou.

No início de 1932, ocorreu uma batalha de cinco semanas pelo controle de Xangai. Este foi o maior teste da capacidade do PCC de influenciar na luta contra o Japão nos centros urbanos mais importantes, especialmente desde a crise que provocou para levar a um motim no exército de Chiang com implicações revolucionárias.

Baseados em sua “concessão extraterritorial” de Xangai – cuja existência já era um ato do imperialismo japonês – os japoneses mais uma vez protagonizaram vários ataques “antijaponeses” na cidade. Isto se utilizou como uma desculpa para uma rápida acumulação de material militar japonês dentro e no entorno da cidade, para “proteger os cidadãos e as propriedades japoneses”. Então, de repente, a cidade foi bombardeada e invadida.

Contudo, em contraponto à patética conduta de Chiang Kai-shek de não resistência na Manchúria, Cai Tingkai levou o 19o Exército do Kuomintang a uma heroica batalha com os invasores japoneses. Embora sem êxito, este intrépido ato de desafio inspirou milhões de chineses, que sofreram durante décadas insultos imperialistas e indignidades coloniais, a começar a resistência. De forma correta, “os comunistas encorajaram as manifestações antijaponeses onde podiam, tentando ao mesmo tempo dirigi-las para a condenação da ‘fragilidade’ governamental” (Guillermaz, op. cit.).

Certamente havia uma base para que tais movimentos negassem qualquer apoio “patriótico” ao governo, visto que todos entendiam que o governo era o principal obstáculo para a defesa da China. Cai Tingkai estava essencialmente desafiando as ordens ao defender Xangai. A subserviência de Chiang ao imperialismo era tão humilhante que Cai Tingkai (e muitos depois dele) foi compelido a desafiá-lo abertamente, inclusive ao ponto de pôr em marcha um governo revolucionário.

Esta foi a rebelião de Fujian, um dos desenvolvimentos mais interessantes neste período. Ela parece encapsular todo este período de guerra com o Japão envolvido. Em particular, o claro caráter de classe deste movimento não poderia deixar de emergir à superfície. Assim como em todos os rompimentos da autoridade do Kuomintang nos anos 1930, vemos a questão da revolução e do PCC projetando sua longa sombra.

Depois de sua heroica e massivamente popular resistência à invasão japonesa de Xangai, o 19o Exército e Cai Tingkai gozavam de enorme prestígio e tinham efetivamente uma base local de apoio, dada sua independência política em relação a Chiang Kai-shek. Quando ele lhes ordenou para atacar o PCC em seu Sovíete de Jiangxi, em novembro de 1933, o exército se rebelou, desgostoso por ser obrigado a atacar o único grupo de resistência aberta ao Japão (além deles mesmos). Em vez disso, se voltaram contra Chiang.

Em 22 de novembro eles convocaram uma “Assembleia Extraordinária do Povo”, na qual anunciaram o estabelecimento de um “Governo Revolucionário do Povo” na Província de Fujian, e chamaram o seu exército de Exército Revolucionário do Povo. Entre os seus vagos planos de justiça social em Fujian, declararam publicamente a intenção de começar uma luta militante contra o Japão e pela derrubada de Chiang Kai-shek. Também declararam seu desejo de estabelecer relações políticas próximas com o Sovíete de Jiangxi do PCC e com a União Soviética, em um esforço para colaborar na luta contra o Japão. Em outras palavras, esta grande rebelião reconheceu todos os critérios de 1932 do PCC para formar uma frente única contra o Japão e o Kuomintang.

De fato, o exército de Cai tinha começado negociações com o PCC por uma frente única na primavera de 1933, antes da Rebelião de Fujian ocorrer. Em outubro tinham concordado em cessar a guerra um contra o outro e em estabelecer relações econômicas. Quando o governo de Fujian foi estabelecido, concordaram na troca de todos os prisioneiros políticos (isto é, membros do PCC na prisão) e no apoio às ações revolucionárias do PCC contra o Kuomintang e o Japão.

Imediatamente as forças de Chiang conduziram um contra-ataque, com três grupos bem como a marinha atacando pouco tempo depois sob as ordens diretas de Chiang Kai-shek (Guillermaz, op. cit.). Esta foi a prova decisiva da estratégia revolucionária anti-imperialista do PCC. Não havia tempo a perder. Politicamente falando, a situação era uma dádiva para o PCC, uma avenida aberta. O único exército com prestígio popular do Kuomintang acabava de lançar uma rebelião aberta contra a autoridade de Chiang e se declarou a favor de estabelecer relações com o PCC. Mais ainda, a situação imediatamente expôs o governo e erodiu a frágil credibilidade que ele retinha, visto que agora ataca suas próprias forças com mais vigor do que defende a China contra os japoneses.

Mas o PCC fez o pior que podia fazer – vacilou. Mostrou-se indeciso no próprio momento em que surgia uma clara oportunidade revolucionária. Por quê?

