Foto: Ministério da Cidadania

O Programa Auxílio Brasil e o aumento da miséria

O Governo Bolsonaro apresentou no dia 09 de agosto deste ano ao Congresso Nacional a Medida Provisória (MP) nº 1.061/2021, que institui o Programa Auxílio Brasil e o Programa Alimenta Brasil – o novo programa de transferência de renda – e revoga o Programa Bolsa Família, criado pela Lei nº 10.836, de 09 de janeiro de 2004.

A MP elenca que o Programa Auxílio Brasil será executado visando “ao fortalecimento das ações do Sistema Único de Assistência Social – SUAS”; porém, foi elaborado de forma autoritária, com falta de diálogo e de transparência, ao não incluir nas discussões a participação dos operadores do SUAS e dos estados e municípios, visto que são eles que executam e administram programas sociais.

Considerando o legado de destruição de direitos que o governo Bolsonaro possui, não é de estranhar que nesta propositura haja algo com outras intenções. Esta suposição encontra respaldo no fato de não se saber, até então, informações fundamentais como verbas, valores do benefício, financiamento, visto que essas questões serão esclarecidas em futuro regulamento.

A extinção do Programa Bolsa Família (instituído na gestão Lula) pelo Programa Auxílio Brasil nos faz pensar numa intenção personalista e eleitoreira para 2022, ao tentar trazer para si o novo programa vinculando-o ao Auxílio Emergencial (instituído em sua gestão durante a pandemia). Cabe pontuar a possibilidade de restrição de direitos, sendo possível que muitas pessoas beneficiárias do Programa Bolsa Família e do Auxílio Emergencial fiquem de fora do novo programa socioeconômico.

Segundo o texto da MP proposta por Bolsonaro, um dos objetivos do Programa Auxílio Brasil é “estimular a emancipação das famílias em situação de pobreza e extrema pobreza”, principalmente por meio “do incentivo ao empreendedorismo, ao microcrédito e à inserção ao mercado de trabalho formal” (art. 1º, VII, c).

O Programa Auxílio Brasil é composto pelos seguintes benefícios financeiros: Benefício Primeira Infância; Benefício Composição Familiar; Benefício de Superação da Extrema Pobreza; Auxílio Esporte Escolar; Bolsa de Iniciação Científica Júnior; Auxílio Criança Cidadã; Auxílio Inclusão Produtiva Rural; Auxílio Inclusão Produtiva Urbana; e Benefício Compensatório de Transição. Nada se sabe sobre valores, como se dará a transição, se todos serão contemplados ou se beneficiários do Programa Bolsa Família ficarão de fora. Questões como essas e outras ficam a cargo de definição “pelo regulamento”. Porém, os parágrafos 2º e 3º do art. 3º nos apontam que haverá um “enquadramento”, como se pode ver:

2º  São elegíveis ao Programa Auxílio Brasil as famílias em situação de extrema pobreza e as famílias em situação de pobreza, nos termos do regulamento.
3º  As famílias que, nos termos do regulamento, se enquadrarem na situação de pobreza, apenas serão elegíveis ao Programa Auxílio Brasil se possuírem, em sua composição, gestantes ou pessoas com idade até vinte e um anos incompletos.

No que se refere ao Auxílio Esporte Escolar e ao Bolsa de Iniciação Científica Júnior, o Programa Auxílio Brasil mostra sua lógica meritocrática, ao dizer que os beneficiados serão aqueles “que se destacarem em competições oficiais do sistema de jogos escolares brasileiros” e “que se destacarem em competições acadêmicas e científicas”, respectivamente.

Quanto à exclusão do programa de transferência de renda, o texto usa, eufemisticamente, a palavra “emancipação”:

“As famílias beneficiárias que tiverem aumento da renda per capita que ultrapasse o limite de renda para concessão dos benefícios previstos nos incisos I, II e III do caput do art. 3º serão beneficiadas pela regra de emancipação”.

Há também um sórdido incentivo à consignação em que os beneficiários (diga-se, pessoas em situação de pobreza ou de extrema pobreza) autorizem descontos “de forma irrevogável e irretratável” em seus benefícios para uma instituição financeira “para fins de amortização de valores referentes ao pagamento mensal de empréstimos e financiamentos, até o limite de trinta por cento do valor do benefício”.

Quanto ao controle social, a MP diz o seguinte: “O controle e a participação social do Programa Auxílio Brasil serão realizados, em âmbito local, pelo respectivo Conselho de Assistência Social”. O governo Bolsonaro extinguiu diversos Conselhos, dentre eles o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), em 01/01/2019; porém, no art. 40 se diz “Os Conselhos de Segurança Alimentar e Nutricional – Consea são instâncias de controle e participação social do Programa Alimenta Brasil”.

