Detalhe do cartaz "Mulher emancipada – construa o socialismo!", de Adolf Strakhov, 1926

Construir o socialismo significa emancipar as mulheres e proteger as mães

Escrito por Leon Trotsky em 1925, o artigo que publicamos hoje traz uma importante análise sobre a situação da mulher nos primeiros anos da União Soviética, antes do processo de burocratização. Trotsky explica que a condição da mulher, especialmente enquanto mãe, é um indicador crucial do progresso social e cultural. A libertação da mulher da escravidão familiar e doméstica é vista como essencial para a construção do socialismo, assim como foi necessário libertar o campesinato para edificar o Estado Soviético.

A maternidade é colocada por Trotsky no centro das questões sociais, pois nela convergem os problemas econômicos, culturais e de infraestrutura — como moradia, saneamento, educação e saúde. Libertar a mulher é um passo fundamental para romper com os legados de opressão, ignorância e superstição herdados do passado.

A maneira mais precisa de medir nosso progresso é por meio das medidas práticas que estão sendo implementadas para melhorar a condição da mãe e da criança. Esse índice é altamente confiável; ele não mente. Revela de imediato tanto os êxitos materiais quanto as conquistas culturais em um sentido amplo. A experiência histórica demonstra que até mesmo o proletariado, já engajado na luta contra os opressores, demora a concentrar a atenção necessária na posição oprimida da mulher enquanto dona de casa, mãe e esposa. Tamanha é a força terrível do costume da escravidão familiar da mulher! Nem vale a pena falar do campesinato. O fardo e o desespero do destino da mulher camponesa — não apenas das famílias pobres, mas também das de classe média — provavelmente não podem ser comparados hoje nem mesmo com o mais severo regime de trabalhos forçados.

Sem descanso, sem feriados, sem um vislumbre de esperança! Nossa revolução está apenas começando a atingir as bases da vida familiar, sobretudo nas cidades, por enquanto nas regiões industriais, e apenas muito lentamente está se expandindo para o campo. E os desafios aqui são imensuráveis.

Transformar a posição da mulher em sua raiz só é possível se todas as condições da existência social, familiar e doméstica forem alteradas. A profundidade da questão da maternidade se expressa no fato de que a mãe é, essencialmente, um ponto vivo onde se cruzam todos os fios decisivos do trabalho econômico e cultural. A questão da maternidade é, antes de tudo, uma questão de moradia, de água encanada, de cozinha, de lavanderia, de refeitório. Mas é também uma questão de escola, de livros, de espaços de lazer. O alcoolismo atinge de forma mais impiedosa a dona de casa e a mãe. O analfabetismo e o desemprego também. Água encanada e eletricidade no lar aliviam, acima de tudo, o fardo da mulher.

A maternidade é a questão das questões. Aqui, todos os fios se entrelaçam e, daqui, se espalham novamente em todas as direções. O inegável crescimento da suficiência material no país torna possível — e, portanto, também necessário — ampliar incomparavelmente o cuidado com mães e crianças, numa escala muito maior e mais profunda do que até agora. O grau de nossa energia nesse campo mostrará até que ponto aprendemos a conectar os fins aos meios nas questões fundamentais da nossa vida.

Assim como foi impossível abordar a construção do Estado Soviético sem libertar o campesinato dos emaranhados da servidão, também é impossível avançar para o socialismo sem libertar a mulher camponesa e a operária da escravidão familiar e doméstica. E se antes determinávamos a maturidade de um trabalhador revolucionário não apenas por sua atitude em relação ao capitalismo, mas também por sua postura em relação ao camponês — ou seja, por sua compreensão da necessidade de libertar o camponês da servidão —, agora podemos e devemos medir a maturidade socialista do operário e do camponês progressista por sua atitude em relação à mulher e à criança, por sua compreensão da necessidade de libertar a mãe da servidão penal, de lhe dar a possibilidade de endireitar as costas e se envolver, como deve, na vida social e cultural.

A maternidade é o eixo central de todos os problemas. Por isso, cada nova medida, cada lei, cada passo prático na construção econômica e social deve ser avaliado também pela maneira como afetará a família: se agravará ou aliviará o destino da mãe, se melhorará a condição da criança.

