A pandemia, a precarização e seus impactos na educação pública em Joinville

O impacto da pandemia de covid-19 na educação pública brasileira foi devastador para a classe trabalhadora. Como comunistas e trabalhadores da educação, sentimos e analisamos essas consequências na vida e no cotidiano da escola pública brasileira. Sendo resultado de um estágio docência para a graduação em História, as presentes reflexões surgem da experiência concreta na Escola Educação Básica Giovani Pasqualini Faraco, em Joinville/SC. 

O Brasil foi um epicentro de mortes causadas pela covid-19, deixando uma cicatriz profunda com mais de 700 mil vidas perdidas em todo o país. Em Joinville, foram 2.365 mortes e mais de 197 mil casos. Estes dados nos mostram que as cidades com governos mais reacionários foram onde constaram os maiores números de mortes, expressão de suas políticas anticientíficas. Além desta marcante tragédia humana, a pandemia também impactou a educação, resultando em lacunas significativas na aprendizagem, especialmente entre os alunos de escolas públicas, que, como sabemos, enfrentam muitos problemas, mas que certamente, após a pandemia, se duplicaram.

O fechamento das escolas durante a pandemia obrigou a transição para o ensino remoto, o que expôs as desigualdades tecnológicas e sociais entre os estudantes, além de também abrir a porta para o intuito privatista da educação que, independente da pandemia, visa impor o Ensino a Distância (EaD) na educação básica. De acordo com dados do IBGE, em 2021, cerca de 4,8 milhões de estudantes brasileiros não tiveram acesso à internet em suas casas, o que impossibilitou ainda mais o processo de aprendizagem. Esse cenário agravou o atraso educacional e hoje nós, educadores, percebemos muitos estudantes enfrentando dificuldades de leitura, escrita e compreensão, assim como problemas de concentração e uso excessivo de redes sociais durante as aulas.

Se por um lado temos os estudantes de escola pública prejudicados, por outro observamos que a pandemia também teve um impacto profundo na formação dos professores. Muitos dos professores recém formados enfrentam a difícil transição para o ensino híbrido, com parte de sua graduação ocorrendo à distância. A falta de apoio e recursos adequados durante esse período resultou em uma formação fragilizada, ocasionando uma sobrecarga de nossos corpos e mentes. Tal exploração certamente tem repercussões a longo prazo no sistema educacional como um todo. 

Hoje vemos na categoria muitos professores adoecidos, exaustos e desanimados com a profissão, sem um plano de carreira para assegurar suas vidas, já que a maioria passa a maior parte da vida profissional contratado em caráter temporário, o que intensifica ainda mais o adoecimento dos educadores. Os professores também lidam com o desinteresse dos alunos, reflexo das dificuldades estruturais enfrentadas pelas famílias trabalhadoras, que dia após dia lutam por sobrevivência em meio a uma crise econômica agravada pela pandemia, com condições de trabalhos insalubres e extremamente exploratórias, sem acesso digno à cultura, à educação, à saúde, ao transporte e ao lazer.

A crise do capital também levou a burguesia a realizar a implementação do Novo Ensino Médio (NEM). Longe de melhorar as condições educacionais, como vendida pelo governo e a imprensa, tem essencialmente o caráter privatizador da educação e novos ataques aos professores e alunos. O aumento da evasão escolar, especialmente no ensino médio, é um reflexo direto do NEM e do impacto da pandemia. Segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), a taxa de abandono escolar no ensino médio aumentou de 5,8% em 2019 para 8,3% em 2021, dado mais recente calculado pelo Inep. O Censo da Educação Básica revelou recentemente que são quase 70 milhões de brasileiros de 18 anos ou mais que estão fora da escola ou não concluíram a educação básica

Hoje muitos autores se debruçam a tentar entender os impactos da pandemia. O historiador francês François Hartog, ao discutir o conceito de “presentismo”, aponta para as consequências do imediatismo exacerbado pelo avanço digital, que obriga indivíduos e instituições a viverem sob um regime de urgência constante. Esse “presentismo”, intensificado durante a pandemia, propaga a sensação de tempo suspenso, onde o futuro se torna incerto e o presente, caótico. Embora o autor não chegue a esta conclusão, esta conjuntura é uma expressão da falência irreversível do capitalismo, que impede qualquer horizonte à juventude trabalhadora. Esse fenômeno teve efeitos profundos na educação, criando uma dissonância temporal que prejudicou o processo de aprendizagem e adaptabilidade dos estudantes e professores.

Nas experiências obtidas na escola Giovani Pasqualini Faraco ficou evidente o atraso educacional que a pandemia causou nos estudantes. Muitos alunos apresentaram limitações na escrita, incluindo a dificuldade básica de formar frases, sendo que a maioria respondia em tópicos as questões descritivas. Além disso, muitos alunos apresentavam dificuldades na comunicação e alguns manifestaram e compartilhavam sintomas de ansiedade generalizada e  depressão. Esses episódios estão relacionados à realidade geral de todas as escolas públicas em estudantes do ensino médio e fundamental, que enfrentam governo após governo o sucateamento da educação e tem suas formações prejudicadas. 

Diante desse cenário, a luta sindical dos educadores é fundamental, continuando a lutar por nossos direitos e pela melhoria das condições de trabalho e ensino. Nosso combate central deve ser dedicado à universalização do ensino, integral, científico e que ofereça aos jovens o conhecimento acumulado pela humanidade ao longo da história. A luta que nos interessa é por uma educação científica que realmente chegue para todos e que desenvolva o ser humano em todas as áreas. Esta bandeira está diretamente ligada à luta contra o capitalismo por um mundo socialista, onde a educação seja tratada como um direito fundamental e básico de todas as pessoas que vivem sob a Terra, onde não haja cortes, mas todo dinheiro necessário seja destinado à educação. Na sociedade capitalista, a educação se torna mais uma mercadoria e a burguesia e seus representantes definem o que é a “qualidade”.

A pandemia e suas consequências evidenciaram a falência da educação promovida pelo capital. A transformação dessa realidade passa por nossa unidade enquanto categoria, convocando o conjunto da classe trabalhadora para paralisações e greves, e toda nossa capacidade de auto organização proletária. Esses são os métodos construídos historicamente pela classe trabalhadora. Desta forma conseguiremos impedir a privatização da educação, expressado nacionalmente através do NEM, sancionado pelo governo Lula-Alckmin, e, aqui em Santa Catarina, pelos programas “Educação Empreendedora” e o falacioso “Universidade Gratuita”.

A revolucionária bolchevique Nadezhda Krupskaya, responsável pela educação soviética, argumentava que a verdadeira educação só pode ser conquistada quando livre e emancipada das amarras do sistema capitalista. Assim, a educação socialista estará a serviço da classe trabalhadora, promovendo não apenas o desenvolvimento intelectual, mas também a formação laboral, técnica e proletária, efetivando a Escola-Trabalho realmente emancipatória.

Em nosso tempo, este horizonte é construído pelas lutas de nossa classe pela educação pública, gratuita e para todos como programa de transição que combate os atrasos burgueses ao mesmo tempo que produz uma outra sociedade: a sociedade comunista internacional, onde a escola será um espaço livre e democrático e desenvolverá o ser humano em todas suas capacidades!

Referências:

INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira.
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
HARTOG, François. Regimes de Historicidade: Presentismo e Experiências do Tempo. Ed. L’Éditions du Seuil, 2020.
KRÚPSKAIA, Nadiéjda Konstantínovna. Educação e Revolução. In: NADIÉJDA KONSTANTÍNOVNA KRÚPSKAIA (1869-1939).