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Boletim SASP – Qual é a situação hoje do Movimento das Fábricas Ocupadas?
Serge Goulart – Neste momento estamos concentrados na luta política, social e jurídica pelo fim da intervenção na Cipla e Interfibra. Isto de certa forma paralisa as atividades de ocupação de fábricas que estão ameaçando fechar ou demitir em massa. A Flaskô segue funcionando em Sumaré (SP), mas com muitas dificuldades, pois além do cerco ilegal do interventor (que liga para os clientes da fábrica dizendo que a produção e as mercadorias são roubadas), temos a ação da CPFL que tenta desde a intervenção e em coordenador com o interventor, cobrar dívidas milionárias dos antigos patrões e se recusa a conceder qualquer prazo ameaçando fechar a fábrica. Aliás, em julho e agosto, a CPFL cortou a energia por 45 dias. A luta para salvar a Álcalis, no Rio de Janeiro, está parada por falta absoluta de recursos e meios. Outras fábricas em São Paulo, Pernambuco,Paraná e Rio Grande do Sul estão esperando nossa ajuda mas estamos neste momento sob intenso ataque do governo, da grande imprensa e do judiciário de forma que nossas forças se concentram nesta questão de terminar com a intervenção.Uma ajuda importante que precisamos hoje é de advogados. Precisamos processar a revista VEJA pelas calúnias que divulgou e temos dificuldades,pois não temos recursos e os advogados que temos são da área trabalhista. Temos recebido apoio nacional e internacional muito importante e isto nos dá um alento muito grande.
Boletim SASP – Como estava sendo o trabalho de vocês desde 2002, quando vocês tomaram conta de duas fábricas e começaram a produzir? Quais as fábricas que vocês ocuparam, qual a produção de vocês e quantos empregos foram mantidos ou criados?
Serge Goulart – O movimento começou com a Cipla e Interfibra com 1.000 trabalhadores. A Interfibra estava parada há três meses com faturamento zero e zero de salários. A Cipla estava fechando com um faturamento de R$ 900 mil e pagando entre R$ 20 e R$ 50 por semana. Agora quando houve a intervenção a Cipla faturava R$3,5 milhões /mês e os salários estavam em dia. A Interfibra está faturando cerca de R$1,5 milhão/mês e os salários estão em dia. Desde a intervenção os salários só são pagos até o limite de R$1 mil reais. Desde 2002 foram cerca de 15 fábricas ocupadas em Pernambuco, São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná e Santa Catarina. A maioria foi derrotada por fortes aparatos policiais e medidas judiciais de estrangulamento econômico e financeiro. Algumas sobreviveram, como a JB Costa, em Recife. Outras se tornaram cooperativas com 20% dos trabalhadores. Podemos afirmar que desde o início salvamos cerca de 2.000 empregos diretamente. Mas o mais significativo foi o recuo dos patrões que em muitos lugares pararam de organizar falências fraudulentas com medo de perder a fábrica.Por exemplo, em Joinville quase não houve mais falências ou demissões em massa depois que ocupamos a Cipla e Interfibra. A metalúrgica BUSSCAR ameaçou demitir dois mil metalúrgicos e nossa luta propondo a ocupação e uma caravana a Brasília para exigir providências de Lula fez a empresa recuar.
Boletim SASP – Por que o INSS entrou com processo contra vocês?
Serge Goulart – Formalmente para cobrar uma dívida dos ex-patrões de 1998.Cerca de R$ 2,3 milhões de reais de apropriação indébita cometida pelos ex-proprietários. Na verdade, o pedido de intervenção feito pelo INSS em outubro de 2006 tinha e tem o objetivo definido pelo governo Lula de fechar as empresas e liquidar o movimento das fábricas ocupadas. É uma questão política.
Boletim SASP – Qual o objetivo do Movimento das Fábricas Ocupadas?
Serge Goulart – Nosso objetivo é salvar os empregos e manter as fábricas funcionando. Consideramos que onde uma fábrica fecha cria-se um cemitério de postos de trabalho, tudo morre em volta e a classe trabalhadora é empurrada para a barbárie. Ao contrário, onde abre uma fábrica, tudo floresce como na primavera.Consideramos que a responsabilidade desta situação, que vivemos no Brasil,hoje, é dos governos e dos patrões. Os governos servis organizam a economia para a rapina dos bancos e das multinacionais. Os governos cortam os serviços públicos, entre eles a fiscalização do trabalho e das contribuições sociais, isso permite a impunidade patronal que conhecemos. Dos capitalistas, então, não é preciso explicar. Eles chupam a laranja e jogamos trabalhadores fora como bagaço. São parasitas. Aliás, em cinco anos mostramos na prática que não precisamos deles para produzir. São sanguessugas inúteis.
Boletim SASP – O Movimento das Fábricas Ocupadas está sendo criminalizado?Por que?
Serge Goulart – Porque é a forma “legal”, hoje, de reprimir os movimentos sociais. O governo Lula e mesmo o de FHC não tem e não tinham condições políticas de reprimir abertamente os movimentos. Eles cairiam. Então, usam a lei que eles fizeram para proteger seus interesses de classe.No caso das fábricas, nos acusam de absurdos como o crime de “pagar passagem para militantes do MST”, “gastar dinheiro em congressos internacionais”, de“viagens de férias no Caribe com dinheiro da empresa” quando fomos ao 1º de maio em Cuba e participamos do 6º Encontro Hemisférico Contra os Tratados de Livre Comércio, etc. É tudo para intimidar e destroçar o movimento pressionando, quebrando militantes e aterrorizando gente. Mas, estão enganados. Em minha opinião Lula deu uma bola fora grave. E vai ficar manchado por isso para sempre. Quem manda a polícia invadir uma fábrica e reprimir violentamente trabalhadores para proteger a propriedade privada e os interesses dos capitalistas, este não tem mais volta e demonstra inequivocamente que sua política está completamente do lado dos patrões. E os juízes que se prestam a ser o instrumento desta política mostram que são apenas serviçais que não tem escrúpulos quando se trata de defender o capital. É o caso deste juiz federal substituto Oziel Francisco de Souza. A quantidade de barbaridades legais que ele cometeu deve ensejar inclusive ações contra ele. Por exemplo, para “cobrar uma dívida previdenciaria dos antigos proprietários da Cipla, ele arrolou na decisão de intervenção, a Interfibra, outra empresa (só que também controlada pelos trabalhadores), e ainda arrolou a Flaskô, que é outra em Sumaré, SP, e por cima de tudo a Associação Ferreirinha, que é uma associação dos trabalhadores do Movimento das Fábricas Ocupadas. Depois que reagimos e o interventor foi expulso da Flaskô, ele teve que recuar e retirou a Flaskô e a Associação da decisão. Ou seja, ele “tentou” pegar tudo como não conseguiu recuou para se proteger. É absurdo o que ele está fazendo.