Zhou Enlai e outros líderes estavam a favor de enviar imediatamente assistência militar a Fujian, mas foram vencidos pela liderança do partido controlada por Moscou (isto aconteceu ainda antes da ascensão de Mao ao poder) e por Mao, que temia as incertas repercussões militares e que não confiava em um movimento sobre o qual não tinha nenhum controle. Em vez disso, argumentaram que o 19º Exército devia sair de Fujian (dessa forma, traindo seu próprio apelo por um “Governo Revolucionário do Povo”), através de terrenos desconhecidos em direção ao sovíete de Jiangxi, onde poderiam fundir-se ao Exército Vermelho. Considerou-se que o Exército Vermelho poderia assim absorver e controlar este movimento mais facilmente (Ibid.).

Como resultado, as tropas do Exército Vermelho foram enviadas de Jiangxi, mas se detiveram a meio caminho. Os rebeldes estavam cercados pelo Kuomintang. Nenhuma das outras facções anti-Chiang do Kuomintang vieram para o resgate (como era de se esperar), em alguns casos alegando o caráter revolucionário do movimento como um obstáculo. Dessa forma, a Rebelião Fujian, à primeira vista, uma questão nacionalista, rapidamente se revelou como uma questão de classe. O PCC seria a única força a oferecer apoio e a ajudar a estender a luta por todo o país. Mas graças a preocupação do Partido com a sobrevivência rural, seus horizontes políticos ficaram estreitos. Em vez de verem este movimento como uma confirmação de sua perspectiva de luta de classes, eles o viram como uma dificuldade e uma perturbação de seus planos. Em meados de janeiro de 1934 esta valente rebelião foi derrotada.

Isto salienta ainda mais o fato de que o isolamento rural tinha colocado o Partido fora do centro da luta de classes na China. Assim que o movimento se desenvolvesse nas cidades, como certamente ocorreria, eles não tinham nenhuma base a partir da qual pudessem intervir. Tivesse o partido se concentrado em construir uma sólida base nos sindicatos, poderiam ter lançado uma campanha de solidariedade a Fujian por todo o país, com greves e apelos às fileiras militares do Kuomintang. Mesmo com o esmagamento do governo de Fujian, isto teria deixado um efeito duradouro sobre as relações de classe na China e servido para fortalecer massivamente a posição do PCC na classe trabalhadora.

A invasão progressiva

Os japoneses vinham testando a China desde 1931, avaliando a força de resistência do regime. Agora, estava óbvio que o regime não tinha nenhuma e, do ponto de vista do imperialismo japonês, seria insensato não tirar rapidamente proveito deste fato.

Pouco antes que a batalha de cinco semanas em Xangai tivesse terminado em março de 1932, a Província de Jehol (que faz parte do que é hoje Hebei, Liaoning e Mongólia Interior) foi invadida e anexada ao Manchukuo, o nome japonês da Manchúria controlada. Os japoneses, então, usaram essa base para forçar a retirada das tropas chinesas do Leste de Hebei. Em 1934, o Japão afirmou direitos e interesses especiais em toda a China na “Declaração de Amau”, assim como os EUA declararam toda a América Latina como sua esfera de influência permanente com a infame Doutrina Monroe.

Encontrando-se sem poder resistir, devido ao seu medo paralisante de mobilizar as massas chinesas (com suas simpatias comunistas), o governo chinês admitiu que seu título de “nacionalista” era uma fraude quando concordou com as exigências japonesas para suas tropas desocuparem todo o Hebei e Chahar de meados para o final de 1935.

Isto permitiu ao Japão instituir a comédia intitulada “Governo Autônomo da Mongólia Interior”, bem como a “Zona Anticomunista Autônoma de Hebei Leste”. A escolha do nome para o último e a cumplicidade do Kuomintang na aprovação disto revela a real divisão nesta guerra – as massas chinesas e os comunistas versus as classes dominantes da China e do Japão. A prova mais clara disso veio quando “as greves nas fábricas japonesas de Xangai, parcialmente como protesto patriótico contra a invasão japonesa de Suiyuan [Mongólia Interior], foram esmagadas com violência considerável pelos japoneses em cooperação com o Kuomintang” (Snow, op. cit.).

A isto se seguiu a vergonhosa tentativa japonesa de se colocar na “defensiva”, quando declarou o “Pacto Anticomintern”, em novembro de 1936, e afirmou que todo o norte da China era como uma zona tampão contra a URSS. Mas essa posição “defensiva” não podia encobrir a pilhagem imperialista evidente e crua da China, como era a guerra na realidade,

A China tinha perdido para os invasores japoneses cerca de um quinto do seu território nacional, mais de 40% de sua rede ferroviária, 85% de suas terras contestadas, grande parte de seu carvão, 80% de seus depósitos de ferro, 37% de suas melhores áreas florestais e cerca de 40% do seu comércio de exportação nacional. O Japão agora controlava mais de 75% do total de ferro-gusa e das empresas de mineração do ferro que restavam na China, e mais da metade da indústria têxtil chinesa” (Ibid.).

Traduzido por Fabiano Adalberto