Imagem: Isabelle Rieger, Sul21

Quem vai parar o machado e o chicote do Zaffari? A luta por Sabará e pela redução da jornada de trabalho

Dois expoentes da burguesia, o grupo Zaffari e a Companhia Melnick, estão em meio à crise climática e, após as enchentes, contribuindo para o desmatamento em Porto Alegre, além de obterem seus lucros sob uma exploração brutal da classe trabalhadora, com jornadas de trabalho análogas à escravidão por meio de escalas 10×1, 6×1 etc. Nós, comunistas, lutamos para tirar o machado e o chicote das mãos ensanguentadas da burguesia.

A floresta do Sabará, localizada no bairro Jardim Itu-Sabará, em Porto Alegre, é uma área de aproximadamente 50 hectares de Mata Atlântica. O monitoramento dessas áreas é feito com imagens de satélite há 29 anos. Localizada em um território que historicamente foi habitado por nativos, principalmente os Guaranis e os Kaingangs, a floresta não é apenas um espaço de recursos naturais para os povos indígenas, mas também um espaço sagrado e culturalmente importante, com fortes ligações com aqueles que habitavam ou ainda habitam a região. A vegetação natural inclui, além das florestas nativas, refúgios, várzeas, campos de altitude, mangues, restingas e dunas; muitas espécies são endêmicas ou estão ameaçadas de extinção.

Acontece que essa área está correndo um grande risco de ser completamente devastada, com apenas 12,5% da área original preservada. Desde o início de março de 2024, iniciou-se o desmatamento dessa área para a construção de um hipermercado do Grupo Zaffari, com planos futuros para um shopping center, quatro torres comerciais e um condomínio de luxo, empreendimento imobiliário da Companhia Melnick. O Grupo Zaffari é o principal responsável por esse desmatamento, dando início às obras. Outras construtoras contratadas para tal também carregam sua culpa ao aceitar tamanha crueldade.

O projeto de desmatamento, por mais incrível que pareça, conta com a aprovação de órgãos como a Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam), que concede licenças ambientais para sua realização. Isso não surpreende tanto, visto que, em 2019, o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), e a Assembleia Legislativa aprovaram um novo código ambiental que flexibilizou 480 pontos da lei estadual de proteção ambiental.

O Projeto de Lei 431/2019 traz mudanças preocupantes: no capítulo IV da minuta, inciso VIII do CEMA – do licenciamento ambiental, o artigo 53, § 4° indica que o Consema poderá estabelecer outras formas de licenças, facilitando a criação de documentos sem amparo técnico. Já no capítulo XIII, que trata dos biomas Mata Atlântica e Pampa, foram suprimidos os artigos que determinavam que o tombamento da Mata Atlântica é um instrumento de proteção das formações vegetais inseridas em seu domínio (art. 234 do atual Código Estadual), bem como um instrumento de gestão territorial (art. 235 do atual Código Estadual).

Esse documento demonstra um claro comprometimento com a flexibilização das regras ambientais e um total descompromisso com a preservação ecológica. As consequências desse projeto vão além da destruição ambiental: ele viola a Lei Estadual n° 11.520/2000, do Código Estadual vigente, o Código Florestal, a Lei Estadual n° 9.519/1992, além de desconsiderar o Capítulo VI da Constituição da República Federativa do Brasil – 1988.

Movimentos ambientalistas e comunidades indígenas, como o Grupo Gãh Ré, se opõem ao projeto, argumentando que a destruição da Floresta do Sabará comprometeria o meio ambiente e as tradições culturais da região. Em 6 de dezembro de 2024, o grupo participou de um ato na Avenida Protásio Alves, que reuniu diversas pessoas em defesa da preservação da floresta e contra o avanço das obras. O grupo também luta pela demarcação de terras indígenas e pelo reconhecimento de direitos territoriais, que incluem o uso sustentável e a preservação de áreas naturais.

Imagens: google maps/Jan-2025

A deputada estadual Luciana Genro (PSOL) também tem se manifestado contra o desmatamento, questionando as licenças ambientais e se posicionando contra o avanço das construções. Além disso, iniciou uma nova proposta de emenda constitucional, a PEC da Resiliência Climática, que prevê que o Estado aplicará, no mínimo, 1% da receita líquida em investimentos destinados a prevenir danos causados por desastres ambientais e pelas mudanças climáticas. A proposta ainda aguarda parecer na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).

