No dia 24 de março os trabalhadores do serviço público municipal de Florianópolis deram início a greve contra o retorno às aulas presenciais nas unidades de educação do município. A data marca o primeiro dia que o Prefeito Gean Loureiro (DEM), em conjunto com o secretário de Educação, Maurício Fernandes, estabeleceu para que os profissionais da educação retornassem às escolas e núcleos de educação infantil e de jovens e adultos que até então seguiam com o atendimento na modalidade remota desde abril do ano passado.
Sabendo da pressão para o retorno presencial sem as mínimas condições sanitárias (EPIs, controle da pandemia, testagem em massa, vacina para todos) que os demais estados e municípios vinham fazendo junto aos professores desde agosto de 2020, pautamos a situação junto ao sindicato da categoria (Sintrasem), que organizou reuniões e assembleias nas quais a categoria definiu “estado de greve”, com instalação da greve assim que o prefeito anunciasse o primeiro dia de retorno presencial. Paralelo a isso, cobramos para que o sindicato fizesse essa discussão junto às reuniões pedagógicas virtuais que estavam acontecendo quase que semanalmente na maioria das unidades educativas, procurando tirar dúvidas e elevar o nível político da discussão em todos os locais de trabalho.
A manutenção do estado de greve e o anúncio da sua deflagração, tão logo houvesse uma data definida para o retorno presencial, fizeram com que o prefeito recuasse na abertura das escolas já no início de março de 2021, conforme havia anunciado. Ao observar o recuo demonstrado pela prefeitura, a atual direção do Sintrasem (composta por militantes da corrente do PT O Trabalho e simpatizantes), em reunião com os representantes das oito forças políticas que compõem a sua base, propôs que a assembleia prevista para o dia 8 de março não mais acontecesse e que, em seu lugar, fosse realizada uma live com especialistas da saúde falando sobre o tema. Nós da corrente sindical Esquerda Marxista Florianópolis fomos a única corrente que reafirmou e defendeu a importância da manutenção da assembleia como espaço não apenas de formação, mas, principalmente, de diálogo e fortalecimento da posição política de toda a categoria. Assim, a assembleia foi mantida, configurando-se como mais um momento de resistência e preparação para a greve que seria deflagrada duas semanas depois.
Apostando na divisão da categoria, a Secretaria de Educação definiu datas de retorno diferentes para as unidades escolares, estabelecendo que algumas retornariam presencialmente dia 24 de março, outras dia 30 do mesmo mês e outras, ainda, ficaram com as datas de 05 e 09 de abril, fechando com esta última data a volta presencial de todos os professores, crianças e estudantes às unidades escolares.
Essa estratégia do executivo municipal pesou para a adesão à greve de alguns profissionais já no seu primeiro dia. Contudo, a ilusão de que a prefeitura ofereceria as condições sanitárias seguras até a data prevista para o ensino presencial foram desfeitas uma a uma. A pandemia de Covid-19 em Florianópolis segue se alastrando, com a rede estadual de saúde colapsada como na maioria dos municípios de Santa Catarina e de outros estados. De janeiro a março foram registrados números de óbitos em decorrência da Covid-19 maiores que os totalizados no ano de 2020. Há filas de pacientes aguardando leitos de UTI, a emergência pediátrica foi reduzida a um único hospital, o número de crianças e jovens infectados cresce a cada dia.
Das quatro unidades escolares que iniciariam as atividades presenciais no dia 24 de março, uma conseguiu funcionar por apenas três dias por falta de EPIs e outra sequer conseguiu receber as crianças, sendo fechada por conta de uma profissional ter testado positivo para Covid-19 após ter ido organizar o espaço na unidade para receber as crianças. Aqui cabe lembrar o fatídico episódio ocorrido no início deste ano letivo num núcleo de educação infantil localizado na região norte, onde após uma reunião presencial realizada só entre adultos e incentivada pela Secretaria de Educação, tivemos 19 profissionais positivados para Covid-19, estando entre esses o diretor, Geraldo Valadares, que veio a óbito semanas depois.
Vale salientar que algumas unidades estavam também com expectativas de que a prefeitura iria cumprir o Plano de Contingência (PlanCon) exigido para que cada unidade fizesse o seu. Plantaram a falsa ideia de que o PlanCon seria cumprido e as unidades educativas teriam as condições ideais para abrir suas portas para receber a comunidade escolar.
Dessa forma, o prefeito retira sua responsabilidade enquanto gestor e coloca nas mãos de cada unidade escolar. Isso ficou evidente com a exigência de que a comissão que elaborou o PlanCon em cada unidade educativa assinasse um termo que a responsabiliza civil e criminalmente por qualquer ato que venha a colocar em risco a vida dos que irão frequentar aquele espaço.
Com um trabalho militante feito desde o primeiro dia junto ao comando de greve (do qual participam, além dos representantes dos locais de trabalho, todos aqueles da base que querem ajudar a construir a greve), estamos conseguindo fazer com que a tentativa de divisão da categoria implementada pelo prefeito Gean Loureiro se reverta em adesão e apoio à greve.