O grande número de crianças sem lar em nossas cidades é o testemunho mais terrível do fato de que ainda estamos enredados, por todos os lados, nos resquícios da velha sociedade — que se manifesta da forma mais cruel na época de sua derrocada. A situação da mãe e da criança nunca foi tão difícil quanto nos anos de transição do velho para o novo, especialmente durante a guerra civil. A intervenção de Clemenceau e Churchill, e os elementos de Kolchak, Denikin e Wrangel atingiram de maneira mais brutal a operária, a camponesa, a mãe — e nos deixaram como herança um nível sem precedentes de crianças abandonadas. A criança vem da mãe, e a situação de rua da criança é, antes de tudo, fruto da situação de rua materna. O cuidado com a mãe é o caminho mais verdadeiro e profundo para a melhoria do destino da criança.

O crescimento geral da economia está criando as condições para uma reconstrução gradual da vida familiar e doméstica. Todas as questões relacionadas a isso devem ser colocadas em sua plena magnitude. Estamos avançando em várias frentes na renovação do capital básico do país: adquirimos novas máquinas para substituir as antigas, construímos novas fábricas, modernizamos nossas ferrovias; o camponês passa a dispor de arados, semeadores, tratores.

Mas o “capital” mais fundamental é o povo — ou seja, sua força, sua saúde, seu nível cultural. Esse capital precisa de renovação ainda mais do que os equipamentos das fábricas ou as ferramentas dos camponeses. Não se pode imaginar que séculos de escravidão, fome e servidão, anos de guerra e epidemias tenham passado sem deixar marcas. Pelo contrário, deixaram feridas e cicatrizes no organismo vivo da população. Tuberculose, sífilis, neurastenia, alcoolismo — todas essas doenças, entre outras, estão amplamente disseminadas entre as massas. A nação precisa ser curada. Sem isso, o socialismo é impensável.

É necessário ir às raízes, às fontes. E onde está a fonte da nação, senão na mãe? A luta contra o abandono das mães deve ocupar o primeiro plano! A construção de moradias, creches, jardins de infância, refeitórios e lavanderias comunitárias deve estar no centro das atenções — e essa atenção deve ser vigilante e bem organizada. Aqui, as questões de qualidade são decisivas. Os serviços de cuidado infantil, alimentação e lavanderia devem ser organizados de modo que, pelos benefícios que oferecem, possam desferir um golpe fatal contra a antiga estrutura familiar fechada e isolada, sustentada inteiramente sobre os ombros curvados da dona de casa e da mãe.

A melhoria do ambiente inevitavelmente desperta uma demanda crescente e, com ela, um aumento dos recursos disponíveis. O cuidado das crianças em instituições públicas, assim como a alimentação dos adultos em refeitórios comunitários, é mais barato do que no seio da família. No entanto, a transferência de recursos materiais do núcleo familiar para creches e refeitórios só ocorrerá se a organização social aprender a atender às necessidades mais básicas melhor do que a própria família. Agora, é essencial prestar atenção especial às questões de qualidade.

O controle social vigilante e a pressão constante sobre todos os órgãos e instituições que atendem às necessidades familiares e domésticas das massas trabalhadoras são essenciais.

As protagonistas na grande luta pela libertação das mães devem ser, naturalmente, as trabalhadoras mais avançadas. A qualquer custo, esse movimento deve ser levado ao campo. Mesmo em nossa vida urbana, ainda há muito do caráter pequeno-burguês e camponês. A visão que muitos operários têm das mulheres ainda não é socialista, mas conservadora, camponesa, essencialmente medieval. Assim, a mãe camponesa, oprimida pelo jugo da família, arrasta consigo a mãe operária. A mulher camponesa precisa ser elevada. Ela deve desejar sua própria elevação — ou seja, deve ser despertada e orientada quanto ao caminho a seguir.

É impossível avançar deixando a mulher para trás. A mulher é a mãe da nação. Da escravidão feminina nascem preconceitos e superstições que envolvem as crianças da nova geração e penetram profundamente por todos os poros da consciência nacional. O melhor e mais profundo caminho de combate à superstição religiosa é o da preocupação integral com a mãe. Ela precisa ser elevada e esclarecida. Libertar a mãe significa cortar o último cordão umbilical que liga o povo ao passado obscuro e supersticioso.

Dezembro de 1925

TRADUÇÃO DE JESSICA STOLFI.