É preciso levantar ainda mais a voz para essas pautas e exigir mais urgência na tramitação desse parecer, o que, por si só, não é suficiente. Defendemos o não pagamento da dívida pública e o direcionamento de todos os recursos necessários para o combate às mudanças climáticas, bem como para a precaução, prevenção e combate aos desastres ambientais. Atualmente, não há registros públicos sobre a posição do prefeito Sebastião Melo (MDB) em relação ao caso, e tudo indica que a administração esteja ciente desse assunto.

O desmatamento da Floresta do Sabará acarretará na perda da biodiversidade, destruindo habitats naturais e forçando animais a se deslocarem para a área urbana. Isso contribuirá para o aumento das mudanças climáticas, levando a enchentes mais frequentes e à diminuição da qualidade do ar. Além disso, o desmatamento desconsidera o direito dessas comunidades de manter sua relação com o território. Animais silvestres como graxains, porcos-espinhos, jacus, ouriços e outros têm aparecido nas casas de moradores e sido atropelados nas ciclovias ao tentarem fugir da obra.

O espaço urbano é construído a partir de pequenas intervenções feitas em nome de grupos privados. A crise ambiental é também consequência da crise urbana gerada pela forma capitalista de organização social. A propriedade privada dos meios de produção gera intervenções fragmentárias na cidade, e as medidas são tomadas de forma autoritária, sem diálogo ou consulta com a população.

Há, em andamento, dois abaixo-assinados (confira aqui e aqui) para que a Floresta do Sabará permaneça em pé e resista. Nós, da OCI, somos aderentes a essa causa e queremos convencer todos a assinarem. Os abaixo-assinados são democráticos ao defenderem a paralisação das obras, a realização de uma audiência pública para escuta e diálogo com moradores e profissionais da área ambiental, além da exigência do Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV).

Hoje, atravessamos uma onda de calor na cidade, e a sensação térmica está insuportável. No ano passado, tivemos o maior desastre ambiental da história do Rio Grande do Sul. O planeta entrou na Era dos Desastres Ambientais e, como tudo no capitalismo, há grupos econômicos lucrando com essas tragédias, enquanto os trabalhadores são os mais vulneráveis. A sociedade já percebe que o clima mudou e que a política também precisa mudar. Mas quem não quer debater a Floresta do Sabará com a população? Quem não quer avaliar os impactos desse empreendimento? Está claro que, se a grande imprensa não noticia essa luta, é porque possui um pacto com o capital e com os inimigos da cidade.

Se não bastasse a Cia Zaffari Bourbon (que lucrou R$ 7,6 bilhões em 2023) ser a principal responsável pela destruição da Floresta do Sabará, a empresa também vem sendo denunciada pelos trabalhadores e investigada por condições abusivas de trabalho, com escalas exaustivas de 10×1 (a mais comum) e até relatos de funcionários submetidos a escalas de 15×1. Há denúncias de horas extras obrigatórias todos os finais de semana, com trabalhadores chegando a atuar por três domingos seguidos. Parte dessas condições degradantes foram normatizadas e estabelecidas no último Acordo Coletivo de Trabalho (ACT) entre a empresa e o Sindicato dos Empregados no Comércio de Porto Alegre (Sindec-POA), entidade que deveria atuar em defesa dos trabalhadores. No entanto, em vez disso, a empresa busca aumentar ao máximo a exploração dos trabalhadores para garantir lucros cada vez maiores para seus acionistas, ao mesmo tempo que desmata a natureza para expandir seus empreendimentos.

Na cláusula trigésima primeira do acordo, que trata sobre o repouso semanal remunerado no domingo — em evidente oposição à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) —, está escrito:

“Estando as empresas autorizadas a trabalharem com a utilização de empregados em domingos, ajustam as partes que, independentemente do gênero, a cada quatro semanas o repouso semanal remunerado deverá coincidir com o domingo, ou seja, após três domingos trabalhados, o outro será necessariamente de repouso. Hipótese em que a concessão do repouso semanal remunerado previsto no art. 7º, XV, da CF poderá ocorrer antes ou após o sétimo e até o décimo dia consecutivo de trabalho, não importando no seu pagamento em dobro, desde que garantido o repouso remunerado em um único dia da semana iniciada na segunda-feira e finalizada no domingo.”