Temos participado de reuniões pedagógicas remotas para dialogar com os trabalhadores que ainda não aderiram ao movimento, realizado reuniões para explicar às famílias os motivos da greve e angariado apoio, avaliando e construindo a greve pari passu e garantindo a realização de assembleias frequentes para discutir com o conjunto da categoria. Dessa forma vamos exercitando os métodos de luta da classe trabalhadora.
Parar totalmente o trabalho, fazer greve de verdade!
Na assembleia ocorrida no dia 19/03, que deflagrou a greve que iniciou no dia 24/03, e, logo após, na assembleia do dia 25/03 (já com a categoria em greve) surgiu a proposta em oposição à paralisação total do trabalho: “continuidade do trabalho remoto, aguardando todas as unidades retornarem presencialmente para só a partir daí iniciar a greve”.
Até aqui a corrente sindical Esquerda Marxista em conjunto com outros trabalhadores já tinha trazido para discussão nas assembleias relatos de vários locais do país em que os profissionais da educação optaram pela chamada “greve sanitária”, ou seja, manutenção das atividades remotas sem ir presencialmente para as unidades. A avaliação dessas “greves sem greve” foi seriamente discutida, demonstrando as retaliações sofridas pelos profissionais que a ela aderiram, além de sua pouca efetividade. Portanto, só uma greve total e militante seria possível para arrancar da prefeitura nossa pauta. Esse debate foi superimportante, refletindo na ampliação da consciência política de nossa base que, nas duas vezes, votou em sua maioria pela manutenção da greve com cessação total do trabalho.
Cabe salientar que apesar dos profissionais da educação serem a grande maioria nesta greve, também contamos com trabalhadores da assistência social e de outros órgãos da prefeitura que estão conosco. Os trabalhadores da saúde, na medida do possível, estão participando de reuniões com as comunidades chamadas pelas escolas para explicar o caos instalado com a pandemia e prestar seu apoio à greve.
Contudo, sabemos que, mesmo sendo importante esse apoio, é preciso ir além: há profissionais da saúde morrendo, além de estarem exauridos físico e emocionalmente. Nossa defesa é de que esses trabalhadores participem das assembleias para expor suas reivindicações por melhores condições e segurança no trabalho e deliberemos juntos as ações, não descartando a possibilidade de eles aderirem à greve.
Os limites de uma greve realizada num momento de colapso por causa da pandemia da Covid-19
Temos uma tradição de luta onde sempre desenvolvemos vários métodos de mobilização, como assembleias, passeatas e atos de rua. Com a pandemia e a necessidade de manter distanciamento social, nossa categoria se vê diante de um dilema: como fazer uma greve que gere impacto na cidade quando a maioria das ações acontecem pelos meios virtuais? Os encontros na praça para assembleia foram substituídos por assembleias virtuais. Nessas assembleias temos contado com cerca de 1.000 a 1.500 participantes e, a princípio, todos têm direito a voz e voto. Há falas de militantes das forças políticas organizadas em nossa base e novas vozes que estão surgindo. Mesmo tendo uma participação expressiva da categoria, a certeza da coletividade e de nossa força, ficamos limitados à tela do computador.
Os atos de rua organizados até o momento têm contado com pouca participação da base procurando manter as medidas sanitárias de segurança e, mesmo sendo importantes, têm apresentado pouca efetividade na pressão para abrir negociação junto ao executivo.
As manifestações têm ocorrido essencialmente nas redes sociais com materiais produzidos pela base e pela direção do sindicato. Com relação a este último, tem deixado um pouco a desejar uma vez que só após uma semana de greve é que coloca em xeque a imagem do prefeito e sua base de governo.
Mesmo diante de todos esses dilemas, observamos que a greve avança com novas adesões ao movimento. Mantê-la forte e coesa é um desafio que se coloca a todos nós nesse momento.
O que reivindicamos
Com o lema “essencial é a vida”, nossa greve leva o nome do nosso primeiro companheiro que tombou diante da Covid-19 no espaço de trabalho: Geraldo Valadares.
É em nome de Geraldo e de todos os demais trabalhadores que tiveram suas vidas ceifadas pela opção capitalista de salvar lucros em vez de vidas que organizadamente lutamos. Essa tem sido a opção de Bolsonaro, seguida à risca pelos governos estaduais e municipais e, por assim ser, aplicada disciplinadamente pelo prefeito de Florianópolis, Gean Loureiro.
Nesse momento, os trabalhadores do serviço público de Florianópolis seguem a sua histórica tradição de organização, unidade e luta para enfrentar Gean e todos aqueles que são partidários de sua política. Se a eles cabe a responsabilidade por cada morte, a nós cabe a incansável defesa da vida!
- Vacina para todos já!
- Testagem em massa!
- EPIs de qualidade, certificados pelo Inmetro!
- Atividades presenciais só com segurança sanitária!