O coronavírus encontrou um sistema capitalista já em crise. O sistema de saúde, direitos trabalhistas e a previdência social já estavam sendo atacados no mundo inteiro. Tudo para garantir a continuidade de lucro aos poucos que já detém a maior parte da riqueza mundial.
O Comitê de Ação Fora Bolsonaro que reúne jovens e trabalhadores de Joinville, Itajaí e Rio Negrinho entrevistou alguns trabalhadores para saber como tudo isso impacta na vida concreta de cada um. A conversa abaixo foi com uma jovem atriz, Patrícia Waltrick, de 23 anos.
Patrícia, como era o seu trabalho antes da pandemia?
Trabalho em um grupo de teatro que presta serviço a empresas, que na sua maioria são prestadoras de serviços públicos, como fornecimento de água e coleta de lixo. Ninguém tem carteira assinada, somos todos MEIs, sendo assim não temos nenhum direito trabalhista nem salário fixo. O espetáculo é levado a escolas e empresas e é financiado por essa empresa prestadora de serviço público. Nosso contrato não protege em nada o ator, que é a ponta da corda.
Até pela flutuação no faturamento, muitos artistas, assim como eu, acabam tendo uma renda complementar, que podem ser as mais variadas. Por isso, eu trabalhava também em um bar/ casa de show nos fins de semana à noite. Precisava fazer isso porque nem sempre os cachês do meu emprego como atriz chegam no tempo necessário. Então era necessária essa dupla jornada pra ter o mínimo de estabilidade.
Há tempo quanto trabalha como atriz?
Estou há oito meses nesse emprego como atriz e há cerca de cinco meses no bar.
O que mudou nos seus trabalhos com a pandemia do coronavírus?
Com a crise, as primeiras atividades cortadas foram escola, teatro, cinemas e casas de show. Elas serão também muito provavelmente as últimas a voltar ao funcionamento normal. Isso impactou a companhia para a qual eu trabalho, pois os contratos assinados precisam ser cumpridos e seria preciso mudar a forma para vídeo, por exemplo, o que tem um custo, alguém teria que pagar por essa diferença e o contratante provavelmente não aceitaria tal manobra.
No bar, eles estão trabalhando em capacidade reduzida entregando por delivery.
Qual o número de funcionários nos locais onde você trabalha? Houve demissão?
No grupo, são dois atores (MEIs) e os donos da produtora. Todos estamos com trabalhos e salário suspensos por tempo indeterminado.
No bar, eram cinco freelancer; um cozinheiro, que possui registro CLT; e os donos (ME). Somente os donos e o cozinheiro permanecem trabalhando e não temos previsão de retorno.
Você se sente segura em relação ao seu emprego?
Não. Não sei quanto tempo isso vai durar, como me manterei depois que acabar as parcelas do auxílio nem sei como minha área vai pensar suas atividades depois disso tudo.
O auxílio que o governo ofereceu é pensado apenas para três meses, mas para os artistas o prejuízo será de muito mais tempo e mais danoso, pois não está sendo pensado em alternativas e soluções para nossa área. Além disso, o valor do auxílio é baixo, por poucos meses e existe a dificuldade de ter acesso ao dinheiro. Eu, depois de duas semanas tentando, consegui transferi-lo para minha conta, mas até agora não caiu. É um sistema lento, nada prático, principalmente para os mais pobres, que não têm acesso à tecnologia e à informação.
Como você avalia as ações do governo Bolsonaro no combate à pandemia?
Incompetente, irracional e revoltante. Tanto no controle da doença, medidas de proteção da população, plano de crise, como no trato com aos pequenos empresários, que estão vendo seu negócio falir e aos autônomos e informais, que hoje são maioria no Brasil por resultado do desmonte das leis trabalhistas.
Como você avalia as ações do governo do estado de SC no combate à pandemia?
No início da crise, o governo pareceu agir rápido, o que deu certa confiança. Porém, agora está cedendo a grupos de comerciantes que pressionam, tem flexionado as medidas de prevenção mesmo com o crescimento do número de casos, o que me faz acreditar que o momento pior ainda não chegou.