No que se refere ao entendimento de famílias, de forma atrasada e conservadora, a Medida Provisória considera, “eventualmente” (sic), como família indivíduos que possuam laços de parentesco ou de afinidade” (Art. 2º, I, P.U.). A família com pai, mãe e filhos não representa mais a realidade brasileira. Portanto, a MP deixa de considerar a pluralidade das famílias.

Quanto ao Programa Alimenta Brasil, também criado pela MP, ele “poderá” (sic) ser executado nas modalidades: compra com doação simultânea; compra direta; incentivo à produção e ao consumo de leite; apoio à formação de estoques; e compra institucional.

Não se pode deixar de refletir sobre o incentivo por soluções individuais, pois o Programa busca o “incentivo ao esforço individual”, bem como promover “ao empreendedorismo, ao microcrédito e à inserção ao mercado de trabalho formal”. Aqui há uma lógica perversa em considerar que a situação de pobreza e de desemprego é de responsabilidade individual e não do sistema capitalista. A MP diz que visa à “promoção de oportunidades de capacitação e de empregabilidade dos beneficiários, de forma a proporcionar autonomia”. Atualmente, são muitos os casos de profissionais graduados e pós-graduados desempregados em busca de qualquer emprego que lhe possa fornecer renda. Logo, não são a formação e a capacitação profissional que garantem emprego, pois para explorar mais e baratear a força de trabalho o sistema capitalista precisa de uma massa de trabalhadores que não conseguem sequer vender sua força de trabalho – a única coisa que possuem. E o exército industrial de reserva cada vez cresce mais…

Outra questão é o estímulo ao empreendedorismo, uma palavra eufêmica para designar desempregados, pessoas sem proteção social, sem direitos trabalhistas e previdenciários. Romantiza-se o desemprego e se culpabiliza o indivíduo por estar na condição de depender de auxílio estatal e, assim, se reforça que ser beneficiário de programa de transferência é um ócio, como sendo algo vantajoso e cômodo para quem recebe… Deixa de ser direito para ser ajuda, favor – o que fica reforçado com esta proposta clientelista que a MP traz.

Há também na MP uma espécie de bônus no recebimento do Auxílio Criança Cidadã, cuja família estará elegível se houver “ampliação de renda identificada mediante atividade remunerada ou comprovação de vínculo em emprego formal”; e, mais à frente, se diz o seguinte:

“1º  A ampliação de renda identificada mediante atividade remunerada prevista no caput considera, para efeitos do Auxílio Criança Cidadã, os empregados autônomos, empreendedores individuais, profissionais liberais ou aqueles que obtiverem aumento de renda mediante atividade remunerada registrada no CadÚnico”.

Aqui fica mais que clara a perspectiva de ócio atribuída a beneficiários de programas de transferência de renda, na medida em que aquele/a que demonstra aumento da renda seja recompensado/a!

Considerando que governos anteriores restringiram direitos, culminado com o obscurantismo e a máxima subserviência do governo Bolsonaro ao imperialismo, num contexto de aumento da fome (com pessoas em fila para receber ossos como doação), enquanto o agronegócio muito produz, porém para exportação, encarecendo o preço dos alimentos para o mercado interno; com trabalhadores passando a cozinhar em fogão de lenha por não poderem comprar gás de cozinha; desempregados em sinais de trânsito com placas penduradas ao pescoço pedindo emprego; falta de vagas na educação infantil, na educação básica e no ensino superior para todos; não se pode esperar que Bolsonaro continue governando até 2022 sob o pretexto de respeito às instituições democráticas (burguesas). É preciso mobilização e participação na construção do partido revolucionário internacional, pois a barbárie já mostra sua face, porém ela é muito pior; e dela temos conhecimento de como está ocorrendo nos mais diversos países do mundo…

Convidamos você a conhecer a e se integrar à Esquerda Marxista e participar de um dos Comitês de Ação pelo “Abaixo Bolsonaro, por um governo dos trabalhadores sem patrões nem generais!”.

Chamamos-te a fazer o que nos conclama o Hino da Internacional Comunista:

“De pé, ó vitimas da fome!
De pé, famélicos da terra!
Da ideia a chama já consome […]

Bem unido façamos
Nesta luta final
Uma terra sem amos
A internacional
Senhores, patrões, chefes supremos
Nada esperamos de nenhum!
Sejamos nós que conquistemos
A terra mãe livre e comum! […]

Façamos nós por nossas mãos
Tudo o que a nós nos diz respeito!”

Referências

Medida Provisória nº 1.061, de 09 de agosto de 2021. Institui o Programa Auxílio Brasil e o Programa Alimenta Brasil, e dá outras providências. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2021/Mpv/mpv1061.htm