Uma de nossas camaradas da OCI, que trabalhou na empresa, relatou o seguinte:

“…quando fui para a entrevista, eles disseram que iríamos trabalhar dois domingos e folgar um, que as horas extras eram opcionais. Foram muito rápidos para fazer a contratação; no mesmo dia da entrevista, já fiz exame admissional e, para quem estava há tempos desempregado, foi um grande alívio. Mas, após duas semanas, tínhamos que fazer duas horas obrigatórias nas quartas, sextas, sábados e aos domingos. Você não tinha escolha; eles te escalavam sem perguntar se tinha compromisso e só avisavam em cima da hora. No mês das enchentes, várias lojas fecharam, mas ali não: nos ameaçavam dizendo que iríamos para a rua, até os que estavam com as casas alagadas. Eu fiquei quatro domingos sem folga, entrando às sete da manhã e saindo às oito da noite…” — Júlia, ex-funcionária (nome fictício).

Ao ser questionado se estava ciente desses fatos, o presidente do Sindec-POA, Nilton Neco, alegou desconhecer as denúncias e que iria averiguar a situação. No entanto, o resultado da investigação interna concluiu que não havia tais condições de trabalho. Posteriormente, ele voltou atrás, afirmando que estava tudo “dentro das leis”, defendendo o acordo:

“Mas está dentro da lei a escala 10×1.”

Ao ser confrontado sobre a decisão do TST (Tribunal Superior do Trabalho) e a nulidade obtida pelo MPT (Ministério Público do Trabalho), argumentou:

“Não saiu decisão no processo do MPT. Eles entraram e nós fizemos acordo com eles lá. Não saiu decisão ainda.”

Há inúmeras quebras de contrato, além de casos de assédio moral e sexual, que ocorreram dentro da empresa entre funcionários, assim como denúncias de racismo. Essas acusações começaram a ganhar força aos poucos, mas já demonstram a gravidade das condições enfrentadas pelos trabalhadores.

Em 2024, houve protestos em várias regiões do Brasil contra as escalas abusivas de 6×1 e 10×1, organizados por diversas frentes, incluindo a OCI (Organização Comunista Internacionalista), PSTU, PCBR, MST, entre outras entidades de luta. A OCI tem assumido um papel de vanguarda nessa batalha e não tem intenção de recuar. Agora, além das denúncias contra condições de trabalho análogas à escravidão, o avanço da construção na Floresta do Sabará representa mais um ataque direto aos trabalhadores e ao meio ambiente.

Não podemos permitir que o Zaffari tente utilizar a justiça burguesa para reprimir e calar um movimento legítimo! Empresários fazem acordos com burocracias sindicais para aprovar ataques brutais contra os trabalhadores, submetendo jovens a escalas extenuantes e condições degradantes.

Somente a luta organizada da classe trabalhadora pode frear a ganância da burguesia, que destrói florestas e territórios de povos tradicionais ao mesmo tempo em que impõe escalas desumanas aos trabalhadores.

Some-se à Organização Comunista Internacionalista – OCI e lute para derrubar o sistema capitalista! Se você é comunista, organize-se!

Petições:

SOS Floresta do Sabará (peticaopublica.com)

SOS Floresta do Sabará (change.org)

Fontes de pesquisa:

Porto Alegre e a Destruição Ambiental: O Caso da Floresta do Sabará

Devastação da Floresta do Sabará foi denunciada ao MP

Ato em defesa da Floresta do Sabará na Zona Leste de Porto Alegre

Eduardo Leite cortou ou alterou quase 500 pontos do código ambiental do RS em 2019

Rio Grande do Sul debaixo d’água: os governos sabem o que estão fazendo?

Mudança climática: 2024 será o ano mais quente já registrado e o primeiro acima de 1,5°C

Nota técnica

Escala de 10×1 é denunciada por trabalhadores da Companhia Zaffari – ContilNet Notícias

Década mais quente da história: Eles brincam com nossas vidas – Organização Comunista Internacionalista (OCI)